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Estado de Minas COVID-19

Empres�rio brasileiro gasta R$ 450 mil para vacinar fam�lia nos EUA

Diante de escassez de imunizantes no Brasil, turistas de classe A e B enfrentam quarentena no M�xico e altos custos em busca de doses em territ�rio americano


17/05/2021 18:35 - atualizado 17/05/2021 18:35

Empresário gastou R$ 450 mil para vacinar família nos Estados Unidos(foto: Getty Images)
Empres�rio gastou R$ 450 mil para vacinar fam�lia nos Estados Unidos (foto: Getty Images)

Quase meio milh�o de reais. Foi esse o custo que um empres�rio da constru��o civil de S�o Paulo bancou para levar a fam�lia para tomar a vacina contra a COVID-19 nos Estados Unidos. O valor da jornada dos sete adultos e duas crian�as – que incluiu 15 dias no M�xico para cumprir quarentena imposta pelas autoridades americanas - seria o suficiente para comprar 45 mil doses de CoronaVac, o imunizante mais usado no Brasil at� agora.

"Coloca um nickname a� pra mim porque n�o quero confus�o para o meu lado, j� tenho cinco stents no cora��o", afirmou � BBC News Brasil o dono de incorporadoras e imobili�rias com capital social declarado de mais de R$ 10 milh�es, a quem chamaremos nesta reportagem de Roberto*.


Aos 60 anos, Roberto � o patriarca de uma fam�lia que qualifica como "unida e conservadora". Ele, a mulher, de 57, as tr�s filhas do casal, com idades entre 24 e 35 anos de idade, e dois genros embarcaram para o M�xico em meados de abril, pouco antes que o pa�s batesse a marca de 400 mil mortos na pandemia.

"V�rios amigos nos EUA e o gerente do banco me alertaram que eu conseguiria tomar as doses l� e j� est�vamos ficando loucos trancados em casa", diz Roberto, que relata ter cumprido quarentena rigorosa, em uma casa de campo, por mais de um ano.

Ele tem comorbidades: al�m de problemas card�acos, � obeso. E via no novo coronav�rus uma amea�a grave, especialmente "depois que um amigo de 48 anos, semiatleta e sem problemas de sa�de, faleceu de COVID".

E embora sua vez na fila n�o estivesse distante no calend�rio vacinal do governo federal, Roberto n�o queria deixar o restante da fam�lia para tr�s - para a filha de 24, por exemplo, n�o h� nem previs�o de imuniza��o no pa�s.

"Meu pai foi claro em dizer que queria que todos tivessem a vacina. N�o fazia sentido uma parte da fam�lia estar protegida e a outra n�o. Por isso todo mundo tinha que ir junto. E dinheiro n�o era uma quest�o, ent�o depois que ele prop�s, embarcamos em apenas quatro dias", diz J�ssica*, filha de Roberto.

Todos receberam a vacina de dose �nica da Janssen em Orlando, na Fl�rida. "Quando chegamos aos EUA, nem deixamos as malas na casa em que ficar�amos, fomos direto para o posto de vacina��o", completa J�ssica.


O empresário Douglas Moretto, de 42 anos, tomou a vacina da Pfizer em Orlando antes que sua mãe, de 63, fosse vacinada no Brasil(foto: Arquivo Pessoal)
O empres�rio Douglas Moretto, de 42 anos, tomou a vacina da Pfizer em Orlando antes que sua m�e, de 63, fosse vacinada no Brasil (foto: Arquivo Pessoal)


O empres�rio endossa o coment�rio da filha. Chega a mencionar um sonho premonit�rio de que um dos sete integrantes do cl� se contaminava.

"Eu tinha o dinheiro e me culparia eternamente se algo acontecesse com minha fam�lia porque n�o os levei para tomar a vacina", diz.

Escassez de vacina no Brasil

Com apenas 18% da popula��o imunizada com ao menos uma dose, o Brasil enfrenta uma escassez de insumos para produzir imunizantes tanto no Instituto Butantan (CoronaVac) quanto na Fiocruz (Astrazeneca-Oxford).

O pa�s tamb�m poderia j� ter recebido mais lotes da vacina da Pfizer, mas, conforme relatou o ex-presidente da farmac�utica � CPI da COVID ao longo da �ltima semana, a gest�o Bolsonaro recusou seis ofertas de doses da Pfizer at� fechar o primeiro contrato, apenas em mar�o desse ano.

O cen�rio de alta mortalidade associada � falta de perspectiva de acesso ao imunizante fez com que brasileiros da classe A e B passassem a estudar formas de obter vacinas fora do pa�s.

Segundo a agente de viagens M�rcia Rosa, de 53 anos, ela chegou a fechar viagens para brasileiros irem aos Emirados �rabes Unidos em busca da vacina, antes que ficasse claro que nos EUA tamb�m seria poss�vel ser vacinado como turista.


Rosa viralizou nas redes sociais na semana passada com a campanha de sua ag�ncia, a Flytour, que oferecia: "Embarque imediato: M�xico + Nova York para a vacina".


A oportunidade estaria acess�vel para quem topasse desembolsar R$ 18.728 (que poderiam ser divididos em at� 10 parcelas): quase R$ 1 mil por dia, j� que o pacote previa dura��o de 21 dias para a empreitada.

"Era o necess�rio para cumprir o tempo de quarentena exigida pelos americanos e tomar a vacina com calma, se recuperar de qualquer efeito colateral antes de voltar", disse Rosa � BBC News Brasil.


Em menos de uma semana ela afirma ter recebido centenas de consultas e fechado 13 pacotes. "A maioria dos nossos clientes s�o pessoas entre 24 e 42 anos, que n�o t�m nem perspectiva de se vacinar no Brasil. E agora que os EUA liberaram vacina a partir dos 12 anos, h� muitos pais de adolescentes em busca tamb�m", explica Rosa.


Ela mesma se vacinou recentemente em Nova York. A ag�ncia oferece aux�lio para que o turista fa�a os agendamentos necess�rios para a aplica��o.

"A gente deixa claro que a vacina n�o � o nosso produto, o que a gente vende � a possibilidade de se vacinar", diz a agente.


Em quase 30 anos no mercado de turismo, Rosa conta que esta foi sua campanha de maior sucesso - e tem esperan�a que o �xito a ajude a reverter o tombo que a pandemia representou nos neg�cios. De olho na mesma oportunidade, j� h� outras empresas no mercado com pacotes de viagem semelhantes.

Clima de 'quem d� mais' para vacinar nos EUA

E se brasileiros da classe A e B t�m se mostrado dispostos a gastar polpudas somas para conseguir vacina no bra�o o quanto antes, nos EUA a situa��o � oposta. As autoridades t�m se desdobrado em solu��es criativas para atrair a popula��o aos postos de vacina��o.


Na �ltima quinta-feira, o governador de Ohio, o republicano Mike Dewine, anunciou a que talvez seja a mais ambiciosa dessas medidas at� agora.

Com apenas 36% da popula��o completamente vacinada e uma baixa demanda pelos imunizantes contra COVID-19, o Estado resolveu que, a partir do pr�ximo dia 26, ir� sortear US$ 1 milh�o por semana entre quem tiver se apresentado em um dos postos de vacina��o nos sete dias anteriores ao sorteio.

A loteria durar� cinco semanas. E como os EUA agora come�am a vacinar adolescentes a partir de 12 anos, caso o vencedor do sorteio tenha entre 12 e 18 anos, o pr�mio ser� o pagamento total das mensalidades dos quatro anos de universidade (que s�o famosas por serem t�o boas quanto caras), mais o suficiente para o custeio de alimenta��o, livros e moradia durante todo o per�odo universit�rio.


Outros governantes e empresas tamb�m ofereceram incentivos - incluindo ingressos para jogos esportivos, vale-presente, bolos de palito gr�tis e, em Nova Jersey, quem comparecesse a um posto de vacina��o saia de l� imunizado e com uma cerveja em m�os.


"Huuummmm… Vacina��o! Eu estou sentindo uma coisa muito boa em rela��o � vacina��o nesse momento", afirmou o prefeito de Nova York Bill de Blasio em um v�deo divulgado na �ltima semana. Entre uma mordida e outra de um hamb�rguer e batatas fritas da rede Shake Shack, ele contava � popula��o local que quem aparecesse pra vacinar ganharia um combo como aquele da lanchonete.


As estat�sticas mostram que os incentivos s�o necess�rios: embora apenas 60% da popula��o adulta tenha recebido ao menos uma dose de imunizante, a procura por vacinas j� caiu significativamente nos EUA.

Se, no in�cio de abril, a m�dia nacional de vacina��o di�ria era de 3,4 milh�es de doses, agora, esse n�mero caiu para 2,2 milh�es de vacinas aplicadas por dia. Diferentes pesquisas mostram que cerca de 20% dos americanos n�o pretendem se vacinar.

O percentual � considerado alto pelas autoridades sanit�rias do pa�s, que temem a possibilidade de uma nova onda de COVID-19 por causa dessa recusa.

"Os americanos est�o praticamente la�ando as pessoas na rua pra tomar vacina. Eu fiquei chateado de ver, � uma coisa descabida pensar que aqui est�o te oferecendo isso sem parar enquanto no Brasil as pessoas est�o implorando por vacina e n�o tem", diz o empres�rio brasileiro Douglas Moretto, de 42 anos.

O fator Bolsonaro

Por ter uma filha de 3 anos nascida nos EUA, Moretto p�de entrar em territ�rio americano no come�o de abril sem enfrentar a quarentena em um terceiro pa�s.

Ele embarcou com a filha e a mulher para Orlando, onde j� recebeu duas doses do imunizante da Pfizer.


"Na hora ningu�m nem te pergunta nada. Os americanos querem resolver o problema, n�o querem saber se voc� � turista, se � residente. Se tivesse vacina no Brasil, eu n�o viria. Me senti at� um pouco ego�sta por ter tido uma oportunidade dessas, incomum. Tomei a vacina antes da minha m�e, que tem 63 anos", relata Moretto.


Tanto ele quanto Roberto votaram em Bolsonaro em 2018 e se dizem decepcionados com as a��es do governo federal em rela��o � vacina��o.

"Ele foi um pouco est�pido de ir contra a vacina e investir em rem�dio sem efic�cia", diz Moretto, em refer�ncia ao investimento do presidente em drogas como a hidroxicloroquina e a ivermectina.


J� Roberto contemporiza. Diz que Bolsonaro errou ao n�o sentar para negociar com a Pfizer as condi��es do contrato, mas que seu erro n�o foi t�o relevante para o resultado final da pandemia no pa�s.

"N�o ia mudar tanto assim, no m�ximo reduziria entre 3% e 5% das mortes at� agora", especula o empres�rio. Se sua conta estivesse certa, isso representaria ter salvo a vida de algo entre 13 mil e 22 mil brasileiros.


"Eu gostaria que todo brasileiro tivesse a mesma condi��o de vacinar que eu. E gostaria que o Brasil fosse como os EUA, mas infelizmente n�o �", diz o dono de incorporadoras.


E embora as decis�es de Bolsonaro tenham arrancado R$ 450 mil de seu bolso, ele � taxativo em dizer que entre o atual mandat�rio e o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT), que emerge como principal for�a de oposi��o em 2022, vai de Bolsonaro nas urnas de novo.

"Esse outro (Lula) eu abomino. � tudo o que eu e minha fam�lia n�o queremos", diz.


Reduto bolsonarista em 2018, a Fl�rida vive hoje uma divis�o em rela��o a Bolsonaro.

Para o brasileiro Richard Harary, CEO da Macrobaby, uma loja varejista de artigos para beb� sediada em Orlando, o sentimento de decep��o � a t�nica entre os brasileiros que procuram vacina no pa�s.


O estabelecimento de Harary � um dos pontos de vacina��o anti-covid na Fl�rida. Por dia, entre 200 e 300 pessoas recebem suas doses entre araras de macac�es, chupetas e carrinhos de beb�. A esmagadora maioria � de brasileiros.

"As autoridades aqui nos procuraram para propor que a gente oferecesse esse servi�o justamente para acessar mais a comunidade brasileira, tanto de turistas como de migrantes que moram aqui em situa��o irregular e estavam com medo de se vacinar e acabar deportados", explica Harary.


Depois de apoiar o atual presidente, ele conta que come�ou a se desiludir com o atual governo bem no in�cio da pandemia, durante a visita do mandat�rio brasileiro � Fl�rida, em mar�o de 2020. "Quando ele esteve em Miami, eu estava l� entre os empres�rios que o receberam. Morri de medo porque um dos assessores dele j� estava contaminado e tinha passado horas do meu lado", diz.


De acordo com o empres�rio, a loja j� recebeu mais de 2 mil consultas de brasileiros que est�o deixando o pa�s em breve ou j� est�o em quarentena no M�xico ou na Costa Rica para se vacinar ali.

"As pessoas est�o sem esperan�a de conseguir se proteger no Brasil. Todo mundo, inclusive eu, conhece algu�m que morreu da doen�a. Quem tem condi��o, vai buscar tomar fora mesmo. O pa�s n�o merecia isso, merecia um governo melhor. O que o Bolsonaro fez, na minha opini�o, foi dar oportunidade para o outro lado, da esquerda, voltar com for�a. � triste", afirma Harary.


*O nome dos entrevistados foi alterado para preservar suas identidades.






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