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Estado de Minas CHECAMOS

Urnas: sistema eleitoral brasileiro tem mecanismos de auditoria

A auditabilidade tem 2 etapas: verificar se os votos foram corretamente computados para o candidato escolhido, e a auditoria do processo de contagem dos votos


06/07/2022 19:50 - atualizado 06/07/2022 19:50


 

Combinação de capturas de tela feita em 4 de julho de 2022 de publicações no Facebook e Twitter
Combina��o de capturas de tela feita em 4 de julho de 2022 de publica��es no Facebook e Twitter (foto: Reprodu��o)
A menos de 100 dias das elei��es gerais de 2022, publica��es alegando que as urnas eletr�nicas brasileiras n�o s�o audit�veis ganham tra��o nas redes sociais. O principal argumento � o fato de as m�quinas eleitorais usadas no pa�s n�o imprimirem o comprovante individual do voto. Tamb�m alega-se que esse tipo de urna s� � usado em mais dois pa�ses, o que indicaria uma falta de seguran�a no processo eleitoral. Mas, diferentemente do que � dito nas redes, o sistema eleitoral brasileiro conta com procedimentos que permitem a sua auditoria. Na vis�o de alguns dos especialistas ouvidos pela AFP, a ado��o de mecanismos adicionais poderia trazer mais auditabilidade e seguran�a ao processo como um todo, o que n�o significa que o sistema atual � inseguro ou facilmente fraud�vel, como sugerem alguns usu�rios.


'Quero meu voto audit�vel para em caso de d�vida haver recontagem com fiscais dos v�rios partidos pol�ticos. ISSO N�O � POSS�VEL COM O SISTEMA ATUAL DE URNA ELETR�NICA', garante uma publica��o no Facebook.

'As urnas emitem a quantidade dos votos conciliando com a quantidade dos votos recebidos pelos candidatos, mas depois disso, n�o existe possibilidade de conferir se o seu voto foi computado para o seu candidato', aponta outro usu�rio.

No Twitter, onde circulam alega��es semelhantes, postagens tamb�m ressaltam que as urnas do Brasil, de Bangladesh e de But�o s�o 'de primeira gera��o e n�o audit�veis'.

Esses argumentos, no entanto, desconsideram o fato de que o sistema brasileiro disponibiliza mecanismos para que o funcionamento de sistemas que geram o arquivo digital de cada voto seja previamente verificado. Al�m disso, tamb�m � poss�vel auditar o processo de totaliza��o, ou contagem, desses votos por meio de comprovantes impressos chamados Boletins de Urna (BUs).

Tipos de auditoria nas etapas de vota��o


A auditabilidade do processo eleitoral brasileiro pode ser dividida em duas etapas: a primeira, para verificar se os votos foram corretamente computados para o candidato escolhido pelo eleitor, e a segunda, que se trata da auditoria do processo de contagem dos votos.

As principais alega��es virais sobre a suposta 'falta de auditabilidade' nas urnas eletr�nicas t�m como foco a primeira etapa. Segundo v�rios usu�rios (1, 2, 3), o fato de a urna brasileira n�o imprimir o registro individual de cada voto - o chamado voto impresso - n�o permite que ela seja auditada.

No lugar do comprovante impresso do voto, a urna usada no Brasil armazena os votos dos eleitores sob a forma de um arquivo eletr�nico chamado Registro Digital do Voto (RDV).

� a partir desse registro digital que se pode fazer a apura��o dos votos na urna. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), partidos pol�ticos e coliga��es podem obter c�pias dos arquivos de RDV de todas as urnas que julgarem necess�rias.

'H� muitos anos o RDV j� est� dispon�vel para auditoria mediante solicita��o das entidades fiscalizadoras do processo eleitoral. E a partir deste ano, todos os arquivos de RDV de todas as urnas ser�o publicados na internet para ampla verifica��o', garantiu o TSE ao Checamos em 17 de junho de 2022.

A verifica��o de que o RDV est� funcionando corretamente e registrando os devidos votos para cada candidato pode ser feita por meio da inspe��o pr�via do c�digo-fonte das urnas eletr�nicas, que est� dispon�vel desde outubro de 2021.

Em uma conversa com a AFP em 29 de junho de 2022, Wilson Ruggiero, phD em Ci�ncia da Computa��o, professor da Universidade de S�o Paulo e membro da Academia Nacional de Engenharia, explicou:

'Se voc� tem a capacidade de ler instru��o por instru��o desse programa [que faz o RDV] e ver que ele faz exatamente o que deve ser feito e n�o faz nada al�m do que ele deve fazer - voc� tem certeza de que o RDV foi registrado corretamente. O sistema de processamento � um sistema determin�stico: uma vez que voc� escreveu aquele programa, ele vai fazer daquele jeito. E da� a import�ncia de ter o c�digo-fonte dispon�vel para todo mundo'.

Atualmente, o docente desenvolve um projeto financiado pelo TSE para aprimorar o sistema eletr�nico brasileiro e que tem como um de seus objetivos melhorar a auditoria do RDV. '[Mas] o fato de um processo de auditoria sobre um determinado elemento poder aceitar melhorias n�o implica, necessariamente, que o elemento n�o � audit�vel", pontuou.

Ruggiero tamb�m destacou que, como parte do projeto, h� uma equipe de pesquisadores que est�o trabalhando no software da urna, analisando-o e testando-o, h� quase um ano.

Para garantir que o software utilizado nas urnas no dia da elei��o seja o mesmo que foi previamente auditado, o TSE realiza uma cerim�nia p�blica de Assinatura Digital e Lacra��o dos Sistemas Eleitorais. Na ocasi�o, s�o lacrados e assinados digitalmente os programas que ser�o usados na urna eletr�nica durante a vota��o.

Outro mecanismo relevante para essa parte da auditoria, segundo os especialistas consultados pelo Checamos, � a cerim�nia de vota��o paralela, uma elei��o simulada e p�blica para verificar se as urnas est�o funcionando corretamente. Um dia antes da elei��o, s�o sorteadas as urnas que passar�o pelo teste, no qual s�o registrados em papel os votos que, depois, ser�o inseridos na urna eletr�nica. Ao final da vota��o, � feita a compara��o entre os votos escritos nas c�dulas em papel e aqueles registrados no equipamento para verificar se a quantidade de votos para cada candidato foi corretamente computada.

'Al�m de todo o processo anterior � elei��o de verifica��o que � feita no software e no hardware das urnas tamb�m tem essa simula��o feita para comprovar que o comportamento � o esperado', disse ao Checamos em 28 de junho de 2022 J�ferson Campos Nobre, professor do Instituto de Inform�tica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Mulher vota no Rio de Janeiro durante o segundo turno das eleições presidenciais em 28 de outubro de 2018
Mulher vota no Rio de Janeiro durante o segundo turno das elei��es presidenciais em 28 de outubro de 2018 (foto: ( AFP / Daniel Ramalho))

A auditoria de totaliza��o dos votos pode ser feita pela sociedade em geral por meio dos boletins de urna (BUs), que se trata de um documento f�sico impresso pela urna eletr�nica ap�s o final da vota��o. Nesse papel s�o indicados quantos votos foram registrados naquela urna espec�fica para cada candidato e para cada partido, al�m de outras informa��es relativas � vota��o.

Esse documento � fixado na porta das respectivas se��es eleitorais e tamb�m est� dispon�vel pela internet. Por meio do Boletim de Urna � poss�vel fazer uma auditoria de forma independente do TSE para verificar se a totaliza��o dos votos feita pela Justi�a Eleitoral est� correta.

Al�m dos procedimentos citados, o TSE tamb�m destaca como mecanismos de auditoria:
Mecanismos de auditoria
Mecanismos de auditoria (foto: Reprodu��o)

O professor Rafael Tim�teo de Sousa, mestre em Sistemas de Informa��o e Computa��o e professor do Departamento de Engenharia El�trica da Universidade de Bras�lia, destacou, ainda, que todo o processo eleitoral brasileiro para a vota��o de outubro de 2022 vem sendo acompanhado pelo Tribunal de Contas da Uni�o (TCU).

'Eu presenciei auditores do TCU em seu trabalho de auditoria. Ent�o temos um fato: a auditoria � poss�vel e � realiz�vel. Existe um �rg�o fazendo auditoria. Acredito que h� uma certa manipula��o na terminologia que � utilizada quando falam que 'a auditoria [da urna brasileira] n�o � poss�vel'. A auditoria segue regras tamb�m', indicou.

No �ltimo relat�rio divulgado pelo TCU, em 2021, o Tribunal concluiu que a urna eletr�nica � audit�vel, contando com diferentes mecanismos de verifica��o.

Urnas de 'primeira gera��o'


Nas redes sociais, usu�rios tamb�m alegam que as urnas brasileiras n�o s�o audit�veis por serem de 'primeira gera��o', sistema que seria usado em poucos pa�ses (1, 2).

O termo 'primeira gera��o' � uma refer�ncia ao fato de as urnas usadas no Brasil serem do tipo DRE (do ingl�s 'Direct Recording Electronic Voting Machines'), ou seja, que n�o imprimem um comprovante impresso do voto. As chamadas urnas de 'segunda gera��o' s�o as que disp�em de um sistema VVPAT (do ingl�s 'Voter-Verified Paper Audit Trails'), que imprimem um comprovante individual de cada voto.

'O DRE foi uma febre mundial no final dos anos 1990 e come�o dos anos 2000, com diversos pa�ses adotando esse tipo de sistema devido � sua praticidade e velocidade de apura��o. No entanto, rapidamente ficou evidente a dificuldade de auditar os sistemas DRE e de conferir transpar�ncia a eles. Pesquisadores passaram, ent�o, a buscar alternativas, com Rebecca Mercuri propondo o VVPAT ('voto impresso') na sua tese de doutorado em 2000', contou ao Checamos em 4 de julho de 2022 Paulo Matias, professor do Departamento de Computa��o da Universidade Federal de S�o Carlos (UFSCar).

O docente explicou que, entre os profissionais da ci�ncia da computa��o, existe o 'princ�pio da independ�ncia do software', segundo o qual um sistema eleitoral � independente 'se uma modifica��o ou erro n�o detectado no seu software n�o puder causar uma mudan�a ou erro indetect�vel no resultado da apura��o". O sistema VVPAT, portanto, seria uma forma de tornar uma m�quina eletr�nica de vota��o um sistema independente do software, j� que manteria o registro de cada voto em papel.

'O princ�pio de independ�ncia de software � o requisito b�sico, de acordo com o consenso cient�fico, necess�rio para rotular um sistema de vota��o como audit�vel. Entretanto, isso n�o quer dizer que � imposs�vel auditar um sistema que n�o siga o princ�pio. Afinal, o TSE realiza diversos processos de auditoria que contribuem, sim, para a seguran�a do processo eleitoral brasileiro', afirmou Matias.

Procurado pelo AFP Checamos, o TSE afirmou que o modelo de classifica��o das urnas por gera��es � 'inconsistente' e desconsidera, por exemplo, o processo evolutivo pelo qual passou a urna brasileira, em especial a mudan�a estrutural realizada no equipamento em 2009.

Naquele ano, foi introduzido o M�dulo de Seguran�a Embarcado, independente do processador principal, para garantir que somente o software desenvolvido pelo TSE possa funcionar na urna.

'Com essa nova arquitetura, mitiga-se de forma definitiva uma s�rie de ataques aos quais os modelos DRE utilizados em outros pa�ses s�o vulner�veis. Essa arquitetura [...] passou a ser denominada de Trusted-DRE - T-DRE (DRE Confi�vel)', continuou o Tribunal, acrescentando que esse modelo � uma inova��o brasileira utilizada somente no pa�s.

Al�m dos sistemas de primeira e segunda gera��o, existem tamb�m m�todos de vota��o chamados de 'terceira gera��o', conhecidos como sistemas de verifica��o fim-a-fim (do ingl�s 'end-to-end'), que, em geral, s�o baseados em mecanismos criptogr�ficos que permitem que o eleitor veja se o seu voto foi corretamente computado.

'Os 'sistemas de segunda gera��o' garantem somente que o seu voto foi registrado para o candidato que voc� escolheu, ao passo que os 'sistemas de terceira gera��o' garantem que o seu voto foi custodiado corretamente (n�o necessariamente de forma f�sica - essa cust�dia pode ser eletr�nica) at� a totaliza��o', resume Paulo Matias.

Lucas Lago, engenheiro da computa��o e pesquisador do CEST-USP, destaca, por�m, que � complexo comparar sistemas eleitorais analisando somente as urnas usadas em cada pa�s, j� que cada na��o tem uma realidade diferente.

'Um exemplo do impacto da realidade brasileira sobre a decis�o da arquitetura � que um dos principais sistemas de vota��o fim a fim (...) foi desenhado para elei��es com poucos candidatos para cada vaga. No cen�rio brasileiro, onde uma elei��o para deputado estadual pode contar com 3 mil candidatos, deve gerar um tempo de processamento bastante elevado para cada voto. Isso geraria atrasos e uma sensa��o ruim ao votar', ponderou.

Limita��es do sistema atual


Na vis�o de Paulo Matias, � verdade que o sistema eleitoral utilizado hoje no Brasil tem limita��es importantes em termos de transpar�ncia e auditabilidade.

Mas esse '� o sistema que foi testado, adaptado � realidade nacional, e que o TSE consegue usar para fazer as elei��es deste ano acontecerem. � importante que o sistema evolua, mas as mudan�as t�m de ser implementadas ao longo de anos de trabalho, com base em discuss�es conjuntas entre TSE, comunidade acad�mica e sociedade'.

Segundo o docente, a urna brasileira precisa evoluir gradualmente para um sistema que seja independente do software. O voto impresso poderia ser um caminho, mas n�o � o �nico.

O TSE tem estudado uma nova arquitetura para o sistema eleitoral brasileiro a fim de permitir a implanta��o do m�todo de vota��o fim a fim, que seria capaz de atender ao princ�pio de independ�ncia do software.

'O fato de haver estudos cient�ficos sobre como melhorar a auditabilidade do sistema eleitoral obviamente n�o significa que ocorra fraude tecnol�gica nas elei��es brasileiras, nem que exista uma conspira��o da posi��o pol�tica rival', acrescentou Matias.

Para Lucas Lago, � correto dizer que a urna brasileira atual n�o permite a realiza��o de uma 'auditoria de limita��o de risco', um processo no qual s�o sorteados e analisados votos ap�s o pleito para verificar estatisticamente se o software do equipamento teve alguma inconsist�ncia.

Por�m, o pesquisador destaca que, desde que autorizados pela Justi�a Eleitoral, existem procedimentos t�cnicos que podem ser usados em uma eventual auditoria, incluindo a vota��o paralela e a auditoria pr�via do c�digo-fonte.

Ainda segundo o engenheiro, embora n�o seja poss�vel afirmar que esse tipo de procedimento leve a um sistema completamente seguro, 'pois nenhum sistema complexo � 100% livre de eventuais falhas', o sistema brasileiro est� em cont�nua evolu��o.

O sistema eleitoral brasileiro 'encontra-se em um estado de robustez no qual tentativas de subverter as diversas 'barreiras de seguran�a' da urna seriam bastante custosas, ou mesmo invi�veis (em especial em larga escala). Mecanismos extras para melhorar a detec��o de eventuais tentativas de subvers�o [fazem] parte da evolu��o cont�nua do sistema. Entretanto, dizer algo como 'sem mecanismos adicionais a urna deve ser considerada insegura' � uma fal�cia'.

Nesse sentido, o fato de que mecanismos adicionais de seguran�a poderiam ser implementados n�o significa que o sistema como um todo � facilmente fraud�vel. Afinal, esses procedimentos tamb�m estar�o sujeitos a eventuais falhas, explicou o acad�mico.

 

O "Beab� da Pol�tica"

s�rie Beab� da Pol�tica reuniu as principais d�vidas sobre elei��es em 22 v�deos e reportagens que respondem essas perguntas de forma direta e f�cil de entender. Uma demanda cada vez maior, principalmente entre o eleitorado brasileiro mais jovem. As reportagens est�o dispon�veis no site do Estado de Minas e no Portal Uai e os v�deos em nossos perfis no TikTokInstagramKwai YouTube.
 


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