
Num rasgo de inspira��o, o presidente do Atl�ntico (Instituto de a��o cidad�) – Rafael Vecchiatti – definiu as duas polaridades brasileiras, como sendo a do Brasil Produtivo e a do Brasil Coercitivo. Foi num artigo para o jornal Gazeta Mercantil, ainda no in�cio dos anos 1980. Na ocasi�o, Roberto Campos, o av�, repercutiu a magistral defini��o de Vecchiatti num artigo sobre os impasses da pol�tica e economia nacionais. At� hoje, a polariza��o vechiatiana persiste e se acentua. De nada valeram os alertas do ent�o senador por Mato Grosso e �cone do pensamento liberal.
Mas por que, afinal, prevalece o confronto pesado entre produ��o e coer��o no Brasil, quando sabemos que qualquer economia, para funcionar bem, depende da produ��o, tanto quanto as institui��es da coer��o, ou seja, da lei? A resposta est� na natureza dessa rela��o entre produ��o e coer��o, entre economia e controles, entre a liberdade de agir e o poder de limitar e proibir. � uma rela��o sempre delicada, pois n�o h� produtividade sem liberdade. Mas tampouco haver� espa�o para se produzir bem sem ordem legal, sem adequado enquadramento (coer��o) da sociedade. Nessa rela��o, o equil�brio entre a��o e coer��o pode significar a diferen�a entre prosperidade e estagna��o, entre criatividade e repress�o, entre felicidade e ciclotimia.
O Brasil Produtivo vem perdendo espa�o para o Brasil Coercitivo desde os anos 1980. N�o deixa de ser paradoxal que esse afogamento da liberdade venha ocorrendo enquanto o pa�s comemora o fim do autoritarismo militar (anos 1960-80) e pranteia a democracia republicana da Constituinte. O per�odo da Constitui��o Federal de 1988 � inteiramente associado � perda de vitalidade produtiva (o pa�s sai de um ritmo de mais de 7% de crescimento para menos de 2% hoje). Enquanto isso, o Brasil Coercitivo vem se expandindo, ano ap�s ano, sob o imp�rio das leis e decis�es judiciais que constrangem os produtores e liberam os corruptores. Veio o Plano Real, mas a infla��o monet�ria foi substitu�da pela infla��o fiscal.
O tamanho do setor p�blico, desde 1988, inchou a ponto de as despesas com a m�quina p�blica e juros da d�vida crescerem ao dobro do ritmo do PIB do setor produtivo que banca essa conta. Resultado: o setor coercitivo, que goza de estabilidade e prerrogativas, hoje extrai do setor produtivo quase 10% do fluxo total de riqueza anual – cerca de R$ 1 trilh�o – de gastos p�blicos est�reis, n�o compensados por maior produtividade. Poucos pa�ses det�m uma rela��o t�o perversa entre os gastos da m�quina coercitiva e os servi�os auferidos pelos cidad�os pagadores da conta (os "produtivos").
� um desequil�brio assustador cuja mensagem se tornou clara para o lado produtivo: n�o adianta insistir, melhor n�o produzir. Claro, o Brasil � composto de v�rios brasis; alguns segmentos seguem avan�ando, como o setor agro, os pequenos neg�cios e certos servi�os. No ramo manufatureiro industrial, totalmente exposto � extra��o do setor coercitivo, a estagna��o � praticamente absoluta, com a ind�stria estancada em n�veis do come�o da d�cada passada.
Conclus�o: os planos de recupera��o neoindustrial do atual governo se tornar�o letra morta enquanto prevalecer decis�es supremas do Judici�rio trazendo mais inseguran�a jur�dica �s atividades produtivas. Excesso de coer��o mata produ��o. Tampouco haver� aumento de produtividade decorrente de uma reforma tribut�ria, tal como pretendida por te�ricos do governo, se o resultado for o aumento da quantidade de impostos – � o que promete o projeto em curso – com eleva��o brutal da carga sobre alimentos, rem�dios e servi�os essenciais, al�m da supress�o do lucro, bem como manifesto preju�zo aos munic�pios, esmagados pela fome tribut�ria dos estados e da Uni�o. O setor produtivo mais uma vez perder�.
Tudo isso, coroado pelos recentes apoios formais de Bras�lia a governos autorit�rios de pa�ses vizinhos, onde a preval�ncia do coercitivo sobre o produtivo causou o afundamento da sociedade na despeda�ada Venezuela, com seus mais de seis milh�es de cidad�os emigrados, que desistiram de viver e produzir em seu pr�prio pa�s. O Brasil parece n�o aprender que a prosperidade jamais vir� do esmagamento da produ��o pela coer��o. N�o existe meia liberdade. A experi�ncia dos �ltimos trinta anos nos indica que somos hoje um pa�s "maduro". Sim, maduro para empobrecer e pronto para explodir.