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Estado de Minas HOMENAGEM

Escritores e professores homenageiam o cr�tico liter�rio Alfredo Bosi

Intelectuais destacam aspectos da vida e obra do autor de 'Hist�ria concisa da literatura brasileira', que morreu de COVID-19 aos 84 anos


09/04/2021 04:00 - atualizado 09/04/2021 12:28

Alfredo Bosi (1936-2021)(foto: Guilherme Gonçalves/Divulgação)
Alfredo Bosi (1936-2021) (foto: Guilherme Gon�alves/Divulga��o)
O Brasil perdeu um de seus maiores far�is. Professor em�rito da Universidade de S�o Paulo (USP), cr�tico liter�rio, humanista, cat�lico progressista, militante de causas sociais, intelectual pleno que, como poucos, trabalhou a converg�ncia da literatura com a hist�ria, a filosofia e a sociologia. Por meio de abordagem libertadora, como no cl�ssico “Dial�tica da coloniza��o”, pontuou as origens das desigualdades, injusti�as e iniquidades que frequentam o pa�s.

Essa � a trajet�ria de Alfredo Bosi, autor de 18 livros, s�timo ocupante da cadeira 12 da Academia Brasileira de Letras (ABL). Aos 84 anos, ele n�o resistiu nesta quarta-feira (7/4) �s complica��es de pneumonia associada � COVID-19, vindo a �bito em S�o Paulo. 

Intelectual de estatura enciclop�dica, Bosi dedicou a vida �s humanidades, em reflex�o cr�tica que traz incompar�vel contribui��o � literatura brasileira, mas tamb�m com trajet�ria que se completa por sua milit�ncia em causas pol�ticas, sociais, culturais, educacionais e ambientais, com destaque para as lutas pela redemocratiza��o do Brasil e a redu��o das desigualdades sociais, atua��o iniciada com um grupo de oper�rios da cidade de Osasco nos anos 70. 

Certo da voca��o fraterna, igualit�ria e libertadora do cristianismo em sua funda��o na sociedade de escravid�o romana, Bosi identificava na evolu��o hist�rica de tais fundamentos os princ�pios democr�tico e socialista: considerava-os herdeiros leigos, sem o conte�do confessional, de uma grande tradi��o da fraternidade crist�. Bosi presidiu nos anos 1980, estertores da ditadura militar, o Centro de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns e desde 1987 integrava a Comiss�o de Justi�a e Paz de S�o Paulo, criada por Arns. 

“Alfredo Bosi era um socialista crist�o, que, por meio da espi- ritualidade, buscava a justi�a social e abra�ava a Teologia da Li- berta��o, que tem em S�o Francisco de Assis – em sua rejei��o ao consumo e aos bens materiais –, uma vis�o muito crist� da luta contra a opress�o. Era militante, com v�nculos profundos com as comunidades de base, pastorais, oper�rias”, afirma o escritor Milton Hatoum, que teve o seu primeiro romance, “Relato de um certo Oriente” (Companhia das Letras, 1989), avaliado por Bosi ao tratar da fic��o produzida a partir dos anos 1970. 

A hist�ria da sociedade brasileira foi contada por Alfredo Bosi por meio da an�lise da literatura produzida no pa�s. No primeiro livro, “O pr�-modernismo”, lan�ado em 1966,  documenta a evolu��o da produ��o nacional entrela�ada em seu contexto sociopol�tico, entre o fim do s�culo 19 e durante as primeiras d�cadas do s�culo 20, per�odo que antecedeu o surgimento do Modernismo. Esse foi movimento art�stico e cultural que rompeu com o padr�o da est�tica europeia, at� ent�o prevalente. 

A segunda obra de Alfredo Bosi, “Hist�ria concisa da lite- ratura brasileira” (1972), est� em sua 52ª edi��o e � refer�ncia para estudantes e pesquisadores da teoria liter�ria. Foi escrita aos 34 anos, sob encomenda do poeta Jos� Paulo Paes (1926-1998), � �poca editor na Cultrix. O mais recente livro de Bosi, “Entre a literatura e a hist�ria”, foi publicado em 2013 e re�ne 40 textos que correlacionam o desenrolar hist�rico com a produ��o liter�ria de cada �poca.

Ao mesmo tempo em que articula a viv�ncia da poesia com a perspectiva filos�fica e social, e sem apagar diferen�as de pensamento, Alfredo Bosi as apresenta em sua complexidade, transformando estudos liter�rios em obras como “C�u, inferno”, “Dial�tica da coloniza��o” e “Ideologia e contraideologia”. A reflex�o que transborda do trabalho de Alfredo Bosi adquire o car�ter da resist�ncia, seja na produ��o intelectual dentro da teoria liter�ria – uma constru��o da hist�ria da literatura brasileira – seja na contextualiza��o hist�ria, cultural e sociopol�tica das obras, que aponta para a an�lise ideol�gica da produ��o no pa�s. A produ��o intelectual de Bosi expressa o horizonte de suas afinidades: no campo liter�rio, padre Ant�nio Vieira, Machado de Assis, Graciliano Ramos e Jorge de Lima e, no campo te�rico, Giambattista Vico (1668-1774), Benedetto Croce (1866-1952) e Ant�nio Gramsci (1891-1937).
 

Breve trajet�ria 

Eleito em 20 de mar�o de 2003 para a Academia Brasileira de Letras (ABL), Alfredo Bosi foi o sucessor de dom Lucas Moreira Neves. Nascido em S�o Paulo (SP), em 26 de agosto de 1936, foi casado com a psic�loga social, escritora e professora do Instituto de Psicologia da USP Ecl�a Bosi, j� falecida, com quem teve dois filhos: Viviana e Jos� Alfredo. Descendente de italianos, logo depois de se formar em letras pela Universidade de S�o Paulo (USP), em 1960, estudou por um ano em Floren�a. Ao retornar ao Brasil, assumiu os cursos de l�ngua e literatura italiana na USP e, em 1970, lecionou literatura brasileira no Departamento de Letras Cl�ssicas e Vern�culas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ci�ncias Humanas da USP, da qual foi professor titular de literatura brasileira.

Ocupou tamb�m a C�tedra Brasileira de Ci�ncias Sociais S�rgio Buarque de Holanda da Maison des Sciences de l’Homme (Paris). Foi vice-diretor do Instituto de Estudos Avan�ados da USP de 1987 a 1997. Desde dezembro de 2020, passou a ocupar o cargo de diretor. Entre outras atividades no IEA, coordenou o Educa��o para a Cidadania (1991-96), integrou a comiss�o coordenadora da C�tedra Sim�n Bol�var (conv�nio entre a USP e a Funda��o Memorial da Am�rica Latina) e coordenou a Comiss�o de Defesa da Universidade P�blica (1998). Desde 1989, era editor da revista Estudos Avan�ados.

Repercuss�o

“Um mestre e um colega”

“O professor Alfredo Bosi, ser humano de olhar atento e sens�vel, e intelectual da mais alta import�ncia, deixa um legado significativo n�o apenas para a hist�ria das literaturas italiana e brasileira, de que se ocupou como professor da Universidade de S�o Paulo. Com forma��o s�lida, alicer�ada no campo da religi�o cat�lica, desenvolveu estudos que abordam a literatura na sua conjun��o com a hist�ria, a filosofia, a sociologia, a pol�tica, de modo a levantar e discutir um repert�rio vasto de quest�es culturais ligadas ao compromisso social com as minorias numa sociedade injusta como a nossa. Perdemos, pois, um ‘humanista’, no seu mais amplo e digno papel de pensador, que, com sensibilidade e agudeza cr�tica, fiel a valores de ordem �tica e moral, voltou-se para as bases de sustenta��o de necess�rias mudan�as pelas quais nossa sociedade espera. Para n�s, da Universidade de S�o Paulo, foi um mestre e um colega sempre presente e assim continuar�, nas nossas lembran�as.” 
>>  N�dia Battella Gotlib, professora de literatura brasileira da USP e escritora

“Uma voz imprescind�vel”

“A partida de Alfredo Bosi � uma perda imensa para a cr�tica liter�ria brasileira. Ele deixa uma obra fundamental n�o apenas para os que se interessam pela hist�ria de nossa literatura, como tamb�m para os estudiosos de poesia e das rela��es entre literatura, hist�ria social e pensamento pol�tico. Foi uma de minhas principais refer�ncias nos meus tempos de forma��o liter�ria na Faculdade de Letras da UFMG, tornando-se, depois, uma voz imprescind�vel para minhas aulas e pesquisas. Sua ‘Hist�ria concisa da literatura brasileira’ � um livro que mantenho sempre por perto, e com os ensaios de ‘O ser e o tempo da poesia’ eu aprendo, at� hoje, muito sobre a arte po�tica.”
>> Maria Esther Maciel, escritora e professora de teoria da literatura e literatura comparada da Faculdade de Letras da UFMG, membro da Academia Mineira de Letras

“Um intelectual l�cido”

“A ‘Hist�ria concisa da literatura brasileira’, do professor Alfredo Bosi, marcou uma gera��o de leitores, na qual me incluo, desde que tomei conhecimento da sua obra, nos tempos da faculdade. Foi um dos grandes cr�ticos liter�rios do Brasil, que fica menor com a sua partida, ainda mais nesse momento de solid�o e incertezas que estamos vivendo. Seu legado � de um intelectual l�cido, que sempre lutou por um pa�s mais justo, e sua partida, agora, nos deixa mais tristes. Mas atentos ao seu legado e � grande contribui��o que ele deu � arte e � cultura brasileira.”
>> Carlos Herculano Lopes, jornalista e escritor 

“Humanista que lutou contra a barb�rie”

“Alfredo Bosi foi um grande pensador da literatura e da cultura brasileira. Ainda jovem, publicou ‘Hist�ria concisa da literatura brasileira’, um manual precioso, dirigido n�o apenas a estudantes de letras, mas a todos que se interessam pela nossa literatura. Foi ainda um cr�tico sofisticado de literatura italiana, como revelam alguns ensaios de ‘C�u, inferno’. V�rios poetas italianos, a est�tica de Croce e a filosofia pol�tica de Gramsci reaparecem em outro livro fundamental, ‘O ser e o tempo da poesia’. Bosi n�o desvinculava a an�lise est�tica da perspectiva hist�rico-pol�tica, fatores integrantes de sua produ��o cr�tica.

Nesse sentido, o j� cl�ssico ‘Dial�tica da coloniza��o’ esclarece muitas das atuais iniquidades do Brasil, em cuja hist�ria est�o entranhados a escravid�o e um ‘liberalismo’ posti�o, farsesco. Afora a obra, � preciso salientar a irrepreens�vel postura �tica de Alfredo Bosi, dentro e fora da universidade. Erudito e generoso, Bosi nunca foi pedante nem mesquinho. Na verdade, foi um humanista que lutou contra a barb�rie. Ele nos deixa num momento em que o pa�s se encontra � beira da barb�rie e do colapso social. Mas tenho certeza de que sua obra e seu exemplo de cidad�o �ntegro s�o perdur�veis.” 
>> Milton Hatoum, escritor 

“Reflex�o social e pol�tica”

“Um dos grandes cr�ticos brasileiros, Alfredo Bosi deixa vasto legado sobre a literatura e a cultura brasileira em estudos nos quais a aten��o � linguagem se abre para arguta e severa reflex�o social e pol�tica. Intelectual participante, uniu a��o e reflex�o de maneira a compor um sistema de pensamento voltado aos problemas cruciais do pa�s em pr�ticas e textos de import�ncia decisiva para sua justa compreens�o.” 
>> Wander Melo Miranda, professor em�rito da Faculdade de Letras da UFMG


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