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Estado de Minas MINIST�RIO DA SA�DE

O que torna a popula��o negra mais vulner�vel ao HIV e a morrer por complica��es da Aids

Diferentemente da d�cada anterior, quando portadores do v�rus eram predominantemente pessoas brancas, negros s�o agora perfil racial mais afetado no Brasil


03/07/2022 14:40 - atualizado 03/07/2022 16:45

Teste de HIV em pessoa negra
Negros s�o agora perfil racial mais afetado por HIV no Brasil (foto: Brent Stirton/Getty Images)

Diferentemente da d�cada anterior, quando portadores do HIV eram predominantemente pessoas brancas, os negros s�o agora o perfil racial mais afetado pelo v�rus no Brasil.


Segundo dados do Minist�rio da Sa�de, entre 2010 e 2020 houve aumento de 12,9 pontos percentuais na propor��o de casos de Aids entre as pessoas negras.


Em termos de �bitos, o percentual � ainda maior. Em 2020, 61,9% das mortes registradas por HIV/Aids no pa�s foram entre pessoas negras (que � contabilizado entre pretos e pardos). Entre mulheres negras, o n�mero atingiu 62,9%.

Para o diretor de arte Raul Nunnes, homem negro mineiro, receber o diagn�stico de HIV em 2016 foi o in�cio de um processo conturbado de entendimento da doen�a.

 

 


"Precisei passar por um processo de autoaceita��o e trabalhar para entender como seria minha vida a partir daquele momento."


Dois anos depois, Emer Conatus, ator e professor de arte, tamb�m se descobriu soropositivo. Apesar de j� acompanhar alguns perfis na internet que falavam sobre o tema, as d�vidas em rela��o a seu pr�prio caso, considerando aspectos sociais, n�o deixaram de surgir.


Ambos homens pretos e criados em regi�es perif�ricas — Raul no bairro Cariocas, em Nova Lima, Minas Gerais, e Emer em Perus, bairro da zona noroeste de S�o Paulo — os dois se conheceram pela internet e perceberam que suas trajet�rias tinham marcos em comum, n�o s� pelo mesmo diagn�stico, mas porque como muitas pessoas, n�o tinham informa��es suficientes sobre o HIV antes de se verem no papel de portadores do v�rus, e a ra�a, al�m do contexto social em que viviam, influenciava em muitos aspectos do combate � doen�a.

As pessoas negras, segundo especialistas entrevistados pela BBC News Brasil, t�m mais barreiras para acessar os servi�os de sa�de em busca de cuidados para preven��o e tratamento.

"Muitas vezes elas n�o t�m acesso �s tecnologias de preven��o e ter�o o diagn�stico mais tardiamente. Tamb�m est�o entre as pessoas com menor escolaridade, menor renda, est�o mais sujeitas � viol�ncia, ent�o para elas o diagn�stico de HIV vem acrescentar mais uma dificuldade �s suas vidas. E ap�s o diagn�stico, v�o continuar a experimentar o estigma e preconceito, dificultando a realiza��o do tratamento. O estigma atrapalha o acesso ao servi�o de sa�de e acrescenta estigma, ent�o atrapalha todo o processo", enumera Nat�lia de Souza, psic�loga que atua em projetos de pesquisa relacionados ao HIV.

Para ajudar outros na mesma posi��o, mas tamb�m informar quem ainda considera o HIV e a Aids como tabus, assim como aqueles que pouco conhecem sobre o v�rus e a doen�a, Raul e Emer criaram o podcast 'Preto Positivo', dispon�vel na plataforma de streaming Spotify.

"Decidimos fazer o projeto porque percebemos que a maior parte dos criadores de conte�do sobre HIV s�o brancos, sendo que a maioria que vive com o v�rus no Brasil e no mundo � negra. A inten��o � trazer as d�vidas, quest�es sociais, familiares, de atendimento de sa�de... Pelo ponto de vista da negritude", diz Emer.

Os epis�dios contam com relatos pessoais, informa��es t�cnicas e falas de convidados, entre eles, m�dico infectologista, psic�logo, parteira, advogado, pesquisadores, apresentador de TV, cantor, poetisa, artistas e ativistas da causa. Al�m disso, h� a voz de um personagem que representa o pr�prio v�rus HIV, narrando, no primeiro epis�dio, o primeiro encontro com Emer e Raul.


Emer e Raul, criadores do podcast' Preto Positivo'
Emer e Raul, criadores do podcast' Preto Positivo' (foto: Reprodu��o Instagram)

Por que o �ndice de infec��es e mortes � maior entre negras e negros?

A resposta para essa pergunta tem diversas camadas — e algumas delas, complexas — mas todas, na avalia��o do infectologista acreano Dyemison Pinheiro, h� um pano de fundo em comum: o racismo estrutural (pr�ticas institucionais e hist�ricas enraizadas na sociedade e repetidas constantemente, ainda que por vezes de forma n�o consciente).

"O acesso � informa��o e aos servi�os de sa�de, tamb�m � afetado pelo racismo institucional, j� que h� reprodu��o desse tipo de viol�ncia simb�lica dentro dos ambientes, como por exemplo, nos servi�os de testagem de HIV e de ISTs (Infec��es Sexualmente Transmiss�veis)."

"Por conta dessas barreiras, a popula��o negra morre mais por complica��es relacionadas ao v�rus, e �s vezes isso acontece por demora no diagn�stico. Quando um paciente � diagnosticado mais cedo, ainda sem altera��es importantes, o tratamento � muito mais simples e gera melhora mais r�pida", afirma o infectologista.

Ele acrescenta que aqueles que descobrem a doen�a tardiamente por vezes j� sofrem com outras infec��es oportunistas, j� que o v�rus causa uma queda na imunidade. E, sem o tratamento adequado, a pessoa j� pode ter desenvolvido Aids.

Isso porque o HIV infecta seletivamente os linf�citos (leuc�citos) do tipo CD4, respons�veis pela resposta imune. Conforme o v�rus se m�ltipla e destr�i os 'CD4', a imunidade vai ficando cada vez mais comprometida.

"Um dos crit�rios para definir que a pessoa tem Aids � a contagem de CD4. quando um paciente tem esse n�mero abaixo de 350, j� � considerado como algu�m que tem a doen�a. Com tratamento, � poss�vel melhorar o n�mero, mas ainda assim, algumas pessoas apresentam falhas qualitativas importantes nas c�lulas de defesa, e por isso, h� autores que advogam que, uma vez que o n�mero esteve abaixo de 350, a pessoa sempre ter� Aids."

H� tamb�m, aponta o m�dico, outras quest�es relacionadas a dificuldades financeiras para acessar o servi�o, regularidade de visitas por rotinas mais complicadas, que afetam principalmente negros, que no Brasil, assim como em outras partes do mundo, ocupam posi��es historicamente desprivilegiadas.

Al�m disso, de acordo com a psic�loga Natalia de Souza, caracter�sticas pessoais que podem tornar o momento do diagn�stico e o tratamento mais ou menos dif�ceis.

"O impacto mental pode variar bastante de acordo com o que o paciente j� sabe sobre HIV, se conhece algu�m que vive com o v�rus, etc. Depende muito do seu pr�prio preconceito tamb�m. Para algu�m que desconhece como � viver com HIV, por exemplo, ou algu�m que tem quest�es com rela��o � pr�pria sexualidade, tende a ser mais dif�cil."

Na opini�o de Pinheiro, produ��es como o podcast 'Preto Positivo' que desmistificam o tema, s�o essenciais.

"Existe uma falta de conhecimento muito grande para alguns p�blicos, trazer uma linguagem acess�vel, f�cil, que chegue de fato a todos e todas, especialmente no caso desse podcast, que � focado na popula��o negra, � muito importante."

"O conte�do traz leveza e tira um pouco desse estigma, porque quando falamos de ISTs, existe um peso, at� um julgamento moral, ent�o ter esse conte�do facilita o acesso a informa��o. As pessoas escutam sobre como podem se testar e as formas de preven��o em geral, al�m de participar de uma discuss�o que vai al�m da qualidade de vida — que se assemelha a de pessoas sem a doen�a — mas que fala sobre descobertas tecnol�gicas, profilaxia, PrEP injet�vel, e por a� vai", afirma o infectologista.

Como � o acesso aos testes e tratamento de HIV/Aids no Brasil?

Os testes que detectam a presen�a do HIV em cerca de 30 minutos est�o dispon�veis gratuitamente para toda a popula��o nas UBSs (Unidades B�sicas de Sa�de), Upas (Unidades de Pronto Atendimento) e CTA (Centros de Testagem e Aconselhamento).

O SUS tamb�m oferece medicamentos antirretrovirais (antes chamados de coquetel), al�m da PrEP (profilaxia pr�-exposi��o) e a PEP (profilaxia p�s-exposi��o), tratamentos indicados em situa��es e por tempos de uso espec�ficos.

Na avalia��o do infectologista Dyemison Pinheiro, em geral, o programa de HIV/Aids brasileiro funciona, mas ainda h� margem para se tornar melhor.

"Temos um sistema p�blico que consegue abarcar muita coisa, mas precisamos aprofundar ainda mais as boas pol�ticas. Os usu�rios de PrEP, por exemplo, que s�o pouco menos de 40 mil pessoas, s�o em maioria s�o homens homossexuais brancos e com Ensino Superior completo. Que mais se infecta e morre n�o � esse p�blico. � necess�rio pensar em como chegar nas popula��es mais vulner�veis"

Em artigo publicado na revista Global Public Health, pesquisadores da fiocruz, destacam que o programa brasileiro contra a doen�a foi refer�ncia, mas regrediu nos �ltimos anos. Entre as causas, segundo o estudo, est� a desarticula��o das institui��es, tanto ag�ncias multilaterais, como a Unaids, quanto do governo brasileiro em rela��o �s demandas das ONGs e pacientes, especialmente em rela��o �s pol�ticas de informa��o e preven��o.

A realidade de acesso tamb�m tende a ser diferente fora das capitais — onde h� mais pacientes diagnosticados, mas tamb�m um melhor rastreio. "Existe essa falta do acesso, sobretudo em �reas afastadas, onde falta informa��o e tamb�m falta desejo dos que fazem a gest�o de pol�ticas p�blicas de sa�de, municipais e estaduais, para tornar as pol�ticas mais s�lidas."

- Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-61960207

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