“Hidroxicloroquina sendo aspirada na nebuliza��o. A melhora � imediata. Maldito todos que impedem as pessoas de se curarem. Melhora Imediata”, diz uma das publica��es compartilhadas em diferentes formatos no Facebook (1, 2, 3), no Instagram (1, 2) e no Twitter (1, 2).
Muitas postagens s�o acompanhadas por v�deos do que seria o procedimento de nebuliza��o de hidroxicloroquina, mas sem que seja demonstrado claramente qual � a subst�ncia administrada aos pacientes. Tamb�m n�o foi poss�vel identificar pelas imagens os locais onde esses procedimentos foram feitos.
Em comum �s postagens h� as afirma��es sobre a melhora nos sintomas respirat�rios da covid-19 ap�s a nebuliza��o com hidroxicloroquina.
No entanto, em uma pesquisa no Google n�o foi encontrado qualquer ensaio cl�nico que comprove a efic�cia desse tipo nebuliza��o para o tratamento da covid-19.
Sobre o suposto tratamento, h� um relat�rio de autoria do m�dico Vladimir Zelenko e publicado no site da University of Texas Rio Grande Valley em 24 de janeiro deste ano.
No texto, Zalenko afirma que hidroxicloroquina nebulizada nos primeiros cinco dias de sintomas da doen�a resultou em melhora na respira��o em pacientes infectados com a covid-19 e que a medica��o usada por inala��o tem vantagens em compara��o com o comprimido de hidroxicloroquina ou em combina��o com ivermectina.
Esse relat�rio, entretanto, em nada se assemelha a uma pesquisa cient�fica. N�o � informado o n�mero de pacientes que foram submetidos ao suposto tratamento, nem h� qualquer refer�ncia no texto a um grupo de controle com placebo para que seja feita uma compara��o de resultados.
No final do texto, pode-se constatar uma afirma��o esclarecendo que n�o se trata de um estudo cl�nico: “Este relat�rio � apenas para fins informativos de profissionais m�dicos”.
Zelenko tem defendido o uso da hidroxicloroquina desde o come�o da pandemia do novo coronav�rus, contando com a simpatia do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e de Jair Bolsonaro.
A cloroquina e a hidroxicloroquina s�o medicamentos de uso controlado e indicados no tratamento de algumas doen�as autoimunes, como l�pus e artrite reumatoide, e da mal�ria.
Essas medica��es foram testadas para o tratamento de covid-19, mas sua efic�cia nunca foi cientificamente comprovada, como j� foi mostrado em outras verifica��es do AFP Checamos (1, 2).
Al�m disso, no come�o deste m�s, a Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS), refor�ou em seu guia de cuidados cl�nicos que a hidroxicloroquina n�o deve ser utilizada de maneira preventiva contra a covid-19.
Riscos
� AFP a presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Irma De Godoy, ressaltou que, al�m de a hidroxicloroquina n�o ter efic�cia comprovada contra a covid-19, o fato de um comprimido s�lido ser usado para a nebuliza��o torna esse procedimento ainda mais arriscado para pacientes.
“As medica��es consagradas para uso em casos de asma e doen�a pulmonar cr�nica foram testadas para serem nebulizadas”, compara.
“O que aconteceu [no caso da nebuliza��o de hidroxicloroquina] foi um experimento com seres humanos, sem avalia��o de um comit� de �tica local - dos hospitais, por exemplo - ou do Conselho Nacional de �tica em Pesquisa (Conep). N�o h� nenhum projeto de pesquisa aprovado, n�o h� nenhum trabalho publicado, nenhuma confirma��o, nenhuma evid�ncia de qualquer benef�cio. Pelo contr�rio, o que temos � esse experimento que possivelmente contribuiu para a morte de tr�s pessoas”.
“Isso � totalmente ilegal, anti�tico, um charlatanismo”, denuncia Godoy.
O Minist�rio P�blico do Rio Grande do Sul investiga a conduta da m�dica Eliane Scherer, que receitou por conta pr�pria a nebuliza��o com hidroxicloroquina para pacientes com covid-de do Hospital Nossa Senhora Aparecida, na cidade de Camaqu�, na regi�o sul do estado. A investiga��o foi aberta depois que tr�s pacientes com covid-19 tratados com a nebuliza��o morreram entre os dias 22 e 24 de mar�o.
Depois de ser afastada do hospital, a m�dica que realizou a nebuliza��o em pelo menos seis pacientes recebeu apoio do presidente Jair Bolsonaro, defensor frequente do chamado “tratamento precoce” da doen�a.
Para Jos� David Urban�z, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, nebulizar part�culas s�lidas “pode agravar em muito a �rvore respirat�ria do paciente, aumentando a inflama��o”.
“� como se fosse uma poeira de local de ind�stria. Isso deveria ser punido exemplarmente. � mais um tipo de charlatanismo”, observa.
Godoy concorda e chama a aten��o para outros efeitos adversos que podem ser desencadeados pela pr�tica: “Essas subst�ncias n�o foram feitas para serem inaladas e podem resultar em laringite, traque�te e broncoespasmos”.
Em nota, a Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia tamb�m alertou para os riscos do procedimento: “Em nenhuma diretriz para tratamento de nenhuma doen�a � recomendado o uso de comprimidos por via inalat�ria. O ac�mulo desse material pode, inclusive, causar consequ�ncias a longo prazo como insufici�ncia respirat�ria cr�nica”.
Procuradas pela AFP, as fabricantes de hidroxicloroquina no Brasil EMS e Apsen refor�aram que o uso da medica��o deve estar de acordo com as indica��es previstas na bula.
“N�o h� estudos dos efeitos do Reuquinol [nome da medica��o feito de sulfato de hidroxicloroquina] administrado por vias n�o recomendadas. Portanto, por seguran�a e para garantir a efic�cia desse medicamento, a administra��o deve ser feita somente por via oral, conforme indicado em bula. Refor�ando que n�o h� aprova��o de nenhum �rg�o regulador da sa�de, nem da OMS, para sua utiliza��o no tratamento da covid-19”, esclareceu a Apsen.
“A EMS orienta que a hidroxicloroquina, medicamento de uso oral, seja utilizada conforme as indica��es da bula – para tratamento de mal�ria, artrite reumatoide e l�pus – e sob prescri��o m�dica”, refor�ou a EMS.
Esse conte�do tamb�m foi checado pelo Estad�o Verifica e pelo Aos Fatos.