Confesso que esperava tr�s rea��es diversas da que Bolsonaro acabou tomando para enfrentar a mais s�ria den�ncia de corrup��o que ronda seu governo, a da compra superfaturada, intermediada e apressada da vacina Covaxin.
Imaginei que, pelos padr�es tradicionais da pol�tica brasileira, iria abrir um ritual de "n�o sabia", a partir do depoimento na CPI do deputado Luiz Miranda, seu admirador, que o teria advertido da tramoia, superficialmente em janeiro e com mais detalhes em mar�o.
estilo diplom�tico de betoneira col�rica para negar que o contrato tenha sido efetivado (nada foi entregue, � verdade) e acusar meio mundo, inclu�das CPI e imprensa, de persegui��o.
Ou, pelos padr�es tradicionais de Bolsonaro, reagir a seu conhecido Ainda havia uma terceira hip�tese, ainda que quase imposs�vel a seu modo, de ficar calado at� o esgotamento da estrid�ncia da den�ncia por ela mesmo, diante de que o contrato n�o foi consumado.
Menos a quarta, n�o muito estranha aos padr�es de seu governo e de sua m�quina de propaganda, de plantar uma vers�o, ainda que absurda e conspirat�ria, para confundir.
At� porque este � o caso em que n�o parece haver uma vers�o alternativa. H� provas e den�ncias dentro de casa. A vers�o que deu base ao ataque ao deputado e seu irm�o, na coletiva do ministro Onyx Lorenzoni ontem, n�o durou duas horas.
A pr�pria empresa investigada admitiu que n�o � falsa a nota fiscal apresentada pelo funcion�rio do Minist�rio da Sa�de e irm�o de Miranda, Luiz Ricardo, como ind�cio de fraude. Um pouco pior, ela revela que havia uma segunda empresa intermedi�ria na jogada, na �ndia, a exportadora Madison.
At� ontem, ainda se poderia trabalhar com a primeira e mais tradicional vers�o do "n�o sabia", que parecia estar se encaminhando com o depoimento do deputado nesta sexta-feira.
Ainda que parecesse suspeito de que tivesse se oferecido para ser ouvido pelos senadores s� agora, depois do vazamento do �udio de Luiz Ricardo sobre as press�es de gente do governo para apressar a importa��o, ao mesmo tempo em que se fazia corpo mole para fechar contratos com outros laborat�rios.
Por essa vers�o, ele alertou Bolsonaro de que havia alguma coisa errada em janeiro e denunciou que a coisa se efetivava em mar�o. Tinha a ilus�o de que o contrato ainda poderia ser desfeito pelo presidente que admira e defende.
Como parece que n�o foi ouvido ou o foi protocolarmente, tamb�m n�o insistiu, n�o cobrou com mais veem�ncia e nem denunciou antes do vazamento.
Pode-se dar o benef�cio da d�vida de que o presidente soubesse ou de sua certeza de que ele ainda paralisaria o processo. J� que, segundo suas palavras na entrevista ao site O Antagonista, Bolsonaro teria agradecido a colabora��o e admitido que o caso era "grave, muito grave".
A vers�o dependia de alta dose de boa vontade. No janeiro em que alertou de que "algo muito suspeito" estaria acontecendo, Jair Bolsonaro passou a m�o no telefone, n�o na sua presen�a, e ligou para intervir pela vacina para ningu�m menos que o primeiro ministro da �ndia, Narendra Modi.
Num dia em que, muito ao acaso, andava por l� Francisco Maximiano, s�cio da empresa interessada na intermedia��o, a Precisa, e da Global Medicamentos, j� enrolada em venda de produtos pagos e n�o entregues ao Minist�rio da Sa�de.
E onde, sabe-se agora, existia uma segunda intermedi�ria, a Madison, que ajudou a onerar o pre�o da vacina.
Mais que isso, pelo que tamb�m se sabe, Bolsonaro havia dado aval para a contrata��o especial ainda no meio do ano passado, quando imprecava contra a Coronavac de Jo�o Doria e acusava o imunizante da Pfeizer de condi��es contratuais leoninas e efeitos de jacar�.
� muito ind�cio para que o governo tivesse optado pela pior das alternativas, na pressa de afastar qualquer sugest�o de corrup��o no seu governo.
Deveria ter tentado o eficiente e velho modelo de ficar calado ou dizer que "n�o sabia".
Como j� escrevi aqui, � a bala de prata contra o que resta de sustenta��o de seu discurso de honorabilidade, que o faria em tese diferente dos demais pol�ticos. At� ent�o, era acusado de coisas piores, mas imateriais. N�o de roubo, algo que nossos costumes pol�ticos condenam mais do que bater em m�e.
Como ensina a hist�ria, desde que Carlos Lacerda inaugurou o assassinato de reputa��es como estrat�gia eleitoral, nos anos 50 contra Get�lio Vargas, a corrup��o virou o argumento mais eficiente — e infal�vel — para encurtar o processo de desmoraliza��o do oponente.
O PT o usou com maestria contra Collor de Mello, no in�cio dos 90, e foi sua maior v�tima em igual ou pior medida, em meados da �ltima d�cada, no turbilh�o de den�ncias da Lava-Jato que resultou no impeachment de Dilma e na elei��o de Bolsonaro.
A ponto de, quase sempre, ofuscar suas inten��es e outros defeitos piores dos denunciados. Prender Get�lio, Collor ou Lula nunca foi o principal objetivo. Assim, como se viria a saber, ser corrupto n�o era o pior de nenhum dos tr�s. Nem, como se sabe, de Bolsonaro.