
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) decretou, nesta quinta-feira (3/8), a Lei Nº 11.560/2023, que cria o Protocolo Mulheres Seguras, a fim de prevenir a viol�ncia sexual contra mulheres em estabelecimentos p�blicos ou privados de lazer. A decis�o foi tomada cinco dias depois que uma jovem de 22 anos foi estuprada ap�s ir a um show no Mineir�o e ser deixada desacordada na porta de sua casa por um motorista de aplicativo.
Partindo de proposi��o parlamentar, o protocolo prop�e um conjunto de a��es a serem – n�o obrigatoriamente – adotadas em estabelecimentos como bares, restaurantes, casas de show e hot�is para detectar e coibir casos de importuna��o, ass�dio e agress�o sexual contra mulheres. Com foco na garantia do bem-estar da v�tima, tamb�m reafirma o direito feminino e imp�e deveres aos estabelecimentos e aderirem ao protocolo, como a identifica��o de situa��es de risco, o fornecimento dos devidos cuidados com as v�timas e o acionamento dos �rg�os de seguran�a.
Em caso de viola��o, as medidas adotadas devem priorizar o melhor atendimento � v�tima, com a finalidade de preservar sua dignidade, sa�de e integridade f�sica e psicol�gica. O protocolo ainda prev� a capacita��o de profissionais, a cria��o de um c�digo de alerta para uso das v�timas e a preserva��o de poss�veis provas para eventuais processos judiciais.
Implica��es do protocolo
Entre janeiro e junho de 2023, Belo Horizonte j� registrou 330 v�timas de estupro, em compara��o a 269 no mesmo per�odo em 2022 – um aumento de 22,7%. Em reuni�o da Comiss�o de Mulheres da PBH, realizada na �ltima ter�a-feira (1/8), a vereadora Cida Falabella (Psol) afirmou que, caso j� tivesse sido implantado, o Protocolo Mulheres Seguras “poderia ter protegido a mo�a [de 22 anos que foi estuprada no �ltimo domingo (30/7)]”.
A ades�o de bares; boates e clubes noturnos; casas de eventos e espet�culos; restaurantes; hot�is; outros espa�os destinados � realiza��o de shows, festivais ou outros eventos semelhantes, � facultativa. De acordo com a norma, caber� � equipe de cada estabelecimento identificar situa��es de risco � integridade de usu�rios e garantir os devidos cuidados �s v�timas de agress�o sexual.
Para Cristina Tadiello, advogada e co-fundadora do projeto Casa das Pretas, que d� acolhimento e atendimento jur�dico a mulheres pretas em situa��o de vulnerabilidade, o protocolo � bastante ben�fico.
“Na realidade, � importante que a mulher esteja segura em qualquer espa�o. Mas ainda � muito importante a quest�o de ambientes de lazer porque, durante muitos anos, as mulheres s�o muito assediadas e importunadas sexualmente, ent�o os avan�os e suas adapta��es s�o sempre bem-vindos”
A n�o obrigatoriedade da implementa��o do protocolo, no entanto, � motivo de preocupa��o, j� que o aux�lio e o acolhimento �s v�timas n�o deveria ser facultativo.
“A principal car�ncia do protocolo � essa [n�o obrigatoriedade]. A sociedade n�o tem esse entendimento da diversidade, do respeito e da legisla��o, afinal a importuna��o e o ass�dio s�o crimes tipificados, ent�o o apoio a essas mulheres, que s�o v�timas, n�o deveria ser facultativo. � por conta disso, tamb�m, que existe o medo social: ‘Ah, mas n�o vai acontecer nada [se eu denunciar]; vai ficar por isso mesmo; vai ser s� para registro’”, explica ela.
“Vivemos em uma sociedade diversa que n�o tem educa��o cidad� e que ainda tem muita hierarquiza��o de g�neros. Historicamente, n�s sempre fomos vulner�veis e objetificadas, ent�o podia-se fazer o que quisesse com as mulheres. Hoje, j� podemos denunciar, e isso salva vidas”, complementa a advogada.
Exemplos
H� cerca de seis anos, o restaurante mineiro A Granel j� realiza a��es de prote��o �s mulheres em suas unidades, principalmente aquelas localizadas em ambientes externos que d�o para a rua.
“Um cartaz foi colocado nos banheiros femininos. Nele, disponibilizamos canais de socorro �s clientes que, de alguma forma, se sintam amea�adas. H� um c�digo que elas podem falar no caixa ou no bar para que um gar�om v� at� a mesa dela e interrompa uma conversa inadequada, ou a acompanhe at� um carro de aplicativo”, explica Cecilia Ramirez, s�cia da rede de restaurantes.
Os funcion�rios da empresa recebem orienta��es breves sobre o que fazer nesses casos, e Cec�lia garante que “somos atentos e cuidadosos com qualquer sinal de desrespeito em rela��o � mulher”.
Quanto em rela��o ao decreto do Protocolo Mulheres Seguras, a s�cia do A Granel garante que haver� avalia��o da ger�ncia sobre a necessidade de mudan�a sobre o protocolo pr�prio que desenvolveram.
“Vivemos em um mundo em que, infelizmente, a viol�ncia contra a mulher tem crescido muito. As taxas de feminic�dio e a invas�o do espa�o feminino t�m se acentuado. Eu, como empres�ria, sempre tive muita preocupa��o no sentido de criar condi��es de prote��o e seguran�a para todos os clientes, mas principalmente para as mulheres em fun��o da vulnerabilidade”, completa.
Procurada a respeito da ado��o do Protocolo Mulheres Seguras, a Associa��o Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) afirmou que “dar� publicidade e todo apoio para que os associados e todos do segmento de alimenta��o fora do lar fa�am ades�o �s medidas, que certamente ser�o de extrema import�ncia para a seguran�a das mulheres”.
A conselheira da Abrasel-MG, Karla Rocha, tamb�m declarou que a associa��o participou ativamente na cria��o de outros protocolos referentes � seguran�a das mulheres.
“A Abrasel Minas Gerais tem participado ativamente das comiss�es que ir�o definir protocolos de atendimento � mulher, relacionados a importuna��o sexual em bares, restaurantes e casas noturnas, tanto o protocolo Quebre o Sil�ncio, da Prefeitura de Belo Horizonte, quanto o Fale Agora, Governo de Minas, mas eles ainda n�o foram finalizados. Esses protocolos s�o muito importantes pois n�o est�o vindo como forma de lei, como imposi��o e, sim, de forma educativa”, explicou.
Outras a��es
A PBH j� tinha uma Lei em vigor desde 2020 (Nº 11.261) que criou o Protocolo “Quebre o Sil�ncio”, e tornava obrigat�rio a bar, casa noturna e restaurante adotar medidas para auxiliar a mulher que se sentisse em situa��o de risco em suas depend�ncias, al�m de criar um comit� que atua na elabora��o de procedimentos complementares � lei.
Com a publica��o da Lei de Nº 11.560, que institui o Protocolo Mulheres Seguras, o munic�pio ganha mais um mecanismo de prote��o �s mulheres ao ampliar a abrang�ncia a espa�os de lazer e entretenimento, como shows, festivais ou outros eventos semelhantes.
Em nota, a PBH explica que, com o Protocolo “Quebre o Sil�ncio”, bares, restaurantes e casas noturnas deveriam treinar e capacitar periodicamente seus colaboradores para auxiliarem mulheres que se sentirem em situa��o de risco em suas depend�ncias. “Assim, os estabelecimentos permanecem obrigados a adotar medidas, mas a ades�o espec�fica ao protocolo � facultativa”, escreveu.
Protocolo na �ntegra
S�o deveres dos estabelecimentos:
- Manter funcion�rios e funcion�rias capacitados e treinados para agir em caso de den�ncia de viol�ncia ou ass�dio contra a mulher;
- Disponibilizar recursos para que a denunciante possa se dirigir a �rg�os de seguran�a p�blica, servi�os de assist�ncia social, atendimento m�dico ou mesmo para o regresso seguro ao lar;
- Preservar as filmagens que tenham flagrado a viol�ncia, quando houver, para disponibilizar aos �rg�os de seguran�a p�blica competentes;
- Criar c�digo pr�prio para que a mulher e outras pessoas possam alertar as funcion�rias e os funcion�rios sobre a situa��o de viol�ncia para que possam tomar as provid�ncias necess�rias sem o conhecimento do agressor;
- Manter, em locais vis�veis, nas �reas principais e nos sanit�rios, informa��es sobre o protocolo de que trata esta lei, com telefones e outras informa��es de acesso imediato pela v�tima;
- Manter um ambiente onde a denunciante possa ficar protegida e afastada, inclusive visualmente, do agressor;
- Conduzir a denunciante a local tranquilo e procurar amigos presentes no local para que possam acompanh�-la;
- Preservar qualquer prova que possa contribuir para a identifica��o e responsabiliza��o do agressor.
Caso a den�ncia seja feita, a equipe do estabelecimento dever�:
- Ouvir, confortar e respeitar a decis�o da denunciante
- Afastar a v�tima do agressor ou agressores;
- Procurar outros acompanhantes da denunciante e encaminh�-los para o local protegido onde a denunciante estiver;
- Garantir e viabilizar os direitos da denunciante previstos no art. 3º desta lei, de acordo com a vontade da denunciante;
- Preservar as eventuais e potenciais provas ou evid�ncias da viol�ncia cometida;
- Adotar outras medidas que julgar cab�veis para preservar a dignidade da denunciante.
- J� os respons�veis pelos espa�os de lazer que aderirem ao Protocolo Mulheres Seguras dever�o averiguar se a propriedade possui �reas escuras e desertas que facilitem a vulnerabilidade de seus usu�rios e, em caso positivo, adotar estrat�gias para que tais �reas fiquem mais seguras como, por exemplo, a instala��o de c�meras de seguran�a ou a presen�a de funcion�rios.
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