
O Dia Internacional da Mulher costuma ser uma data em que as homenageadas s�o presenteadas com flores. No entanto, a efem�ride � sin�nimo de uma hist�ria de lutas, que demarca a mobiliza��o pela igualdade de direitos e, sobretudo, pelo fim da viol�ncia. Mais at� do que comemorar, � momento de apontar que ainda s�o necess�rias muitas conquistas para que haja igualdade de g�neros. A origem da data est� relacionada a mobiliza��o das mulheres por melhores condi��es de trabalho.
O movimento feminista engloba diferentes correntes e vertentes. Tamb�m h� distintas fases da luta: por direitos pol�ticos, como o direito ao voto; pelo ingresso no mercado de trabalho e por sal�rios equiparados; pela representa��o igualit�ria na pol�tica... Parte da luta tamb�m � contra as v�rias faces da viol�ncia: do ass�dio sexual ao feminic�dio.
Os n�meros n�o deixam d�vidas de que, apesar da gentileza de quem oferece flores, o dia 8 de mar�o � mais de mobiliza��o do que de comemora��o. Das in�meras formas de desequil�brio na balan�a entre homens e as mulheres, a da viol�ncia � a mais cruel, como refor�a a pesquisa “Percep��es sobre seguran�a das mulheres no deslocamento pelas cidades”, realizado pelos institutos Locomotiva e Patr�cia Galv�o: 81% das ouvidas afirmam j� ter sofrido viol�ncia no deslocamento pela cidade.
Outra pesquisa do grupo aponta que 76% delas j� sofreram viol�ncia e ass�dio no trabalho. Refor�am o quadro preocupante e outras realidades: uma mulher � v�tima de estupro a cada 10 minutos, e tr�s s�o v�timas de feminic�dio a cada dia, de acordo com o Fora do Eixo, uma rede de coletivos culturais.
"Quem ama n�o mata"
Era agosto de 1980, Elizabeth Fleury declamou o poema “Aos homens nosso mel e nosso fel”, em manifesta��o no adro da Igreja S�o Jos�, no Centro de Belo Horizonte. A mobiliza��o foi um dos marcos do movimento Quem Ama N�o Mata. A mobiliza��o nasceu como resposta � viol�ncia contra a mulher, aos assassinatos cometidos por homens e para reivindicar direitos sobre o pr�prio corpo. Quest�es que, 42 anos depois, continuam atuais.
O movimento � considerado fundamental para mudar o arcabou�o jur�dico em rela��o aos crimes cometidos contra mulheres. Na d�cada de 1980, os assassinatos de Helo�sa Ballesteros e Maria Regina Souza Rocha foram o estopim para a cria��o do grupo. O ato p�blico realizada na escadaria da Igreja S�o Jos� reuniu cerca de 400 mulheres.
Anos antes, outra morte havia chocado a opini�o p�blica: o assassinato da mineira �ngela Diniz pelo companheiro, Doca Street, em 1976. No julgamento, a defesa do assassino usou o argumento de leg�tima defesa da honra. Foi gra�as � mobiliza��o feminina em todo o Brasil que o tema ganhou debate p�blico que resultou em mudan�a na compreens�o de crimes cometidos contra as mulheres. Mas foi somente em 2015 que o C�digo Penal Brasileiro foi alterado, com inclus�o da Lei 13.104, que tipifica o feminic�dio como homic�dio cometido por motiva��es de g�nero.
Transforma��o
A mobiliza��o das mulheres para garantia de direitos � o tema do debate “Feminismo no Brasil: mem�rias de quem fez acontecer”, hoje, �s 18h30, que ter� a participa��o de Branca Moreira Alves, Jacqueline Pitanguy, Benedita da Silva e Maria Bet�nia �vila. A media��o ser� realizada pela jornalista Aline Midlej, no canal do YouTube da editora Bazar do Tempo.“Ser feminista � lutar para que as mulheres possam ter protagonismo sobre sua vida”, afirma Dirlene Marques, professora de economia da UFMG, militante social e feminista. Ela considera a luta pelos direitos da mulher a mais antiga de todas as batalhas, marcando toda a hist�ria.
Mobiliza��o em frentes diversas

Em todos os indicadores sociais, mulheres negras aparecem em maior vulnerabilidade. A perda de emprego � mais recorrente entre elas, assim como a viol�ncia e o ass�dio. A doutoranda da UFMG Dalila Maria Musa Belmiro, de 28 anos, que pesquisa a atua��o de mulheres negras que se tornaram celebridades, destaca que a mulher negra � negada em termos de g�nero e ra�a.
Na mesma dire��o aponta a jornalista Eneida da Costa. “Eu sou feminista pela falta de op��o de n�o ser feminista. N�o tem outra op��o na vida de uma mulher negra, oper�ria, que n�o ser feminista”, afirma Eneida, que integra o movimento Quem Ama N�o Mata e o Grupo de mulheres da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Eneida aponta que a mulher negra � v�tima de hipersexualiza��o, de machismo e de racismo. Em ambientes de trabalho, por exemplo, s�o quase sempre minorias. A pr�pria jornalista conta que j� passou por situa��es em que era qualificada para um cargo, mas foi preterida em favor da contrata��o de um homem branco.
“Se voc� olhar o que os homens fazem, nesse sentido de se protegerem, a gente tem que aprender com isso. Se tem uma vaga, um espa�o, uma oportunidade, vou colocar uma mulher, porque se deixar por conta do sistema, as mulheres v�o para a borda”, afirma.
Milit�ncia

Ana F� � transfeminista militante pelo movimento Afronte! e a primeira pessoa trans a ocupar cargos de diretoria e coordenadoria na Uni�o Estadual dos Estudantes e no Diret�rio Central dos Estudantes da UFMG. Come�ou a atuar em a��es que promovem a dignidade feminina no territ�rio do Barreiro, em 2020 e luta, na universidade, pela aplica��o de cotas trans e pela inclus�o do crit�rio de viol�ncia de g�nero nas pol�ticas de assist�ncia estudantil."A luta contra a viol�ncia de g�nero � uma das muitas quest�es importantes que v�rios corpos diferentes sofrem"
Ana F�, transfeminista militante pelo movimento Afronte! eaprimeira pessoa trans a ocupar cargos de diretoria e coordenadoria na Uni�o Estadual dos Estudantes e no Diret�rio Central dos Estudantes da UFMG
O feminismo interseccional � parte importante de sua trajet�ria, pois inclui sua exist�ncia, apagada e silenciada por muito tempo. “Foi atrav�s dessa abordagem que o movimento feminista p�de se tornar um espa�o de unifica��o de diversos corpos e lutas”, afirma Ana F�. “A luta contra a viol�ncia de g�nero � uma das muitas quest�es importantes que v�rios corpos diferentes sofrem. Mulheres cisg�nero, mulheres trans e travestis s�o colocadas, de formas diferentes, em situa��es de viol�ncia dentro de casa e, dessas, as mais vulnerabilizadas s�o as negras”, completa.
Ela conta que participar� do 8 de mar�o unificado – ato que reunir� em Belo Horizonte 80 coletivos de mulheres com o lema “Mulheres do fim do mundo em luta por justi�a social: abaixo o capital e fora Bolsonaro” – e relembra algumas das lutas que ser�o reivindicadas na mobiliza��o, cujo slogan faz alus�o � cantora Elza Soares, nascida em 1937 e que morreu este ano. “Ser� um dia importante para lutar contra os retrocessos promovidos pelo governo atual. Estaremos l� para exigir o direito � vida das mulheres, para resistir contra a viol�ncia de g�nero e pela dignidade menstrual e direitos reprodutivos”, diz ela. “Vamos �s ruas contra esse governo, mas muito inspiradas pela luta que outras mulheres latino-americanas t�m realizado”, completa.
Origens e vers�es
O 8 de mar�o foi oficializado em 1975 pela Organiza��o das Na��es Unidas (ONU) como o Dia Internacional da Mulher. No entanto, a origem da data tem vers�es diferentes: uma delas relata que, em 8 de mar�o de 1857, 129 mulheres foram carbonizadas em uma f�brica t�xtil em Nova York, de onde teriam sido impedidas de sair pelo propriet�rio. Outra vers�o � que a data remonta a 8 de mar�o de 1917, em protestos liderados por mulheres na R�ssia. De todo modo, ano a ano, os movimentos feministas reafirmam que � uma data de apresentar reivindica��es, e n�o de comemora��es.