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Estado de Minas DIA DE LUTA

No Dia Internacional da Mulher, n�o me d� 'parab�ns'

'Flores e as congratula��es podem ser substitu�das pelo compromisso em se tornar um aliado real da luta antissexista"


08/03/2021 07:32 - atualizado 02/06/2021 18:04

"O Dia Internacional da Mulher vem para nos lembrar que todo dia � um dia de luta" (foto: Ramiro Furquim)

O Dia Internacional da Mulher � uma data que marca na Hist�ria as primeiras manifesta��es e eventos na busca da equidade de g�neros e da amplia��o dos direitos femininos. A data tamb�m nos lembra que ainda estamos longe de chegar a esses objetivos.

 

No come�o do s�culo XX, os principais pa�ses do mundo viviam as consequ�ncias da Primeira Guerra Mundial e a necessidade de manter a produ��o industrial levou as mulheres (especialmente as brancas) ao mercado de trabalho. Diferentemente do que gostar�amos, esse movimento n�o aconteceu como um processo de empoderamento feminino onde mulheres poderiam escolher trabalhar fora, enquanto os homens assumiriam as suas responsabilidades nas tarefas dom�sticas. 

 

Nessa �poca, nem as mulheres foram de fato empoderadas e nem os homens passaram a realizar as tarefas de um adulto funcional que mora, come e procria. As consequ�ncias desse processo � que enquanto parte das mulheres passOU a ter jornada dupla de trabalho (na f�brica e em casa), a outra parte terceirizou o trabalho de casa e a cria��o dos filhos para mulheres negras e mais pobres. Por isso, � necess�rio observar a interseccionalidade da ra�a no movimento feminista, desde o seu in�cio.

 

� importante ressaltar que as mulheres que foram para as f�bricas ainda viviam sob o controle dos maridos, n�o podiam votar e, historicamente, tinham acessado a educa��o h� pouco tempo. As mulheres, que j� eram exploradas pelos seus maridos, passaram a ser exploradas tamb�m pelos seus patr�es. Tudo para sustentar o capitalismo. 

 

Em pouco tempo, as oper�rias se organizaram na luta por melhores condi��es de trabalho e foi nesse momento que as manifesta��es femininas explodiram. �ngela Davis, professora e fil�sofa, cita um evento ocorrido em 1908 em que "as mulheres socialistas do Lower East Side, em Nova York, organizaram uma manifesta��o de massa em apoio ao sufr�gio igualit�rio”, ou seja, o voto feminino. 

 

Um ano depois, em 1909 acontece em Nova York uma jornada de protestos pela igualdade de direitos civis, em favor do voto feminino. Muitos desses protestos foram brutalmente reprimidos pela pol�cia. Ao mesmo tempo, na R�ssia v�rias manifesta��es parecidas tamb�m aconteciam. Foi em 1910, durante a segunda Confer�ncia Internacional de Mulheres Socialistas de Copenhague, que Clara Zetkin sugere a cria��o do Dia da Mulher e que a data passasse a ser celebrada todos os anos.

 

As condi��es de trabalho eram t�o prec�rias que em 1911 acontece um inc�ndio da f�brica da Triangle Shirtwaist, nos EUA. Esse inc�ndio, que hoje em dia certamente teria sido considerado criminoso, causou a morte de 129 mulheres oper�rias. A partir de ent�o, crit�rios rigorosos sobre as condi��es de seguran�a no trabalho come�aram a ser especificados e os sindicatos foram estruturados como consequ�ncia da revolu��o industrial.

A luta no Brasil

 

No Brasil, o movimento pela equidade entre os g�neros e pela amplia��o dos direitos das mulheres chega com mais for�a alguns anos depois. Em 1917 acontece a primeira passeata das sufragistas no Rio de Janeiro. Diferentemente do que aconteceu na R�ssia e nos Estados Unidos, no nosso pa�s as manifesta��es pelo voto feminino n�o foram constru�das pela base da sociedade. Uma das principais ativistas da �poca era filha de um cientista e de uma enfermeira. Bertha Lutz se formou como bi�loga (uma exce��o entre as mulheres brasileiras que, em sua maioria, ainda n�o estudavam) e criou a Federa��o Brasileira pelo Progresso Feminino, em 1922.

 

Foi somente em 1932 que a mulher conquistou o direito ao voto no Brasil, mesmo assim, com restri��es. O C�digo Eleitoral da �poca permitia o voto apenas para mulheres casadas, desde que os maridos autorizassem. As vi�vas e solteiras somente poderiam votar caso tivessem renda pr�pria. Em 1945 as principais restri��es para o voto feminino foram retiradas e ele passou a ser obrigat�rio para (quase) todos os cidad�os, independente do g�nero.

 

Enquanto n�s mulheres f�ssemos privadas de exercer nossos direitos, a nossa representatividade pol�tica seria inviabilizada e n�s continuar�amos vivendo em uma sociedade totalmente organizada pelos interesses masculinos. Mesmo com tantos avan�os, grande parte das mulheres negras continuou de fora do processo democr�tico brasileiro. Por n�o terem tido oportunidade de se alfabetizar, muitas mulheres negras passaram a votar apenas em 1985, quando foi promulgada a emenda constitucional que ampliava o direito de voto aos analfabetos brasileiros. Nessa perspectiva, fica ainda mais claro como o movimento feminista brasileiro n�o contemplou a realidade das mulheres negras.

 

O Dia Internacional da Mulher vem para nos lembrar que todo dia � um dia de luta. Ainda hoje, n�o temos uma representatividade proporcional na pol�tica. Apesar de as mulheres serem mais de 50% da popula��o brasileira, ocupamos menos de 15% dos cargos pol�ticos no pa�s. De acordo com o Mapa Mulheres na Pol�tica 2020, o Brasil ocupa o lugar 140 no ranking de representatividade feminina nas 193 na��es pesquisadas. A sub-representa��o feminina na pol�tica impede que as demandas das mulheres sejam contempladas na nossa organiza��o social.

 

Ainda temos muito o que avan�ar. No Brasil, a viol�ncia contra a mulher e os crimes de feminic�dio s�o cada vez mais frequentes. De acordo com o Anu�rio Brasileiro de Seguran�a P�blica (2017) a cada 11 minutos acontece um estupro no nosso pa�s; a cada uma hora, 503 mulheres s�o v�timas de agress�o; a cada duas horas, uma mulher � assassinada no Brasil.

No nosso pa�s, viol�ncia de g�nero tem cor de pele. De acordo com a pesquisa da doutora em demografia pelo Instituto de Filosofia e Ci�ncia Humanas da Universidade Estadual de Campinas, Jackeline Aparecida Romio, o feminic�dio cresce entre mulheres negras e ind�genas e diminui entre brancas no Brasil.

 

Outro recorte importante de ser observado � o da sexualidade e da performance de g�nero. Nesse sentido, mulheres l�sbicas, bissexuais, transexuais e travestis correm maior risco de viol�ncia. Infelizmente, n�o � raro que mulheres l�sbicas ou identificadas desta forma sejam v�timas de “estupros corretivos”. Esse tipo de viol�ncia sexual � cometida com o intuito de controlar e punir as mulheres homoafetivas e assim “corrigir” a sua orienta��o sexual.

 

Enquanto mulheres s�o v�timas de 67% das agress�es f�sicas no Brasil, para as mulheres transsexuais e travestis a situa��o � de ainda mais vulnerabilidade. O nosso pa�s � o que mais mata travestis e transexuais no mundo e os n�meros n�o param de crescer. Segundo dados do Minist�rio da Mulher, da Fam�lia e dos Direitos Humanos (MMDH), o primeiro quadrimestre de 2020 registrou aumento de 49% nos assassinatos de mulheres transexuais e travestis no Brasil.

 

Mesmo no cen�rio privilegiado das mulheres brancas ainda h� muita desigualdade se compararmos os acessos femininos com os espa�os de poder do homem branco. De acordo com a Catho (2017), a diferen�a salarial entre homens e mulheres pode chegar a 62% dependendo do cargo. Ainda no contexto das organiza��es, quanto mais alto � o cargo, menos mulheres se fazem presentes nas salas de reuni�es. De acordo com a Boston Consulting Group, apenas 19% das mulheres est�o em cargos de gest�o s�nior, 11% delas s�o CEO´s de empresa e somente 7% s�o membros de conselhos administrativos.

 

Avan�amos sim, por�m muito pouco em rela��o a tudo o que precisamos nos mobilizar para conquistar. N�o queremos direitos apenas para algumas mulheres. Queremos direitos, liberdade, seguran�a e uma vida digna para todas. � por esses e por outros motivos, que eu n�o quero receber “parab�ns” nesse Dia Internacional da Mulher. As flores e as congratula��es podem ser substitu�das pelo compromisso em se tornar um aliado real da luta antissexista, incluindo a��es pr�ticas no seu cotidiano pela equidade de g�nero.

 

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