Por tr�s dos sorrisos e das medalhas conquistadas pela atleta Luciane de Lima, h� uma hist�ria de supera��o que aconteceu ap�s um transplante renal, em 2014. Embora a data desse renascimento n�o conste em seu RG, ela possibilitou que a advogada subisse em alguns p�dios.
Dois deles foram nos Jogos Mundiais para Transplantados, que reuniu 1550 pessoas de 46 pa�ses, entre transplantados e doadores, em Perth (Austr�lia) durante os dias 15 e 21 de abril deste ano. Luciane ficou em terceiro lugar nas provas de 100 metros e de salto em dist�ncia na categoria de 40 a 49 anos. Ao lado de sete pessoas, ela representou a Liga de Atletas Transplantados, que adota o esporte como filosofia de vida e promove a causa da doa��o de org�os.
H� 10 anos, isso era inimagin�vel. Luciane come�ou a sentir mal-estar, dores de cabe�a, ter lapsos de mem�ria, dificuldade para se alimentar e ingerir l�quidos, entre outros sintomas. Sua fun��o renal estava bastante comprometida e ela estava entre os milhares de brasileiros que precisavam de um transplante de �rg�os. Ap�s sete meses e meio de hemodi�lise, Luciane recebeu um novo rim. O doador foi seu marido, Antonio Carlos Lisboa.
"Viver na esperan�a da chegada de um �rg�o � extremamente complexo. Quando uma pessoa diz sim para a doa��o de �rg�os, muitas vezes, est� pensando em algu�m que sequer conhece. H� a necessidade de pensar no legado que as pessoas querem deixar para esse mundo. � muito importante que as pessoas tenham esse sentimento de poder ajudar algu�m quando estiverem partindo deste mundo. � a �ltima oportunidade de fazer o bem", observa Luciane.
Atleta Luciane de Lima
Arquivo Pessoal
O impacto do transplante renal na sua vida foi t�o grande que Luciane ressignificou at� sua rela��o com a atividade f�sica, praticada esporadicamente at� ent�o. Ela entrou em um grupo de corrida e se apaixonou pelo esporte. Pouco tempo depois, incluiu exerc�cios de fortalecimento, nata��o e bicicleta na rotina e come�ou a participar de competi��es.
Apesar de o Brasil possuir o maior sistema p�blico de transplante de �rg�os no mundo, a fila de transplantes ultrapassou 50 mil pessoas pela primeira vez desde 1998, segundo a Associa��o Brasileira de Transplante de �rg�os (ABTO). Em 2022, o Brasil realizou pouco mais da metade (21,8 mil) dos cerca de 40 mil transplantes necess�rios de c�rnea, f�gado, cora��o, pulm�o e rim. Segundo a ABTO, a expectativa era de que os n�meros de transplante retornassem aos mesmos �ndices do per�odo pr�-pandemia, mas isso ainda n�o aconteceu.
Coletivo mostra que � poss�vel ter qualidade de vida ap�s transplante
A Liga de Atletas Transplantados atua para transformar essa realidade. Fundada por Luciane e outros atletas em 2021, o coletivo re�ne 42 atletas brasileiros transplantados de f�gado, rins, pulm�o, p�ncreas, cora��o e medula que superaram doen�as graves. O grupo utiliza o esporte como um grande aliado para a manuten��o da sa�de f�sica e ps�quica, participa de competi��es e dissemina a conscientiza��o sobre a import�ncia da doa��o de �rg�os, desmistificando mitos sobre o assunto.
"Inicialmente, a ideia da Liga era reunir atletas para conseguir patroc�nio para os Jogos Mundiais da Austr�lia. Nossa primeira reuni�o foi em janeiro de 2022, conversamos e entendemos que era preciso lutar pela conscientiza��o da doa��o de �rg�os. Nosso maior objetivo passou a ser atrair mais atletas e compreendemos que nosso papel era muito maior do que ir aos jogos, mas mostrar que o transplante n�o � o fim da vida, que � poss�vel ter uma vida de qualidade praticando esportes, promover a doa��o de �rg�os e transmitir uma mensagem de esperan�a para quem est� na fila", explica o engenheiro Cornelis Poel, um dos fundadores da Liga de Atletas Transplantados.
Em 2011, Cornelis foi diagnosticado com colangite esclerosante prim�ria, uma doen�a rara autoimune que resultou em um transplante de f�gado em 2018. Os problemas de sa�de de Cornelis continuaram e, seis meses depois da cirurgia, ele descobriu ter uma doen�a neurol�gica autoimune denominada neuropatia perif�rica, que provocava sintomas como alta sensibilidade, formigamento e dores extremas nos p�s. O tratamento durou 18 meses e, em 2019, Cornelis recome�ou a correr.
Atleta Cornelis
Arquivo pessoal
No ano seguinte, deu o pontap� que iniciou uma rela��o de amor pelo esporte ao completar 10 quil�metros. Em 2021, introduziu o ciclismo, mountain bike e aprendeu a nadar para praticar triathlon."A Liga de Atletas Transplantados enxerga o esporte como um complemento fant�stico ao tratamento m�dico, e � um mecanismo muito bom para divulgar a doa��o de �rg�os, trabalhar a mente e fortalecer o corpo. O esporte � muito democr�tico e � poss�vel escolher um que te d� prazer", acrescenta Cornelis, que tamb�m competiu nos Jogos Mundiais para Transplantados.
Exerc�cios f�sicos fortalecem sistema imunol�gico de transplantados
Os exerc�cios f�sicos podem ser um grande aliado para a recupera��o de pacientes transplantados, desde que a pr�tica seja autorizada pela equipe m�dica e que haja acompanhamento de um profissional de educa��o f�sica. A hist�ria do professor Jeferson Lacerda � emblem�tica ao mostrar a transforma��o causada pelo esporte. Ex-obeso m�rbido, Jeferson era sedent�ro e pesava 130 quilos at� ser diagnosticado com cirrose hep�tica em 2018 e precisar de um transplante. Uma das recomenda��es m�dicas foi que o professor come�asse a se exercitar para perder peso e facilitar o processo cir�rgico.
Jeferson emagreceu 56 quilos em seis meses depois de adotar uma alimenta��o saud�vel, realizar caminhadas e corridas de rua. Por�m, a doen�a evoluiu rapidamente e o deixou muito debilitado. Em novembro de 2019, Jeferson ganhou uma nova chance de vida e realizou o transplante. Pouco tempo depois, a pandemia e o isolamento social fizeram com que ele se conectasse com outros transplantados de v�rias regi�es do pa�s. Um deles era um triatleta transplantado do cora��o que foi a inspira��o de Jeferson para se dedicar ainda mais ao esporte.
Da obesidade m�rbida aos Jogos Mundiais para Transplantados
Aos poucos, ele aumentou a quilometragem das corridas de rua e, em 2022, aprendeu a nadar, recebeu uma bicicleta da loja The Auge Bike Shop, de Teresina (PI), para praticar triathlon e competir e tornou-se o primeiro triatleta transplantado vinculado a uma equipe de ciclismo no Piau� chamada The Auge Bike Team. Jeferson tamb�m participou da funda��o da Liga de Atletas Transplantados com Luciane e Cornelis. Nos Jogos Mundiais para Transplantados, o atleta participou de provas de triathlon, ciclismo e nata��o.
"Encontrei no triathlon um esporte que transformou a minha vida. "Nosso desempenho na Austr�lia foi maravilhoso, conhecemos muitos atletas transplantados e levamos a mensagem da doa��o de �rg�os para o mundo inteiro. A doa��o de �rg�os � um dos maiores desafios hoje, depende do amor de outra pessoa, a fam�lia precisa dizer sim num momento de dor. Se n�o fossem as fam�lias doadoras, eu e tantas outras pessoas transplantadas n�o teriam uma segunda chance de continuar vivendo. Por isso, sou um ativista da causa da doa��o de �rg�os e vejo que nosso intuito � fazer com que a fila de transplantes diminua e que mais pessoas possam sentir a felicidade de voltar a sonhar, trabalhar, viver, sorrir, conviver com seus familiares, praticar seu esporte favorito e ter uma vida plena de realiza��es e supera��o", afirma.
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