
Uma semana depois de ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de pris�o e perdoado em seguida pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) viveu mais uma reviravolta nessa quarta-feira (27/04).
Ele se tornou membro titular da Comiss�o de Constitui��o e Justi�a (CCJ) da C�mara dos Deputados, a mais importante da Casa. Al�m disso, foi eleito vice-presidente da Comiss�o de Seguran�a P�blica da C�mara.
Mas como o deputado condenado na semana passada e cujo perd�o ainda est� sendo analisado pelo STF passou a ocupar cargos de destaque na C�mara dos Deputados?
A explica��o de como isso aconteceu tem dois fatores: acordo entre os partidos da base de apoio de Bolsonaro, de um lado, e um recurso aguardando an�lise no STF, de outro.
Para entender o caso � preciso voltar ao julgamento de Silveira pelo Supremo. Na quarta-feira passada, ele foi condenado — por 10 votos a 1 — e as puni��es estipuladas foram de oito anos e nove meses de pris�o, perda do mandato de deputado federal e suspens�o dos direitos pol�ticos pelos crimes de coa��o em processo judicial e tentativa de impedir o livre exerc�cio dos poderes da Uni�o.Entre 2020 e 2021, ele divulgou v�deos com ataques a ministros do STF e pedindo um golpe militar no pa�s.
Daniel Silveira � um dos militantes bolsonaristas mais conhecidos do p�blico. Em 2018, ele ficou famoso ao participar de uma manifesta��o no Rio de Janeiro durante a qual ele quebrou uma placa com o nome da vereadora Marielle Franco, morta a tiros em mar�o daquele ano.
A condena��o de Silveira mobilizou a base bolsonarista e, no dia seguinte, o presidente Jair Bolsonaro usou suas redes sociais para anunciar um decreto no qual ele concedeu uma "gra�a" a Daniel Silveira. Gra�a � o termo jur�dico para um perd�o de pena individual.
No Brasil, a tradi��o � que os perd�es de penas sejam dados a grupos de pessoas condenadas a tipos espec�ficos de crimes, e n�o individualmente. Apesar disso, a gra�a est� prevista na legisla��o brasileira.
O decreto do presidente criou mais um atrito com o Judici�rio. A oposi��o questionou a legalidade do perd�o dado a Bolsonaro alegando, entre outras coisas, que teria havido um "desvio de finalidade", uma vez que o presidente estaria ajudando um aliado.
Recurso em an�lise
A Rede Sustentabilidade entrou com um recurso no STF pedindo a anula��o do decreto. Na pr�tica, isso significaria que a decis�o do Supremo seria mantida e Silveira poderia perder o mandato. O caso, por�m, est� sob a relatoria da ministra Rosa Weber, mas ainda n�o foi deliberado pelo Supremo.

Al�m da quest�o envolvendo a validade do decreto, os ministros tamb�m avaliam duas outras quest�es: se cabe, de fato ao Supremo determinar a perda de mandato ou se essa decis�o � exclusiva da C�mara; e se mesmo recebendo o perd�o presidencial, Silveira est� ineleg�vel e impedido de disputar as elei��es deste ano.
Nos bastidores, o temor � de que uma decis�o contr�ria ao decreto de Bolsonaro aumente ainda mais a tens�o entre o Judici�rio e o Executivo.
Mas enquanto o recurso n�o � julgado, Daniel Silveira continua exercendo o seu mandato normalmente, inclusive transitando pelas instala��es da C�mara dos Deputados livremente.
Elei��es e acordos
O outro ponto que ajuda a explicar como Silveira saiu de deputado condenado a membro de comiss�es importantes s�o os acordos partid�rios em vigor na C�mara dos Deputados.
As duas comiss�es das quais Silveira � membro fazem parte das chamadas "comiss�es permanentes".
� nessas comiss�es que tramitam, inicialmente, projetos de lei sugeridos tanto pelos parlamentares quanto pelo Executivo. Essas comiss�es s�o respons�veis por analisar os projetos e produzirem pareceres e mudan�as no texto antes de eles serem encaminhados � vota��o pelo Plen�rio da C�mara.
No caso da CCJ, ela � ainda mais importante porque ela � que analisa se uma proposta legislativa � constitucional ou n�o. Em outras palavras, a delibera��o da CCJ pode fazer avan�ar ou derrubar um projeto de lei.
Al�m disso, a comiss�o funciona como uma esp�cie de c�mara recursal para an�lise de decis�es da Presid�ncia da C�mara.
A cada ano, os seus membros s�o trocados. De acordo com o regimento interno da C�mara, a escolha dos integrantes de cada uma � feita por meio da indica��o dos l�deres de cada partido, respeitando crit�rios como proporcionalidade e forma��o de blocos partid�rios.
Os blocos partid�rios mais fortes t�m direito de escolher um maior n�mero de comiss�es que desejem comandar.
Uma vez definido o controle das comiss�es, parte-se para a indica��o dos seus integrantes. Neste momento, o crit�rio para defini��o de quantos nomes um partido ter� em cada comiss�o � o tamanho da sua bancada na C�mara.
"N�o h� vota��o para saber quem ser�o os integrantes de cada comiss�o. Eles s�o escolhidos por meio dos acordos feitos entre as lideran�as partid�rias sempre que um novo ano legislativo come�a. S�o os l�deres que indicam os seus integrantes", explicou o coordenador das comiss�es permanentes da C�mara, Marcelo Brand�o Lapa.
Brand�o explica que, uma vez selecionados os membros da comiss�o, h� uma elei��o interna para decidir quem vai presidi-la.
Ele afirma que o comando da comiss�o tamb�m �, normalmente, acertado previamente entre os pr�prios l�deres partid�rios e que, raramente, h� chapas formadas por integrantes dela disputando o seu controle.
No caso da CCJ e da Comiss�o de Seguran�a P�blica, o respons�vel pela indica��o de Silveira foi o l�der do partido na C�mara, o deputado Paulo Bengtson (PTB-PA).
Segundo ele, o fato de Silveira ser bacharel em direito e ex-policial militar o credencia a integrar as duas comiss�es.
"Ele tem forma��o compat�vel com o que se espera de um parlamentar nessas duas comiss�es. Como foi PM, ele pode ajudar bastante a causa da seguran�a p�blica", diz Bengtson, cujo partido faz parte da base aliada do governo Bolsonaro.
O PTB tamb�m � o partido de outro aliado de Bolsonaro, o ex-deputado federal Roberto Jefferson, que est� em pris�o domiciliar determinada pelo STF e que � investigado em inqu�rito que apura ataques a institui��es democr�ticas.
Bengtson negou que a indica��o de Silveira para as duas comiss�es tenha sido determinada pelo governo e disse que a indica��o do deputado foi poss�vel porque, do ponto de vista legal, ele est� no pleno exerc�cio do seu mandato.
"A indica��o � uma decis�o discricion�ria minha e tomei sem consultar o governo. O deputado est� exercendo seu mandato de forma legal e, por isso, n�o haveria nenhum impedimento para que ele fosse indicado", diz o deputado.
A chegada de Silveira �s comiss�es, no entanto, causou rea��o na oposi��o. A deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) classificou a indica��o de Silveira � CCJ como um "acinte".
"Queria expressar a minha indigna��o com indica��o do PTB de Daniel Silveira para a principal comiss�o da Casa. A Casa que deveria zelar pela Constitui��o de 1988 e que, na verdade, vive esse acinte de ter na titularidade algu�m que j� deveria ter ido cassado, algu�m que j� foi condenado por 10 votos a 8 anos de pris�o, que est� ineleg�vel que foi indultado pelo presidente da Rep�blica num indulto ilegal", disse a parlamentar.
At� que haja uma nova defini��o sobre a condena��o de Silveira pelo STF, a tend�ncia � que ele continue integrando as duas comiss�es at� o fim deste ano legislativo, que dever� se encerrar apenas em 2023.
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