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'Kit intuba��o': 'Desativamos leitos de UTI para n�o ficarmos sem estoque'

Hospitais vivem incerteza em meio a cen�rio de escassez de medicamentos que garantem a sa�de de pacientes internados em estado grave com a COVID-19


15/04/2021 16:47 - atualizado 15/04/2021 17:12

Decisão sobre o momento de intubar é crucial. Se uso da ventilação mecânica for retardada demais, paciente pode lesionar o pulmão só pelo esforço para respirar, dizem médicos ouvidos pela BBC News Brasil(foto: REUTERS/Diego Vara)
Decis�o sobre o momento de intubar � crucial. Se uso da ventila��o mec�nica for retardada demais, paciente pode lesionar o pulm�o s� pelo esfor�o para respirar, dizem m�dicos ouvidos pela BBC News Brasil (foto: REUTERS/Diego Vara)

Em meio � escassez de medicamentos essenciais para pacientes intubados, os respons�veis pela Santa Casa de S�o Carlos (SP) decidiram, h� cerca de duas semanas, desativar seis dos 30 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) destinados a pacientes com a COVID-19.




Os respons�veis pelo local afirmam que a medida se tornou necess�ria para n�o faltar medicamentos aos pacientes que j� est�o intubados na unidade de sa�de.

"Fizemos isso porque temos enfrentado dificuldades para conseguirmos analg�sicos, sedativos e bloqueadores neuromusculares, que s�o fundamentais para pacientes intubados", diz o infectologista Vitor Marim, diretor-t�cnico do hospital.

Segundo Marim, os seis leitos que est�o vagos foram bloqueados no momento em que os pacientes que estavam neles receberam alta hospitalar.

"H� uma press�o muito grande para admitirmos novos pacientes. O nosso desejo � voltar aos 30 leitos. Mas a gente n�o consegue fazer isso agora, pela incerteza se teremos medicamentos suficientes para assistir os internados", declara o m�dico � BBC News Brasil.

A decis�o de diminuir as vagas na unidade � preocupante, em raz�o da tr�gica fila por um leito de UTI, na qual somente em mar�o morreram quase 500 pessoas em S�o Paulo. Por�m, Marim afirma que foi a �nica alternativa no atual per�odo. "Se esses leitos estivessem ocupados agora, certamente estar�amos sem medica��es", declara.

Mesmo com a redu��o de 20% no atendimento na UTI destinada a casos de COVID-19, Marim aponta que atualmente h� medicamentos para pacientes intubados somente pelos pr�ximos tr�s ou quatro dias.

"O estoque de anest�sico, principalmente, est� muito cr�tico", declara. Ele ressalta, por�m, que a situa��o � din�mica e que "a busca por fornecedores � incessante e di�ria", por isso acredita que a unidade logo deve conseguir abastecer o estoque.

A atual realidade da Santa Casa de S�o Carlos � um exemplo em meio a tantas outras unidades de sa�de que tamb�m vivem o drama da escassez de medicamentos que comp�em o chamado "kit intuba��o". Esse cen�rio tem sido registrado em todo o pa�s.

Nesta quarta-feira (14/4), S�o Paulo ganhou destaque em rela��o ao tema, ap�s o governo estadual solicitar os medicamentos com urg�ncia ao Minist�rio da Sa�de e afirmar que teve pedidos anteriores ignorados pelo governo federal.


Seis leitos de UTIs foram desativados na Santa Casa de São Carlos (SP) em razão da escassez de medicamentos para pacientes intubados(foto: Assessoria Santa Casa de São Carlos)
Seis leitos de UTIs foram desativados na Santa Casa de S�o Carlos (SP) em raz�o da escassez de medicamentos para pacientes intubados (foto: Assessoria Santa Casa de S�o Carlos)

Escassez do 'kit intuba��o'

Medicamentos do chamado "kit intuba��o" — como anest�sicos, sedativos e bloqueadores neuromusculares — s�o fundamentais para pacientes intubados porque garantem a chegada de oxig�nio aos pulm�es, como nos casos graves de COVID-19.

Diante do atual cen�rio no pa�s, o pior desde o in�cio da pandemia, a explos�o de interna��es pela COVID-19 fez com que o sistema de sa�de ficasse ainda mais sobrecarregado.

Cada vez mais, os medicamentos para pacientes em estado grave s�o utilizados. A partir de ent�o, eles viraram alvos de alertas sobre a possibilidade de se tornarem escassos.

Em mar�o deste ano, o Minist�rio da Sa�de tomou uma s�rie de medidas administrativas para centralizar as compras dos medicamentos que comp�em o chamado "kit intuba��o".

Com isso, todo o excedente de produ��o dos laborat�rios farmac�uticos que fabricam esses anest�sicos, sedativos e bloqueadores neuromusculares foi encaminhado para o Governo Federal, que ficou respons�vel por realizar a distribui��o aos Estados por meio do Sistema �nico de Sa�de (SUS).

Para o Minist�rio da Sa�de, na �poca sob o comando do ent�o ministro Eduardo Pazuello, a centraliza��o das compras de medicamentos do "kit intuba��o" seria uma forma de melhorar a distribui��o dos itens pelo pa�s.

Mas desde o m�s passado, os relatos sobre escassez desses medicamentos se tornaram cada vez mais comuns.

O secret�rio de Sa�de do Estado de S�o Paulo, Jean Gorinchteyn, afirmou nesta semana que a quantidade de medicamentos enviada ao Estado at� o momento � "�nfima".

Na ter�a-feira (13/4), o governo de S�o Paulo encaminhou um of�cio ao Minist�rio da Sa�de afirmando que precisava receber medicamentos do kit intuba��o em 24 horas para repor estoques e evitar o desabastecimento das medica��es nos hospitais.

Gorinchteyn disse que encaminhou, nos �ltimos 40 dias, nove of�cios ao Minist�rio da Sa�de sobre a situa��o e a redu��o cont�nua dos estoques. Apesar disso, ele afirma que n�o recebeu nenhuma resposta.

"� medida que o Governo Federal fez essa requisi��o emergencial, n�s perdemos a possibilidade de adquirir esses produtos. N�s atendemos os nossos hospitais estaduais, mas os munic�pios tamb�m est�o pedindo ajuda e n�s precisamos acolh�-los", declarou Gorinchteyn, em entrevista coletiva na quarta-feira (14/4).

O secret�rio de S�o Paulo afirmou que a situa��o no Estado � "grav�ssima". Ele disse que o sistema de sa�de est� na "imin�ncia do colapso" por causa da escassez desses medicamentos.

De acordo com Gorinchteyn, o Estado paulista precisa receber essas medica��es com urg�ncia para conseguir abastecer 643 hospitais pelos pr�ximos dez dias.

Durante a coletiva de quarta-feira, o governador de S�o Paulo, Jo�o Doria (PSDB), afirmou que o Minist�rio da Sa�de "cometeu um erro grav�ssimo" ao centralizar a compra e distribui��o dos medicamentos.

"Nenhum governo estadual, municipal ou institui��es privadas pode adquirir esses insumos porque as empresas receberam um confisco, um sequestro do Governo Federal. Gostar�amos de saber por que o Minist�rio da Sa�de n�o faz a distribui��o desse material aos Estados, que podem levar at� a ponta nos hospitais", declarou.

Nos �ltimos dias, representantes de Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Bahia e outros Estados tamb�m fizeram manifesta��es e alertas ao Minist�rio da Sa�de sobre a escassez dessas medica��es.

Esse cen�rio existe atualmente em todos os Estados, segundo o Conselho Nacional de Secret�rios de Sa�de (Conass).

Em nota � BBC News Brasil, o Minist�rio da Sa�de afirma que j� distribuiu mais de 8 milh�es de medicamentos "para intuba��o de pacientes ao longo da pandemia". Segundo a pasta, um grupo de empresas vai doar, nesta semana, mais de 3,4 milh�es de medicamentos, "que ser�o distribu�dos imediatamente aos entes federativos".

O Minist�rio da Sa�de afirma que est�o em andamento dois preg�es e uma compra direta desses medicamentos por meio da Organiza��o Pan-Americana de Sa�de (OPAS).

"A pasta esclarece que todos os acordos feitos para aquisi��o de medicamentos de intuba��o orotraqueal (IOT) respeitam a realidade de cada fabricante, os contratos fechados anteriormente e a necessidade do Brasil, contemplando hospitais p�blicos e privados nas regi�es com maior risco de desabastecimento", diz o comunicado do Minist�rio da Sa�de.

'Est� faltando em muitos locais'

Um m�dico intensivista que trabalha em UTIs de hospitais da Grande S�o Paulo afirma � BBC News Brasil que muitas unidades de sa�de da regi�o t�m enfrentado diversas dificuldades diante da escassez do "kit intuba��o".

"A atua��o est� muito complexa. Hoje mesmo estava com o pessoal de compra de um hospital e n�o conseguiram sequer uma ampola de bloqueadores musculares. O Minist�rio da Sa�de ordenou que as f�bricas repassem os medicamentos ao governo federal, por�m isso n�o est� chegando na ponta", critica o m�dico, que pediu para n�o ser identificado.

"A gente tem recorrido a drogas alternativas, que n�o usamos em condi��es normais. Isso virou uma realidade em grande parte do pa�s", acrescenta o m�dico.

Pelo pa�s, profissionais de sa�de t�m recorrido a medicamentos que normalmente n�o s�o usados em terapia intensiva para manter paciente em ventila��o mec�nica atualmente. Desta forma, medicamentos que j� estavam em desuso para esse fim voltaram a ser adotados em alguns locais, como Metadona (opioide), Diazepam (ansiol�tico) em comprimido, tiopental (barbit�rico usado para indu��o de anestesia geral), entre outros.


Sem sedativos, anestésicos e bloqueadores neuromusculares, a intubação é muito mais difícil e traumática(foto: Getty Images)
Sem sedativos, anest�sicos e bloqueadores neuromusculares, a intuba��o � muito mais dif�cil e traum�tica (foto: Getty Images)

O intensivista ouvido pela reportagem afirma que faltou organiza��o do Minist�rio da Sa�de em rela��o aos medicamentos.

"Chegamos � atual situa��o porque houve aumento mundial no consumo dessas drogas, mas isso era admiss�vel. O governo federal deveria ter colocado as f�bricas para at�, se poss�vel, quintuplicar as produ��es dessas drogas no Brasil ou importar para ter um estoque estrat�gico. Era preciso ter vis�o estrat�gica", diz.

O m�dico diz que o cen�rio de escassez do "kit intuba��o" aumenta a mortalidade nas unidades de sa�de. Ele afirma que essa situa��o supera at� a j� preocupante m�dia de 80% de mortes entre os infectados que precisam de ventila��o mec�nica no Brasil, conforme revelou levantamento feito em 2020 pelo pesquisador Fernando Bozza, da Fiocruz — a m�dia mundial � de, aproximadamente, 50% de �bitos nesse est�gio da doen�a.

"Posso dizer que est� faltando muitos (medicamentos) em muitos locais. Isso faz com que a qualidade da assist�ncia fique p�ssima. N�o � toa a mortalidade em v�rios locais est� acima de 90% em quem � intubado", declara o intensivista.

Dificuldades para adquirir medica��es

Na Santa Casa de S�o Carlos, cujos atendimentos s�o por volta de 80% relacionados ao SUS, os estoques duravam de sete a 10 dias no ano passado, em meio � pandemia. "Se precisasse, a gente conseguia buscar o material, pois sabia onde encontrar", afirma o infectologista Vitor Marim.

Agora, al�m de alguns medicamentos terem aumentado at� 500% em raz�o da alta demanda, os respons�veis pelos hospitais enfrentam dificuldades para encontrar os f�rmacos.

"Hoje, nem se tiv�ssemos muito dinheiro conseguir�amos encontrar com facilidade, por causa da escassez no mercado", declara Marim.

No fim de mar�o, por exemplo, a unidade de sa�de de S�o Carlos precisou receber anest�sicos de outros dois hospitais da regi�o porque n�o tinha o medicamento para a intuba��o de pacientes com a COVID-19. Situa��o semelhante j� foi registrada em outras unidades de sa�de de S�o Paulo, como a Santa Casa de Limeira, que tamb�m precisou pedir medicamentos a outros hospitais.

Um levantamento feito com 300 hospitais filantr�picos nesta semana pela Federa��o das Santas Casas e Hospitais Beneficentes de S�o Paulo (Fehosp) apontou que as unidades de sa�de do Estado entraram em contato com mais de 22 fornecedores de medicamentos no in�cio desta semana e n�o encontraram possibilidade de compra.

Segundo a Fehosp, a Secretaria de Sa�de do Estado de S�o Paulo tem auxiliado, mas n�o tem conseguido grandes volumes dos f�rmacos.


UTI em São Paulo; pesquisa com farmacêuticos de hospitais paulistas despertou preocupação com o desabastecimento de medicamentos cruciais(foto: Reuters)
UTI em S�o Paulo; pesquisa com farmac�uticos de hospitais paulistas despertou preocupa��o com o desabastecimento de medicamentos cruciais (foto: Reuters)

"Estamos batalhando por importa��es que est�o sendo lideradas pela Confedera��o das Santas Casas, mas os estoques no exterior tamb�m n�o est�o dispon�veis e tememos pelo pior. Se o volume de interna��o n�o cair rapidamente, n�o conseguiremos repor os estoques e ser� uma situa��o tr�gica", afirmou o diretor-presidente da Fehosp, Edson Rogatti, em nota encaminhada � imprensa.

O levantamento da Fehosp apontou que mais de 160 hospitais consultados tinham estoques de anest�sicos, sedativos e relaxantes musculares para, em m�dia, tr�s a cinco dias de dura��o. Al�m disso, os respons�veis pelas unidades tamb�m relataram que os antibi�ticos estavam come�ando a ficar escassos.

Segundo a federa��o, alguns dos hospitais que est�o operando com estoques de dois a tr�s dias est�o localizados em cidades como Mat�o, Guaruj�, Votuporanga, Presidente Epit�cio, Fernand�polis e Rio Preto.

Conforme a Fehosp, s�o raros os locais de S�o Paulo que possuem estoque para 10 dias. Al�m disso, a entidade alerta que as unidades que afirmam ter medicamentos para cerca de oito dias s�o os hospitais maiores, que recebem grande volume de novas interna��es diariamente e nos quais o estoque pode cair "bruscamente de um dia para o outro".

O temor de faltar qualquer alternativa de medicamento � constante para profissionais de sa�de que atuam em hospitais com pouco estoque do "kit intuba��o".

Vitor Marim, que est� na linha de frente na Santa Casa de S�o Carlos, comenta que uma das maiores dificuldades � come�ar um tratamento e n�o saber se aquela prescri��o ser� executada at� o fim, em raz�o da possibilidade de que a medica��o acabe em poucos dias.

"Diariamente avaliamos o que podemos usar hoje ou amanh�. Daqui a dois dias, pode ser que n�o tenha mais aquela medica��o e precisaremos alternar com outra", diz o infectologista.

"O tratamento atual tem uma complexidade muito maior, porque n�o sei se terei medicamento para daqui a dois ou tr�s dias", acrescenta.

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