Dona Tereza Gomes

Tereza Gomes, 60 anos, vende panos de prato nas cal�adas e bares da regi�o Centro-Sul de BH. Ela lamenta n�o conseguir vaga no mercado formal de trabalho

Fotos: T�lio Santos/EM/D.A Press
 
 
As noites de sexta-feira e s�bado h� muito tempo deixaram de ser dias de lazer para a belo-horizontina Tereza Gomes, de 60 anos. O grande fluxo de pessoas nas ruas da capital � o cen�rio ideal para que ela possa vender seus panos de pratos nas cal�adas de bares e restaurantes, sobretudo na regi�o Centro-Sul.

A rotina j� dura pelo menos quatro d�cadas e foi a maneira encontrada para colocar comida dentro de casa, num Brasil cujo desemprego atinge 10,1 milh�es de pessoas e a informalidade torna a solu��o mais imediata para se livrar da fome.

Dados da Pesquisa Pnad Cont�nua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE), mostram que o Brasil teve taxa de desocupa��o de 9,3% no segundo trimestre (abril, maio e junho) de 2022, volume 1,8% menor que o registrado no trimestre anterior. Se os empregos formais cresceram, os postos sem registro tamb�m registraram expans�o e atingiram o maior n�mero desde 2015.

O pa�s terminou o mesmo per�odo com estimativa de 39,2 milh�es de pessoas atuando em empregos informais. No comparativo com igual per�odo de 2021, houve crescimento de 10,1% no n�mero de trabalhos sem registro profissional.

Em Minas Gerais, o percentual tamb�m cresceu em rela��o ao ano passado, quando o pa�s vivia o auge da pandemia do coronav�rus: atualmente, a estimativa � de 4 milh�es de trabalhadores informais. A taxa daqueles que sobrevivem sem carteira assinada � de 38,7%, a segunda maior da Regi�o Sudeste, atr�s apenas do Esp�rito Santo (40,1%).

O IBGE considera como trabalhador informal aquele empregado no setor privado sem carteira assinada, o dom�stico sem carteira assinada e o que atua por conta pr�pria ou como empregador sem CNPJ, al�m daquele que ajuda parentes em determinada atividade profissional.
 

Tereza Gomes teve experi�ncia em empregos de menor remunera��o, mas diz n�o conseguir mais se fixar no mercado de trabalho. “Estudei at� a sexta s�rie e n�o tenho mais idade para tentar sorte em outra coisa. � preciso trabalhar vendendo nas ruas para sobreviver”. Com as vendas, ela consegue tirar acima de um sal�rio m�nimo l�quido na maioria das ocasi�es. “� muito imprevis�vel apontar um m�s em que voc� vende mais ou menos. Tem vezes em que mal d� para pagar as mercadorias”, diz.

Diante da perspectiva de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro para 1,7% em 2022, de acordo com dados do Banco Central, aumenta tamb�m a expectativa de oferta de vagas no mercado formal. No entanto, o panorama da informalidade n�o deve ter mudan�a neste ano.
 

“Parte significativa dos desempregados s�o trabalhadores informais que n�o tiveram acesso ao seguro-desemprego e muitos sofrem com o desemprego de longa dura��o, ou seja, est�o tentando se recolocar no mercado de trabalho h� mais de dois anos e n�o t�m mais a prote��o do seguro-desemprego”, afirma Adriana Marcolino, analista do Departamento Intersindical de Estat�stica e Estudos Socioecon�micos (Dieese).

Eva Gomes

Desempregada h� quase quatro anos, Eva Gomes de Amorim, 54 anos, desistiu de buscar emprego fixo


Perda de direitos

Para o professor de Economia da Unihorizontes, Paulo Vieira, a informalidade se torna um drama � medida em que o trabalhador perde cada vez mais seus direitos: “O desemprego e a informalidade n�o s�o quest�es econ�micas, apenas, e sim sociais. S�o problemas muito s�rios nos dias atuais. Por mais que o Brasil tenha gerado empregos, o mercado formal n�o d� conta de absorver a m�o de obra existente. Os empregos gerados t�m sido aqueles de menor qualifica��o e que pagam menos. Os demais que precisam sobreviver t�m de fazer algo para ganhar dinheiro fora do padr�o”.

Apesar de o desemprego ter perdido f�lego no Brasil, a expans�o do mercado de trabalho ainda n�o foi suficiente para reduzir a propor��o de trabalhadores que esperam, h� muito tempo, por uma recoloca��o no mercado.

Segundo o IBGE, o n�mero de desempregados h� mais de dois anos no Brasil foi de 2,985 milh�es, cerca de 29,6% do total no pa�s. No primeiro trimestre, esse n�mero reunia cerca de 500 mil trabalhadores a mais desempregados h� mais tempo. O levantamento do IBGE tamb�m apontou que o pa�s encerrou o trimestre passado com um contingente de 4,3 milh�es de desalentados, ou seja, pessoas que desistiram de buscar vaga no mercado de trabalho.

Humilha��o nas ruas da capital

Diante das dificuldades, a informalidade se tornou o caminho natural para quem j� n�o � mais absorvido pelo mercado de trabalho. Desempregada h� quase quatro anos, Eva Gomes de Amorim, de 54 anos, praticamente desistiu de buscar emprego. Ela sobrevive da venda de flores durante as noites pelos bairros mais badalados da capital.
 

Moradora de Venda Nova, ela sempre tem de descontar o valor de transporte e o que resta � reservado para as compras de casa. Segundo a vendedora, a rotina � dura para tirar um sal�rio inst�vel. “Sempre tentei emprego est�vel, mas ningu�m contrata. Vender na rua foi a op��o que me restou para n�o passar fome. � uma vida muito dif�cil. Passamos humilha��o na rua. As pessoas nos xingam, nos recebem mal, maltratam. Infelizmente, temos que passar por isso”.

Para Paulo Vieira, a expans�o do mercado informal n�o � garantia de crescimento econ�mico no pa�s. “Isso n�o � bom para ningu�m. O governo n�o arrecada impostos e as garantias trabalhistas s�o m�nimas para o trabalhador”.

Luiz Carlos Peixoto, de 58 anos, ganha a vida h� quase duas d�cadas vendendo incenso, produtos indianos e livros nas ruas. Para economizar o dinheiro da condu��o de volta at� Contagem, onde mora, usa a bicicleta. � comum v�-lo durante o trabalho com um capacete na m�o. “Sempre trabalhei por conta pr�pria, pois voc� � livre e pode viajar”, diz. Segundo o ambulante, o local preferido das vendas � justamente a regi�o Centro-Sul, onde o poder aquisitivo dos consumidores � mais elevado: “Gosto mais da Savassi, porque as pessoas normalmente compram”.

O RETRATO DA INFORMALIDADE

N�meros de trabalhadores acima de 14 anos sem emprego fixo
BRASIL
Trimestre encerrado em junho/2022
Trabalhador por conta pr�pria sem CNPJ – 19,2 milh�es
Empregados no setor privado sem carteira assinada – 13 milh�es
Empregados dom�sticos sem carteira assinada – 4,3 milh�es
Trabalhador familiar auxiliar – 1,7 milh�o
Empregador sem registro CNPJ – 800 mil
Total:
39,1 milh�es
�ndice de 39,7% da popula��o total ocupada

Trimestre encerrado em junho/2021
Trabalhador por conta pr�pria sem CNPJ – 18,8 milh�es
Empregados no setor privado sem carteira assinada – 10,6 milh�es
Empregados dom�sticos sem carteira assinada – 3,6 milh�es
Trabalhador familiar auxiliar – 1,9 milh�o
Empregador sem registro CNPJ – 669 mil
Total:
35,5 milh�es
�ndice de 39,7% da popula��o total ocupada