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Estado de Minas PENSAR

As revolu��es: ideias europeias formaram base te�rica da independ�ncia

Alma das transforma��es na Fran�a, o Iluminismo chegou ao Brasil por meio de textos clandestinos e inspirou diversos movimentos contra a Coroa


02/09/2022 04:00 - atualizado 02/09/2022 01:09

Ilustração
L�minas afiadas assombravam cabe�as nas monarquias absolutas europeias. Ao final do s�culo 18, o continente era varrido por ideias inquietantes, que, ao bojo de transforma��es sociais, pol�ticas e econ�micas, destruiriam, nas pr�ximas d�cadas, tudo aquilo que na antiga sociedade provinha e estava conectado � aristocracia agr�ria e �s suas institui��es feudais. Marcando a inevit�vel passagem  para as sociedades modernas, na Fran�a, a Revolu��o Francesa decapita o Absolutismo, dando aos povos a certeza de que s�o escritores de sua pr�pria hist�ria. Foi um processo que abriria, nos termos do historiador Eric Hobsbawm, o s�culo de revolu��es que se espalharam pelo mundo, delimitando os limites do exerc�cio do poder e a garantia de direitos universais. No horizonte, concretizava-se a ascens�o de uma nova classe social, as burguesias urbanas, que no contexto da Revolu��o Industrial (1760) , iniciada na Inglaterra, consolidaria um novo sistema econ�mico. 
Na alma de tantas transforma��es, o Iluminismo. Ao mesmo tempo em que as ideias de pensadores como John Locke disseminavam a individualidade e a sociedade civil como fundamentos de um novo contrato social, a propriedade privada e a liberdade de express�o integraram o inovador ide�rio a ser defendido. Como forma de enfrentamento �s tiranias e poder absoluto de monarcas, Montesquieu teoriza sobre a divis�o dos poderes Executivo, Legislativo e Judici�rio. Contra as rivalidades religiosas que sustentavam as fronteiras entre pot�ncias europeias, Voltaire pregava a toler�ncia como valor universal e fundamento do conv�vio de sociedades entre iguais.  

Tais ideias revolucion�rias cruzam o Atl�ntico e chegam suavemente, em textos clandestinos, em franc�s, � principal col�nia portuguesa das Am�ricas. Nas Minas, tais ideias encontraram gente “intrat�vel”, “em cont�nuo movimento”,  um lugar em que “a terra parece que evapora tumultos; a �gua exala motins; o ouro toca desaforos; destilam liberdades os ares; vomitam insol�ncias as nuvens; influem desordens os astros”. Esse � um registro do Conde de Assumar, entre 1717 e 1720 governante da Capitania de S�o Paulo e Minas do Ouro, em discurso que lhe foi atribu�do por ocasi�o da subleva��o  dos mineiros no ano de 1720, mencionado pela historiadora Helo�sa Starling em “Independ�ncia do Brasil – As mulheres que estavam l�” (Editora Bazar do Tempo, 2022). 

De natureza sobretudo antifiscal, em 1789, o legado de insurg�ncia dessa gente “intrat�vel” germina a primeira a revolta. “At� a Conjura��o Mineira emergir � superf�cie e assumir o formato de um movimento pol�tico explicitamente disposto a combater a rela��o colonial, ningu�m ainda havia acusado a Coroa portuguesa de despotismo; e muito menos planejado criar uma Minas Gerais independente, soberana, autossuficiente e republicana”, constata a historiadora Helo�sa Starling  na obra “Brasil uma biografia” (Companhia das Letras, 2015). Tiradentes foi o mais ativo propagandista da Conjura��o Mineira, principal movimento anticolonial da Am�rica portuguesa no campo das ideias e o primeiro a adaptar um projeto de independ�ncia claramente republicano para as Minas, considera Helo�sa Starling. Ela identifica nos planos da Conjura��o Mineira tra�os da inova��o constitucional de uma rep�blica confederada de estados independentes com autonomia legislativa. 

Embora a maquina��o anticolonial tenha fracassado em Minas, o ide�rio abasteceu outras conjura��es. “Na Conjura��o Baiana, livros manuscritos sobre a Revolu��o Francesa atingiram a popula��o pobre de Salvador. No Rio, tradu��es de jornais da Europa eram distribu�das nas boticas. As ideias se movimentavam de forma criativa, em volumosos panfletos e textos mais curtos, pregados nas ruas”, avalia Heloisa Starling na obra “Ser republicano no Brasil col�nia – A hist�ria de uma tradi��o esquecida” (Editora Companhia das Letras, 2018), que em pesquisa detalhada visitou arquivos do Brasil, de Portugal e da Fran�a para analisar a trajet�ria desse pensamento.

Ainda que despeda�adas pela Coroa, as conjura��es integram um longo aprendizado pol�tico da col�nia. Em contraste � narrativa de um pa�s tropical em harmonia com o colonizador portugu�s, entre os s�culos 17 e 18, novos sentidos ao mundo em que viviam passaram a ser expressos pelos colonos. “Declararam direitos, abriram um espa�o antes inimagin�vel para o debate e as negocia��es pol�ticas, enriqueceram paulatinamente o vocabul�rio da vida p�blica, deixando, para o s�culo 19, um conjunto de ferramentas intelectuais e pol�ticas que poderiam ser mobilizadas, selecionadas, reelaboradas e aplicadas para seus prop�sitos”, afirma Helo�sa Starling.  E � em 1817 que esse corpo de ideias entra em ebuli��o e se concretiza, em Pernambuco, pela primeira vez no Brasil, numa rep�blica, abrindo o Ciclo Revolucion�rio da Independ�ncia. 


REP�BLICA PIONEIRA


Ao chegar-lhe a den�ncia de que mais uma conspira��o contra a Coroa era urdida naquela prov�ncia, o portugu�s e governador de Pernambuco Caetano Pinto de Miranda Montenegro convocou o Conselho de Guerra no Forte das Cinco Pontas e decretou a pris�o de civis, eclesi�sticos e de alguns militares envolvidos. No Regimento de Artilharia, os acontecimentos se precipitaram e sa�ram do script: ao receber a voz de pris�o do comandante portugu�s, brigadeiro Barbosa de Castro,  Jos� de Barros Lima,  capit�o do Regimento de Artilharia conhecido como Le�o Coroado, desembainhou a espada e desferiu  golpe mortal contra o superior. Foi o estopim. Os rebeldes tomaram o quartel, impediram o avan�o das tropas monarquistas e ganharam as ruas aos gritos de “Viva a p�tria! Viva a revolu��o!”.  Em meio � amotina��o e desordens, o  governador portugu�s se refugiou na Fortaleza do Brum. Capitulou. 

Na prov�ncia de Pernambuco, era promulgada a rep�blica 72 anos antes que essa fosse implantada no Brasil. Teve curta dura��o. Mas foi pioneira, inovadora. Entre 6 de mar�o e 19 de maio de 1817,  constituiu um governo provis�rio e implementou Lei Org�nica de 28 artigos, algo pr�ximo a uma pr�-Constitui��o, a primeira elaborada por brasileiros, de reda��o atribu�da a Ant�nio Carlos Ribeiro de Andrade e a frei Joaquim do Amor Divino Rabelo – Frei Caneca – , autor da c�lebre frase "quem bebe da minha caneca tem sede de liberdade!". 

 Apesar do conjunto de ideias liberais revolucion�rias e embora o  Governo Provis�rio de Pernambuco tenha se manifestado favoravelmente � aboli��o da escravatura,  a pauta n�o era consensual entre os revolucion�rios; limitou-se, nesse sentido, a informar que reconheceria, naquele momento, a “propriedade privada”. Havia muitos fazendeiros envolvidos no movimento, de tal forma que n�o lhes interessava a aboli��o do trabalho escravo. Em que pese a diversidade de ideologias entre os revolucion�rios – de republicanos radicais a monarquistas conservadores –, consensual foi a reivindica��o por autonomia provincial. “Houve o desejo de que o novo arranjo pol�tico que se formava levasse em considera��o as autonomias locais, principalmente as fiscais, um maior equil�brio entre a arrecada��o e o investimento nas prov�ncias”, assinala o historiador George F�lix Cabral de Souza, sublinhando ser esta uma reivindica��o muito marcante, que transbordou para o movimento independentista, republicano, de base constitucional. 

O governo revolucion�rio de Pernambuco atraiu para a causa as unidades administrativas coloniais da Para�ba, do Rio Grande do Norte e parte do Cear�. Simultaneamente contr�rios a Portugal e ao Rio de Janeiro, foi um programa que combinou constitucionalismo, republicanismo e autonomia provincial, em contraposi��o ao projeto de estado-na��o vitorioso da Independ�ncia, gestado pelo Rio de Janeiro, que se constituiu centralizado e unit�rio. 


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