(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas ENTREVISTA

Nei Leite Xakriab�: "A arte � essencial para mostrar que a gente existe"

Professor ind�gena destaca a import�ncia de preservar e transmitir as tradi��es na luta contra o preconceito e por mais direitos das popula��es origin�rias


04/10/2023 04:00 - atualizado 04/10/2023 07:25
432

Nei Leite Xakriabá
Nei Leite Xakriab� falou ao EM em seu atelier na terra ind�gena sobre a import�ncia da perpetua��o da cultura na luta dos xakriab�s (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A. Press)

Nei Leite Xakriab� vive na Aldeia Barreiro Preto, umas das mais de 35 existentes na Terra Ind�gena Xakriab�. Graduado em educa��o ind�gena pela UFMG, o artista atuou no ensino de jovens xakriab�s em disciplinas que mant�m viva nas escolas a cultura tradicional do seu povo.

 

Em sua disserta��o de mestrado “Arte Ind�gena Xakriab�: com um p� na aldeia e outro p� no mundo”, Nei Leite discute seu trabalho com cer�mica e a transmiss�o de h�bitos e costumes como uma forma de resist�ncia da cultura ind�gena e de dar visibilidade � luta do povo.

 

� um dos artistas cujo trabalho � apresentado na exposi��o “A �gua � m�e da terra”, no Museu de Artes e Of�cios, na Pra�a Rui Barbosa, Centro de BH, at� 4 de novembro. Ele falou ao EM em seu atelier na terra ind�gena sobre a import�ncia da perpetua��o da cultura na luta dos xakriab�s. Leia abaixo os principais pontos da entrevista.

 

 

Como a retomada dos trabalhos com cer�mica ajudou na educa��o de jovens ind�genas?

 

Atuei por mais de 20 anos como professor nessa �rea de artes e pr�ticas tradicionais e um dos trabalhos que eu tenho feito � retomar as pr�ticas com a cer�mica. Conversando com os mais velhos e desenvolvendo oficinas com as crian�as para tentar trazer de volta essa pr�tica que, no passado, era bastante presente. A cer�mica circulava muito nas casas das pessoas, o pote, a panela, esses objetos que com o tempo e com essas viol�ncias todas que aconteceram no nosso territ�rio foram se perdendo. A gente foi se interessando mais para esses objetos industrializados de pl�stico e alum�nio que provocam muito preju�zo tamb�m o meio ambiente.

 

Esse tamb�m � uma forma de gerar renda. Eu j� participei de algumas exposi��es e feiras fora tamb�m do munic�pio. J� fiz algumas viagens para outros estados, inclusive fui para Europa em 2022 para participar de um workshop, fiz uma exposi��o online na Turquia. Agora mesmo enviei umas pe�as pra bienal de arte da Am�rica Latina que vai acontecer na China. Ent�o assim, � uma pr�tica que estava adormecida e hoje voltou com for�a.

 

 

O ensino de pr�ticas tradicionais pode ser uma alternativa para gerar renda dentro da Terra Ind�gena? Qual o impacto de seu trabalho nesse sentido?

 

Esse meu trabalho com a cer�mica tem muito a ver com a rela��o que a gente tem com os animais, com a terra e com a pr�pria �gua. Quando pensei em fazer a moringa, pensei muito nessa coisa assim de que ela � utilizada para armazenar �gua e, para n�s, a �gua � um grande problema. Nosso cerrado � meio que uma grande esponja de absorver a �gua, mas essa �gua, com essa quest�o da falta de chuva ou o pr�prio desmatamento que tem aumentado, secou. Nem essa esponja ela tem alimentado.

 

Essa pr�tica da cer�mica tem sido uma boa possibilidade de gera��o de renda. Aqui, muitos dos jovens v�o para fora do territ�rio cortar cana, trabalhar em outras �reas como a constru��o civil ou colheita de caf�. Existem pessoas que n�o voltam mais e tem pessoas que voltam j� com problemas, sejam eles relacionados a drogas ou a religi�es que muitas vezes pro�be de participar das pr�ticas tradicionais. Ent�o, quando voc� tem uma possibilidade de gerar renda no territ�rio e permite que as pessoas fiquem sem precisar sair para longe seus familiares � uma alternativa mais interessante.

 

 

O senhor tem participado de exposi��es dentro e fora do pa�s. Acredita que a divulga��o da arte Xakriab� pode ser um instrumento para fortalecimento das lutas internas?

 

� bem essencial essa quest�o da gente tentar cada vez mais ter visibilidade, como uma forma mesmo de mostrar para as pessoas que a gente existe e estamos aqui. Que, apesar de tudo, a gente tem resistido. Essas discuss�es, por exemplo, de primeiro dizer que voc� n�o pertence mais e que n�o existem povos naquela regi�o � uma estrat�gia tamb�m de depois dizer que voc� n�o tem mais direito ao territ�rio. E a� vem esses pol�ticos com esse discurso e ele vai se espalhando. As pessoas v�o achando que ind�gena tem que ter sempre uma certa caracter�stica �nica: olho esticadinho, cabelo lisinho, tem que estar nu tem que estar morando no meio da floresta. Se voc� estiver na cidade, fizer um curso, voc� j� deixa de ser ind�gena. � um pensamento preconceituoso.

 

A nossa arte ajuda a contar a hist�ria do nosso povo. Por meio dela muita gente tem se aproximado da gente nem tentado saber mais da nossa realidade, conhecer mais da nossa hist�ria e ela passa a ser uma ferramenta importante de luta. As pessoas hoje n�o sabem, n�o conhecem muito a realidade dos povos. No Brasil existem mais de 300 povos ind�genas, s�o povos diferentes, povos que est�o vivendo processos diferentes de contato. Quando a gente vai para as feiras eu tenho encontrado muita gente e percebido que as pessoas t�m uma falta de informa��o muito grande sobre os povos ind�genas porque eles acham que s�o todos iguais. Eles n�o sabem que existem uma variedade grande de povos, que falam l�nguas diferentes, que tem um processo diferente de contato. Tem povos isolados, mas, como n�s, h� grupos com 400 anos de contato com n�o ind�genas. E foi um contato muito violento, com chacinas, proibi��o de falar a l�ngua, de realizar rituais tradicionais, casamentos for�ados, estupros, invas�o de territ�rios.

 

Muita gente acha que a gente deixou de ser ind�gena porque n�o atende �quela imagem muitas vezes generalizada. Eles acham que � o ind�gena tudo igual, que mora em casa de palha no meio da floresta, que vive como se ainda tivesse em 1500. A nossa arte tem ajudado a mostrar essa diversidade.

 

 

Como o ensino art�stico refor�a a no��o de identidade entre os pr�prios xakriab�s?

 

Eu tenho tentado, nessa minha pr�tica pedag�gica, fortalecer esse conhecimento ancestral, mostrar para os alunos a import�ncia que isso tem para a nossa pr�pria identidade. Se a gente for deixando as nossas pr�ticas e aderindo a pr�tica do colonizador, vai chegar uma �poca que a gente vai ser olhado pelos outros com um olhar muito mais preconceituoso, cada vez mais preconceituoso. V�o dizer que a gente n�o � mais ind�gena. H� esse discurso de dizer que as pessoas n�o pertencem mais a um povo para depois justificar que n�o tem mais direito a um territ�rio, por exemplo. Eu tenho tentado conscientizar eles para ir aos mais velhos, aprender as pr�ticas deles. Por exemplo, conhecer uma medicina tradicional que vai te ajudar a curar de uma doen�a sem precisar muitas vezes de muitas vezes recorrer a rem�dios. Tenho tentado mostrar para eles que existem v�rias pr�ticas ancestrais que s�o mais saud�veis do que as pr�ticas que hoje a gente tem aderido.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)