
Assim, surgiam as pot�ncias econ�micas e geopol�ticas no decorrer dos s�culos. Os pa�ses assumiam um papel de lideran�a que subjugava os demais povos, menos favorecidos, pelos meios que possu�am e garantiam esse controle, quase absoluto.
Todavia, a supremacia das na��es sofre mudan�as ao longo do tempo, sendo comum a transfer�ncia desse dom�nio de um pa�s para outro. No decorrer do intenso e breve S�culo XX, despertado com a for�a do Imp�rio Brit�nico e adormecido nos bra�os estadunidenses, eventos marcantes determinaram como o poderio seria expresso.
As duas grandes guerras mundiais, as revolu��es russa e chinesa, a bipolaridade da economia, as tens�es entre as superpot�ncias e as �reas aliadas foram alguns dos elementos que definiram as rela��es entre os povos neste �ltimo s�culo.
As revolu��es industriais alteraram significativamente as rela��es geopol�ticas e as formas de apropria��o espacial. Mas mantiveram, praticamente, inalteradas as rela��es existentes entre os l�deres e os subordinados. De modo geral, a capacidade b�lica, atrelada � capacidade industrial, foram elementos marcantes do exerc�cio da autoridade durante a recente hist�ria humana.
Em busca de recursos naturais e novos mercados, sociedades inteiras foram subjugadas pelas pot�ncias que acumularam um avassalador �mpeto de domina��o. Historicamente, at� meados do s�culo passado, os centros de decis�o estavam concentrados no continente europeu. Entretanto, com o fim da Segunda Grande Guerra, ocorreu a transfer�ncia do centro de comando para o continente americano, com a ascend�ncia dos EUA sobre as demais na��es, incluindo aquela que outrora o havia colonizado.
As disputas entre os dois s�mbolos da Antiga Ordem Mundial, caracterizada pelas disputas entre o capitalismo e o socialismo, desencadearam a corrida armamentista (Guerra Fria) entre os dois pa�ses alicerces do p�s-guerra: os Estados Unidos (EUA) e a Uni�o Sovi�tica (URSS). Com o fim da Guerra Fria e a intensifica��o da globaliza��o econ�mica, surgem novos atores disputando fatias do poderio econ�mico global.
O continente asi�tico desperta, como uma oposi��o ao dom�nio ocidental, com o crescimento estratosf�rico chin�s, desencadeado nos primeiros anos da d�cada de 1980, e acaba por ditar novos postulados. Os modelos do passado estavam ultrapassados e havia necessidade de criar outros meios de controle.
O mercado � a nova forma de domina��o. Se, inicialmente, a China n�o foi vista como um rival a ser temido e sim aproveitado, pelas vantagens oferecidas nas Zonas Econ�micas Especiais (ZEEs), somado � farta e barata m�o de obra, n�o tardaria para o Ocidente perceber que os chineses tinham metas claras de se colocarem como for�as centrais no tabuleiro do poder global.
Novos meios de garantir a lideran�a mundial s�o impostos pelas mudan�as na geopol�tica do p�s- Guerra Fria e, principalmente, ap�s os atentados �s Torres G�meas, em Nova Iorque (2001).
Assim, no findar do s�culo passado, os EUA avan�am em um novo aparato de poder: a lei. O Direito Americano como forma de controlar, de enfraquecer os advers�rios e de obter cifras alt�ssimas para o Tesouro Americano, passou a ser utilizado como estrat�gia de combate, em especial, �s pr�ticas de corrup��o e ao terrorismo, resultando em enormes ganhos financeiros e eliminando poss�veis desafetos que comprometam sua posi��o de l�der global.
A Lei de extraterritorialidade – Foreign Corrupt Practices Act (FCPA)- adotada no pa�s para combater a corrup��o pode ser at� considerada louv�vel, mas deveria ter peso e medida semelhantes para as empresas nacionais e estrangeiras, mas n�o � o que normalmente se observa. H� um abismo entre as exig�ncias aplicadas as advers�rias internacionais e aquelas sediadas no pa�s.
Inicialmente, quando a lei foi criada em 1977, a puni��o seria aplicada apenas �s empresas estadunidenses, mas no final da d�cada de 1990 (com o apoio posterior da OCDE, sua aplica��o ultrapassou as fronteiras do pa�s de origem) se estendeu a todas as empresas, sediadas ou n�o no pa�s, que, direta ou indiretamente, envolvesse o “falc�o” do ocidente, mesmo que atrav�s do uso de um e-mail, cujo servidor estivesse nos EUA.
Quando os estadunidenses perceberam que “limpar a casa” obrigaria suas empresas a respeitar a lei, mas as deixariam em desvantagens em rela��o �s empresas estrangeiras, poupadas da aplica��o dessa lei, mudaram a estrat�gia. A solu��o encontrada para eliminar essa desvantagem � colocar todos em p� de igualdade, portanto o mundo inteiro dever� se sujeitar e cumprir as regras da FCPA. Assim foi feito.
Os EUA se armaram de um arsenal jur�dico para atingir as empresas estrangeiras. Tudo come�a com um comunicado � empresa-alvo sobre uma investiga��o aberta pelo governo norte-americano sobre suspeitas de pr�ticas il�citas cometidas pela empresa. Com frequ�ncia, a comunica��o � acompanhada da pris�o de algum executivo do alto escal�o, suspeito de envolvimento com a investiga��o em andamento. O ato aumenta a tens�o e o medo dos envolvidos. Tendem a ceder mais facilmente �s severas exig�ncias que ser�o apresentadas pelos procuradores.
Um escrit�rio de advocacia contratado, obrigatoriamente, nos EUA, ser� o intermediador entre o acusado e o acusador, at� o fechamento de um acordo, que, geralmente, resultar�, entre outras coisas, em centenas de milh�es ou de bilh�es de d�lares aos cofres do governo dos EUA! H� tamb�m o risco de desmantelamento da pr�pria empresa, principalmente das concorrentes norte-americanas.
Essa lei garante a legitimidade da a��o e funciona como uma arapuca para as na��es e gigantes transnacionais, em todo o mundo. Para ser aplicada, basta que ocorra uma transa��o em d�lares, o uso de um e-mail com um servidor, instalado em um rinc�o do pa�s ou uma conex�o com um elemento americano (como uma desobedi�ncia por desrespeitar um embrago ou san��o imposta a algum pa�s, considerado hostil, como Cuba, Ir�, Sud�o, L�bia etc.) para os EUA darem in�cio a uma investiga��o.
O campo econ�mico transformou-se em um campo de confronto nos tribunais norte-americanos. Os pa�ses, principalmente, os europeus, os maiores alvos, perceberam, tardiamente, que deram amplos poderes para seus s�mbolos industriais serem julgados, al�m de suas fronteiras, pelos EUA. Os ideais de liberdade e democracia ganharam novas conota��es. O Direito Americano foi exportado e quase sem condi��es de contesta��o externa quando aplicado. Uma a��o pouco livre e pouco democr�tica.
Os casos s�o julgados por Washington e isso abre uma falha que poderia ser usada pelas empresas investigadas. Levar o processo para a justi�a americana para identificar poss�veis abusos, como afirmam os analistas. At� o presente, todos os processos levam a uma negocia��o e um reconhecimento de culpa, que pode resultar na redu��o da multa e da pena aplicada aos acusados.
Os processos, em geral, s�o julgados no �mbito administrativo do pa�s e encerrados com um acordo. Levar os casos � justi�a ou aos tribunais americanos poderia esclarecer a legitimidade de muitas dessas investiga��es, mas, praticamente, nenhuma das grandes empresas envolvidas se atreveram a tanto.
H� um temor em rela��o �s retalia��es severas do governo dos EUA e acabam por pagar vultosas d�vidas, como as francesas Total e a Alstom (um dos acusados de envolvimento abriu um precedente e levou a a��o aos tribunais, saindo do escopo exclusivo dos procuradores do Departamento de Justi�a/DoJ – United States v. Hoskins), a alem� Siemens, a chinesa ZTE, a brasileira JBS, entre outras.
Fran�ois Guillaume Guizot (1787-1874) dizia “Quando a pol�tica penetra no recinto dos tribunais, a justi�a se retira por alguma porta”. Talvez este seja o caso. Se nada mudar, a FCPA pode se transformar em uma lei destinada a governar o mundo. Muito pouco democr�tico para um pa�s que defende a democracia como o pilar de todas as na��es. Cheira muito � hipocrisia.