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Estado de Minas PEPSI STUFF

O incr�vel erro que levou Pepsi a enfrentar universit�rio por avi�o militar

Um comercial lan�ado em 1995 desencadeou uma batalha legal que ainda hoje � lembrada nas faculdades de direito dos Estados Unidos


06/05/2023 21:33 - atualizado 07/05/2023 10:05


Garoto bebendo Coca Cola e Pepsi
A Pepsi-Cola e a Coca-Cola sempre competiram por mercado (foto: Getty Images)

O ano era 1995. A "guerra das colas", iniciada na d�cada de 1970, seguia a todo vapor.

Na verdade, a acirrada rivalidade entre a Coca-Cola e a Pepsi-Cola havia come�ado no exato momento em que a Pepsi Cola Company foi fundada, em 1902, dez anos depois da Coca-Cola Company.

Enquanto a Coca-Cola dominava, a Pepsi reduzia os pre�os e usava outros artif�cios para ganhar mercado.

At� que, em 1975, ela lan�ou o que chamou de "Pepsi Challenge", voltado diretamente � concorrente, declarando essa guerra de marketing.

Duas d�cadas e muitos comerciais depois, ela investiu na campanha promocional "Pepsi Stuff", cujo slogan era: "Beba Pepsi e ganhe coisas".

Se os consumidores guardassem os r�tulos de Pepsi, acumulavam pontos que poderiam ser trocados por mercadorias, como camisetas, bon�s, jaquetas jeans e de couro, bolsas e mountain bikes.

Esta foi a estrat�gia mais bem-sucedida na disputa entre os dois refrigerantes.

Mas surgiu uma pedra no caminho da Pepsi que, por pouco, n�o se tornou um enorme obst�culo.

O avi�o

As lojas divulgavam a promo��o em pontos de venda com fotos da supermodelo Cindy Crawford. Mas os cat�logos em si eram pouco atraentes, particularmente para a chamada "Gera��o Pepsi", que eles queriam conquistar.

Para aumentar seu impacto, a campanha precisava ser refor�ada no grande campo de batalha da publicidade — as telas de cinema e televis�o.

Os profissionais de cria��o idealizaram ent�o um comercial mostrando um menino se arrumando para ir � escola.

Conforme ele vestia alguns dos itens oferecidos pela companhia, aparecia a quantidade de pontos necess�rios para adquiri-los: "camiseta, 75 pontos Pepsi"; "jaqueta, 1.450 pontos Pepsi".

"Agora, quanto mais Pepsi voc� beber, mais coisas geniais voc� vai ganhar", dizia o narrador.

Quando estava pronto, o menino sa�a de casa e subia em um avi�o de combate para ir � escola. Na tela, surgiam os dizeres:

"Avi�o de combate Harrier, 7.000.000 pontos Pepsi", seguidos pelo slogan da campanha.

Em nenhum momento no comercial, originalmente lan�ado nos Estados Unidos, apareceram aquelas legendas em letras min�sculas que sempre nos recomendam ler. No caso, deveriam ter indicado que este �ltimo item n�o estava inclu�do na promo��o.


Avião de combate
(foto: Getty Images)

Quest�o matem�tica

� claro que ningu�m na empresa pegou l�pis e papel para fazer as contas antes de determinar o pre�o do avi�o de combate em pontos Pepsi. Afinal, quando se trata de grandes n�meros, tudo o que vem depois de um certo ponto indica apenas que o n�mero � grande demais.

Neste caso, o n�mero 7 milh�es atendia a este prop�sito, especialmente considerando o quanto era dif�cil obter os pontos necess�rios para qualquer mercadoria.

Cada garrafa de refrigerante equivalia a apenas um ponto. No caso das latas, a situa��o era pior: um pack de 24 latas, por exemplo, valia quatro pontos.

Ou seja, era preciso tomar muita Pepsi para ganhar a camiseta do comercial... e a quantidade para resgatar o avi�o era absurda.

Na verdade, os respons�veis pelo comercial nunca pararam para pensar na quantidade. Para eles, era apenas um truque para chamar a aten��o dos espectadores.

At� que algu�m fez as contas. E, mais do que isso, conseguiu os pontos necess�rios para ganhar o avi�o.


Cindy Crawford bebe latinha de Pepsi
An�ncio premiado da Pepsi em 1991, com a supermodelo Cindy Crawford (foto: Getty Images)

John Leonard

John Leonard era estudante universit�rio. Ele estava sempre em busca de oportunidades para ganhar dinheiro e, assim, financiar suas aventuras — particularmente, sua paix�o pelo alpinismo.

Ele tinha 20 anos e uma longa lista de trabalhos que havia feito desde pequeno com este objetivo.

Um dia, ele ouviu falar de um comercial que oferecia a possibilidade de ganhar um avi�o. Ao assistir, reparou que n�o havia um aviso legal de isen��o de responsabilidade — e decidiu fazer o dever de casa que a Pepsi n�o havia feito.

Ele somou e multiplicou, para saber quantos refrigerantes ele precisaria comprar para ganhar o avi�o de combate. Depois, calculou o valor que precisaria gastar para armazenar milh�es de garrafas e retirar os r�tulos. E concluiu que, embora os n�meros fossem altos, a oferta era, na verdade, uma pechincha.

Custaria a ele cerca de US$ 4 milh�es para adquirir um avi�o com valor aproximado de US$ 23 milh�es.

Leonard apresentou seu plano ao milion�rio Todd Hoffman, com quem havia feito amizade durante uma viagem em que trabalhou como guia de alpinismo.

Hoffman, v�rios anos mais velho do que ele e muito mais experiente, fez as perguntas necess�rias para determinar a viabilidade do plano.

At� que uma dessas perguntas fez o plano ruir: o que aconteceria se a promo��o terminasse quando estivessem a ponto de reunir todos os r�tulos? O que fariam com milh�es de garrafas de refrigerante sem r�tulo?


John Leonard e Todd Hoffman
John Leonard (� esquerda) e Todd Hoffman (� direita) s�o amigos at� hoje (foto: Getty Images)

Pingue-pongue

Decepcionado, Leonard se deu por vencido. Mas, um dia, folheando o cat�logo da Pepsi, encontrou outro caminho.

A Pepsi oferecia a venda dos pontos em dinheiro — por US$ 0,10 cada, o que significava que os sete milh�es de pontos necess�rios para resgatar o avi�o custariam US$ 700 mil.

Hoffman fez o cheque, e eles enviaram para a Pepsi. Ali come�ou o que mais parecia uma partida de pingue-pongue em c�mera lenta.

A primeira resposta da Pepsi foi na linha "Que engra�ado! Aqui est� seu cheque e alguns cupons de brinde".

Leonard e Hoffman responderam da seguinte forma:

"Se n�o recebermos as instru��es de transfer�ncia em at� 10 dias �teis a partir da data desta carta, n�o teremos escolha a n�o ser iniciar um processo judicial contra a Pepsi."

Mas a empresa se adiantou, apresentando uma peti��o em Nova York, garantindo que um eventual processo legal ocorreria em um local conhecido por favorecer as empresas.

Com a peti��o, a Pepsi tentava obter "uma declara��o judicial que determinasse que ela n�o tinha a obriga��o de fornecer um jato Harrier ao solicitante", segundo consta no parecer final.

O caso gerou um frenesi na imprensa, que inicialmente retratava Leonard como Davi lutando contra Golias (a Pepsi). Mas, com o tempo, Leonard acabou sendo rotulado de oportunista, como algu�m que quis se aproveitar da pobre multinacional dos refrigerantes.


Logo da Pepsi
(foto: Getty Images)

Leonard x PepsiCo

A disputa judicial se estendeu por anos.

Ao longo do processo, Leonard chegou a recusar um acordo oferecido pela fabricante de refrigerantes.

Como Leonard e Hoffman tamb�m deram entrada em uma a��o no Estado da Fl�rida, as faculdades de direito americanas ensinam o caso at� hoje como "Leonard x PepsiCo" — e n�o o inverso.

Em certo momento, a disputa recebeu o apoio do advogado Michael Avenatti que, anos depois, ficaria famoso defendendo a atriz porn� Stormy Daniels em sua batalha judicial contra Donald Trump. Em 2022, Avenatti foi condenado por enganar quatro dos seus clientes, incluindo a pr�pria Daniels.

Mas quando Avenatti prop�s amea�ar a Pepsi usando um caso anterior em que a companhia n�o honrou a promessa de um pr�mio milion�rio a seus consumidores nas Filipinas, alegando um erro de inform�tica, Hoffman se recusou porque pareceu a ele que a estrat�gia seria uma chantagem.

O julgamento ocorreu, finalmente, em 1999, na jurisdi��o de prefer�ncia da Pepsi: Nova York.


Michael Avenatti e Stormy Daniels, em 2018
Michael Avenatti e Stormy Daniels em 2018 (foto: Getty Images)

O julgamento

Para Leonard e Hoffman, a possibilidade de ganhar a disputa contra o ex�rcito de advogados da Pepsi, suas seguradoras e a ag�ncia de publicidade era remota. Mas eles teriam mais chance se a decis�o fosse tomada por um j�ri formado por pessoas comuns.

Infelizmente para eles, a ju�za Kimba Wood descartou a possibilidade de fazer um julgamento com j�ri. E decidiu por um julgamento sum�rio.

Outra possibilidade que poderia ter sido vantajosa para Leonard eram os depoimentos — em que cada uma das partes faz perguntas � outra parte ou a testemunhas sob juramento.

Leonard havia descoberto que o mesmo comercial havia sido lan�ado no Canad�, mas incluindo as fundamentais letras min�sculas abaixo da express�o "jato de combate Harrier: 7.000.000 pontos Pepsi".

Al�m disso, a Pepsi j� havia alterado o comercial, acrescentando zeros — eram agora 700 milh�es de pontos pelo avi�o – e incluindo uma legenda dizendo "� brincadeira". As altera��es podiam ser interpretadas como admiss�o do erro.

Os executivos da ag�ncia de publicidade BBDO, criadora do an�ncio, poderiam ser interrogados sobre estas e outras decis�es — e eles poderiam defender melhor sua posi��o.

Mas a ju�za decidiu que j� tinha os fatos relevantes, de forma que tampouco permitiu os depoimentos.

Ap�s a audi�ncia, seguiu-se mais uma longa espera, at� que a ju�za Kimba Wood acabou decidindo a favor da Pepsi.

"Nenhuma pessoa imparcial poderia ter conclu�do razoavelmente que o comercial oferecia aos consumidores, na verdade, um avi�o Harrier", ela escreveu em um extenso documento, incluindo observa��es como:

"Nenhuma escola forneceria um espa�o de pouso para o avi�o de combate de um estudante, nem aprovaria a interrup��o que seria causada pelo uso do avi�o."

O que aconteceu?

Al�m de p�r fim ao sonho de Leonard, a ju�za Wood nos deixou sem saber por que a Pepsi cometeu esse erro.

Mas o produtor cinematogr�fico Andrew Renzi encontrou a resposta no document�rio Pepsi, Cad� Meu Avi�o? (2022), que fez para a Netflix.

Nele, o ex-diretor de cria��o da ag�ncia de publicidade encarregada dos an�ncios da Pepsi, Michael Patti, revelou que, originalmente, o n�mero de pontos mencionado no comercial relativo ao avi�o Harrier era de 700.000.000.000.000 (700 trilh�es).

Mas, quando o comercial foi apresentado � Pepsi na sala de edi��o, um dos executivos da empresa disse que era um n�mero dif�cil de ler.

Dois executivos da Pepsi que estavam presentes confirmaram no document�rio que foi o que aconteceu, mas ningu�m lembrava quem havia feito a observa��o.

Patti disse que explicou a eles que n�o precisava ser leg�vel, que n�o era preciso saber qual era o n�mero exato. Bastava "ver que era um 7 com muitos zeros para entender que era imposs�vel e engra�ado".

Mas ele n�o os convenceu.

Cortaram um zero, mas n�o pareceu suficiente. Depois cortaram outro, at� que todos concordaram que assim era melhor.

"Deveriam ter pensado melhor. A promo��o era deles. Passou pelo departamento jur�dico, que revisou [o an�ncio] para garantir que estava tudo certo", relembra Renzi.

Se tivesse tudo certo mesmo, o comercial de 1995 da Pepsi teria sido relegado ao esquecimento.


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