
Entrevista/Juliano Assun��o (Economista, professor da PUC-Rio e diretor-executivo do Climate Policy Initiative)
O desmatamento da Amaz�nia trouxe riqueza?
Esta � a quest�o central. Eu diria que o desmatamento � hoje muito mais um empecilho ao desenvolvimento econ�mico do que uma fonte de renda � popula��o. Se pegarmos o per�odo em que fomos mais efetivos no combate ao desmatamento, que � o per�odo de 2004 a 2012, a taxa caiu em torno de 80%, o PIB da agropecu�ria da Amaz�nia subiu.
As imagens de sat�lite das �reas desmatadas da Amaz�nia Legal indicam que aproximadamente a quinta parte delas est� abandonada, em algum processo de regenera��o. Por um lado, isso mostra como a floresta tem capacidade para o restauro natural. Mas por outro lado, ilustra com muita clareza que se desmatou � toa, por quest�es que n�o est�o associadas � necessidade de produzir, tanto � que foram abandonadas. E em outras �reas desmatadas, o grau de produtividade � extremamente baixo.
O desmatamento n�o foi uma fonte relevante nem de emprego nem de renda. Apenas 17% da m�o de obra na Amaz�nia est� associada � agropecu�ria, portanto, a agropecu�ria n�o � um grande gerador de empregos. E o emprego gerado pela agropecu�ria tem ca�do. Al�m disso, a associa��o do desmatamento com a ilegalidade, eu diria que se torna um empecilho aos investimentos, pois cria um ambiente de deteriora��o institucional pela conviv�ncia com a ilegalidade.
Ent�o tipicamente os melhores investidores, as melhores empresas em suas avalia��es de risco, eles olham para a Amaz�nia com o desmatamento associado �s �reas como fator de risco. Al�m disso, h� as quest�es internacionais: os p�los comerciais come�aram a utilizar o desmatamento fora de controle como barreira n�o tarif�ria em suas importa��es.
Quais s�o as vari�veis que mais impactaram a queda vertiginosa do desmatamento da Amaz�nia Legal no per�odo compreendido entre 2004 e 2012?
Temos um trabalho do Climate Policy Iniciative, que eu dirijo, para estimar o impacto causal da pol�tica de combate ao desmatamento, que se inicia com o monitoramento via sat�lite sobre o desmatamento. Conseguimos afirmar, com grande seguran�a, que a maior parte da queda do desmatamento est� associada � pol�tica de comando e controle que usa o sat�lite como ponto de partida.
N�o tem muita d�vida que essa pol�tica lan�ada em 2004, que come�ou a monitorar a Amaz�nia via sat�lite e tomar a��es e puni��es a partir das imagens, teve impacto extraordin�rio sobre a queda do desmatamento. No governo Bolsonaro teve o monitoramento, mas n�o teve pol�tica. � preciso ter o pacote inteiro. O que o sat�lite faz � aumentar a efetividade da a��o policial: voc� aumenta muito a efetividade do esfor�o policial, com a tecnologia.
O desmatamento acaba acontecendo ao longo de algumas semanas e h� tempo de fazer uma opera��o, apreender equipamentos, destru�-los e aplicar as principais puni��es aos desmatadores. Agora, claro, apenas a tecnologia, sozinha, n�o vai acontecer nada, apenas vai assistir ao desmatamento da floresta em HD. Ent�o existe uma agenda de combate ao desmatamento para a qual o Brasil tem muita expertise, que precisa ser recuperada.
Esse sistema, apesar de efetivo, tem v�rios caminhos de aprimoramento. E � importante olhar para a atividade econ�mica do sistema como um todo, para que se consiga aumentar a governan�a da regi�o e, ao mesmo tempo, abordar alguns dos obst�culos ao desenvolvimento.
Como a floresta amaz�nica pode se tornar sustent�vel?
O desmatamento na Amaz�nia em quase a sua totalidade � ilegal, est� associado ao roubo de terra p�blica e a uma cultura de impunidade, de conviv�ncia com o ilegal. O grosso do desmatamento � para a pecu�ria, a grande atividade que se estabelece ap�s o desmatamento. Sob o ponto de vista de efici�ncia econ�mica, da dimens�o mais vis�vel que � a do carbono - ou seja o carbono vis a vis a pecu�ria que ali se estabelece.
Temos feito algumas simula��es. Se tirasse a pecu�ria e adotasse o restauro florestal, e se fosse capaz de capturar o carbono associado ao crescimento da floresta, a uma taxa de 20 d�lares a tonelada, a pecu�ria n�o teria a menor chance de se estabelecer na Amaz�nia. O pre�o do carbono chegou a bater recentemente a 100 d�lares nos mercados europeus. Al�m disso, 25% da �rea devastada da floresta est� em processo de regenera��o: h� 7 milh�es de hectares da Amaz�nia que est�o regenerando h� mais de tr�s anos de maneira passiva.
E n�o h� nada mais eficaz para capturar carbono do que o processo de fotoss�ntese. Na Amaz�nia, como as �rvores crescem bastante - tem muita biomassa - o potencial de captura � muito grande. Ent�o enquanto a floresta est� se regenerando, a cria��o da biomassa est� fixando o carbono atmosf�rico nas �rvores, nas folhas. O desafio � como a gente estrutura o mecanismo para que esse potencial se realize. Mas n�o temos d�vida de que somente o carbono j� seria suficiente para inviabilizar a agropecu�ria do ponto de vista da efici�ncia econ�mica.
Agora, al�m do carbono, temos um processo de ocupa��o humana desastroso da regi�o e um contingente de jovens desalentados, dispon�veis para se conectar ao mercado de trabalho, mas h� o desafio de inser��o produtiva: a qualifica��o profissional � baixa e o acesso � internet � mais limitado. Ent�o tem alguns caminhos que conseguimos identificar para a regi�o, mais condizentes com as oportunidades de trabalho que se apresentam do que o desmatamento.
O que podemos aprender que uma agenda de inser��o produtiva de jovens na Amaz�nia, em que vamos tirar proveito da combina��o entre capacita��o profissional, acesso � internet e maneiras de conectar os jovens ao mercado de trabalho � muito mais promissor do que qualquer atividade voltada ao desmatamento, que � atividade ilegal que acaba deteriorando o ambiente de neg�cios e de investimento.