
Mais de 4 mil servidores p�blicos, entre estaduais e municipais, foram apanhados recebendo o Benef�cio de Presta��o Continuada (BPC), aux�lio no valor de um sal�rio m�nimo (R$ 998) destinado a pessoas com defici�ncia ou idosos com 65 anos ou mais, em situa��o de mis�ria. Uma opera��o pente-fino identificou as fraudes em seis estados e no Distrito Federal. Os servidores recebem sal�rios entre R$ 15 mil e R$ 18 mil.
“Nos assustamos com o n�mero de servidores que estavam recebendo o BPC, pois isso mostra a fragilidade do processo de negocia��o”, disse o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Renato Vieira, em entrevista ao CB.Poder, uma parceria entre a TV Bras�lia e o Correio Braziliense. Por outro lado, a identifica��o da fraude s� foi poss�vel porque, por um decreto publicado h� dois meses, 51 diferentes bases de dados p�blicos passaram a ser compartilhadas com o INSS.
“O cruzamento de informa��es � o caminho n�o s� para cortar um benef�cio indevido, mas para evitar que ele seja concedido”, afirmou.
Vieira disse que a digitaliza��o, que est� sendo aprofundada no INSS e j� alcan�a 90 dos 96 servi�os fornecidos, � fundamental para o combate �s fraudes na Previd�ncia. Segundo ele, o Tribunal de Contas da Uni�o estima que 11% da folha de pagamento do INSS — cerca de R$ 5 bilh�es por m�s — t�m algum tipo de irregularidade. Segundo o presidente, a transforma��o digital tem permitido que a autarquia trabalhe com quadro de pessoal mais reduzido. Por conta disso, contrata��es n�o est�o no radar do �rg�o. “N�o h� perspectiva de concursos a curto prazo”, informou.
O INSS se preparou para a reforma da Previd�ncia? Como est� o movimento nas ag�ncias? H� mais pessoas querendo se aposentar, tentando pedir contagem de tempo?
O INSS se preparou desde o in�cio da tramita��o do projeto no Congresso Nacional. Mas o movimento nas ag�ncias caiu ap�s a aprova��o da reforma. Houve uma grande procura dos segurados antes da promulga��o. Havia muita inseguran�a na popula��o. Por mais que houvesse informa��o sobre o fato de a reforma n�o atingir direitos adquiridos, as pessoas correram para as ag�ncias.
Ent�o as pessoas anteciparam os pedidos?
Sim. Mesmo aquelas que n�o tinham ainda direito � aposentadoria, acharam por bem protocolar o pedido como uma forma de garantir espa�o no mundo previdenci�rio. Isso n�o era necess�rio, mas o fato � que houve picos de demanda em julho, quando a reforma foi aprovada na C�mara dos Deputados, e em novembro, no Senado Federal. �s v�speras da promulga��o no Senado, houve o maior n�mero de pedidos no ano inteiro no INSS. A m�dia de requerimentos administrativos � de 20 mil a 25 mil por dia. Os pedidos de aposentadoria por idade, por tempo de contribui��o, de sal�rio-maternidade, s�o cerca de mil. Naqueles per�odos, foram 40 mil por dia. Mas a demanda voltou � normalidade ap�s a promulga��o.
Qual � o prazo m�dio, hoje, para a concess�o do benef�cio de aposentadoria?
Cada tipo de benef�cio tem um tempo m�dio espec�fico, porque alguns s�o mais complexos e outros, mais simples. Nas aposentadorias, o tempo m�dio est� na casa dos 120 dias. No meio do ano, estava em 190 dias. Ent�o, houve uma queda no tempo de espera e no tempo m�dio de concess�o de todos os benef�cios. Nos aux�lios, caiu para aproximadamente 60 dias, assim como nas contribui��es. No sal�rio-maternidade, o tempo m�dio est� em 10 dias. Mas, se considerarmos o conjunto de benef�cios, o tempo m�dio de espera est� em 59 dias. N�o estamos satisfeitos. Nosso objetivo � reduzir para aproximadamente um m�s, quarenta dias.
O INSS vem digitalizando muitos servi�os, e mais de 90 j� podem ser feitos pela internet. O que isso mudou em termos de benef�cio para o cidad�o?
O ano de 2019, no INSS, foi de transforma��o digital, mas tamb�m cultural e institucional. A ag�ncia f�sica era praticamente o �nico canal com o cidad�o, que tinha que sair da sua cidade, muitas vezes, por n�o haver ag�ncia, enfrentar fila. Hoje, a ag�ncia se tornou o canal menos buscado pelo cidad�o. O Meu INSS j� � o maior canal, o outro � o 135 por telefone. Mas a presen�a da pessoa nas ag�ncias ainda � necess�ria por uma raz�o muito simples: �s vezes, o sistema n�o identifica uma determinada contribui��o, um determinado documento, ent�o, o cidad�o ainda precisa complementar as informa��es que o INSS j� possui para fazer an�lise.
H� um questionamento do pr�prio Minist�rio P�blico sobre a necessidade de o INSS fazer concursos. Voc�s precisam de mais funcion�rios?
� fato que houve uma redu��o muito significativa no quadro de servidores. N�s t�nhamos, em 2015, 11 mil servidores a mais do que temos hoje. Em 2018, eram 6 mil a mais. Mas os dados mostram que houve aumento de produtividade. Come�amos o ano com 655 mil decis�es administrativas para concess�o por deferimento e chegamos a outubro com 977 mil decis�es em um �nico m�s. Ser� que � de mais servidores que precisamos, ou seria de melhoria de processos, de simplifica��o e desburocratiza��o? Antes de pensarmos naquela solu��o simples que sempre foi adotada — aposentou, rep�e com concurso —, precisamos fazer uma an�lise cr�tica e reflexiva dos nossos procedimentos para saber onde podemos melhorar para n�o dependermos perpetuamente de reposi��o de quadros. H� casos de concess�es autom�ticas de benef�cios, aquelas que nenhum servidor precisa analisar. O cidad�o faz um requerimento no Meu INSS e o pr�prio sistema faz o c�lculo. Foram 737 mil aposentadorias concedidas em 2019, de forma autom�tica, no mesmo dia. � uma aposentadoria mais r�pida e mais segura, porque n�o h� espa�o para erro de avalia��o. Como n�o h� comportamento humano envolvido, n�o h� risco de adultera��o.
Isso ajudou a diminuir as fraudes no INSS? A digitaliza��o reduz o risco de fraude?
N�o tenho d�vida. O maior aliado do combate � fraude � o compartilhamento de dados e a integra��o dos sistemas. O governo publicou h� dois meses um decreto que obriga o compartilhamento com o INSS de 51 bases de dados p�blicos, desde cadastro de motoristas at� cadastro de cortadores de cana-de-a��car, para voc�s terem uma dimens�o do que estamos falando. Com bases integradas, o risco de fraude � menor. Na primeira etapa do pente-fino, nos assustamos com o n�mero de servidores p�blicos estaduais e municipais que estavam recebendo BPC, o Benef�cio de Presta��o Continuada, destinado a pessoas em situa��o de miserabilidade. N�s estamos falando de servidores com remunera��o de R$ 15 mil, R$ 18 mil, ganhando um sal�rio m�nimo que seria destinado a pessoas em situa��o miser�vel.
Quantos casos?
Identificamos, nessa primeira etapa, 4.700 servidores nessa situa��o. Os benef�cios j� foram cortados.
E v�o ser devolvidos para o er�rio?
Esse � o processo mais complexo, mas, quando h� identifica��o do fraudador, � mais f�cil a cobran�a, principalmente daqueles que t�m recursos para pagar, que � o caso desses servidores. Essa primeira etapa do pente-fino analisou a base de dados de servidores de Rio de Janeiro, Maranh�o, Amazonas, Minas Gerais, Alagoas, Goi�s, Pernambuco e Distrito Federal. Agora, estamos expandindo para todos os estados, e � poss�vel que outros casos apare�am. Isso nos assusta, mas tamb�m nos direciona ao caminho da solu��o. Nos assusta pela fragilidade do processo de negocia��o, mas o cruzamento de base de dados � o caminho n�o s� para cortar um benef�cio indevido, mas evitar que ele seja concedido.
A gente sabe que ainda tem muita reclama��o. O que pode fazer um cidad�o que est� com problema no INSS para resolv�-lo?
O cidad�o pode, em um primeiro momento, telefonar para o 135. N�o precisa ir � ag�ncia, procurar advogados, atravessadores, despachantes. A primeira coisa � ligar e buscar informa��es. Pode dar os seus dados, o n�mero do protocolo, o atendente localizar� o requerimento e vai orient�-lo. Na d�vida, ligue para o 135. Existem atravessadores que se aproveitam da boa-f� e, muitas vezes, da hipossufici�ncia dos benefici�rios da Previd�ncia para ganhar dinheiro em cima disso.
Como fica a inspe��o dos assistentes sociais para deficientes e para quem requerer BPC? Por que o INSS colocou fim ao servi�o social?
N�o houve extin��o do servi�o social. Isso foi um grande mal-entendido. A Medida Provis�ria (MP) nº 905, em algum dispositivo, revogou um inciso que previa uma atribui��o espec�fica do servi�o social. Alguns interpretaram como o fim do servi�o social no INSS. N�o foi o que aconteceu. A regulamenta��o do servi�o social continua inteiramente r�gida na Lei nº 8213, que regulamenta os benef�cios previdenci�rios. Toda a disciplina do servi�o social continua �ntegra, n�o foi alterada pela MP. A reda��o pode ter gerado esse tipo de interpreta��o, ent�o, vamos aproveitar o projeto de lei para tornar isso mais claro.
E isso n�o criou uma fila virtual, j� que agora � preciso resolver tudo pela internet?
Algumas pessoas criticam a transforma��o digital como sendo uma forma de esconder os problemas e tornar invis�veis as filas. Mas, em meados da d�cada passada, um dos maiores problemas do INSS eram as filas nas cal�adas, sobretudo nas madrugadas, que viraram um com�rcio onde as pessoas vendiam suas senhas. O fato � que n�s avan�amos muito e n�o h� mais problemas cr�nicos de fila, porque parte significativa do p�blico migrou para o atendimento remoto. Em outubro, 90% dos requerimentos j� foram por canais remotos, o Meu INSS e o telefone 135. Ent�o, se o cidad�o pode fazer o requerimento pelo app ou por telefone em uma liga��o gratuita, para que se deslocar? O Meu INSS mudou a cultura de relacionamento do cidad�o, permitiu que ele tenha mais independ�ncia. S�o 650 mil visitas di�rias ao Meu INSS. Isso permite ao cidad�o escolher o hor�rio em que deseja fazer o requerimento. Um grande n�mero � realizado de madrugada, ou aos s�bados e domingos.
Isso vale para a prova de vida a dist�ncia tamb�m?
A entrega de documentos que precisam ser autenticados, a prova de vida e a per�cia m�dica s�o servi�os que, naturalmente, exigem a presen�a f�sica da pessoa. N�s estamos fazendo um enorme esfor�o para que o pr�ximo servi�o transformado seja a prova de vida remota. Existe uma riqu�ssima base biom�trica no Tribunal Superior Eleitoral e, se conseguirmos a integra��o das bases, um aplicativo simples pode coletar a biometria do cidad�o, que � a forma mais segura de realiza��o de prova de vida sem fraude. � uma coleta de digital que vai para o TSE, volta e diz ao INSS se a pessoa est� viva. N�s j� fizemos um piloto em agosto e setembro para testar essa ferramenta em 14 cidades, e o resultado foi aprovado. Agora, estamos em fase final de tratativas com os �rg�os envolvidos.
� injusto uma senhorinha de 90 ou 95 anos, �s vezes deficiente, tendo que ir �s ag�ncias...
N�o � injusto, � absurdo. N�o existe eufemismo para uma situa��o de uma pessoa com dificuldade de locomo��o ou de problemas de sa�de ter que se deslocar a uma institui��o financeira que paga o benef�cio, ou ao INSS. Nosso principal objetivo � atender a esse p�blico com a prova de vida remota.
E quais s�o as fraudes mais comuns? Desde a MP das fraudes, o que avan�ou?
Em 2019, o combate �s fraudes entrou na pauta priorit�ria do governo. A segunda medida provis�ria editada pelo novo governo, ainda em janeiro, foi a MP nº 871, conhecida como MP Antifraude. O TCU (Tribunal de Contas da Uni�o) estima que 11% da folha de pagamento do INSS tem algum tipo de irregularidade. Isso nos assusta, s�o cerca de R$ 5 bilh�es por m�s. H� fraudes, h� irregularidades e h�, tamb�m, inconsist�ncias cadastrais — o benef�cio � devido, mas o sistema detecta alguma inconsist�ncia. Por exemplo, existem cerca de 600 mil pens�es por morte pagas pelo INSS, em rela��o �s quais n�o h� registro no sistema de quem � o instituidor da pens�o, ou, em outras palavras, quem foi que morreu. S�o casos antigos, em que, em algum momento, n�o se cadastraram todos os dados do benefici�rio. Neste m�s, come�amos a expedir notifica��es para 1,8 milh�o de segurados em rela��o aos quais o sistema identificou alguma inconsist�ncia. Criamos um sistema de verifica��o de conformidade da folha de pagamento do INSS. Ele faz uma varredura todos os meses. Antes de pagar o benef�cio, ele busca inconsist�ncias.
Quanto representam, em reais, esses benef�cios?
Os casos s�o os mais diversos. Desses, alguns ser�o identificados como irregulares e ser�o cancelados. Outros, n�o, ser�o corrigidos pelo sistema. At� o momento, j� suspendemos ou cancelamos 261 mil benef�cios s� em 2019. Isso representa R$ 4,3 milh�es.
E os concursos?
Precisamos ser honestos, francos e transparentes. N�o h� perspectiva de concursos a curto prazo.
* Estagi�ria sob supervis�o de Odail Figueiredo