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Estado de Minas DIREITO SIMPLES ASSIM

O fim da pris�o "especial": por que n�o para a Advocacia?

A Advocacia mant�m a prerrogativa da pris�o especial e � preciso entender porque isso � um ganho para a sociedade e n�o para o Advogado


05/04/2023 06:00 - atualizado 05/04/2023 11:48

Grades em linha compondo estrutura prisional.
O abuso de poder � muitas vezes exercido pela amea�a de pris�o (foto: Pixabay)

 

Todo mundo viu a not�cia da decis�o do Supremo Tribunal Federal na A��o de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 334 que declarou ser incompat�vel com a Constitui��o da Rep�blica de 1988 a previs�o do C�digo de Processo Penal que estabelecia a pris�o especial para “os diplomados por qualquer das faculdades superiores da Rep�blica”.

O Relator, Min. Alexandre de Moraes, destacou que a "extens�o da pris�o especial a essas pessoas caracteriza verdadeiro privil�gio que, em �ltima an�lise, materializa a desigualdade social e o vi�s seletivo do direito penal e malfere preceito fundamental da Constitui��o que assegura a igualdade entre todos na lei e perante a lei."

 

Rapidamente a OAB emitiu nota informando que a pris�o especial estabelecida para os Advogados n�o foi atingida pela decis�o do STF, o que significa que o nosso quartinho (chamado de sala de Estado Maior), com instala��es e comodidades condignas, ou a pris�o domiciliar, est�o garantidos.

 

Pois bem, a minha inten��o aqui � te convencer que faz muito sentido manter esta ressalva para os Advogados e eu quero fazer isso sem tecnicalidades jur�dicas. Para isso tem uma enxurrada de engravatados cumprindo o seu papel.

 

A minha inten��o aqui � ir pelo lado contr�rio e mostrar, em uma perspectiva social e hist�rica, porque a gente precisa proteger a Advocacia e n�o o Advogado. Ent�o aqui v�o diversos par�ntesis antes de a gente continuar....

 

- Par�ntesis 1: Argui��o de Descumprimento de Preceito Fundamental � daqueles nomes que faz o professor de Direito Constitucional ter regozijos lingu�sticos e o aluno uma s�ncope. Adoro!

 

- Par�ntesis 2: � preciso deixar claro para as pessoas normais que para as pessoas com forma��o jur�dica (que est�o, obviamente, apartadas da primeira classe), norma inconstitucional � diferente de norma n�o recepcionada pela Constitui��o. E acredite, tem l�gica! Mas eis a� um bom exemplo do porqu� a gente n�o consegue se comunicar fora da bolha.

 

- Par�ntesis 3: Eu realmente acho curios�ssimo o conceito de “pris�o especial”, como se tivesse alguma coisa de especial em uma pris�o. Ademais, a necessidade de destacar que a pris�o especial deve ser “condigna” � a confiss�o institucionalizada de que a pris�o geral n�o �. Dorme com essa...

 

- Par�ntesis 4: A primeira vez que eu ouvi a express�o “sala de Estado Maior” fiquei tentando descobrir se tem uma “sala de Estado Menor”... Neurot�picos n�o entender�o...

 

Chega!

Voltemos: Quando a OAB soltou a nota, veio uma galera criticar e falar que era um absurdo! Falar que esse povinho do Direito j� tinha dado um “jeitinho” de se proteger das picaretagens que pratica e mais um monte de groselha bem t�pica de quem estuda pelo grupo do zap.

 

Por causa disso, � importante situar as crian�as sobre o ambiente em que vivemos e, para isso, precisam entender coisas que n�o viveram. Isso d� um trabalho do c�o e se chama estudar Hist�ria. � uma das coisas mais legais de se fazer na escola e, infelizmente, muitas vezes � relegada a um segundo plano.

 

- Par�ntesis 5 (foi mal, n�o resisti): Obviamente que fica muito mais dif�cil de mudar esse cen�rio desinteressante da Hist�ria em um ambiente em que os professores de Hist�ria (e n�o s� eles) s�o reduzidos a comunistinhas incumbidos da catastr�fica tarefa de destruir as nossas fam�lias. Como diz a minha querid�ssima comadre Luciana, que � dessas desparafusadas que enfrenta um ex�rcito de crian�as diariamente (acreditem, elas s�o perigosas!), esse povo atribui um poder meio surreal para os professores enquanto eles est�o tentando (sem sucesso) s� fazer com que a molecada cale a boca...

 

Voltando: Eu estou fazendo essa volta aparentemente sem sentido para te mostrar um neg�cio importante aqui e que talvez voc� ainda n�o tenha lido:

 

“Art. 10 - No interesse da paz e da honra nacional, e sem as limita��es previstas na Constitui��o, os Comandantes-em-Chefe, que editam o presente Ato, poder�o suspender os direitos pol�ticos pelo prazo de dez (10) anos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais, exclu�da a aprecia��o judicial desses atos.”

 

Sabe quem assinou esse neg�cio a�? Um tio do zap chamado General do Ex�rcito Arthur da Costa e Silva, no dia 09 de abril de 1964. Esse a� � o art. 10 do Ato Institucional n. 1 que “consolidou” o golpe de 1964. 

 

- Par�ntesis 6 (eu juro que estou tentando, mas est� dif�cil de segurar): pode me confessar que voc� s� estudou o AI-5 como se n�o existisse um AI-1, AI-2, AI-3 e AI-4 antes!

 

Voltamos: E podem vir os chiliquentos para discutir o que quiserem: foi golpe! Tem um mandat�rio eleito que � tirado do poder para assumir uma pessoa que n�o foi eleito � golpe, meu povo! E se esse n�o eleito � das for�as armadas, ent�o � golpe militar.

 

A� j� vem o outro: mas e Cuba? Ora, � golpe! E a Venezuela? � golpe! E tantos quantos voc� quiser! Desrespeitou regras b�sicas de uma democracia (como altern�ncia de poder e respeito ao resultado das urnas) � golpe e � ditadura. Qual a dificuldade de ser coerente, meu senhor!

 

Mas bem, ent�o repara que � meio linear esse neg�cio. E eu posso provar! D� uma olhada em outro trecho do AI-1:

 

O presente Ato institucional s� poderia ser editado pela revolu��o vitoriosa, representada pelos Comandos em Chefe das tr�s Armas que respondem, no momento, pela realiza��o dos objetivos revolucion�rios, cuja frustra��o est�o decididas a impedir. (...) Fica, assim, bem claro que a revolu��o n�o procura legitimar-se atrav�s do Congresso. Este � que recebe deste Ato Institucional, resultante do exerc�cio do Poder Constituinte, inerente a todas as revolu��es, a sua legitima��o.”

 

Presta aten��o neste trecho ic�nico! Pode me agradecer se voc� n�o lembra de ter lido isso na aula de Hist�ria. E o que tem isso com pris�o especial? Tem tudo. Volta l� e repara nesse trecho: “exclu�da a aprecia��o judicial desses atos.”

 

Em resumo: o que essa galera fazia n�o podia ser questionado na Justi�a! N�o � de hoje que esse povo tem uma certa resist�ncia em dar explica��es...

 

Pois �! E a� vem uma perguntinha inevit�vel: quem � mesmo que “leva” os questionamentos contra autoridades para a Justi�a? Ah sim... � o maldito do Advogado. N�o fosse essa praga, o juiz n�o ficava sabendo da ilicitude e do abuso da autoridade. E se esse miser�vel n�o abrisse a boca para falar essas baboseiras, n�o obrigava o juiz a decidir.

 

Sacou? O sistema jur�dico � um verdadeiro entrave para quem exerce o poder. E para quem quer abusar do poder, o sistema jur�dico � um inimigo. Um Advogado com as suas prerrogativas garantidas n�o tem medo de levar ilegalidades ao Judici�rio.

 

Se juntar a isso um Minist�rio P�blico independente (e com prerrogativas garantidas) e um Poder Judici�rio independente e tamb�m com as prerrogativas garantidas, o resultado � miser�vel! Afinal, as ilegalidades das autoridades s�o debatidas, discutidas, tratadas e decididas publicamente! Pior! Diante destas ilegalidades, essa trupe independente pode levar � condena��o da autoridade ou � invalida��o da decis�o da autoridade.

 

Voc� h� de concordar comigo que para aqueles que n�o s�o muito afeitos a limites esse � um cen�rio realmente amea�ador.

 

E voc� acha que para por a�! Claro que n�o. Eu n�o ia deixar de te deleitar com o famoso AI-5, aquela norma jur�dica que � quase igual � B�blia: quase todo mundo j� ouviu falar, mas quase ningu�m leu! Pois �, ent�o vai a� uma pitadinha:

 

"Art. 5º - A suspens�o dos direitos pol�ticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em: 

I - cessa��o de privil�gio de foro por prerrogativa de fun��o;

II - suspens�o do direito de votar e de ser votado nas elei��es sindicais;

III - proibi��o de atividades ou manifesta��o sobre assunto de natureza pol�tica;

IV - aplica��o, quando necess�ria, das seguintes medidas de seguran�a:

a) liberdade vigiada;

b) proibi��o de freq�entar determinados lugares;

c) domic�lio determinado,

 

§ 1º - O ato que decretar a suspens�o dos direitos pol�ticos poder� fixar restri��es ou proibi��es relativamente ao exerc�cio de quaisquer outros direitos p�blicos ou privados."

 

N�o � legal isso a�? O Estado Militar podia retirar a prerrogativa de foro de um agente pol�tico que resolvesse falar demais! Tem gente que � matraqueiro, n�? A� nesses casos � melhor julgar com um juiz que o Estado Militar escolhesse. Pareceu justo e adequado?

 

- Par�ntesis 7 (eu juro que � o �ltimo): algu�m me lembra, pelo amor de Deus, de escrever um texto explicando que a �nica hip�tese legal em que aparece o termo “foro privilegiado” � no AI-5 e que a sua extin��o � uma aberra��o democr�tica!

 

Voltando: Ah... eles podiam tamb�m te proibir de frequentar um sindicato e ser votado l�. Afinal, sindicato � lugar de gente indecente mesmo. Tudo criminoso. Melhor o Estado Militar decidir quem entra e quem sai.

 

Obviamente, para a garantia da paz social, � importante que o Estado Militar possa decidir tamb�m quem pode abrir a boca para falar de pol�tica e quem n�o pode. Afinal, o bom senso desse povo para este tipo de recorte � conhecido e ningu�m melhor para nos conduzir neste pl�cido caminho � ordem e � seguran�a. Eu mesmo, se me vigiasse, me proibia de falar, mas n�o tem mais lei nesse pa�s... 

 

Por fim, podia tamb�m te deixar livre! � um Estado bom n�? Como criticar... claro que com ressalvas porque, conforme o pre�mbulo do AI-5, atos subversivos estavam conspirando contra os objetivos maiores da revolu��o vitoriosa. Ent�o voc� � livre como passarinho, desde que fosse vigiado por um agente do Estado, sem poder frequentar os lugares que o Estado determinava e com domic�lio obrigat�rio fixado pelo Estado.

 

Tudo em nome da seguran�a nacional, obviamente. 

 

E a� eu te pergunto: e quem discordasse da decis�o? E se voc� se julgasse um cidad�o de bem, defensor do regime e do Estado Militar e, por isso, n�o tivesse feito nada para ser punido mas foi? E se voc� tivesse sido confundido com um comunistinha subversivo por causa de maldito hom�nimo desses pais desvairados que insistem em batizar a crian�ada como Vladmir?

 

Pois �, foi mal, mas mesmo assim n�o ia dar para fazer muita coisa. Sabe por qu�? Porque tinha um par�grafo segundo no meio do caminho. D� uma olhada:

 

“§ 2º - As medidas de seguran�a de que trata o item IV deste artigo ser�o aplicadas pelo Ministro de Estado da Justi�a, defesa a aprecia��o de seu ato pelo Poder Judici�rio.”

 

Sabe o que significa a palavra “defesa” a� do texto, meu consagrado? Significa “proibida” de uma forma polida e bonitinha. Em outras palavras: n�o adianta nem tentar porque o Judici�rio n�o pode julgar o seu pedido.

 

Acabou? Claro que n�o! Sempre tem mais porque sempre tem um comunistinha para amea�ar a nossa exist�ncia. Ent�o se voc�, cidad�o de bem, cumpridor dos seus deveres c�vicos e defensor ardoroso do Estado Militar fosse preso injustamente porque estava no lugar errado e na hora errada, sabe o que ia acontecer? Nada. Voc� ia ficar l�.

 

E a hist�ria do telefonema e de chamar quem mesmo??? Ah... a hist�ria hollywoodiana e est�pida de chamar um Advogado para te defender... Ent�o, n�o podia. Olha a�:

 

“Art. 10 - Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes pol�ticos, contra a seguran�a nacional, a ordem econ�mica e social e a economia popular.”

 

Mas e se voc� encontrasse um Advogado corajoso (ou maluco ou, mais provavelmente, tamb�m comunistinha) que resolvesse ignorar essa bela estrutura legal, talvez com essas ideias bizarras de que leis injustas precisam ser combatidas? E se esse maluco resolvesse procurar um juiz (tamb�m maluco) para contestar a legitimidade dessa coisa toda?

 

N�o se engane, quando a gente vai com a farinha esse povo j� est� voltando com a farofa. Vamos tirar as prerrogativas do juiz tamb�m!!! � t�o simples manter a ordem e progresso n�! Olha a�:

 

“Art. 6º - Ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exerc�cio em fun��es por prazo certo.”

 

E a�, para arrematar, a gente tira esses enxeridos de tudo, porque fica mais simples:

 

“Art. 11 - Excluem-se de qualquer aprecia��o judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares, bem como os respectivos efeitos.”

 

Ficou bom para voc�? A galera de l� gostou e aplicou bastante. At� porque � um racioc�nio simples: a gente faz o que quer e ningu�m pode questionar. Se o retardado do subversivo encontrar um maluco de um Advogado para questionar, a gente prende o Advogado.

 

E se por um acaso o maluco (e agora criminoso) Advogado encontrar um maluco de um juiz que aceite o escutar, a gente despacha o juiz e coloca outro no lugar que atenda aos mais elevados interesses nacionais! Pronto! A amea�a comunista est� gloriosamente combatida.

 

E eu espero profundamente que voc� tenha entendido que prerrogativa n�o � privil�gio. Prerrogativa � garantia para que abusos n�o sejam cometidos. Me lembro que h� poucos meses eu fiz uma peti��o ao Poder Judici�rio e assinei com o meu nome (todinho l�, com todos os dados e tudo mais) afirmando que um Tenente-Coronel do Ex�rcito Brasileiro havia praticado um ato ilegal e, por isso, nulo de pleno direito.

 

Imposs�vel n�o pensar em quanta gente n�o foi presa e calada para que eu, um simples Advogado, sem sobrenome e nem costas quentes, possa afirmar publicamente que uma autoridade desta patente viola a lei sem ter medo de voltar para casa. Prerrogativa � isso.

 

E se a autoridade abusar do seu poder (como a gente j� viu a� o povo prendendo Advogado por desacato, sendo que desacato est� fora do rol de crimes pass�veis de pris�o cautelar), a pris�o especial � a prerrogativa para evitar que o mero ato prisional seja instrumento de press�o, penalidade e amea�a. � algo do tipo: quer prender? Toca adiante. Vai ser abuso de autoridade e ainda vai ter que me dar suquinho.

 

N�o � � toa que a pris�o especial prevalece para o Advogado, para o Minist�rio P�blico e para o Poder Judici�rio, assim como outras prerrogativas. N�o � luxo, � necessidade. E as crian�as n�o viram, mas podem ter f�cil acesso aos dados que mostram como � preciso dar cobertura para quem vive a vida mexendo em vespeiros.

 

Recentemente o Estado de Israel parou (literalmente) para defender a independ�ncia e as garantias do seu Poder Judici�rio. Um projeto de lei autocrata absurdo pretende retirar a independ�ncia do Judici�rio e blindar adivinha quem? Pode rir... porque o padr�o n�o muda mesmo.

 

E o povo foi com metade (isso mesmo!!!) da popula��o da capital na rua para barrar o projeto e garantir a independ�ncia do Judici�rio e o valor das suas decis�es. S� quem sentiu na pele o que � o perigo da aus�ncia de limites de poder para entender que isso n�o � conversa de zap. 

 

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