
O governo federal quer que os manifestantes que depredaram os pr�dios dos Tr�s Poderes, nos atos antidemocr�ticos de 8 de janeiro, paguem pelos preju�zos ao patrim�nio p�blico. A maioria dos golpistas na mira da Advocacia-Geral da Uni�o (AGU) produziram provas contra si mesmos, divulgando imagens e v�deos nas redes sociais comemorando o movimento criminoso, chamado de "tomada do Poder". Caso condenados, conforme o parecer da AGU, eles dever�o ressarcir os danos. O valor total estimado � de R$ 26,2 milh�es. O problema, conforme explicam alguns juristas, � que apesar da materialidade das provas, esse tipo de dano n�o �, expressamente, disposto em lei no Brasil.
Os casos tramitam sob segredo de justi�a na 8ª Vara Federal de Bras�lia. O �ltimo relat�rio divulgado pela AGU, em maio, ressaltou que, do valor total, R$ 7,9 milh�es s�o referentes apenas aos danos ao pr�dio do Pal�cio do Planalto — um dos principais alvos dos manifestantes no 8 de janeiro. Nesse montante, n�o foram contabilizados preju�zos com objetos hist�ricos e obras de artes danificados dentro do pal�cio, como o rel�gio de Balthazar Martinot, tamb�m chamado de rel�gio de Dom Jo�o VI, doado pela corte francesa e trazido ao Brasil em 1808. O objeto, destru�do por Ant�nio Cl�udio Alves Ferreira, de 30 anos — detido em Uberl�ndia (MG) — � considerado raro e de valor inestim�vel.
A AGU prop�s sete a��es c�veis, pedindo que 280 manifestantes reparem os danos cometidos. Na grande maioria, esses denunciados pelos ataques �s sedes dos Tr�s Poderes s�o depredadores que foram presos em flagrante por estarem praticando o delito, seja invadindo ou destruindo os pr�dios. Ao todo, mais de 2 mil pessoas foram detidas, e atualmente 253 delas permanecem presas. A grande maioria est� encarcerada no Complexo Penitenci�rio da Papuda.
A expectativa � que a AGU ofere�a mais a��es, j� que a quantidade de pessoas denunciadas pela Procuradoria-Geral da Rep�blica (PGR), por exemplo, � bem maior. Assim como a AGU, o Grupo Estrat�gico de Combate aos Atos Antidemocr�ticos da PGR — respons�vel por denunciar os manifestantes que participaram dos atos — imputa dentro das den�ncias oferecidas o crime de danos ao patrim�nio p�blico. O "leque" ainda contempla crimes como a incita��o � animosidade das For�as Armadas contra os Poderes constitu�dos, tentativa de aboli��o do Estado Democr�tico de Direito e associa��o criminosa, entre outros.
Como forma de chegar � identifica��o e pedir o ressarcimento, a AGU utilizou dados da Ag�ncia Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para descobrir os acusados de financiarem o fretamento de �nibus de golpistas � Bras�lia, al�m de um trabalho minucioso da intelig�ncia da Pol�cia do Senado Federal, que identificou publica��es deles em redes sociais, feitas no dia 8 de janeiro.
Dificuldade
Para o jurista Bernardo Linhares Marchesini a a��o encontrar� dificuldades para individualizar o dano cometido por cada um, bem como o nexo de causalidade entre a a��o e o preju�zo dos bens. O especialista explica que os advogados da AGU ter�o de batalhar nesse campo, apesar da materialidade das provas. "A sa�da mais interessante seria buscar o que se chama no direito americano de 'punitive damages', que s�o indeniza��es concedidas com a inten��o de punir atitudes que causaram danos, exatamente como ocorrido neste caso", diz.
"O problema � que, mesmo que aceito aos poucos em alguns tribunais do Brasil, esse tipo de dano n�o �, expressamente, disposto em lei, sendo uma adapta��o doutrin�ria de outros pa�ses, como j� citado nos Estados Unidos", explica. "Por outro lado, o apelo popular gerado pela insatisfa��o da popula��o em ter que pagar pelo 'quebra quebra' promovido, pode vir a sensibilizar o julgador a ponto de ser menos criterioso quanto � individualiza��o da a��o de cada um dos 280 prov�veis r�us", pontua.
"A verdade � que pelo rigor t�cnico, a tentativa da Advocacia Geral da Uni�o tem poucas chances de prosperar, pois como dito, a indeniza��o por dano material tem que trazer a rela��o direta entre a a��o promovida e o dano causado, bem como a an�lise da culpa do ofensor. Agora, quando o direito encontra a pol�tica, tudo pode acontecer", completa.
A��es
Para a garimpagem das obras e objetos vandalizados no 8 de janeiro, o Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), em conjunto com os acervos do Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e do Planalto, conclu�ram um relat�rio com o mapeamento de cada obra tombada. Como a maioria dos bens possui valor inestim�vel, a decis�o de cada um dos poderes foi iniciar procedimentos de manuten��o. Grande parte foi restaurada, embasando tamb�m as a��es propostas pela AGU.
Na primeira de sete a��es, a AGU solicitou o bloqueio de bens dos suspeitos de financiar o fretamento de �nibus para os atos. Na avalia��o da AGU, 54 pessoas, tr�s empresas, uma associa��o e um sindicato est�o envolvidos diretamente em trazer os manifestantes, insatisfeitos com o resultado das urnas, � capital federal.
Contra esses 54 suspeitos e as empresas envolvidas, a AGU tamb�m pede a condena��o por dano moral, com causa estipulada na casa dos R$ 100 milh�es. Os advogados justificam que al�m dos preju�zos materiais, no caso deles ainda houve viola��o frontal e grave les�o aos valores jur�dicos, como os estabelecidos no Estado Democr�tico de Direito.
Repara��o
Um dos principais exemplos de quem veio � capital federal para causar baderna � o do condenado por tentar explodir um caminh�o-tanque no Aeroporto de Bras�lia, Alan Diego dos Santos Rodrigues. Em seu depoimento � Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito (CPI) dos Atos Antidemocr�ticos, da C�mara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), Ele disse que n�o pagou um real e viajou do Mato Grosso a Bras�lia dentro de um �nibus lotado de golpistas.
A AGU ainda pede em quatro outras a��es a condena��o de 151 criminosos que participaram dos atos e foram presos em flagrante, bem como o bloqueio dos bens deles na Justi�a que servir�o como forma de ressarcimento. H�, ainda, o pedido de repara��o referente �s pessoas que foram presas em flagrante dentro do Pal�cio do Planalto.
Para o professor, mestre e doutor em direito constitucional Rubens Be�ak, as a��es propostas pela AGU contra as 280 pessoas apontadas de estarem nos atos de vandalismo no 8 de janeiro, � uma medida mais do que necess�ria, desde que a triagem dos advogados da Uni�o apresentem, dentro das a��es, elementos que comprovem a participa��o dos criminosos.
"Posso dizer que isto [as a��es] era exatamente o esperado, na medida em que ficassem evidenciados os atos delituosas daquelas pessoas. Isso � o resultado das investiga��es, em que, ap�s a manifesta��o do Minist�rio P�blico — fiscal da legalidade e higidez das mesmas — iniciam-se os processos legais em si, ou seja, aqueles em que — respeitado o devido processo legal — poder�o, se positivas as a��es, serem aplicadas as eventuais condena��es e penas", explicou.