
Al�m da CPI, a Prevent Senior � investigada tamb�m pelo Minist�rio P�blico de S�o Paulo, pela Ag�ncia Nacional de Sa�de Suplementar (ANS) - �rg�o do governo federal que regula o setor de planos de sa�de - e pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de S�o Paulo (Cremesp).
A operadora de planos de sa�de � suspeita de pressionar seus m�dicos a prescrever rem�dios sem efic�cia comprovada para o tratamento da covid-19 ; ministrar esses medicamentos em alguns casos sem o consentimento dos pacientes e seus familiares; e fraudar atestados de �bito, registrando mortes pelo coronav�rus com outras causas.
Em depoimento � CPI da Covid na quarta-feira (22/9), o diretor-executivo da Prevent Senior, Pedro Batista, negou as acusa��es e disse que o dossi� apresentado � comiss�o � fruto de dados roubados e manipulados. A empresa pediu que a Procuradoria-Geral da Rep�blica investigue o caso.
Em meio a todas essas den�ncias, a empresa enfrenta a maior crise de imagem desde sua funda��o, em 1997.
No entanto, benefici�rios insatisfeitos com acusa��es de m�-conduta da companhia se veem numa sinuca de bico: praticamente n�o existem concorrentes que ofere�am planos para idosos na mesma faixa de pre�os da Prevent Senior em S�o Paulo, maior mercado para planos de sa�de do pa�s e regi�o de foco de atua��o da empresa.
Assim, analistas avaliam que, mesmo diante da sucess�o de esc�ndalos envolvendo a companhia, ela tende a ser pouco afetada em seu n�mero de benefici�rios - atualmente em 542 mil, segundo a ANS, o que coloca a operadora entre as dez maiores do Brasil.
Como os idosos clientes da Prevent chegaram nessa situa��o, de quase n�o terem alternativas no mercado de planos de sa�de paulista? E como a empresa cresceu apostando nesse segmento desprezado pelas demais operadoras? Contamos aqui.

Hist�ria da Prevent Senior
A Prevent Senior foi fundada pelos irm�os Fernando e Eduardo Parrillo, que come�aram a atuar no setor de sa�de no neg�cio de remo��o de pacientes por ambul�ncia.
Fernando Parrillo falou sobre isso em entrevista publicada em 2007 na revista Mem�ria Empresarial:
"Em 1996, surgiu a ideia da ambul�ncia. Eu era o motorista, e o meu irm�o, quando remov�amos pacientes de UTI, ia como m�dico na parte de tr�s.
Come�amos dessa forma, com uma empresa chamada Remotion, quando percebemos que poder�amos exercer outra fun��o. Em vez de fazermos a remo��o, n�s poder�amos ser a empresa que recebia os pacientes", contou o hoje presidente-executivo da Prevent Senior.
O passo seguinte dos irm�os foi comprar uma cl�nica em Santo Amaro e criar um plano de sa�de. Em seguida, eles decidiram investir numa estrutura pr�pria, para que a cl�nica n�o dependesse mais das empresas de ambul�ncia para fazer a remo��o dos pacientes.
O pr�ximo passo, segundo o empres�rio, foi criar um modelo de neg�cios focado na preven��o e no p�blico com mais de 60 anos.
"Nessa fase, apareceu a oportunidade da compra de um hospital na Bela Vista [bairro da regi�o central de S�o Paulo], que foi o grande salto da nossa vida", contou Fernando Parrillo. Esse primeiro hospital foi inaugurado em 1997.
"Outra estrat�gia fundamental foi investir em publicidade pela televis�o. Ainda n�o existia merchandising de operadora de sa�de, e n�s fomos os primeiros a entrar. Quando o meu irm�o aparecia falando do nosso sistema em um programa vespertino, era uma loucura para atender todas as chamadas telef�nicas."
O modelo de neg�cios deu certo: a empresa viu seu faturamento saltar de R$ 449 milh�es em 2011, para R$ 1 bilh�o em 2014 e mais de R$ 4 bilh�es em 2020. O lucro acompanhou essa trajet�ria ascendente, indo de R$ 33 milh�es em 2011, para R$ 496 milh�es no ano passado.
Por que a maioria das operadoras cobra pre�os exorbitantes dos idosos?
"A Prevent Senior � um caso �nico em seu segmento, que desafia a l�gica do setor", observava a XP Asset Manegment, em relat�rio de 2020.
"Apresenta majoritariamente benefici�rios idosos, que a princ�pio oneram mais a rede devido � maior frequ�ncia de atendimentos, sobretudo dos mais complexos e interna��es, e ainda assim exibe margens de rentabilidade muito acima da m�dia do setor."
O coment�rio da gestora de recursos ajuda a entender por que os outros planos cobram pre�os proibitivos dos idosos - o que fez a Prevent se destacar ao cobrar mensalidades de em m�dia R$ 800.
"O pre�o tem a ver com risco na �rea planos de sa�de", explica Carlos Suslik, m�dico, consultor na �rea de sa�de e ex-diretor executivo do Instituto Central do Hospital das Cl�nicas (HC) de S�o Paulo.
"A gente costuma dizer na �rea de sa�de que a pessoa gasta 50% de tudo que ela gasta em sa�de ao longo da vida no �ltimo ano de vida, porque � nesse �ltimo ano que em geral vem o 'evento catastr�fico', como um c�ncer, um infarto, um AVC [acidente vascular cerebral]", exemplifica o consultor.
"� muito dif�cil a gente morrer que nem um passarinho, que dorme, e no dia seguinte est� morto. E, quanto mais velho a gente est�, mais pr�ximo estamos desse �ltimo ano de vida. Isso faz com que o custo da sa�de do idoso seja muito maior", justifica.

A quest�o das faixas et�rias para reajuste dos planos
Para Alessandro Acayaba de Toledo, presidente da Anab (Associa��o Nacional das Administradoras de Benef�cios), um outro fator que leva aos altos pre�os dos planos de sa�de para idosos � o fato de, a partir de 2004, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), os planos de sa�de terem ficado proibidos de fazer reajustes por faixa et�ria para pessoas acima dos 60 anos.
At� 2004, os planos tinham sete faixas et�rias, sendo as �ltimas 50 a 59 anos, 60 a 69 anos e 70 anos em diante. Depois do Estatuto do Idoso, as faixas passaram a ser dez, mas a �ltima delas � 59 anos ou mais.
A partir dessa idade, portanto, os planos n�o podem mais fazer reajuste por faixa et�ria, mas apenas o reajuste anual baseado na varia��o dos custos m�dico-hospitalares e na sinistralidade (n�mero de vezes em que o plano de sa�de � usado pelos pacientes).
"Por essa regra, o cara de 65 anos paga a mesma coisa que o cara de 85 anos. Isso faz com que o plano tenha que cobrar mais caro de todo mundo na m�dia", argumenta Suslik, que defende a volta das faixas adicionais para os idosos mais velhos.
Matheus Falc�o, advogado do programa de Sa�de do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), discorda da proposta e diz que a faixa �nica acima dos 59 anos foi estabelecida para proteger os direitos dos idosos.
"Conhecemos esse argumento, mas n�o concordamos com essa tese", diz Falc�o. "Foi estabelecida uma faixa s� porque o Estatuto do Idoso veta a discrimina��o entre idosos. A proibi��o de que haja reajustes distintos � uma forma de proteger essa parcela da popula��o", considera.
Segundo o advogado, o mercado de planos de sa�de � orientado pelo princ�pio do mutualismo, em que os setores mais jovens ajudam a financiar os mais velhos. "Voc� n�o pode individualizar o risco, isso quebra com a ideia do mutualismo. Se voc� permitir que as pessoas mais velhas recebam reajustes mais elevados, isso vai expulsando as pessoas nos n�veis mais elevados e nada garantiria que as operadoras reduziriam o percentual de reajuste."
Como a Prevent conseguiu ent�o ser bem sucedida atendendo idosos?
Segundo dados da ANS, a Prevent Senior tem 76% de sua carteira de benefici�rios composta por idosos, comparado a uma m�dia de 14,2% do setor. A idade m�dia dos pacientes da operadora � de 66,6 anos, contra m�dia setorial de 35,8 anos.
O que garante � operadora menores custos do que a concorr�ncia e permite a ela oferecer planos mais baratos aos idosos � a verticaliza��o, jarg�o do mundo dos neg�cios para quando uma empresa controla as diversas etapas do seu processo, sem terceiriz�-las para outras companhias.
"A empresa conseguiu com muito sucesso implementar uma estrutura muito vertical, centrando grande parte dos atendimentos e exames, dos simples aos complexos, em seus postos de atendimentos e rede pr�pria de hospitais, conhecida como Sancta Maggiore", diz a XP Asset no seu relat�rio.
Suslik explica que o uso da rede pr�pria permite � empresa um maior controle dos custos.
"Na rede pr�pria, voc� consegue regular o uso de exames, de laborat�rios, de interna��es, o tempo de interna��o, porque a rede � sua", diz o consultor, lembrando que outras operadoras tamb�m t�m redes pr�prias, como NotreDame Interm�dica, Hapvida e Unimed, no Brasil, e a Kaiser Permanente, no mercado americano.
Outro fator que reduz o custo da Prevent, segundo o ex-diretor do HC, � a regionaliza��o.
"Se um paciente da Prevent de S�o Paulo passar mal em Manaus, ele n�o tem cobertura - quem compra sabe disso. Isso reduz custos porque, para ter uma cobertura nacional, � preciso credenciar servi�os no pa�s inteiro, para um n�mero de pacientes muito pequeno, ent�o o pre�o para credenciar � muito mais alto, porque voc� n�o tem poder de barganha", explica.
O problema desse modelo baseado em rede pr�pria e regionaliza��o � a dificuldade de escalar o neg�cio. Isso explica por que somente em 2020 a Prevent Senior expandiu sua atua��o para o Rio de Janeiro, ainda restrita � capital fluminense.
Plano individual ou coletivo?
Outra peculiaridade do modelo de neg�cios da Prevent � apostar quase que exclusivamente em planos individuais ou familiares, quando a maioria do setor prefere os planos coletivos, que s�o aqueles oferecidos por empresas ou associa��es de classe, como os sindicatos.
Segundo a ANS, a Prevent tem 94,5% de benefici�rios em planos individuais ou familiares e somente 5,5% em planos coletivos. No setor em geral, 81,4% dos benefici�rios est�o em planos coletivos.
"A diferen�a � que, nos planos individuais, a defini��o do reajuste � feita pela pr�pria ANS - recentemente, numa decis�o in�dita da ag�ncia, teve at� um reajuste negativo. Enquanto isso, nos planos coletivos, h� uma liberdade de reajuste entre as empresas contratantes", explica Toledo, da Anab.
"Historicamente, o �ndice de reajuste aplicado aos planos individuais � inferior �quele aplicado aos planos coletivos, ent�o as operadoras j� h� muito tempo desestimularam a comercializa��o de planos individuais e passaram a ter oferta maior de planos coletivos."
- ANS investiga Hapvida e faz dilig�ncias para apurar suspeitas em prescri��es contra a covid-19
- O que � o glicoc�lix, pouco conhecido �rg�o humano que se espalha pelo corpo inteiro
Aqui, novamente, o representante do setor de planos de sa�de defende que uma menor regula��o pela ANS poderia aumentar a competi��o no segmento de planos individuais, dando mais op��es aos consumidores. E aqui, tamb�m de novo, o advogado do Idec discorda.
"No entendimento do Idec, a solu��o seria que a regula��o se estendesse tamb�m para os planos coletivos", diz Falc�o, do instituto de defesa do consumidor. "O problema n�o est� na regula��o dos planos individuais, est� na falta de regula��o dos planos coletivos, que permite �s operadores cobrarem a� pre�os mais elevados."
Para o advogado, o que poderia reduzir custos no setor de planos de sa�de e permitir uma maior oferta de servi�os para os idosos seria uma maior transpar�ncia nos custos das operadoras, o que beneficiaria empresas e consumidores, na sua vis�o.
Idosos sem alternativa
O resultado desse modelo �nico criado pela Prevent e da falta de competi��o no segmento em que ela atua � que seus pacientes n�o t�m muita op��o, se ficarem descontentes.
"Se eu n�o tenho outra op��o, ou a outra op��o � pior, eu fico onde estou, � basicamente isso", diz Suslik.
Ele tamb�m descarta que as concorrentes tentem aproveitar a crise de imagem da empresa para abocanhar parte do seu fil�o. "Esse modelo que eles fizeram � muito dif�cil de copiar, eles s�o muito especializados na terceira idade e s�o muito bons nisso. Mesmo quando o [ex-ministro da Sa�de Luiz Henrique] Mandetta criticou a empresa, e eles tamb�m tiveram uma perda de imagem, aumentou o n�mero de pacientes", exemplifica o consultor.
Ele faz refer�ncia a epis�dio ocorrido em mar�o de 2020, quando o ent�o ministro acusou a Prevent Senior de promover "aglomera��o de idosos", num momento em que a rede era destaque no notici�rio pelo n�mero elevado de mortes por covid-19 em seus hospitais.

Prevent Senior: como plano de sa�de investigado cresceu como '�nica alternativa' para idosos
Toledo, da Anab, avalia que a situa��o da empresa poderia se complicar mais, caso as diversas investiga��es em andamento sobre a Prevent se estendam do �mbito da pandemia para outras pr�ticas. Mas tamb�m avalia que as op��es dos idosos s�o restritas.
"A partir dessas den�ncias de impulsionamento do 'kit covid', da hidroxicloroquina e outras coisas mais, por talvez ser um tratamento mais em conta, mais barato, isso chama a aten��o das autoridades e pode eventualmente ter desdobramentos para saber se esse tipo de pr�tica se replicava em outros modelos de aten��o e assist�ncia �s pessoas", afirma.
O representante lembra que uma pesquisa do Instituto Vox Populi, encomendada pelo IESS (Instituto de Estudos de Sa�de Suplementar) e divulgada em junho deste ano, mostrou que ter um plano de sa�de � o terceiro maior desejo do brasileiro, atr�s de casa pr�pria e educa��o.
"� claro que os idosos que t�m l� seu dinheirinho querem ter uma assist�ncia m�dica privada de qualidade, mas muitas vezes n�o cabe no bolso deles. A� a Prevent Senior acaba apresentando uma solu��o com custo benef�cio interessante. O fato de ela estar no centro da CPI arranha, � claro, a imagem da empresa, mas, no fim do dia, as pessoas nessa faixa et�ria n�o t�m uma outra op��o."
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube ? Inscreva-se no nosso canal!
Leia mais sobre a COVID-19
- Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil e suas diferen�as
- Minas Gerais tem 10 vacinas em pesquisa nas universidades
- Entenda as regras de prote��o contra as novas cepas
- Como funciona o 'passaporte de vacina��o'?
- Os protocolos para a volta �s aulas em BH
- Pandemia, epidemia e endemia. Entenda a diferen�a
-
Quais os sintomas do coronav�rus?