
“Um dia de cada vez e muito aprendizado a cada jornada” – Camila Nascimento Monteiro, de 36 anos, mineira, natural de Piedade do Rio Grande, no Campo das Vertentes. Ela cursou a Faculdade de Farm�cia na Universidade Federal de Juiz de Fora e ingressou no mestrado e doutorado na �rea de epidemiologia na Universidade de S�o Paulo (USP). Atualmente, faz p�s-doutorado em epidemiologia tamb�m na USP, onde criou um forte v�nculo com o Hospital das Cl�nicas, al�m de trabalhar no Hospital Israelita Albert Einstein (Hiae). Duas institui��es que tratam grande n�mero de casos de pacientes que contra�ram o coronav�rus, em momento de pandemia que desafia profissionais da �rea.
Destacando que suas opini�es n�o representam as dos hospitais em que trabalha, Camila contou ao Estado de Minas como tem sido seus dias no enfrentamento da doen�a, enquanto ainda tenta entender seus mecanismos. E j� tem ao menos uma conclus�o: "Muitos dizem ser a doen�a democr�tica. Sim, a doen�a afeta todas as classes de renda, mas quanto � oferta de leitos, n�o � democr�tica".
S�o Paulo � um dos estados que mais sofrem com a expans�o do novo coronav�rus. No total, desde o primeiro caso, registrado em fevereiro, o novo coronav�rus causou a morte de 991 pessoas no estado at� ontem, segundo n�mero de �bitos confirmados pela Secretaria de Estado da Sa�de de S�o Paulo. O total de casos confirmados chegou a 13.894 ontem.
Camila se mudou para S�o Paulo em 2009 e mora no Bairro Aclima��o, na Regi�o Central da cidade. O v�nculo com o Hospital das Cl�nicas veio com o p�s-doutorado, mas ela fica a maior parte do tempo no Hospital Israelita Albert Einstein. A farmac�utica conta que as prepara��es nesses dois hospitais foram "intensas" para o combate � pandemia do novo coronav�rus. "Nossa, nem eu sei como consigo conciliar... N�o sei te responder", disse sobre a rotina profissional, que � tamb�m, segundo ela, um per�odo de aprendizado, com muito, muito trabalho.
Medo
Em m�dia, s�o 12 horas por dia trabalhadas, sem nenhum momento de folga ou lazer no �ltimo m�s. "A press�o � grande, muito grande. Com isso, tamb�m o cansa�o", contou. No Hiae, onde fica a maior parte do tempo, no in�cio havia uma reuni�o semanal. “Passamos a ter reuni�es di�rias e, muitas vezes, duas vezes ao dia.” Camila conta que s�o reuni�es para discutir os indicadores, o manejo dos pacientes, os protocolos, os insumos, a organiza��o e reorganiza��o do servi�o, divis�o de escalas, entre outros assuntos.
A farmac�utica trabalha na �rea administrativa. N�o tem contato diretamente com os pacientes com COVID-19, mas convive com profissionais que atuam na linha de frente e podem ser assintom�ticos. "Tenho medo de ser infectada, como a maioria da popula��o. Por morar e trabalhar em locais com muitos casos de COVID-19, fico ainda com medo de estar infectada, mas assintom�tica, e minha preocupa��o � principalmente sobre o risco de transmitir a doen�a para meus pais, minha av� e familiares, que moram na minha cidade natal. N�o vou pra l� desde janeiro, fico com muita saudade deles, entretanto, sei que � necess�rio aguardar para visit�-los", relatou.
Estudos
Camila avalia que o clima � de medo, inseguran�a, "desconhecimento" do que est� por vir. "Vou dizer dos profissionais que est�o na linha de frente e s�o colegas meus: todos t�m muito medo, ficam inseguros. A escassez de testes para a COVID-19 aumenta ainda mais a inseguran�a. Mesmo usando todos os EPIs (equipamentos de prote��o individual), muitos foram infectados. Um dos colegas do HC diz que quanto maior a exposi��o ao v�rus, como no caso de profissionais de sa�de na linha de frente, maior a chance de ser infectado", relatou ela.
"Estamos estudando muito e tentando entender melhor essa epidemia. Pegamos modelos de pa�ses que j� tiveram pico da doen�a, como It�lia, Espanha, EUA. H� semelhan�as e diferen�as. Aqui h� pacientes graves de todas as idades, apesar de a propor��o maior ser em idosos", completou ela.
Ela concilia a rotina intensa com a leitura de artigos cient�ficos sobre a COVID-19. Camila acompanha artigos sobre preven��o e estudos sobre os medicamentos para o tratamento, o que a deixa ainda mais apreensiva pelo fato de termos ainda muitas perguntas e nem todas as respostas sobre esse v�rus. "Preocupa-me tamb�m a quest�o da insufici�ncia de leitos. A ocupa��o dos leitos nos hospitais p�blicos est� aumentando exponencialmente, me preocupa chegar no limite", afirma. At� porque, segundo ela, h� uma grande desigualdade de leitos no Brasil.
Especificamente no caso de S�o Paulo, tamb�m h� uma grande desigualdade entre leitos p�blicos e privados. "Os primeiros casos de COVID-19 foram de pessoas com acesso � sa�de suplementar – pessoas que voltaram do exterior. Hoje est� nessa popula��o e tamb�m na que � dependente do Sistema �nico de Sa�de (SUS)", acrescentou.
Para Camila, a conclus�o at� agora � que a doen�a � "democr�tica" e afeta todas as classes de renda. "Isso � diferente de muitas outras doen�as infecciosas, que em geral s�o mais prevalentes na popula��o com pior condi��o socioecon�mica. Mas quanto � oferta de leitos, a COVID-19 n�o � democr�tica", pontuou.
Em uma megal�pole como S�o Paulo, com enormes desigualdades econ�micas, sociais e culturais, essas desigualdades ficam evidentes com a epidemia. "Sabemos que os arranjos urbanos interferem muito na preven��o da doen�a. Por mais necess�rio que seja o isolamento social, � muito dif�cil que seja cumprido totalmente em comunidades em que vivem pessoas com baixo poder aquisitivo, em que h� elevada densidade demogr�fica por c�modo de resid�ncia. Grande parte dessa popula��o passa o dia trabalhando fora de casa, o que aumenta o risco de infec��o; s�o essas pessoas que dependem do SUS caso necessitem de interna��o, e sabemos que n�o h� leitos suficientes. A pandemia ressalta ainda mais a desigualdade social em S�o Paulo e no Brasil em geral", acredita.
A quest�o da insufici�ncia de vagas nas unidades de sa�de preocupa Camila em rela��o a sua cidade natal, que n�o tem leitos de UTI. No munic�pio vizinho, S�o Jo�o del-Rei, o n�mero de leitos n�o � suficiente. Ela participa de uma grande mobiliza��o em Piedade – que tem 100% de cobertura do programa Estrat�gia Sa�de da Fam�lia (ESF) – para a preven��o da doen�a, como a confec��o de m�scaras e conversas dos profissionais de sa�de com a popula��o no sentido de ajudar a compreender a gravidade da doen�a. "Sabemos que a Aten��o Prim�ria � Sa�de (APS) tem um papel fundamental nesse processo de preven��o da COVID-19," acrescentou.
Isso porque a doen�a se agrava muito rapidamente. Em muitos casos, conta Camila, vemos que um dia o paciente est� bem e no seguinte j� pode estar na UTI. "Quando vemos modelos de pa�ses do hemisf�rio norte, como It�lia, Espanha, EUA, em geral � assim que a COVID-19 se comporta, com 20% dos pacientes apresentando casos graves. H� v�rios modelos para avaliar o risco de propaga��o da epidemia. N�o existe um modelo verdadeiro, n�o sabemos claramente como vai ser no Brasil como um todo e n�o temos n�mero real de casos, para isso ter�amos que testar toda popula��o", disse. Para ela, os dados s�o incipientes, h� muitas limita��es nas bases das estat�sticas, como a m� qualidade dos registros, o que dificulta muito fazer uma proje��o.
Em rela��o aos pacientes que chegam aos hospitais onde ela trabalha, Camila pontua: "Todas as idades, a maioria idosos". O preocupante � que a doen�a n�o atinge s� o pulm�o. Altera tamb�m o sistema nervoso central, microcircula��o – a parte hematol�gica � muito afetada. � uma doen�a multissist�mica. � preciso estudar muito as altera��es, ainda h� muitos pontos de interroga��o sobre a COVID-19", disse. Portanto, a recomenda��o continua: fiquem em casa.
Li��es
"Epidemias sempre existiram e sempre v�o existir em todo o mundo, temos que aprender com elas. A COVID-19 tem sido um aprendizado constante. Vemos a import�ncia da ci�ncia em todos os aspectos da doen�a, na preven��o, manejo e tratamento. H� muitas pesquisas em torno da COVID-19 em todas as �reas, n�o s� na da sa�de, e que t�m chegado a um n�mero maior de pessoas. O Brasil tem um sistema de sa�de forte, vai suportar. Precisamos aprimorar o sistema de vigil�ncia e quando terminar essa epidemia, continuar a trabalhar para que possamos ter um sistema ainda mais forte e enfrentar as pr�ximas epidemias, que certamente vir�o."
O que � o coronav�rus?
Coronav�rus s�o uma grande fam�lia de v�rus que causam infec��es respirat�rias. O novo agente do coronav�rus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doen�a pode causar infec��es com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte.
Como a COVID-19 � transmitida?
A transmiss�o dos coronav�rus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secre��es contaminadas, como got�culas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal pr�ximo, como toque ou aperto de m�o, contato com objetos ou superf�cies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.
Como se prevenir?
A recomenda��o � evitar aglomera��es, ficar longe de quem apresenta sintomas de infec��o respirat�ria, lavar as m�os com frequ�ncia, tossir com o antebra�o em frente � boca e frequentemente fazer o uso de �gua e sab�o para lavar as m�os ou �lcool em gel ap�s ter contato com superf�cies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra a COVID-19.
Quais os sintomas do coronav�rus?
Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:
- Febre
- Tosse
- Falta de ar e dificuldade para respirar
- Problemas g�stricos
- Diarreia
Em casos graves, as v�timas apresentam:
- Pneumonia
- S�ndrome respirat�ria aguda severa
- Insufici�ncia renal
Mitos e verdades sobre o v�rus
Nas redes sociais, a propaga��o da COVID-19 espalhou tamb�m boatos sobre como o coronav�rus � transmitido. E outras d�vidas foram surgindo: O �lcool em gel � capaz de matar o v�rus? O coronav�rus � letal em um n�vel preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar v�rias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS n�o teria condi��es de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um m�dico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronav�rus.
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