As grandes empresas enviam mensagens enganosas sobre os seus esfor�os para reduzir as emiss�es de gases do efeito estufa e frear a mudan�a clim�tica, especialmente atrav�s das redes sociais, advertem ativistas e analistas.
Para eles, o 'greenwashing' ou 'impostura ecol�gica', que consiste em manter um discurso ecol�gico ao mesmo tempo em que se segue promovendo os combust�veis f�sseis, � o novo campo de batalha na luta contra a desinforma��o sobre o clima.
Os cr�ticos dessa pr�tica consideram que tais mensagens 'verdes' buscam disfar�ar a atividade das empresas poluidoras, mesmo conscientes de que o impacto das energias f�sseis na mudan�a clim�tica est� devidamente documentado.
As emiss�es l�quidas zero
O Painel Intergovernamental sobre Mudan�as Clim�ticas (IPCC), da ONU, explica que as emiss�es de gases de efeito estufa devem ser reduzidas ao l�quido zero at� 2050, para respeitar o limite de 1,5 ºC de aumento das temperaturas em rela��o � era pr�-industrial estabelecido no Acordo de Paris, o que, em tese, permitiria evitar as piores consequ�ncias ambientais da mudan�a clim�tica.
A Ag�ncia Internacional de Energia (AIE) publicou em 2021 um roteiro para a transi��o a fontes de energia n�o f�sseis para chegar a esse objetivo. Um dos principais meios � 'n�o investir em novos projetos de abastecimento de combust�veis f�sseis'.
Apesar disso, grandes bancos t�m financiado com milhares de milh�es de d�lares empresas que extraem petr�leo e g�s, segundo uma an�lise da organiza��o ShareAction, especializada em vigil�ncia de investimentos �ticos.
E n�o s�o s� bancos: muitas empresas que assumiram o compromisso seguem defendendo os combust�veis f�sseis, segundo investigadores.
Ativistas clim�ticos e especialistas destacam a diferen�a entre o discurso 'verde' e as a��es reais.
Consultados pela AFP, ExxonMobil e Chevron afirmaram que os cen�rios previstos pelo Acordo de Paris e pela AIE entendem que os combust�veis f�sseis desempenhar�o um papel durante a transi��o, junto �s novas fontes de energias renov�veis.
A compara��o de imagens abaixo mostra um exemplo dessa pr�tica, por parte da companhia energ�tica brit�nica BP: em uma publica��o no Facebook (� esquerda), afirma que 'as empresas que est�o se transformando para serem mais sustent�veis permitem alcan�ar os objetivos do Acordo de Paris mais rapidamente, gra�as a seu tamanho e seus recursos', enquanto em outra da �frica do Sul incentiva a encher o tanque para participar de um concurso.

A BP n�o respondeu �s perguntas da AFP sobre essa quest�o.
Outro exemplo na mesma rede social � o da francesa TotalEnergies: em uma publica��o de fevereiro de 2022 (� esquerda), alega 'participar da descarboniza��o do transporte rodovi�rio', ao mesmo tempo em que sua p�gina para o Marrocos sorteia a cada semana 'um ano de combust�vel' gr�tis.

Ao ser contatada para este artigo, a TotalEnergies se referiu ao discurso de seu diretor geral, Patrick Pouyann�, na assembleia geral de acionistas de maio de 2022, em que detalhou o plano da empresa para alcan�ar um n�vel de emiss�o l�quida zero at� 2050: 'Este enfoque n�o � uma ilus�o nem um exerc�cio de 'greenwashing', est� ancorado em objetivos quantific�veis de redu��o de nossas emiss�es de g�s de efeito estufa', disse.
Pinguins e petr�leo
A chave para identificar o 'greenwashing' � observar quanto diferem as a��es das empresas das normas que os cientistas consideram necess�rias para reduzir realmente as emiss�es, explicou � AFP a ativista e pesquisadora norte-americana Genevieve Guenther.
O Greenpeace sinaliza que as empresas recorrem a "afirma��es audaciosas, imagens inspiradas na natureza e a palavras 'verdes' da moda', enquanto 'ignoram outras quest�es ambientais mais importantes'.
O observat�rio Eco-Bot.net, cujo objetivo � 'revelar a desinforma��o em torno da mudan�a clim�tica e do 'greenwashing' das empresas durante a COP26', celebrada em 2021, aponta por sua vez a comunica��o que 'apresenta a��es simb�licas para construir uma imagem de marca simp�tica'. A organiza��o identificou an�ncios e mensagens em redes sociais sobre a prote��o dos bichos-da-seda (da empresa mexicana Cemex), dos sapos (da empresa de g�s TransCanada), dos pinguins (da brasileira Petrobras), dos bosques (da espanhola Repsol, entre outras) e uma mensagem da gigante norte-americana ExxonMobil sobre a reciclagem de redes de pesca na Patag�nia chilena.

Zona cinza
Este tipo de mensagem usualmente escapa ao trabalho de verifica��o da informa��o (fact-checking) tradicional, assinalam v�rios dos especialistas consultados pela AFP.
'A impostura ecol�gica � uma forma muito mais complexa de desinforma��o', n�o pode ser classificada como 'verdadeira' ou 'falsa', apontou Melissa Aronczyk, professora de Comunica��o da Universidade Rutgers, de Nova Jersey, e coautora de v�rios estudos sobre o tema.
Emmanuel Vincent, fundador do site de verifica��o especializado em quest�es clim�ticas Climate Feedback, concordou e destacou que o 'greenwashing' se encontra em uma 'zona cinza' para a verifica��o.

A pr�pria natureza das atividades de 'greenwashing' faz com que elas sejam 'dif�ceis de identificar', analisou Aronczyk. 'Se uma empresa diz que est� avan�ando para as emiss�es l�quidas zero ou que luta contra a mudan�a clim�tica com ve�culos el�tricos (...), como pode algu�m investigar ou refutar isso?'
Impacto e atraso
Segundo ativistas clim�ticos, a promo��o de slogans ambientais tranquilizadores (como as iniciativas das empresas sobre a prote��o da fauna local) e os planos de a��o com uma utilidade limitada prejudicam o trabalho que deve ser feito para conter as mudan�as clim�ticas.
'Este 'branqueamento ecol�gico' � fundamentalmente uma t�tica que busca atrasar a regula��o governamental. Tamb�m pode enganar o p�blico, ao convenc�-lo que j� foram tomadas medidas a favor do clima quando as 'Big Oil' [as grandes companhias petroleiras] seguem pressionando para que haja novas explora��es petroleiras e de g�s', considera Faye Holder, diretora de programa em InfluenceMap.
Esse grupo de reflex�o tem analisado milhares de documentos para avaliar as mensagens de empresas energ�ticas em redes sociais e compar�-las com suas a��es.
'Temos visto que as grandes petroleiras usam diferentes estrat�gias de mensagens p�blicas para tentar acalmar as preocupa��es' sobre as mudan�as clim�ticas, explicou Holder.
Um estudo publicado em fevereiro de 2022 pela revista cient�fica PLOS One analisou tamb�m a diferen�a entre as palavras e os atos sobre a mudan�a clim�tica de quatro multinacionais energ�ticas: BP, Shell, ExxonMobil e Chevron.
Suas estrat�gias 'verdes' est�o 'dominadas mais pelas promessas do que pelas a��es concretas', concluiu o estudo, cuja autora principal � Mei Li, da Universidade de Tohoku, Jap�o.

Contatadas pela equipe de checagem da AFP, essas empresas detalharam os esfor�os que fazem em temas clim�ticos: energias alternativas, captura e armazenamento de carbono.
A ExxonMobil e Chevron destacaram suas medidas a favor do clima em v�rios informes. A Shell sublinhou seu objetivo de emiss�es l�quidas zero e suas pol�ticas de transi��o. A BP n�o respondeu � solicita��o da AFP (sua estrat�gia clim�tica pode ser consultada aqui).
O 'greenwashing' diante da justi�a
A empresa francesa TotalEnergies tem dirigido parte de sua produ��o para o g�s, uma energia criticada pelos ativistas, por�m considerada uma forma de garantir a transi��o para as energias limpas, j� que emite menos gases de efeito estufa que o carbono e o petr�leo.
Isso n�o a impediu de ser levada para a justi�a por 'pr�ticas comerciais enganosas' por ONGs ao apresentar seus produtos em uma campanha na m�dia e na internet em 2021. Eles p�em em d�vida sua ambi��o declarada de neutralidade de carbono at� 2050 e que apresente o g�s como a energia f�ssil 'mais limpa'.
'A TotalEnergies executa sua estrat�gia de forma concreta (investimentos, novos of�cios, redu��o significativa de gases de efeito estufa...) e est� alinhada com os objetivos que a empresa estabeleceu para alcan�ar a neutralidade de carbono em 2050', respondeu um porta-voz do grupo petroleiro. 'Por isso, � falso dizer que nossa estrat�gia � 'greenwashing'', disse � AFP.
Nos Estados Unidos, a cidade de Nova York lan�ou em 2021 uma a��o judicial parecida contra ExxonMobil, Shell, BP e American Petroleum Institute (API), um poderoso grupo de press�o, acusados de 'enganar intencional e sistematicamente os nova-iorquinos" com sua publicidade.

Grupos de press�o
Segundo os ativistas do clima, os v�nculos entre essas empresas e os grupos de press�o (conhecidos como 'lobistas') favor�veis �s energias f�sseis demonstram a natureza ambivalente de sua comunica��o p�blica em mat�ria de energia e mudan�as clim�ticas.
Uma an�lise do InfluenceMap mostrou que as cinco maiores empresas petroleiras e de g�s que cotam na bolsa gastaram 1 bilh�o de d�lares para promover mensagens 'enganosas' sobre o clima atrav�s 'da imagem da marca e atividades de press�o' nos tr�s anos posteriores � assinatura do Acordo de Paris.
Nos Estados Unidos, uma comiss�o liderada pelos democratas colocou � prova grandes empresas ao solicitar que seus dirigentes declarassem sobre suas atividades de lobby.
'Por um lado, se comportam como se atuassem em conformidade com esses importantes objetivos em mat�ria de mudan�a clim�tica. Por outro, criam grupos de press�o para transmitir uma mensagem que vai diretamente no sentido contr�rio a esses objetivos', declarou o deputado democrata John Sarbanes, em uma audi�ncia da comiss�o em 8 de fevereiro de 2022.
'Grande parte das atividades de press�o foram realizadas de forma indireta, inteligente, h�bil e c�nica por grupos comerciais industriais formados por essas empresas', disse Sarbanes � comiss�o.
Em uma reportagem publicada pela emissora p�blica brit�nica Channel 4 News, em 2021, um lobista que trabalhou para a ExxonMobil foi gravado enquanto admitia, durante uma entrevista com ativistas do Greenpeace, que faziam-se passar por ca�a-talentos, que havia 'lutado de forma muito ativa contra certos dados cient�ficos' para 'proteger [seus] investimentos'.
Os montantes que os grupos de combust�veis f�sseis gastam em a��es de lobby federal nos Estados Unidos e diante das institui��es europeias em Bruxelas s�o p�blicos e consult�veis. Por�m as quantias declaradas s�o insignificantes em compara��o com os valores globais que as empresas dedicam a publicidade, rela��es p�blicas e outras formas de influ�ncia, segundo estudos realizados por investigadores como Aronczyk.