
L�deres de algumas das principais organiza��es sustentam o discurso de que eventuais cobran�as podem coexistir com a defesa da gest�o, mas a primeira passagem do petista pelo Planalto (2003-2010) mostrou o risco de fissuras. Na vit�ria de agora, Lula sempre exaltou os grupos e prometeu espa�o a eles.
MST (dos sem-terra), MTST (dos sem-teto), CUT (Central �nica dos Trabalhadores) e UNE (Uni�o Nacional dos Estudantes) s�o alguns dos movimentos que reivindicam voz na transi��o de governo e esperam o atendimento de suas demandas, ao mesmo tempo em que falam em manter mobiliza��es.
Tamb�m � consenso que a capacidade de articula��o do bolsonarismo exige um estado permanente de alerta. A expectativa � que o campo rival agite manifesta��es para desestabilizar o governo e p�r em risco a democracia, como vem fazendo com os atos antidemocr�ticos contestando o resultado do pleito.
"Nossa mobiliza��o n�o � feita s� como oposi��o", diz Simone Nascimento, do Movimento Negro Unificado, um dos apoiadores de Lula. Segundo ela, que foi eleita deputada estadual pelo PSOL em um mandato coletivo, a meta � estabelecer "discuss�o permanente" com o Planalto.
"A mobiliza��o no nosso campo tamb�m � vital quando se considera poss�vel arrancar vit�rias. N�o podemos ser adesistas, mas precisamos nos organizar coletivamente para enfrentarmos as dificuldades do pr�ximo per�odo."
O risco de coopta��o pela m�quina p�blica � minimizado por l�deres desse espectro, sob o argumento de que n�o interessaria ao futuro governo esvaziar o papel das bases. O racioc�nio � o de que o Planalto precisar� desse suporte para arregimentar apoio na popula��o e no Congresso, em um cen�rio adverso.
Para Josu� Rocha, da coordena��o do MTST, a "raz�o de ser dos movimentos � a participa��o" na vida p�blica, o significa que eles "t�m que ter a sua atua��o aut�noma na sociedade, algo saud�vel para a democracia e que estava amea�ado pelo governo Bolsonaro e sua eventual reelei��o".
Ligado a Guilherme Boulos (PSOL-SP), deputado federal eleito e aliado de Lula, o MTST pressiona por pol�ticas na �rea de habita��o, que o petista sinalizou ser uma de suas prioridades, com a volta do Minha Casa, Minha Vida.
No caso do MST, tamb�m coincidem os pedidos e o discurso do novo mandat�rio —com agricultura familiar, pol�tica ambiental e reforma agr�ria—, mas o coordenador Jo�o Paulo Rodrigues diz que movimento e governo ser�o esferas apartadas, ainda que algum membro ganhe cargo, como se especula.
"N�s vamos apoiar o governo, ajudar a governar se for poss�vel, mas temos uma base que tem que ser contemplada, com cr�dito, terra e pol�tica p�blica. Vamos ter que ter uma combina��o permanente de 'pau e prosa'", resume.
De acordo com Rodrigues, organiza��es como o MST v�o exercer press�o, "para que o governo n�o seja pressionado s� pelo tal mercado", mas sem esquecer que do outro lado do balc�o estar� o que ele chama de "um governo nosso, do qual somos base, e n�o um governo inimigo".
Se j� � delicado conseguir essa sintonia em circunst�ncias favor�veis, menos f�cil ainda ser� fazer isso sob uma s�rie de restri��es salientadas pelo dirigente, que v�o do arrocho or�ament�rio at� as composi��es com a frente ampla montada na campanha e a influ�ncia do bolsonarismo.
"Nem o Lula nem o MST querem acordos m�tuos que inviabilizem a luta e a press�o pol�tica. Podemos estar dentro do governo, ajudando o presidente Lula no que ele precisar, e continuar nossas atividades, sem cair na l�gica da oposi��o. Vamos ter que defender o governo que n�s elegemos."
O tom � mais comedido do que o apresentado pelos sem-terra no primeiro mandato de Lula, quando o movimento optou por fazer cobran�as e queixas p�blicas logo nos primeiros meses. Agora, a ordem geral � instituir uma esp�cie de prazo de car�ncia e evitar na largada desgastes de rela��o.
"Para n�s, que estamos com Lula durante todo o �ltimo ciclo, desde a pris�o, � justific�vel dar esse respiro num primeiro momento, j� que o governo se compromete com as nossas pautas, mas tem obst�culos por causa da economia", diz Raimundo Bonfim, da CMP (Central de Movimentos Populares).
O ativista afirma que as entidades sociais n�o ficar�o inertes porque entendem que "ser� um governo em disputa", com cabo de guerra "entre povo e burguesia". Ele avisa que algum tipo de rebeli�o s� ocorrer� "se o governo priorizar outras demandas que n�o sejam a do movimento popular".
"O Lula fala que � importante o engajamento da sociedade. Nossa mobiliza��o n�o ser� contra o governo, mas para que ele atenda �s reivindica��es", afirma.
Segundo Bonfim, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, informou que o gabinete de transi��o chamar� nos pr�ximos dias os movimentos sociais. Al�m das a��es governamentais a partir de 2023, ser� discutida a participa��o na posse. Caravanas para Bras�lia est�o em prepara��o.
Na opini�o de Jo�o Carlos Gon�alves, o Juruna, secret�rio-geral da For�a Sindical, a experi�ncia mostra que "negocia��es avan�am nos governos que dialogam" —e isso � o que se espera do terceiro mandato de Lula. "Mesmo com a abertura, cabe a n�s manter a autonomia do questionamento", pontua.
Na mesma linha, a presidente da UNE, Bruna Brelaz, prega que os movimentos n�o se deixem arrefecer diante da nova realidade nem recuem em suas bandeiras ou relevem eventuais diverg�ncias. Ir �s ruas para manifesta��es n�o � uma ideia desconsiderada, segundo ela.
"O que fortalece a democracia � possuir o movimento social constantemente atento e energizado. Precisamos estar organizados porque o outro lado tamb�m est�", diz.
Para o soci�logo Ruy Braga, professor da USP que pesquisa o tema, as expectativas est�o elevadas porque o novo mandato do PT � tido como uma janela de oportunidade ap�s "anos de desmanche de pol�ticas p�blicas diretamente associadas �s pautas reivindicativas dos movimentos".
Ele n�o descarta, por�m, que as limita��es da nova gest�o Lula acabem por esgotar a paci�ncia de alguns grupos, levando at� a mobiliza��es de car�ter conflituoso, como greves. "Tudo depender� de at� onde o governo estar� disposto a ir a fim de cumprir suas promessas de campanha."