(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas VERSOS

Helo�sa Buarque de Hollanda reedita colet�nea de poetas

Ensa�sta re�ne novas vozes femininas que marcaram os anos 1970


19/02/2021 04:00 - atualizado 19/02/2021 11:05

Heloisa Buarque de Hollanda(foto: Fotos: Cia. das Letras/Divulgação)
Heloisa Buarque de Hollanda (foto: Fotos: Cia. das Letras/Divulga��o)
Os versos da poeta carioca Ana Cristina Cesar (1942-1983) enunciam caminhos, principalmente, para as mulheres que buscam na palavra uma forma de reinven��o do mundo. Dois livros organizados pela pesquisadora Helo�sa Buarque de Hollanda, com a diferen�a de quase cinco d�cadas entre eles, mostram a poesia como um campo de partilha do sens�vel.

A tarefa de dar a ver a si e ao outro, portanto, al�m de est�tica se torna pol�tica se tomarmos as reflex�es do fil�sofo franc�s Jacques Ranci�re. As antologias foram lan�adas nessa quinta-feira (18/2): a reedi��o de “26 poetas hoje”, que completa 45 anos, e “As 29 poetas hoje”, como parte da cena da poesia contempor�nea.

Os dois livros, inclusive, nascem desse entendimento de Helo�sa, que busca entender a pol�tica a partir de pequenas revolu��es. Foi o que fez com que ela buscasse 26 poetas na d�cada de 1970, da chamada gera��o mime�grafo ou gera��o marginal. � essa busca que a guia no s�culo 21, quando os feminismos prop�em mudan�as na estrutura das sociedades capitalistas.

O elo entre as antologias � Ana Cristina Cesar, uma “jovem c�none da poesia de mulheres”. Helo�sa � guiada pela forma como a obra da poeta reverbera na produ��o contempor�nea. A pesquisadora oferece entrevistas com as jovens, que revelam como foi o encontro com a obra de Ana Cristina.

As convidadas para “As 29 poetas hoje” trazem testemunho afetuoso com a obra da carioca, principalmente pelo livro “A teus p�s”, uma porta de entrada para muitas no universo de poesias feitas por mulheres. Em trecho da introdu��o, Mar�lia Garcia diz sobre Ana Cristina: “N�o cria uma escrita para ser falada, mas uma fala para ser escrita”.  Helo�sa tamb�m deixa clara a homenagem que presta: “Este livro � um s� poema longo, com todas as digress�es permitidas no narrar de uma breve, mas intensa hist�ria de amor.”

Com a participa��o de Chacal e Cacaso (veja mat�ria ao lado), a antologia “26 poetas hoje” foi publicada em 1976 com os escritos de poetas � margem do circuito liter�rio, n�o publicados por grandes editoras. Eles produziam os livros de forma artesanal, e eles mesmos tratavam da comercializa��o em bares, portas de cinemas. Na antologia “As 29 poetas hoje”, Helo�sa joga luz sobre essa poesia feita por jovens poetas que, muitas vezes, falam os versos em saraus na periferia e bancam produ��es independentes, como Mel Duarte, Luiza Rom�o e Jarid Arraes.

Na antologia de 1970, Helo�sa inclui cinco mulheres – Zulmira Ribeiro Tavares, Vera Pedrosa, Ana Cristina Cesar, Isabel C�mara, Leila Miccolis. Na obra de 2021, elas s�o a totalidade das vozes: 29 poetas. Helo�sa, que n�o esconde o ativismo, conta ao leitor sua motiva��o para a antologia: ela sai em busca de poesia de mulheres, sobretudo das jovens afetadas pela quarta onda feminista

A pesquisadora deixa claro o pressuposto de que h� diferen�as de poesias feitas por mulheres e por homens. “Enfim, realiza-se o desejo de Ana Cristina Cesar de ‘n�o silenciar sobre temas de mulher’ e o que a poeta Ang�lica Freitas, em “Um �tero � do tamanho de um punho”, prop�e sobre a escrita da mulher e de seu corpo”. 

A reedi��o de “26 poetas hoje” traz as introdu��es de 1976 e 1998, al�m de uma nota � presente edi��o que reflete sobre o termo “poesia marginal”. A denomina��o vem para descrever um movimento de autores e autoras que fugiam �s defini��es da literatura dominante. “Eram tamb�m textos que traduziam um cotidiano pr�ximo � experi�ncia social dos poetas e se faziam notar pelo alto grau de oralidade, comunicabilidade, humor e ironia.” Mas a pr�pria Helo�sa evoca Chacal para fazer uma cr�tica ao uso do adjetivo marginal.

“26 POETAS HOJE”

Ana Cristina Cesar

flores do mais
devagar escreva
uma primeira letra
escrava
nas imedia��es constru�das
pelos furac�es;
devagar me�a
a primeira p�ssara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das mar�s;
devagar imprima
o primeiro
olhar
sobre o galope molhado
dos animais; devagar
pe�a mais

e mais e
mais

Waly Sailormoon

pickwick tea
(cenas da vida teresopolitana, petropolitana, friburguense, itaipavense)

A m�e comenta o ‘Inferno de Dante’.
A mo�a quinze anos l� o roman ‘La Charteuse’ de Parma.
Fala de Balzac aussi como servindo para descri��es de paisagens e ambientes de baile. Narra as aventuras pelo imposs�vel de Candide et Zadig. Thomas Mann na estante. Michelet �colier.
Quand le ma�tre parle j’�coute/ le sac qui pend � mon
�paule dit que je suis un bon gar�on.

Chacal

papo de �ndio

veio uns �mi di saia preta
cheiu di caixinha e p� branco
qui �les disserum qui chamava a�ucri
a� �les falaram e n�s fechamu a cara
depois �les arrepitirum e n�s fechamu o corpo
a� �les insistiram e n�s comemu �les.

“29 POETAS HOJE”

Adelaide Iv�nova
o marido
de repente do riso fez-se
Humboldt de jeans e descal�o
como eu gosto
e das bocas unidas fez-se
porra nenhuma porque n�o houve
bocas unidas
e das m�os espalmadas
fez-se um high five
fez-se do marido pr�ximo
um amante fez-se do amante
um marido esperante
e n�o foi de repente:
o marido se casa.

Luiza Rom�o
dia 1. nome completo
eu queria escrever a palavra br*+^%
a palavra br* ^% queria escrever eu
palavra eu br* ^% escrever queria
brasil
eu queria escrever a palavra brasil
aquela em nome da qual
tanto homem se faz bicho
tanto bandido general
aquele em nome de quem
a borracha vira bala
a perversidade qualidade de bem
aquela empunhado em canto
atestada em docs
que esconde pranto
m�e do dops
eu queria escrever a palavra brasil
mas a caneta
num ato de leg�tima revolta
feito quem se cansa
de narrar sempre a mesma trajet�ria
me disse “para
e volta
pro come�o da frase
do livro
da hist�ria
volta pra cabral e as cruzes lusitanas
e se pergunte
da onde vem esse nome?”
palavra-mercadoria
brasil
pau-brasil
o pau-branco hegem�nico
enfiado a torto e a direto
suposto direito
de violar mulheres
o pau-a-pique
o pau-de-arara
o pau-de-araque
o pau-de-sebo
o pau-de-selfie
o pau-de-fogo
o pau-de-fita
o pau
face e orgulho nacional
a coloniza��o come�ou pelo �tero
matas virgens
virgens mortas
a coloniza��o foi um estupro
pedro ejaculando-se
dom precoce
deodoro metendo a espada
entre as pernas
de uma princesa babel
costa e silva gemendo cinco vezes
ai ai ai ai ai
get�lio juscelino geisel
collor j�nio sarney
a decis�o parte da cabe�a
do membro ereto
de quem � a favor da redu��o
mas v� vida num feto
� o pau-brasil
multiplicado trinta e tr�s vezes
e enterrado numa s� garota
olho pra caneta e tenho certeza
n�o escreverei mais o nome desse pa�s
enquanto estupro for pr�tica cotidiana
e o modelo de mulher
a m�e gentil

”26 poetas hoje”
•  Org. Heloisa Buarque de Hollanda
•  Companhia das Letras
•  280 p�ginas
•  R$ 39,90


”As 29 poetas hoje”
•  Org. Heloisa Buarque de Hollanda
•  Companhia das Letras
•  264 p�ginas
•  R$ 69,90


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)