
Enquanto a maioria das pesquisas mostrava Joe Biden com ligeira vantagem em rela��o a Donald Trump na Fl�rida, um dos lugares mais cobi�ados destas elei��es nos EUA, brasileiros que vivem h� anos no Estado apostavam no justo oposto durante a tarde de ter�a-feira (3), dia de vota��o, nos arredores de Miami.
"Eu creio, pelo que tenho visto, que Trump tem vantagem", afirmava a empres�ria Patricia Brito, que vive h� 23 anos nos EUA, 13 deles no Estado da Fl�rida. Ela se diz "encantada" com a pol�tica migrat�ria do republicano.
"N�o � que pode ganhar, Trump tem que ganhar", disse Carlos Alberto Soares, que est� nos EUA h� 18 anos e vive e trabalha na regi�o de Pompano Beach, um importante reduto de brasileiros ao norte de Miami. Para ele, Trump "salvou" a economia dos EUA.
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Com 36 anos nos EUA, Sergio (que preferiu n�o dar o sobrenome) � dono de uma sala comercial em um centro de compras na mesma �rea. "A elei��o aqui vai ser complicada", previu o brasileiro, que defende a resposta do presidente americano � pandemia do novo coronav�rus, em entrevista � BBC News Brasil. "Mas Trump vai ganhar."
Impress�es semelhantes foram compartilhadas com a BBC News Brasil por mais de 10 brasileiros que vivem na regi�o de Miami (s� um casal preferiu se abster: "Preferimos fazer o nosso", "n�o estamos nem a� para pol�tica", disseram).
As opini�es revelam como alguns pontos-chave da ret�rica de Trump — migra��o, rela��es raciais, religi�o, economia e pandemia — ressoam entre brasileiros conservadores que reconstru�ram suas vidas nos EUA e hoje t�m dupla nacionalidade.
At� a publica��o desta reportagem, com 96% dos votos apurados na Fl�rida, Trump havia se declarado vencedor no Estado com 51,2% dos votos, contra 47,8% do oponente, Joe Biden.
Imigra��o: 'O sonho americano n�o existe mais'
A pol�tica linha-dura do republicano em rela��o �queles que vivem sem documentos nos EUA � a que mais agrada �queles que, um dia, chegaram ao pa�s como imigrantes.

"Por mais que eu seja imigrante, eu concordo", diz Patricia Brito, dona do Feij�o com Arroz, um restaurante a quilo muito frequentado por brasileiros na regi�o de Miami.
Para ela, "os EUA mudaram muito" e a chegada de estrangeiros indocumentados aumenta o risco de "terrorismo" e cria situa��es "injustas" para empres�rios e assalariados.
"A gente que tem neg�cios, est� no com�rcio, conhece muita gente, a gente v�. As pessoas da classe m�dia est�o perdendo poder de compra, perdendo a independ�ncia. Aquele sonho americano n�o existe mais. Por qu�? Uma pessoa para fazer um parto gasta US$ 15 mil. Uma pessoa indocumentada n�o vai pagar nada. Quem est� pagando? A classe m�dia", diz.
"Hoje ter um small business (pequeno neg�cio) � muito dif�cil. Os custos fixos s�o alt�ssimos. N�o � justo com o povo esse sistema (criado) para manter essa parte informal. O americano est� pagando a conta e a gente sente na pele."
Nos EUA, como no Brasil, mesmo as pessoas sem documentos pagam determinados impostos — embutidos no pre�o final — quando comprarem qualquer produto ou servi�o.
Enquanto Trump subiu o tom contra imigrantes nas duas campanhas e durante seus 4 anos na Casa Branca, seu antecessor, Barack Obama, j� havia batido recordes de deporta��es.
Segundo levantamento do jornal Washington Post, 1,18 milh�o de pessoas foram deportadas nos 3 primeiros anos de Obama, contra em torno de 800 mil no mesmo per�odo sob Trump. S� em 2012, o governo democrata havia deportado 409.849 pessoas. Segundo o levantamento, o m�ximo de deportados em um ano na gest�o Trump seria de 260 mil.
Pandemia: 'Morre de covid quem tem que morrer'
"A pandemia, todo mundo sabe, � uma inven��o. Eu tive o v�rus, sei que ele est� a�, ele mata, mas morre de covid quem tem que morrer", diz Sergio, um veterano nos EUA com mais de tr�s d�cadas no pa�s.
"Nos EUA, morreram duzentas e alguma coisa mil pessoas", ele afirma.
A reportagem diz que foram 232 mil mortes, segundo dados oficiais compilados pela Universidade Johns Hopkins, de Washington. "Que sejam 300 mil pessoas. Em rela��o a 330 milh�es de habitantes (popula��o aproximada dos EUA), isso � nada. N�o � nada."
O brasileiro ecoa a narrativa do presidente americano, que culpa a China pela pandemia e pelo que chama de "v�rus chin�s" — classifica��o vista como pejorativo pela comunidade chinesa e parte da comunidade internacional.

"Se fosse uma doen�a hiper contagiante e hiper fatal, ter�amos milh�es de pessoas", diz o brasileiro, enquanto descarrega caixas de papel�o de um carro preto. "Acho que esse v�rus foi criado, a China � muito sabida."
Como outros brasileiros ouvidos pela reportagem, Sergio diz que j� esperava que algo como a pandemia pudesse acontecer.
"Isso � b�blico. Estamos no princ�pio das dores, est� escrito no livro de Apocalipse, pega qualquer b�blia, vai l� e l�. Haver� pestes e pragas e estamos chegando l�. � sem retorno. N�o adianta curar pandemia. N�o adianta. � sem retorno e vai chegar no final", diz.
A reportagem pergunta o que acontece no final.
"Vai se cumprir o livro de Apocalipse."
Conservadorismo e religi�o: 'Trump � o nosso Bolsonaro'
Muitos dos entrevistados fizeram refer�ncia � B�blia em sua defesa a Donald Trump.
Para uma dupla de gar�onetes que trabalha em uma lanchonete frequentada por brasileiros em Miami, Trump "trouxe a religi�o de volta" ao cotidiano dos americanos.
"Ele � crist�o e botou uma ju�za crist� para proibir o aborto", diz uma delas. Ela faz refer�ncia � indica��o de Trump � Suprema Corte da ju�za cat�lica Amy Coney Barrett � cadeira deixada pela ju�za progressista Ruth Bader Ginsburg, que morreu neste ano.
Desde 2017, Trump j� nomeou tr�s ju�zes para a Suprema Corte, al�m de outros mais de 200 ju�zes para tribunais federais com cargos vital�cios.
"Trump � o nosso Bolsonaro", completou a colega de trabalho, em refer�ncia � ret�rica conservadora de ambos.
"Eu concordo muito com o Trump, principalmente nas quest�es de fam�lia", disse a empres�ria Patricia Brito. "O povo crist�o est� muito ligado nessa quest�o da destrui��o da c�lula familiar. A sabe o rumo que essas coisas est�o tomando. A proposta do Trump � reverter essa situa��o."
Segundo ela, um governo Biden significaria "uma deturpa��o no princ�pio familiar".

A reportagem pergunta se o coment�rio tem a ver com o casamento gay. "Acho que a escolha � deles e eles vivem do jeito que acham que � certo. S� que da� a trazer isso para escola, voc� come�ar a trazer valores relativos para as crian�as. Eu convivo muito com adolescente e eles hoje est�o perdidos", diz.
A brasileira prossegue: "� complexo eu falar isso, eu n�o tenho alto 'background' de psicologia, mas eu diria que 2 ou 3% da popula��o realmente tem essa escolha embasada em problemas do passado, situa��es que viveram, traumas, quest�es, gen�ticas, quest�es de problemas qu�micos. Mas a grande massa est� sendo influenciada".
As informa��es n�o t�m qualquer amparo m�dico, sociol�gico ou cient�fico.
Economia: "Obama e Biden destru�ram os EUA"
A condu��o da economia seria um dos pontos fortes de Donald Trump entre o eleitorado, segundo pesquisas divulgadas ao longo de todo o per�odo eleitoral.
Para muitos americanos, o republicano teria mais capacidade que o rival democrata em temas econ�micos.
Dias antes da elei��o, o Departamento do Trabalho americano divulgou alta recorde no produto interno bruto dos EUA no terceiro trimestre deste ano, em rela��o aos tr�s meses anteriores.
No per�odo, segundo o escrit�rio oficial de estat�sticas dos EUA, o PIB cresceu 33,1%, recorde na s�rie hist�rica do indicador, contra estimativas de 31%.
No segundo trimestre, a economia Americana havia encolhido em 31,4% — maior queda desde a crise de 1929.
"Se o Trump facilitasse mais para a covid, a economia dos EUA estaria l� embaixo. Ele n�o deixou isso acontecer. E ele estando a�, a economia foi muito boa. Ele recebeu a economia destro�ada pelo Biden e pelo Obama", diz Carlos Alberto Soares, que � dono de uma �tica.
A vis�o bate com a do conterr�neo Sergio.
"(Trump) � um presidente que tem um ego muito grande, por ser um cara muito rico, com muito poder, conquistou tudo na vida, ent�o ele 'se acha o cara'", diz.

"O presidente, para ser um l�der, tem que ter integridade e tem que saber business, tem que saber de neg�cio. Tem que entender como se negocia, pol�tica estrangeira � neg�cio", continua o brasileiro. "Trump � um bom presidente por ser um bom empres�rio e ser direto. Creio que ele � honesto."
Durante os tr�s primeiros de governo Trump, os EUA registraram crescimento econ�mico m�dio anual de 2,5%. Nos �ltimos tr�s anos da administra��o do antecessor, Barack Obama, os EUA viram um n�vel semelhante de crescimento (2,3%), junto com uma taxa significativamente maior (5,5%) em meados de 2014.
At� o in�cio da pandemia, Trump afirmava ter entregado a menor taxa de desemprego em meio s�culo. Isso � correto: em fevereiro deste ano, a taxa era de 3,5%, a menor em mais de 50 anos.
Obama tamb�m adicionou mais empregos � economia, comparando-se per�odos semelhantes: sob Trump, nos tr�s anos anteriores � pandemia, foram registrados 6,4 milh�es de empregos adicionais; j� nos �ltimos tr�s anos de Obama, foram criados 7 milh�es de empregos.
Tudo isso mudou drasticamente com a pandemia: segundo o Departamento do Trabalho dos EUA, mais de 20 milh�es de pessoas perderam seus empregos e, em um �nico m�s, o pa�s perdeu o equivalente a uma d�cada de ganhos de empregos.
Fl�rida
A Fl�rida era considerada pelas campanhas de Trump e Biden um dos Estados mais importantes na disputa eleitoral. Trata-se de um dos chamados Estados-p�ndulo: onde n�o h� prefer�ncia clara por um partido ou pelo outro no eleitorado.
Desde 1900, os democratas ganharam 17 vezes na Fl�rida, contra 13 vit�rias de republicanos.
Entre as elei��es de 2000 e 2016, as �ltimas cinco elei��es, os republicanos ganharam 3, os democratas 2.
Junto a Nova York, a Fl�rida � o terceiro maior col�gio eleitoral dos EUA — depois de Calif�rnia e Texas.
Do Estado saem 29 dos 270 votos necess�rios no col�gio eleitoral para que um dos candidatos se consagre presidente.
O Estado � marcado pela diversidade. Em 2020, dos 5,7 milh�es de hisp�nicos do Estado, mais de 2,5 milh�es se registraram para votar — quase meio milh�o a mais que na elei��o de 2016, segundo dados do governo do Estado analisados pelo Instituto Pew.
Os latinos, tradicionalmente, votam por democratas nos EUA: 7 em cada 10 latinos do pa�s votaram Obama em 2012; depois 66% votaram em Hillary Clinton em 2016.
Mas o Estado tem a maior concentra��o de cubanos nos EUA — na grande Miami, os cubano-americanos s�o maioria na popula��o.
Segundo a �ltima edi��o de uma pesquisa anual feita h� 29 anos pela Universidade Internacional da Fl�rida (FIU) sobre o perfil pol�tico dos cubanos da cidade, os cubanos da regi�o votaram Trump — 59% preferiam o republicano, contra 25% que disseram que votariam em Biden.
N�o h� um recorte espec�fico sobre como os brasileiros votam na Fl�rida.
Em escala nacional, segundo pesquisa do Instituto Ideia, esperava-se que 71% dos brasileiros que vivem nos EUA e possuem direito a voto votassem no candidato democrata, enquanto 27% diziam preferir o republicano Donald Trump.
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