
As madrugadas est�o mais frias, a pandemia cresce sem dar sinal de al�vio, a oferta de servi�o, principalmente de “bicos”, escasseia e as vias p�blicas da capital, aos olhos de quem trabalha diretamente com a popula��o em situa��o de rua , ganham novos moradores a cada dia. “� vis�vel o aumento quando comparamos o per�odo anterior � pandemia e o de agora. Aqui, dobrou. Receb�amos 400 pessoas e agora s�o 800 por dia”, afirma a coordenadora da Pastoral de Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte, assistente social Claudenice Rodrigues Lopes, do Canto da Rua Emergencial, projeto aberto desde junho na Serraria Souza Pinto, na Pra�a da Esta��o, Centro de BH.
No local, h� atendimento social, avalia��o b�sica de sa�de, lavanderia, caf� da manh� e outros benef�cios oferecidos a homens e mulheres com investimentos, a partir de setembro, da Prefeitura de Belo Horizonte, via Secretaria Municipal de Assist�ncia Social, Seguran�a Alimentar e Cidadania, e gest�o das pastorais de Rua de BH e Nacional do Povo da Rua.

"Desde que passei a viver na rua, nunca mais dormi em cama. Esta ser� a primeira vez. J� est� esfriando � noite e um amigo me falou sobre este luga"
Gustavo de Jesus dos Santos, na fila para pernoite no Albergue Tia Branca
Conforme o �ltimo censo municipal (janeiro de 2020), havia 4,6 mil pessoas em situa��o de rua na capital, sendo a maior parte masculina (89%). Mas basta um giro pelas ruas e avenidas, �reas sob viadutos e pra�as para ver o tamanho dessa chaga social e como ela ganha corpo noite e dia, incluindo v�rias gera��es dormindo sob caixas de papel�o, em barracas de pl�stico ou enroladas em cobertores pu�dos.
O quadro se torna ainda mais evidente e dram�tico na porta das unidades municipais para acolhimento ou encaminhamento das pessoas, de forma especial nas duas casas de passagem – o Albergue Tia Branca (400 leitos), no Bairro Floresta, na Regi�o Centro-Sul, e o Abrigo S�o Paulo (200), no Bairro Primeiro de Maio, na Regi�o Norte. Para atender � demanda, os leitos foram mantidos na pandemia, embora eliminando atividades coletivas nos espa�os e refor�ando os protocolos de seguran�a, como uso de m�scaras, higieniza��o das m�os e distanciamento social.
Segundo o diretor de prote��o especial da Secretaria Municipal de Assist�ncia Social, R�gis Sp�ndola, as refei��es, antes feitas conjuntamente, agora obedecem a nova din�mica, com intervalo de tempo e separa��o em grupos menores. “Distribu�mos 15 mil m�scaras mensais”, informa.
A procura, nessas unidades, n�o apresenta crescimento. Sp�ndola diz que a taxa de ocupa��o se mant�m em 75%. Ele cita como avan�o, na Regional Pampulha, a unidade de acolhimento espec�fica para a popula��o em situa��o de rua com sintoma ou confirma��o de COVID-19.

"Fui pai aos 15, quase 16. Tenho cinco filhos e tr�s netos. Estou h� quatro anos na rua, tive uns problemas a�. Durmo na rua, mas, neste momento de aperto, o albergue ajuda"
Anderson Martins Vieira, de 43 anos, pedreiro
Cama limpa
S�o 17h e a fila se alonga na porta do Albergue Tia Branca, na Rua C�nego Rocha, no Bairro Floresta. L� est�o os que esperam o momento de entrada, com paci�ncia, encostados no muro do pr�dio, os que ficam sentados na cal�ada e outros em volta de uma fogueira. O movimento � intenso, as conversas s�o em tom mais alto, a maior parte usa m�scaras, mas outros consideram a prote��o desnecess�ria. “N�o preciso disso”, comenta um homem com forte sotaque carioca.
Em cada rosto h� um pedido de ajuda; nas vozes, um grito abafado por uma sa�da; nas m�os, a espera pelo prato de comida. Esperando a hora de entrar no albergue, Gustavo de Jesus dos Santos, de 43 anos, solteiro, conta que n�o dorme h� 20 anos numa cama: “Desde que passei a viver na rua, nunca mais tive isso. Esta ser� a primeira vez. J� est� esfriando � noite e um amigo me falou sobre este lugar. Nem sabia que existia”. Natural do Esp�rito Santo, Gustavo diz que a pandemia piorou a situa��o de quem sobrevive na rua. “Estou at� pensando em voltar para minha terra, mas n�o tenho dinheiro para a passagem. N�o encontro servi�o… T� dif�cil.”
Ao ouvir a hist�ria de Gustavo, o pedreiro Anderson Martins Vieira, de 43, se surpreendeu. “Puxa! 20 anos?” Diante da confirma��o, o belo-horizontino revelou que sua trajet�ria � bem diferente. “Fui pai aos 15, quase 16. Tenho cinco filhos e tr�s netos. Estou h� quatro anos na rua, tive uns problemas a�. Durmo na rua, mas, neste momento de aperto, o albergue ajuda.”

"Venho dormir no albergue toda noite. Neste tempo de pandemia n�o est� f�cil para ningu�m, ainda mais para quem vive na rua"
Jerry Adriani Silva, de 37 anos, mineiro de Rio Vermelho, na Regi�o Leste
Um dos primeiros da fila, no fim da tarde de quarta-feira, era Jerry Adriani Silva, de 37, solteiro. A exemplo dos outros dois, ele n�o teve COVID-19, e quer dist�ncia da doen�a. “Venho dormir no albergue toda noite. N�o est� f�cil para ningu�m, ainda mais para quem vive na rua”, disse o mineiro de Rio Vermelho, na Regi�o Leste do estado. Protegido por m�scara, Luiz Eduardo Gon�alves, de 38, contou ter passado tr�s meses no Rio de Janeiro (RJ), e, ao voltar, h� tr�s dias, n�o encontrou mais em casa a mulher e o filho. “Por isso estou aqui; me falaram que ela (a mulher) mudou para outra rua.”
Levantamento da Prefeitura de BH aponta os principais motivos que levam � vida nas ruas: conflitos familiares, alcoolismo, desemprego e perda da moradia.
Acolhimento
Em nota, a PBH informa que mant�m a oferta de servi�os de atendimento � popula��o em situa��o de rua durante a pandemia, com funcionamento regular e ininterrupto, especialmente dos servi�os de acolhimento institucional, oferta de alimenta��o ou outros criados de forma emergencial no per�odo de pandemia. Para as unidades de acolhimento institucional, a PBH orientou a implementa��o de medidas que garantam a prote��o de trabalhadores e usu�rios.
Os espa�os devem ser mantidos arejados, com boa ventila��o e intensifica��o da limpeza e higiene. Para o acesso aos albergues de pernoite, por exemplo, est�o sendo realizados procedimentos espec�ficos na entrada das pessoas, como higieniza��o. As organiza��es da sociedade civil que executam os servi�os foram orientadas e autorizadas a usar os recursos para compra de itens de preven��o e controle.
No total, Belo Horizonte conta com capacidade de acolhimento de cerca de 2 mil pessoas em 16 abrigos destinados a homens e mulheres adultos, adolescentes e fam�lias em situa��o de rua.
Canto da Rua
Na manh� de quinta-feira, era intenso o movimento na Serraria Souza Pinto, com oferta de atendimento di- urno e provis�rio por meio do Projeto Canto da Rua Emergencial. O objetivo � minimizar os impactos causados pelo novo coronav�rus. No local, h� suporte t�cnico psicossocial, acesso a espa�os e materiais para higieniza��o, banho, lavagem de roupas, lanche, al�m da oferta de 60 vagas de hospedagem para acolhimento emergencial e provis�rio dos usu�rios com maior vulnerabilidade.
“Ningu�m est� na rua porque quer. Trata-se de uma situa��o complexa, que demanda uma estrutura para que a popula��o tenha direito a moradia digna”, afirma a coordenadora da Pastoral de Rua da Arquidiocese de BH, Claudenice Rodrigues Lopes. Nas ruas da cidade se encontram, conforme a PBH, 43% de pessoas da capital, 36% do interior mineiro e 21% de outros estados.
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