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Estado de Minas TRAG�DIA DE JANA�BA

Ap�s 4 anos, v�timas de inc�ndio em creche suportam sequelas e abandono

Sem previs�o de indeniza��o, fam�lias de sobreviventes do ataque na Creche Gente Inocente, em 2017, veem doa��es se esgotarem e recebem aux�lio insuficiente


12/11/2021 06:00 - atualizado 12/11/2021 09:52

Flávio Silva, pai da menina Flávia Nayara, internada no CTI do Hospital Joao XXIII depois de incêndio na Creche Gente Inocente, de Janaúba
Fl�vio de Oliveira Silva nos tempos de apreens�o enquanto a filha de 4 anos estava internada em BH e hoje, com a mulher, �lica, e Fl�via, j� recuperada (abaixo): gratid�o pela vida, apesar das dificuldades (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press - 3/11/17)

Jana�ba – Para uns, o sofrimento f�sico e psicol�gico resultado das sequelas de uma trag�dia que abalou o Brasil e o mundo; para outros, a saudade que n�o passa, deixada pelos que se foram em um inc�ndio criminoso que matou crian�as e adultos; para todos, a dor do descaso, da lentid�o judicial e do desamparo econ�mico. Passados mais de quatro anos do ataque � antiga Creche Gente Inocente, em Jana�ba, no Norte de Minas, as fam�lias das v�timas do inc�ndio criminoso enfrentam em sil�ncio dificuldades financeiras para tratamento m�dico e compra de medicamentos.

Ainda lutam na Justi�a em busca de indeniza��o por parte do munic�pio, que paga por m�s, a t�tulo de antecipa��o, quantias que variam de R$ 500 a R$ 1 mil por atingido. Muito pouco para quem v� o refor�o dos recursos obtidos na �poca, por meio de doa��o, se aproximar do fim, e lida com o temor concreto de que a repara��o completa ainda demore d�cadas.

Era manh� de 5 de outubro de 2017, �s v�speras dos dias das Crian�as e do Professor, quando o vigia municipal Dami�o Soares dos Santos, de 50 anos, portador de transtorno mental, invadiu o centro de ensino infantil e ateou fogo � sala onde estavam as crian�as. Matou a si pr�prio e provocou as mortes de 10 alunos e tr�s adultos, deixando mais de 40 feridos. Na �poca, a trag�dia alcan�ou repercuss�o internacional, mas, quando completou quatro anos, h� pouco mais de um m�s, foi pouco lembrada.

Desde ent�o, os maiores avan�os vieram de a��es da pr�pria sociedade civil e da Defensoria P�blica de Minas Gerais. O antigo pr�dio incendiado foi demolido. Em seu lugar – com recursos de doa��es de um grupo de empres�rios –, foi erguido um novo centro de educa��o infantil, que recebeu o nome da professora Heley de Abreu Silva Batista, morta como hero�na, depois de tentar salvar as crian�as em meio �s chamas. Ela tamb�m lutou com o vigia Dami�o para tentar impedir a trag�dia.



Entre as v�timas, a quase totalidade � formada por fam�lias de baixa renda, sem recursos para custear procedimentos m�dicos e comprar medicamentos exigidos para tratar sequelas das queimaduras ou reflexos psicol�gicos do ataque. Desde o inc�ndio criminoso, sem ter como pagar advogados, as fam�lias das v�timas encontraram amparo na Defensoria P�blica, que ajuizou a��es em busca de indeniza��o por parte do munic�pio, com o qual, agora, busca um acordo para repara��o, na tentativa de evitar o desamparo dos atingidos e garantir a continuidade dos tratamentos.

O defensor p�blico Gustavo Dayrell, que atua em Jana�ba, explica que at� ent�o, vem sendo feito um pagamento mensal referente � antecipa��o parcial das verbas indenizat�rias, com desembolso pela Prefeitura de Jana�ba para as fam�lias atingidas, nos valores de R$ 500 (para v�timas de les�es leves e m�dias) e R$ 1 mil (caso de mortes e les�es graves). Esse aux�lio antecipado, que findaria em dezembro de 2018, tem sido renovado anualmente, resultado de Termo de Ajustamento de Conduta firmado pelo munic�pio ap�s o ajuizamento da A��o Civil P�blica pela Defensoria.

Desamparo preocupa Defensoria e associa��o

O defensor Gustavo Dayrell afirma que as fam�lias enfrentam uma situa��o preocupante, porque o dinheiro recebido por meio de doa��es est� chegando ao fim. Os recursos, administrados pela Associa��o dos Familiares das V�timas e Sobreviventes da Trag�dia da Creche Gente Inocente de Jana�ba (AVTJana), s�o destinados ao custeio das consultas m�dicas e dos medicamentos usados pelos atingidos.

O presidente da associa��o, Luiz Carlos Batista (vi�vo da professora Heley Abreu), afirma que foram arrecadados em torno de R$ 900 mil, em doa��es vindas de todo o pa�s, na campanha SOS Creche Gente Inocente, realizada na ocasi�o. Do total, R$ 250 mil foram destinados a obras nas casas das fam�lias, para que pudessem receber de volta as crian�as em recupera��o de queimaduras graves. “Havia casas que estavam em condi��es t�o prec�rias, que tiveram que ser demolidas e reconstru�das para que pudessem oferecer a condi��o apropriada para receber as crian�as em tratamento das queimaduras”, explica.

A menina Flávia Nayara Dias Silva, vítima do incendio na Creche Gente Inocente, e os pais Flávio de Oliveira Silva e Élica Nayara Soares Dias


O restante do dinheiro arrecadado passou a ser usado no pagamento das consultas m�dicas, compra de medicamentos e outras despesas de 83 fam�lias assistidas pela entidade. Agora, segundo Luiz Carlos Batista, a associa��o disp�e de cerca de R$ 40 mil do montante original. “Gastamos em torno de R$ 8 mil a R$ 10 mil por m�s com a compra de medicamentos para as crian�as v�timas de queimaduras”, afirma o presidente da AVTjana.

“At� ent�o, conseguimos fazer milagre com as doa��es. Mas, pela quantidade de pessoas em tratamento, o dinheiro que temos n�o vai dar por muito tempo. Precisamos de uma solu��o r�pida”, afirma. Ele salienta ainda que a apreens�o maior � pelo fato de que as crian�as v�timas de queimaduras n�o podem interromper o tratamento, sob o risco de as sequelas se agravarem.

Luiz Carlos anuncia que, diante da situa��o e da falta de solu��o oficial, vai novamente apelar para a solidariedade e retomar a campanha SOS Gente Inocente, em prol das v�timas, divulgando o n�mero da conta banc�ria para doa��es (veja ao lado). 

“Estamos em um per�odo dif�cil para todos, ainda enfrentando a pandemia. Mas creio que, com f� em Deus, muitas pessoas possam ajudar”, diz Batista. “Quem quiser, sejam de cidades vizinhas ou at� de outros estados, pode visitar Jana�ba para ver a situa��o atual das crian�as”, completa.

Pouco dinheiro para muitas dificuldades

A professora Marley Simone Lima Antunes, vítima de incêndio na creche Gente Inocente, de Janaúba
A professora Marley Simone Lima Antunes, que enfrentou o maior per�odo de interna��o, e os medicamentos: sequelas f�sicas e psicol�gicas (foto: Arquivo pessoal/Divulga��o)
As fam�lias das v�timas do inc�ndio da Creche Gente Inocente j� enfrentavam as dificuldades da car�ncia financeira e a seca na regi�o. Com a trag�dia, viram a vida piorar, mas n�o desanimaram. Vivem uma rotina de supera��o, demonstrada por gente como Fl�vio de Oliveira Silva, de 33 anos, pai de Fl�via Nayara Dias Silva, de 8 anos, uma das v�timas do inc�ndio criminoso.

A menina, ent�o com 4 anos, teve 80% do corpo queimado no ataque. Foi transportada em estado grave para o Hospital Jo�o XXIII, em Belo Horizonte, onde ficou por dois meses. “Ela foi uma das sobreviventes que mais tiveram o corpo queimado”, afirma o pai, que considera que a filha se salvou por obra de Deus e pela assist�ncia m�dica.



Fl�vio afirma que trabalhava como montador de equipamentos de irriga��o em planta��es de banana, e j� encarava dificuldades para encontrar servi�o por causa da escassez h�drica na regi�o. Com a trag�dia, teve que interromper a atividade totalmente para cuidar da filha. A mulher, �lica Nayara Soares Dias, de 29, deixou o trabalho de cuidadora de idosos pelo mesmo motivo.

Com outro filho, de 1 ano e 6 meses, a fam�lia tem que se virar com os R$ 1 mil mensais da antecipa��o de indeniza��o pagos pela Prefeitura de Jana�ba. Mesmo completando a renda com alguns bicos, tem sido dif�cil sobreviver. Por�m, Fl�vio n�o desanima e agradece pela vida da filha. “Dou gra�as a Deus por ela estar alegre, correndo e brincando, sempre com o sorriso no rosto, sem recuar ou ficar em um cantinho devido �s marcas no corpo, por timidez ou vergonha.”

Apesar da gratid�o, ele reclama do abandono das v�timas do inc�ndio por parte das autoridades. “Muitos colocaram a trag�dia no mar do esquecimento”, lamenta, enquanto agradece o apoio da Defensoria P�blica. “Eu nem imaginava que teria um suporte t�o forte da Defensoria”, diz Fl�vio, agradecendo tamb�m a assist�ncia da dire��o da associa��o das v�timas do inc�ndio.

Nas m�os de Deus

Outra li��o de supera��o vem da professora Marley Simone Lima Antunes, de 46. Ela teve 43% do corpo queimado, ficou em estado grav�ssimo e permaneceu no Hospital Jo�o XXIII por quatro meses e 11 dias. Na sequ�ncia, foi transferida para o Hospital Regional de Jana�ba, onde ficou mais um m�s. Foi a v�tima do inc�ndio com maior tempo de interna��o. “Fiquei internada, fiquei entre a vida e a morte. Por v�rias vezes, os m�dicos falaram que eu estava nas m�os de Deus”, relata ela, lembrando que, al�m de v�rias cirurgias, teve de enfrentar a hemodi�lise.

Marley permanece em tratamento. E n�o s� devido �s queimaduras de segundo e terceiro graus, mas tamb�m por que ficou com sequelas renais graves, al�m de sequelas pulmonares e psicol�gicas. Arrimo de fam�lia, divorciada, hoje sobrevive com os R$ 1 mil mensais da antecipa��o de indeniza��o da prefeitura. Pouco, j� que, al�m de consultas, exames e tratamento m�dico, tem que pagar aluguel e garantir o sustento de si pr�pria e de tr�s filhos, que tamb�m enfrentam sequelas psicol�gicas devido ao que ocorreu com a m�e, passam por tratamento e dependem de medicamentos.

A situa��o n�o � muito diferente para Fl�via Nunes Rocha, m�e do garoto Luciano Gabriel Nunes Rocha, de 6, uma das v�timas das chamas na creche. O menino, na ocasi�o com 2 anos, inalou fuma�a e precisou de interna��o. Recuperou-se, mas enfrenta sequelas pulmonares e depende de aten��o cont�nua. Fl�via, que n�o tem marido, tem outros tr�s filhos pequenos. Desempregada, sobrevive dos R$ 500 mensais da indeniza��o antecipada pela prefeitura. Diante das dificuldades, atualmente encontra amparo apenas na associa��o das v�timas e na Defensoria P�blica.

Para colaborar

  • Campanha SOS Creche Gente Inocente
  • Conta corrente: 61.841-8
  • Caixa Econ�mica Federal
  • Ag�ncia: 0937
  • Opera��o: 013
  • Associa��o Creche Gente Inocente

A dor que n�o tem tratamento

Para as m�es que perderam filhos no ataque � Creche Gente inocente, passados mais de quatro anos o inconformismo permanece. � o sentimento com que convivem pessoas como a balconista Valdirene dos Santos Borges, de 43 anos, que perdeu Mateus Felipe Rocha Santos, aos 5, no inc�ndio. “Na �poca, procurei ser forte diante da minha fam�lia. Mas parece que agora estou vivendo meu luto. Hoje, a dor que sinto est� mais forte do que nunca. Meu filho deixou muita saudade e um vazio enorme. Minha vida mudou muito, e para pior”, conta Valdirene, que toda semana vai ao Cemit�rio Municipal de Jana�ba para visitar o t�mulo de Mateus.


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