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A subtra��o como estrat�gia narrativa no livro 'A menina chinesa'

Em v�rias camadas, o livro de Anelito de Oliveira nos verte � posi��o de um urso-polar perdido no sert�o


postado em 13/12/2019 04:00 / atualizado em 13/12/2019 10:02

O escritor, professor e ensaísta mineiro Anelito de Oliveira(foto: Arquivo Pessoal)
O escritor, professor e ensa�sta mineiro Anelito de Oliveira (foto: Arquivo Pessoal)
Instintivamente, eu buscava a equaliza��o e a ordena��o de um discurso em A menina chinesa (P�ginas Editora), de Anelito de Oliveira, mas, frustrada pela din�mica de “dar e tomar” nesses relatos, apercebi-me de que, mais do que acomodar as narrativas em blocos conceituais mais ou menos uniformes, esse livro se serve a outras menta��es. Quando semiarmadilhada de que seu narrador n�o sabia das coisas da literatura, sou acometida por uma constru��o narratol�gica extremamente consciente, mas disfar�ada por um discurso de uma ilus�ria despretens�o sobre a pr�pria escrita.

O que segura a literatura � o fato de ela s�-lo como um artif�cio que se descompromete com a realidade do “mundo administrado”, de Andre Breton, mas que mant�m um ou outro ponto de contato com aquele, penso. Em A menina chinesa (2019), os relatos s�o uma am�lgama desconectada entre si; os pontos de contato com a realidade s�o tentadores � contextualiza��o sociopol�tico e cultural; as urinas, os cachorros e as n�voas se repetem desambiciosamente. Ou n�o.

Os textos se d�o � por subtra��o: esse artif�cio se vislumbra n�o necessariamente pela presen�a do “n�o”, mas pelo conjunto de despetalamentos com os quais os elementos da narrativa se constroem, causando uma sensa��o de aus�ncia, de escuro, de titubeio, de menos, de abandono, de apequenamento, de procura, de anula��o, de mudez; h� uma retic�ncia, uma interroga��o com valor de retic�ncia, do jornalista (n�o) afirmado (n�o) amigo, dos par�nteses, do n�o barulho dos sorrisos mudos. Mas o que (n�o) se fala � que o discurso da subtra��o � um discurso de resist�ncia, pois, o n�o dizer e o n�o lugar s�o tamb�m todos os dizeres, todos os lugares. Coisas ditas. Desditas. Ainda a dizer. Coisas.

A din�mica do cl�max � minguada. Tanto macroestruturalmente quando os cap�tulos cont�m hist�rias independentes entre si e que n�o necessariamente se evoluem em reciprocidade, como microestruturalmente, pois, no corpo de seus textos h� v�rios coitos que s�o interrompidos e redirecionados, provocando-nos um processo de gastura que �, por�m, viciante. � como se algo faltasse, mas algo sobrasse, um aborto. Contudo, � essa mesma subtra��o que tamb�m pode corroborar v�rios �pices disseminados em projetos de tr�ades e de d�ades, um, um/outro, outro/um. Ou n�o.

O livro estruturalmente assim se disp�e: h� primeiro um conjunto de elucubra��es te�rico-liter�rias travestidas de relatos; em seguida, narrativas curtas e semicurtas geralmente encerradas com desempolga��o ou com uma palavra solit�ria; depois disso h� o converseiro em “Igualzim eu te falei”, �nico texto, penso, que em vez de se ausentar de cl�max, espalha-o; isso porque a narrativa � ficcionalmente motivada por um ditado oral transcrito fidedignamente, emulando todas as recursividades da fala, como sua espontaneidade, aglutina��o de pautas, a despreocupa��o com a �nfase de um ou outro ponto ou a multiplica��o de seus �pices. Por fim, h� um relato provocado por uma invoca��o do “mundo administrado”, a do pintor Diego Rivera, em que a certa altura releva sua rela��o com a narrativa ou n�o.

Em v�rias camadas, A menina chinesa (2019) nos verte � posi��o de um urso-polar perdido no sert�o, quando somos aquela menina que nada tinha a ver com aquele lugar, a menina chinesa. Chinesa? Negra? Nele, de vez em quando, pressinto um empenho quase fant�stico, quase sinest�sico, mas n�o d� tempo e nem sobra espa�o, pois a temporalidade � marcada pela m�e rec�m-morrida e a espacialidade pelo (n�o) lugar Manguidau Dois, aquele que � acessado pelo processo nebuloso da mem�ria e do del�rio de coisa-com-coisa.

H� uma penetra��o na noite e as narrativas excedem consideravelmente algumas premissas  tradicionais. Todas as vezes em que somos tentados a nos contextualizar n�o ficcionalmente, e a dar nomes e motiva��es menos liter�rias aos textos, frustramo-nos positivamente, pois isso se torna secund�rio, uma vez que imediatamente somos convidados a reflex�es mais universais e mais existenciais, pelas quais j� fomos desavisadamente engolidos naquela madrugada inicial.

Creio mesmo � que h� uma sensa��o generalizada de desarraigamento, tanto pelo despertencimento ou superpertencimento que se deflagra numa investida de busca: do outro, da morte, da suposi��o, da inexatid�o, do quase e da concomit�ncia. Do tudo, do nada, do pouco de um e de outro, do tudo e do nada ou de uma terceira margem. Ideia similar � subtra��o que ao negar, abre-se. Quanto, e com mesma intensidade, como que datas, nomenclaturas, cita��es, lugares e acontecimentos que juram uma veracidade jornal�stica s�o difundidos nas narrativas: Engenheiro Navarro, Montes Claros, Belo Horizonte, Curitiba, S�o Paulo etc. etc.

Isso porque se ambos os artif�cios ajuntarmos temos uma lida inusual com o tempo, o espa�o e a constru��o das personagens dessas narrativas, aquela mesma do “dar e tomar” de que falei no come�o. O que se constr�i aqui � uma teoria das cordas da literatura, j� que aqueles componentes narrativos parecem ter menos a ver com sua linearidade compuls�ria e mais com a possibilidade de que se movimente entre eles, em busca de, do regresso, da viagem, do outro lado, do fogo, do labirinto que parece se estreitar, rumo � sina e � possibilidade de poder regressar a um outro lugar. Posso divisar.

*Fl�via Figueir�do � doutora em letras pela Universidade Federal de Juiz de Fora


Lan�amento
S�bado (14/12), �s 18h, no Sab�tico – Rua Sapuca�, 153, Floresta.


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