
Diante de demandas profissionais no sentido de orientar clientes sobre procedimentos extrajudiciais, parei para analisar as absurdas dificuldades enfrentadas pelas pessoas na regulariza��o de bens e direitos pela via dos servi�os de cart�rio.
Fiquei pensando: como � poss�vel exigir regulariza��o de bens e direitos quando o custo se torna um saco sem fundo?
Antes de entrar no tema espec�fico, vale a pena relembrar parte do tema de um texto nosso publicado em junho de 2022 no blog que t�nhamos no Portal UAI com o mesmo nome de nossa coluna.
H� uma s�rie de atos que, por sua pr�pria natureza, exige solenidade, certeza, formalidade, tudo com o objetivo de dar mais seguran�a aos atos individuais e coletivos. Os cart�rios dotados de “f� p�blica” visam dar tais garantias.
O certo � que, desde o nascimento at� a morte e ainda depois dela, os servi�os cartor�rios est�o presentes. E vale noticiar algumas fun��es e servi�os prestados por cada um. De forma geral e de maneira bem simples ao entendimento, os cart�rios mais usados pelas pessoas s�o os notariais e registrais. Comecemos ent�o pelos registrais:
– Registro Civil das Pessoas Naturais: Aqui s�o registrados os nascimentos, casamentos, div�rcios, interdi��es (tutelas e curatelas), �bitos. Nesse tipo de cart�rio temos o ciclo da vida, atrav�s desses registros s�o gerados os dados mais importantes da passagem existencial da pessoa.
– Registro Civil de Pessoas Jur�dicas: Aqui tamb�m, nasce vive e morre uma empresa ou mesmo entidades jur�dicas sem fins lucrativos (civis, religiosas, cient�ficas, liter�rias, associa��es, funda��es etc.).
– Registro Civil de T�tulos e Documentos: Visa registrar contratos de neg�cios privados ou compromissos firmados entre pessoas f�sicas e ou jur�dicas. Fazer notifica��es, cobran�as
- Registro de Im�veis: Contam toda a hist�ria registral das transfer�ncias de titularidade dos im�veis ao longo do tempo.
– Protestos de T�tulos: Tornam p�blicos os t�tulos que n�o foram efetivamente pagos por seus titulares.
– Notariais: S�o os cart�rios de notas respons�veis pela maioria dos servi�os do dia a dia. Lavratura de escrituras, procura��es, autentica��o de documentos, reconhecimento de firmas (assinaturas) etc.
As escrituras podem ser de compra e venda de im�veis, permutas, doa��es, pactos antenupciais para casamentos, div�rcios, declara��es ou dissolu��es de uni�o est�vel, invent�rios, compromisso de obriga��o alimentar, declara��o de paternidade e um outro tanto de situa��es. Esses cart�rios tamb�m atestam autenticidade de documentos, reconhecem assinaturas etc.
Em que pese tudo o que foi dito acima, o que h� de mais destacante no nosso recorte de hoje � exatamente o abuso sofrido pelos cidad�os j� que n�o podem se dar ao luxo de prescindir tais servi�os. Al�m do alto custo, tem a qualidade discut�vel de tratamento recebido em alguns.
Falando como exemplo da Comarca de Belo Horizonte, temos mais ou menos nove cart�rios de notas, nove de registro de im�veis e quatro de registro civil de pessoas, entre os demais. Existem servi�os que o consumidor n�o tem o direito de escolher em qual cart�rio fazer, � obrigat�rio que seja naquele X. E embora existam leis e resolu��es, provimentos a serem seguidos, existem diferen�as consider�veis no trato entre eles, que leva muito em conta o modo de pensar do Oficial do Cart�rio, que cria suas regras internas. Muitas vezes o fazem por medo do erro, mas de outro lado tamb�m n�o � raro o excesso de regras trazer desgaste e at� preju�zo para o consumidor que paga pelos servi�os caros.
Ainda em sede de exemplo, faremos pequeno recorte sobre um processo de invent�rio que pode ser feito pela via judicial ou administrativa (no cart�rio de notas) dependendo do caso.
Al�m de arcar com as custas judiciais ou taxas para lavratura da escritura; pesquisa sobre a exist�ncia de testamento na Central Notarial de Servi�os Eletr�nicos Compartilhados (CENSEC); o Imposto de Transmiss�o por Causa-mortis e Doa��es (ITCD ou ITCMD); dentre outras despesas como expedi��o de formal, libera��o de alvar�, honor�rios advocat�cios, tem tamb�m taxas posteriores a tudo isso.
E � aqui o nosso foco, taxas de Cart�rio que parecem n�o ter fim. Pois ainda que exista uma Tabela de Emolumentos (que pode ser encontrada site do TJMG ), os valores ali apontados na realidade s�o sempre menores do que o consumidor ter� que desembolsar, pois s�o in�meros "penduricalhos com justificativa legal" a se acrescentar.
Para que se tenha ideia, em 2023, o reconhecimento de firma custa R$10,10 por assinatura em documentos, mas na tabela consta como valor final R$9,75, e se precisar abrir a firma, ou seja, deixar l� o cart�o com assinatura para confer�ncia futura, paga ainda R$20,20. Da mesma forma, se tiver que autenticar c�pia de documento, paga R$10,10 cada um, mesmo que estejam na mesma folha.
No caso de se fazer qualquer escritura que o objeto tenha valor econ�mico, ter� que pagar taxa que vai de R$191,86 a R$9.333,74, escalonadamente equivalente �quela faixa de valor, no cart�rio de notas.
Ultrapassada essa etapa, segue o indiv�duo para registrar o formal de partilha nos Cart�rios de Registro de Im�veis. E come�a por ter que pagar o valor exorbitante, basicamente o mesmo que j� pagou no outro cart�rio ou na justi�a, levando mais uma vez em conta a tabela.

Como se n�o bastasse, o cart�rio come�a a verificar pend�ncias, exigindo documentos que n�o foram exigidos no invent�rio j� julgado. Claro, cada um com c�pia autenticada em cart�rio, aqueles R$10,10. Tem que preencher um requerimento de registro do formal devendo constar a assinatura de todos os herdeiros e meeiro que, se n�o estiverem presentes no Cart�rio, ter�o que reconhecer firma (sua assinatura). Mais uma vez os R$10,10 por assinatura. E n�o pense que para por a�, pois antes de registrar o formal tem que averbar a certid�o de �bito (que j� est� no formal), mas tem que ser o documento original (que fica retido) ou, mais vez a c�pia autenticada. Se for fazer pelo E-protocolo (eletr�nico) via CRI/MG, tem mais exig�ncias e taxas para pagar.
S�o exigidos documentos em excesso e se forem certid�es, como de casamento ou nascimento. elas devem estar atualizadas em no m�ximo 90 dias, Certid�o de �nus do im�vel com validade somente de 30 dias. Aqui nem vou comentar a possibilidade absurda de cobrarem certid�o de �bito atualizada (como se o morto pudesse voltar a viver), pasmem!
Cansei de colocar todos os valores!
E o que dizer do atendimento? Falar por via telef�nica � quase imposs�vel. No atendimento presencial, filas e mais filas. E-mail, sites etc., em que pese haver certas diferen�as de cart�rio para cart�rio, no geral � ainda tudo muito prec�rio!
Reafirmando o que j� foi dito, no caso dos cart�rios de notas, o cidad�o tem a liberdade de escolha, mesmo estando sujeito aos valores da tabela aumentados por uma s�rie de penduricalhos justificados. Mas � obrigado a ir naquele cart�rio de registros im�veis no qual consta a matr�cula do bem e de forma igual se d� registro civil de pessoas.
Se n�o h� escolha, propiciam-se os abusos no trato e exig�ncias que, muitas vezes, ultrapassam em rigor as determina��es legais, seja de lei, de provimentos etc. S�o exig�ncias exageradas, burocr�ticas, que s� servem para atrasar os procedimentos e engrossar a arrecada��o dos cart�rios, pois a seguran�a pode ser alcan�ada com menos burocracia.
Respeitando aqueles que pensam de forma diferente, a meu ver esse quadro precisa mudar. Precisamos tirar o grito do sil�ncio! Estamos vivendo a era da velocidade digital, tempo em que a cobran�a excessiva de papel est� ultrapassada. Os cidad�os e cidad�s do Brasil s�o obrigados a utilizar os servi�os de cart�rio e precisam aprender a manifestar sua indigana��o publicamente , para que haja mudan�a na forma legal visando o bem coletivo.
E voc� j� teve alguma experi�ncia question�vel com servi�os extrajudiciais de cart�rio? Conte pra n�s!