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Estado de Minas COVID-19

Margareth Dalcolmo: 'n�o podemos considerar a pandemia superada'

Pesquisadora da Fiocruz e uma das principais refer�ncias no combate � COVID-19 alerta sobre amplia��o da cobertura vacinal e adverte para o uso da m�scara


01/08/2022 09:46

Margareth Dalcolmo, pneumologista da Fiocruz
A pneumologista e pesquisadora da Fiocruz Margareth Dalcolmo alerta que nunca foi t�o importante manter h�bitos n�o-farmacol�gicos. E que o uso de m�scaras em locais fechados ainda � relevante, porque as cepas hoje circulantes com predom�nio t�m escape vacinal (foto: Mauro Pimentel/AFP)
  V�rios estados brasileiros flexibilizaram, nos �ltimos meses, as medidas de preven��o contra a COVID-19. Como consequ�ncia, leva-se hoje no Brasil uma vida semelhante � observada em tempos pr�-COVID, sem uso de m�scaras, com grandes aglomera��es normalizadas — cenas que, h� um ano, seriam inimagin�veis. Na contram�o dessas decis�es est� parte significativa dos cientistas brasileiros, como a pneumologista e pesquisadora da Fiocruz Margareth Dalcolmo.

"Nunca foi t�o importante manter h�bitos n�o-farmacol�gicos. O uso de m�scaras em locais fechados ainda � muito relevante, porque as cepas hoje circulantes com predom�nio t�m escape vacinal", salienta a m�dica. Dalcolmo � uma das mais respeitadas lideran�as da ci�ncia atuantes no combate � pandemia. Envolveu-se diuturnamente na miss�o de conscientizar a popula��o brasileira sobre a preven��o � COVID-19 desde os primeiros dias, quando chegou, inclusive, a prestar consultoria t�cnica ao ent�o ministro da Sa�de, Luiz Henrique Mandetta.
A pesquisadora destaca que, apesar de a maior parte da popula��o agir de maneira despreocupada, o Brasil ainda n�o superou a pandemia e deve preocupar-se, principalmente, com a popula��o infantil. "Os estudos nessa popula��o realmente demoram. Eles s�o mais complexos de serem feitos, do ponto de vista �tico. Mas hoje n�s j� temos vacinas aprovadas no Brasil", ressalta. "� muito estranho que as fam�lias tenham sido inoculadas com esse v�rus do medo", provoca a m�dica.

O Brasil superou a pandemia, ou a gente ainda tem um caminho pela frente?
N�s ainda n�o podemos considerar a pandemia da COVID-19 superada no Brasil por v�rias raz�es. Primeiro, estamos diante de uma doen�a nova, com aparecimento de novas variantes. Hoje, praticamente h� uma variante ou uma subvariante que aparece a cada duas semanas. Algumas dessas, comoa cepa BA5, que predomina no Brasil, de alta transmiss�o e com o que chamamos de escape vacinal. Ent�o, o uso de m�scaras em locais fechados ainda � muito relevante. A segunda raz�o � que, a despeito de uma boa taxa de vacina��o, n�o alcan�amos com as doses de refor�o, que s�o as terceira e quarta doses, um percentual realmente importante na popula��o brasileira. Em terceiro lugar, precisamos urgentemente vacinar a popula��o pedi�trica. A despeito de as vacinas terem se mostrado extremamente protetoras nas crian�as, essa hesita��o vacinal por parte de muitas fam�lias � muito grave e contraria uma tradi��o muito arraigada na nossa popula��o, que � gostar e confiar nas vacinas.

Por que isso ocorre?
A popula��o brasileira sempre aderiu de maneira muito saud�vel �s vacinas oferecidas pelo SUS �s nossas crian�as, de modo que considero muito importante que a imprensa e todos n�s, m�dicos, nos manifestemos com veem�ncia, instando as fam�lias a levarem as suas crian�as para serem vacinadas e que n�o deem ouvidos a essa quantidade de not�cias falaciosas que t�m sido disseminadas contra as vacinas nas crian�as, inclusive por alguns m�dicos, o que eu considero um desservi�o enorme � nossa popula��o j� t�o sofrida e amedrontada.

Existe a chance de a gente ter alguma variante mais forte ainda das j� conhecidas?
A probabilidade � pequena, porque as variantes e subvariantes n�o t�m, at� o momento, demonstrado uma mortalidade maior. E, se algu�m duvidava do efeito protetor contra formas graves, hospitaliza��es e mortes pela COVID-19 por for�a da aplica��o das vacinas, essa d�vida caiu por terra. Os dados falam por si. A curva de diminui��o � t�o dram�tica, os hospitais se esvaziaram, o n�mero de mortes que j� chegou a mais de 3 mil pessoas por dia, diminuiu muito, embora ainda seja um n�mero relevante, porque cada vida humana conta. Quem est� internado hoje ou, eventualmente, morrendo ou s�o pessoas n�o vacinadas, ou portadoras de uma condi��o cl�nica muito desfavor�vel do ponto de vista imunol�gico.

Muitos pais ficaram com medo de vacinar as crian�as alegando que os estudos n�o eram conclusivos, que n�o se sabia exatamente os efeitos da vacina. Ao mesmo tempo, n�o se sabe exatamente quais s�o os efeitos, a longo prazo, da COVID nas crian�as.
O Brasil teve um dos piores desempenhos e uma das mais altas letalidades pela covid-19 em popula��o pedi�trica. N�s tivemos quase 3 mil �bitos em crian�as abaixo de cinco anos de idade, o que � absolutamente impressionante. As crian�as precisam ser protegidas pelas vacinas. Os estudos nessa popula��o realmente demoram. Eles s�o mais complexos de serem feitos, do ponto de vista �tico, mas j� temos vacinas aprovadas no Brasil, tanto a da Pfizer quanto recentemente a Corona Vac para a popula��o entre 3 e 5 anos de idade. � muito estranho que essas fam�lias tenham sido inoculadas com esse v�rus do medo, diante de uma um programa de vacina��o t�o incorporado � nossa cultura. Eu nunca vi pais e m�es se perguntarem o que tinha numa vacina chamada pentavalente, que a gente aplica nos beb�s abaixo de um ano de idade. Ent�o, � um desservi�o atribuir �s vacinas efeitos nocivos que absolutamente elas n�o t�m. O que n�o sabemos at� agora, isso sim, � quais ser�o os efeitos a m�dio e longo prazos que a covid-19 poder� causar nessa popula��o pedi�trica, como j� sabemos que ela causa na popula��o adulta, por exemplo, com a chamada s�ndrome da covid longa. Hoje, o maior desafio da medicina � lidar com essas pessoas que precisam de reabilita��o, muitas vezes complexa, para ganharem de volta o m�nimo de normalidade em suas vidas.

Os efeitos neurol�gicos ainda est�o sendo estudados.
Neurol�gicos, respirat�rios, cardiovasculares e, inclusive, psiqui�tricos. O n�mero de pessoas que precisam de assist�ncia psicol�gica e psiqui�trica pelo trauma de terem ficado internados por um longo tempo, em confinamento, � grande. O v�rus afeta o sistema nervoso central, o que pode ocasionar mudan�a de comportamento, um quadro neurol�gico prolongado, neuropatias perif�ricas prolongadas. Tudo isso s�o efeitos que hoje n�s estamos lidando nos servi�os de reabilita��o p�s-covid.

Leia tamb�m: Gr�vidas com COVID t�m maior risco de parto prematuro. 

Esses efeitos ainda ser�o sentidos por d�cadas?
N�o podemos dizer por quanto tempo, nem se eles ser�o indel�veis. N�o sabemos, porque ainda n�o temos o necess�rio recuo hist�rico para essa an�lise. Ent�o, s� o tempo dir� se eles s�o indel�veis ou tempor�rios.

Apesar dos constantes cortes na sa�de p�blica, o SUS foi essencial para o combate da pandemia. Como a senhora v� a falta de valoriza��o da sa�de no pa�s?
Em 13 de mar�o de 2020, dei minha primeira entrevista p�blica e, naquele momento, disse, convicta, que n�s t�nhamos duas armas para enfrentar a tsunami que estava chegando ao Brasil. A primeira e mais nobre delas era o SUS. Sem o SUS, a trag�dia teria sido muito maior. A segunda seria o distanciamento f�sico e social, que era uma arma absolutamente fundamental em se tratando de uma virose aguda de transmiss�o respirat�ria. Por conta de todas as fragilidades, subfinanciamento, car�ncia de recursos humanos, enfim, tivemos uma operacionaliza��o que muitas vezes deixou a desejar. Mas, sem o SUS, a trag�dia teria sido muito pior.

Houve falta de sincronia entre o poder p�blico e as demandas de sa�de? Porque a gente viu atraso na vacina��o, diversos percal�os que parecem uma certa neglig�ncia...
Desde o in�cio, ficou claro que, contra esse tipo de doen�a, com alta capacidade de transmiss�o, a arma seriam as vacinas, porque virose aguda se resolve com vacina, tradicionalmente. E o Brasil viveu um paradoxo. Foi o pa�s que desenvolveu estudos de fase tr�s para vacinas de grande qualidade, como foi com a CoronaVac, com a Pfizer, com a Janssen e com a AstraZeneca. Foi o pa�s que mais colocou volunt�rios nos estudos de fase tr�s, e viveu a contradi��o de ter um embate entre uma ret�rica paradoxal de algumas autoridades e a necessidade �bvia de vacinar a popula��o. N�s poder�amos ter come�ado a vacinar antes do que efetivamente come�amos. Esse embate ret�rico entre a ci�ncia brasileira e o discurso oficial, sem d�vida, n�o foi positivo no resultado.

A Procuradoria Geral da Rep�blica desqualificou as investiga��es da CPI da COVID. N�o houve responsabiliza��o. Por que a sa�de segue sendo negligenciada, mesmo com todas as evid�ncias?
Eu n�o sei se n�o haver� responsabiliza��o. Sem d�vida nenhuma, caber� � sociedade brasileira ter a consci�ncia c�vica do que � necess�rio e reivindicar da maneira adequada. Politicamente, eu n�o saberia dizer em que isso vai resultar. Agora, sem d�vida nenhuma, mais do que a responsabiliza��o retr�grada daquilo que n�o aconteceu, temos que ter um olhar pra frente. � como conduzir o problema daqui pra frente num momento dif�cil, num ano eleitoral. Onde as tens�es obviamente tendem a se acirrar, e n�s precisamos ter a serenidade, a efici�ncia que os servi�os de sa�de naturalmente exigem nesse momento.

O debate eleitoral tem se concentrado na economia. Aparentemente, a sa�de p�blica est� relegada a segundo plano.
O que � um equ�voco, porque sa�de p�blica e economia s�o basicamente a mesma coisa. Quando voc� investe em sa�de voc� est� fazendo um investimento nobre em economia, porque as pessoas adoecerem menos nas fases mais produtivas de suas vidas, trabalharem, produzirem, estudarem, produzirem conhecimento t�cnico e cient�fico, � absolutamente fundamental. O equ�voco est� na maneira de olhar. Investir em sa�de e educa��o n�o � gastar. � olhar o dia de amanh�, o futuro do pa�s, as novas gera��es.

Eu acho que o Brasil est� vivendo um momento extremamente dram�tico, com v�rias contradi��es. Uma popula��o que envelhece. N�s hoje temos uma popula��o acima de 60 anos no Brasil que j� representa um n�mero muito importante. N�s precisamos cuidar dessas pessoas, ter uma vis�o para as doen�as cr�nicas que comprometem as pessoas de mais idade. Inseri-las socialmente de uma maneira adequada. Isso exige uma sa�de p�blica muito bem conduzida e com muita efici�ncia. Outras quest�es fundamentais, como saneamento b�sico, est�o diretamente relacionadas � economia. Ent�o, olhar isso de maneira dicotomizada n�o me parece correto.

Por quanto tempo o Brasil precisar� de refor�o na vacina��o contra a covid-19? E por quanto tempo a doen�a permanecer� nas nossas vidas?
S�o duas quest�es a�. Primeiro, haver�, sem d�vida, uma nova leva de vacinas de segunda gera��o. Algumas j� est�o sendo fabricadas com a prote�na spike, da cepa Omicron, e n�o mais com as cepas originais, com a qual foram formuladas todas as vacinas que n�s usamos at� o momento. Acho que n�s ainda precisaremos receber uma dose, pelo menos, de vacina, com as vacinas de segunda gera��o quando forem liberadas. O v�rus SARS-CoV-2 n�o deve desaparecer das nossas vidas, ele dever� permanecer num comportamento epidemiol�gico end�mico. Ou seja, vamos ter casos de vez em quando. O v�rus j� faz parte do diagn�stico diferencial das viroses respirat�rias.

A senhora participou, na semana passada, do encontro da SBPC na UnB. Como est� a situa��o da ci�ncia no Brasil?
Nunca foi t�o necess�rio que governantes e autoridades se sensibilizassem para o fato de que investimento em ci�ncia, tecnologia e inova��o � um investimento mais nobre. Enquanto isso for equivocadamente olhado como gasto, e n�o como um olhar para o nosso amanh�, estaremos perdurando no que eu chamaria de um erro de vis�o de pa�s. Foi muito simb�lica essa SBPC presencial realizada nas depend�ncias da UnB nesse momento. Acho que, para a universidade, que j� sofreu tanto nas �ltimas d�cadas, no Brasil, isso representa muito. Espero que essas discuss�es possam aumentar o n�vel de consci�ncia dos jovens ali presentes.
 
A OMS definiu como preocupante o avan�o da var�ola dos macacos no Brasil. Como est� a doen�a no mundo?
� um outro n�vel, outra doen�a. Mas de qualquer maneira, acho que a OMS fez um alerta correto e oportuno. Hoje, alguns pa�ses se ressentem de n�o ter mantido estoques adequados de vacinas, como n�o temos quantidades suficiente se precisarmos de uma vacina��o em maior �mbito, de algumas popula��es ou grupos de risco. Acho que n�s precisaremos, sim, vacinar alguns grupos de popula��o com a vacina da var�ola, e o Brasil seguramente � um pa�s que tem condi��es pra fabricas a vacina. Isso depende de vencer alguns entraves t�cnicos, como, por exemplo, ter o v�rus original para que a vacina seja produzida. O Butantan e a Fiocruz s�o institui��es p�blicas perfeitamente qualificadas para fabricar a vacina da var�ola.
Quais s�o os principais sintomas dessa doen�a pouco conhecida no Brasil? Que cuidados devem ser adotados?
S�o sintomas de uma de uma doen�a geral. Ela chama a aten��o quando existe a suspeita epidemiol�gica de que tenha havido contato com algu�m sabidamente doente. Quem teve contato deve ser observado, antes mesmo do aparecimento das les�es cut�neas. Como o per�odo de incuba��o � relativamente longo, de tr�s a quatro semanas, a pessoa tem que saber se teve contato com algu�m doente ou esteve num ambiente onde houve outros casos. O diagn�stico precoce vai levar ao isolamento. O isolamento deve ser de quatro semanas, que � o per�odo em que podem aparecer les�es cut�neas, que s�o altamente contagiosas. A maior parte dos casos n�o tem sido grave, s�o muito poucas mortes at� o momento. ï¿½ uma doen�a que, eventualmente, pode ser controlada por vacina, se aumentar o n�mero de casos ou declarada essa necessidade.




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