Metade dos trabalhadores est� esgotada, diz pesquisa
Um em cada tr�s profissionais diz que sua felicidade foi afetada pelo estresse do trabalho.
Pandemia fez surgir o quiet quitting, a chamada demiss�o silenciosa
Entre os motivos para insatisfa��o do trabalhador, est�o sal�rio baixo, esgotamento emocional, falta de flexibilidade da empresa e excesso de horas extras (foto: Elisa Ventur on Unsplash
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A pandemia deixou marcas profundas nas rela��es de trabalho. A cada dois trabalhadores, um se sente esgotado e acha o emprego muito estressante. Um em cada tr�s profissionais considera que sua felicidade foi afetada pelo estresse do trabalho e 40% deles planejam pedir demiss�o nos pr�ximos anos. Os n�meros s�o da pesquisa Talkspace’s Employee Stress Check, feita este ano por uma consultoria de sa�de mental nos Estados Unidos, mas que refletem uma realidade mundial.
Os principais motivos para insatisfa��o do trabalhador, segundo a pesquisa, s�o sal�rio baixo (57%), esgotamento emocional ou Burnout (51%), falta de flexibilidade da empresa (45%) e excesso de horas extras (44%). Esse cen�rio de pandemia fez surgir um fen�meno que vem ganhando espa�o no mundo corporativo, o chamado quiet quitting, ou demiss�o silenciosa. Na vers�o corrente, demiss�o silenciosa � quando o trabalhador executa estritamente suas fun��es limitando-as ao necess�rio, o suficiente para se manter no emprego.
A psic�loga Patr�cia Ansarah, uma das fundadoras do Instituto Internacional de Seguran�a Psicol�gica (IISP), afirma, no entanto, que o comportamento se populariza, alavancado pela Gera��o Z (nascidos entre 1996 e 2012), porque d� voz ao sofrimento das pessoas no ambiente de trabalho.
Fazer s� o necess�rio. Sacrificar tempo e sa�de? N�o mais
De acordo com Patr�cia Ansarah, a demiss�o silenciosa n�o tem rela��o com falta de engajamento. "Tem a ver com o colaborador optar por permanecer fazendo suas fun��es sem assumir responsabilidades extras, contra as expectativas de l�deres e empregadores de que todos dedicar�o horas adicionais e energia sem compensa��o adicional. Embora possa parecer falta de engajamento ou apatia, s�o pessoas que at� n�o se importam em trabalhar muito, desde que vejam valor e benef�cio em sacrificar o seu tempo e sa�de para isso".
O movimento foi criado em um contexto de inseguran�a financeira, constante estresse, aumento nos casos de ansiedade, Burnout (esgotamento emocional) e, consequentemente, baixa qualidade de vida.
Trabalhadores n�o s�o valorizados nem bem remunerados
A demiss�o silenciosa � quando o trabalhador executa estritamente suas fun��es limitando-as ao necess�rio, o suficiente para se manter no emprego (foto: Steve DiMatteo/Pixabay
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A psic�loga Veruska Galv�o, tamb�m fundadoras do IISP, afirma que a mudan�a dr�stica do modelo de trabalho durante a pandemia, com profissionais sobrecarregados, sofrendo press�o por resultados e, na maioria das vezes, n�o sendo valorizados e nem remunerados por isso, provocou o aumento desse comportamento.
“� um movimento mundial que essa gera��o mais nova provoca sobre o que significa ter uma carreira de sucesso e qual o pre�o disso, numa resposta �s gera��es anteriores que est�o adoecendo por terem negligenciado conversas sobre limites, sa�de e bem-estar. � um movimento social de cr�tica � normaliza��o do excesso de trabalho", afirma Patr�cia Galv�o.
Empresas despreparadas para lidar com atual contexto
Segundo Veruska, empresas que n�o prepararem seus l�deres para compreenderem o contexto e o impacto desse movimento sofrer�o consequ�ncias negativas.
Ela diz que os gestores precisam reavaliar prioridades, estabelecer conex�o com seus times, incluir em suas pautas o tema de sa�de mental e, principalmente, se colocar como parte do time, assumindo a responsabilidade pelos indicadores de sa�de e performance da equipe.
O especialista em log�stica e s�cio da empresa Pathfind, Antonio Wrobleski, divide os praticantes de quiet quitting em duas vertentes. Uma delas � caracter�stica das novas gera��es. “O jovem de hoje n�o tem mais pretens�o de permanecer longos per�odos na empresa, est� muito suscet�vel a mudan�as e enxerga motivos em diferentes situa��es”, afirma.
O outro aspecto est� relacionado � empresa, quando o funcion�rio n�o v� perspectivas de crescimento ou a companhia n�o oferece atratividade. “A pessoa s� se estressa, se frustra, quando n�o alcan�a seus objetivos, sejam pessoais, de relacionamentos ou empresariais. O quiet quitting � um ponto na curva que acontece h� algum tempo e hoje est� tendo publicidade porque algumas empresas n�o sabem como lidar com isso”, diz Wrobleski.
Para Patr�cia Ansarah, o movimento de quiet quitting est� diretamente relacionado � lideran�a. A falta de clareza dos pap�is, objetivos e metas causa inefici�ncia operacional, que resulta em retrabalhos, horas extras e esfor�os que n�o geram valor ao neg�cio. A inseguran�a dos l�deres em confiar em seus times e a falta de tempo como desculpa para n�o estar com suas equipes geram distanciamento entre l�der e liderado".
�reas vulner�veis ao quiet quitting
Ainda n�o h� estudos sobre os setores mais vulner�veis ao quiet quitting, mas os casos de Burnout s�o mais frequentes nas �reas de sa�de, servi�o e educa��o, especialmente em grandes empresas multinacionais, nas quais os profissionais relatam maior dificuldade para se desconectar do trabalho nos momentos que deveriam ser focados para o descanso, lazer ou cuidados com a sa�de, devido principalmente ao excesso de cobran�a por resultados.
Segundo Patr�cia Ansarah, a demiss�o silenciosa impacta os resultados financeiros e sustentabilidade do neg�cio, o que pode ser prejudicial �s organiza��es que est�o precisando inovar rapidamente para se manterem competitivas. O aumento de turnover, aux�lio-doen�a, absente�smo, afastamento m�dico, inefici�ncia operacional, processos de sele��o e de treinamento afetam a reputa��o da empresa e impacta diretamente o resultado financeiro.
“Para se ter uma ideia de grandeza de valores, uma pesquisa realizada pela Gallup mundialmente com mais de 3 milh�es de pessoas, mostra que apenas 25% dos profissionais est�o engajados no trabalho. A estimativa, em d�lares, � que isto custe US%uFF04 7,8 trilh�es � economia global”, aponta Veruska Galv�o.
Rela��o mais humana e vulner�vel
A demiss�o silenciosa n�o tem rela��o com falta de engajamento, tem a ver com o colaborador optar por permanecer fazendo suas fun��es sem assumir responsabilidades extras (foto: Tumisu por Pixabay )
Para romper esse ciclo � preciso preparar a lideran�a, concordam Patr�cia, Veruska e Wrobleski. “Identificar o que precisa ser mudado � o primeiro passo e isso s� ser� poss�vel se a qualidade do relacionamento entre l�der e liderado virar prioridade”, afirma Patr�cia. Veruska defende que � preciso desenvolver uma rela��o mais pr�xima, mais vulner�vel e humana para que as pessoas se sintam confort�veis ao trazer suas quest�es, compartilhar inseguran�as e pedir apoio sem medo de sofrer retalia��o ou julgamento.
Wrobleski aponta que a empresa precisa oferecer um ambiente de trabalho saud�vel. Isso inclui hor�rios mais flex�veis, ambientes mais leves e soltos. “Tudo isso faz parte das regras de conviv�ncia entre empresas e funcion�rios, que � como uma conviv�ncia familiar. Se n�o houver uma boa conviv�ncia, n�o vai haver funcion�rios estimulados e a empresa tamb�m n�o ser� estimulante".
O empres�rio diz que existem variadas op��es para oferecer recursos ao trabalhador. “Eu sempre gostei de atualiza��o pessoal, abrir canais para novas forma��es. Existem muitas ferramentas que trazem bons resultados”.
Ambiente favor�vel � sa�de do profissional
Resultados a qualquer custo n�o cabem mais nas empresas saud�veis e sustent�veis. A qualidade das rela��es humanas � o foco para criar e manter ambientes produtivos. A gest�o empresarial precisa estar preparada para fazer mais perguntas e dar menos respostas. Essa tamb�m � a melhor maneira de incluir a diversidade de pensamentos e criar di�logos e discuss�es f�rteis para o neg�cio.
“Criar condi��es para que o ambiente seja favor�vel � sa�de do profissional e da organiza��o � oferecer ambientes psicologicamente seguros, onde haja limites, falar dos problemas que ningu�m fala, pedir ajuda, falar daquilo que importa, sem medo”, afirma Patr�cia Ansarah.
Wrobleski diz que, mais do que o KPI, os indicadores-chave de performance, fundamentais para conduzir bem os neg�cios, � preciso voltar a aten��o aos indicadores-chave das pessoas no mundo corporativo. “Sempre fui muito favor�vel e estou olhando com particular carinho para esses indicadores de pessoas, abrindo a vis�o sobre o que acontece com essas pessoas no dia a dia".
Falta de motiva��o, presen�a inconstante e entregas irregulares
O chamado quiet quitting, ou demiss�o silenciosa, � um movimento que d� voz ao sofrimento das pessoas no ambiente de trabalho (foto: Tumisu/Pixabay )
Ao observar as pessoas na empresa, o gestor consegue identificar eventuais problemas, como por falta de motiva��o, presen�a inconstante, entregas irregulares, que caracterizam o quiet quitting. “O gestor precisa ter ferramentas para se aproximar das pessoas e para que as pessoas se aproximem da empresa”, explica Wrobleski.
Cultura do sil�ncio e medo instalado
Segundo Veruska Galv�o, empresas em que existe a pr�tica do quiet quitting s�o as que adotam o microgerenciamento, retalia��o, falta de confian�a, medo instalado e a cultura do sil�ncio imperando. “Ambientes psicologicamente seguros favorecem a alta performance em uma din�mica social saud�vel, a qualidade das conversas aumenta e o n�vel de estresse diminui, impactando a sa�de do colaborador e a sa�de financeira da empresa".
Quiet firing: resposta imatura da lideran�a
Mas a conversa franca depende tamb�m do trabalhador. No lugar da pr�tica da demiss�o silenciosa, Patr�cia Ansarah sugere que o profissional seja transparente com o seu l�der e tome a iniciativa para conversar sobre limites do trabalho. Esse di�logo, segundo ela, pode impedir consequ�ncias ainda mais graves, como a ado��o do quiet firing, resposta imatura da lideran�a ao quiet quitting, que aumenta a dist�ncia entre o l�der e liderado.
No lugar de olhar para a demiss�o silenciosa como um diagn�stico que aponta para a urg�ncia de se criar rela��es psicologicamente seguras que geram aprendizado e crescimento para todos, no quiet firing os l�deres passam suspender feedbacks, congelar promo��es, promover mudan�as repentinas, n�o compartilhar informa��es relevantes para o trabalho, cancelar reuni�es, entre outras pr�ticas, at� que a situa��o se torne insustent�vel e o funcion�rio pe�a para sair, comenta Veruska Galv�o.
Como empres�rio, Wrobleski defende que o quiet firing n�o deve existir. “Se o funcion�rio n�o est� atendendo � empresa, n�o importa o comportamento dele, se estiver fora da curva, o gestor precisa traz�-lo para dentro. N�o pode nunca haver uma din�mica de quiet firing”, alega.
As empresas devem colocar o ambiente saud�vel na agenda de neg�cio. “Assim como hoje respondem por indicadores de performance e de acidente de trabalho, responder�o por indicadores de sa�de mental e reputa��o organizacional. E empresas que quiserem se manter competitivas e saud�veis no mercado, precisar�o trabalhar em estrat�gias de preven��o com muito foco na qualidade das rela��es”, diz Veruska Galv�o.
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