
Miami se divide entre a perplexidade, a dor e a descren�a.
O Champlain Towers South, um edif�cio de 100 unidades � beira-mar, desabou parcialmente na madrugada de quinta-feira (24/6). A partir de ent�o, foi iniciada uma das maiores opera��es de salvamento e resgate na hist�ria recente do condado de Miami Dade.
Enquanto parentes de mais de 100 pessoas esperam por not�cias de seus familiares, outras pessoas vivem o luto pela perda de entes queridos. Muitos se perguntam: como explicar o colapso da constru��o de 12 andares?
Isso pode incluir problemas estruturais do edif�cio (que tem 40 anos), assim como poss�veis sumidouros, constru��es na �rea e at� fatores ligados �s mudan�as clim�ticas.
Um laudo pericial feito em 2018, e publicado na noite da �ltima sexta-feira (25/06), mostrou que na �poca um engenheiro encontrou "grandes danos estruturais", muitos deles associados ao impacto do salitre, da umidade e da corros�o devido � proximidade com o mar.
Ap�s o desabamento, a m�dia local tamb�m noticiou um estudo realizado em 2020 pela Universidade Internacional da Fl�rida (FIU, por suas siglas em ingl�s) no qual o ge�logo Shimon Wdowinski detectou um afundamento de at� 2 mil�metros por ano na �rea em que o Champlain Towers est� localizado.
Segundo Wdowinski, o edif�cio foi o �nico local da �rea em que foi detectado esse fen�meno entre 1993 e 1999, per�odo em que o estudo se baseou.
O especialista esclarece, por�m, que apenas isso n�o explica a trag�dia.
A BBC News Mundo, servi�o em espanhol da BBC, conversou com Wdowinski para saber mais a respeito do estudo desenvolvido por ele, o que pode significar para outras �reas afetadas por afundamentos e para o futuro de Miami.
Confira abaixo a entrevista com o ge�logo:

BBC - Por que o senhor estudou essa �rea do edif�cio que desabou?
Shimon Wdowinski - O estudo que fizemos buscava determinar os n�veis de subsid�ncia — afundamento da superf�cie — como parte de uma investiga��o sobre o impacto e os custos das inunda��es costeiras em raz�o das mudan�as clim�ticas. Estudamos toda a ilha de Miami Beach durante um per�odo de seis anos (1993 a 1999) e usamos isso para detectar movimentos nas comunidades que s�o impactadas por enchentes na regi�o.
Portanto, o prop�sito era ver o quanto essa subsid�ncia impacta, como ela contribui para as inunda��es e identificar as �reas em que isso � mais frequente.
BBC - O que o senhor encontrou em particular sobre o Champlain Towers South?
Wdowinski - O estudo n�o se concentrou naquele edif�cio em particular, mas o Champlain se destacou como um dos locais que mais apresentou afundamento, cerca de dois mil�metros por ano.
N�o � muito, mas n�o sabemos o que ocorreu depois de 1999, em que n�vel continuou a afundar, se continuou a afundar e como isso pode ter afetado as suas funda��es e estrutura.
BBC - Em alguns lugares, como a Cidade do M�xico, o n�vel de afundamento do solo � muito mais alto do que o que foi detectado nessa �rea. No entanto, existem constru��es, desde mans�es coloniais a catedrais que t�m mais de tr�s s�culos e existem at� hoje. Como ent�o esse afundamento pode ter contribu�do para que o pr�dio desabasse?
Wdowinski - N�o � t�o comum que os edif�cios que sofrem com algum tipo de subsid�ncia desabem. Na verdade, � muito incomum.
O que sugerimos com o estudo � que o movimento do pr�dio n�o come�ou pouco antes do colapso.
Houve alguns processos que afetaram a estrutura da constru��o por um longo per�odo. E talvez um ponto foi alcan�ado onde a estrutura n�o pode suportar a carga e colapsou. Mas isso � um problema estrutural. N�o s�o coisas que estudo.
O que sabemos � que o edif�cio que desabou em Miami estava afundando havia d�cadas, mas somente isso n�o explica o desabamento.
BBC - Ap�s o colapso, e tamb�m com os resultados da investiga��o sobre o desabamento, muitas pessoas que moram em Miami se perguntam se outros edif�cios pr�ximos tamb�m podem estar em perigo.
Wdowinski - Olhando o mapa que publicamos em nossa investiga��o, h� outros pontos que aparecem como risco de subsid�ncia, mas n�o naquela regi�o. Esse foi um ponto muito espec�fico.
Tamb�m quero lembrar que com essa pesquisa estamos falando de algo que ocorreu h� 20 ou 30 anos. N�o temos dados para saber o que ocorreu ap�s esse per�odo investigado.
No entanto, eu diria que o que vimos foi um movimento muito peculiar naquele edif�cio que n�o vimos nos outros.
BBC - Vamos falar um pouco sobre as tecnologias que o senhor usou. Como � poss�vel detectar que um edif�cio est� afundando?
Wdowinski - Temos uma tecnologia chamada radar interferom�trico de abertura sint�tica (ou InSAR) que se baseia em um radar que envia sinais do espa�o que logo s�o comparados com outras observa��es que o sat�lite faz no mesmo lugar no espa�o.
S�o enviados sinais que atingem o solo, �rvores ou edif�cios, qualquer objeto na superf�cie, e ent�o alguns desses sinais voltam ao sat�lite.
Dessa forma, � poss�vel detectar pequenos movimentos da ordem de cent�metros ou mil�metros. � assim que � poss�vel identificar edif�cios que est�o sofrendo afundamento e que podem ser comprometidos por isso no futuro.

BBC - Mas como isso poderia ser comprometido por esses pequenos afundamentos? Se voltarmos ao exemplo do M�xico, o n�vel de afundamento da capital � de v�rios cent�metros por ano e s� vimos edif�cios como esse cair durante terremotos.
Wdowinski - � surpreendente que a Cidade do M�xico esteja afundando nesse ritmo e milh�es de pessoas continuem vivendo por l�. Seus engenheiros est�o acostumados com isso e est�o construindo edif�cios que respondam a essas circunst�ncias. Devem assegurar-se de que o edif�cio n�o est� constru�do sob bases suficientemente fortes para que possa afundar junto com a superf�cie.
Por�m, acontece que algumas linhas de metr� foram constru�das com uma base muito s�lida e isso est� se tornando um problema. Temos outro estudo que est� sendo analisado no sistema de metr� e como algumas linhas da Cidade do M�xico est�o em condi��es muito cr�ticas devido ao afundamento.
Na verdade, a linha que colapsou no m�s passado estava entre um dos lugares que identificamos como um dos mais perigosos do sistema de metr� da cidade. Infelizmente, o estudo n�o p�de ser publicado antes do acidente acontecer.
BBC - Por�m, o artigo alertando sobre o afundamento do edif�cio Champlain Towers South foi publicado antes do desabamento. Houve alguma rea��o das autoridades ap�s o estudo? Alguma a��o ou outra investiga��o foi feita para determinar o impacto ou o perigo de subsid�ncia detectado?
Wdowinski - A pesquisa que fizemos tratou do perigo de inunda��es costeiras. Poranto, o foco desse estudo era compreender o quanto a subsid�ncia da terra contribuiu para as inunda��es. � assim que o apresentamos e como o discutimos em f�runs cient�ficos.
� agora, depois do acidente, que o estudo assume essa outra dimens�o que n�o foi a que propusemos originalmente.
Mas acreditamos que a tecnologia que usamos poderia ser utilizada para detectar situa��es semelhantes.
BBC - Miami Beach � uma das �reas mais afetadas por esse problema, segundo o seu estudo. Por que isso acontece em uma ilha que �, contraditoriamente, uma das �reas mais caras do Sul da Fl�rida?
Wdowinski - Miami Beach foi constru�da em uma ilha-barreira que � um terreno natural. A parte oriental da cidade, que � uma eleva��o mais alta, � constru�da sobre rochas calc�rias.
A parte oeste da cidade foi constru�da em �reas �midas recuperadas. Ou seja, quando a cidade se expandiu, arrasaram o manguezal. Eles colocaram terra e constru�ram outros bairros ali.
Portanto, essa parte da cidade n�o se assenta sobre rochas muito fortes e � por isso que temos cada vez mais afundamentos e inunda��es na parte ocidental da ilha.
Al�m disso, h� o fato de que a �rea onde Surfside, Miami Beach e outras comunidades est�o localizadas em uma eleva��o muito baixa e o calc�rio � muito poroso. Isso significa que n�o podemos usar o modelo da Holanda, onde se constroem diques, porque a �gua pode vir de baixo.
Outras estruturas precisam ser projetadas, como barreiras, esta��es de bombeamento e sistema de drenagem.

BBC - O que pode acontecer nos pr�ximos anos com as mudan�as clim�ticas, a eleva��o do n�vel do mar e a subsid�ncia nessa regi�o?
Wdowinski - Essa � a raz�o para que a gente tenha feito o estudo, porque estamos preocupados com a cidade e outras comunidades na Fl�rida e ao longo da costa atl�ntica.
Agora enfrentamos o que chamam de situa��o intermedi�ria, em que se espera que os n�veis do mar aumentem na taxa anual nos pr�ximos 20 ou 30 anos.
A longo prazo, depende da rapidez com que o n�vel sobe.
Tudo depende de como as pessoas respondem ao chamado para reduzir a quantidade de emiss�o de carbono. Temos diferentes cen�rios de como as mudan�as clim�ticas e o derretimento das regi�es polares impactar�, mas quase todos eles representam uma grande amea�a tanto para Miami Beach quanto para muitas outras comunidades.

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