Mulher e crianças

Mulher e crian�as

CHANDAN KHANNA

O cumprimento ou n�o das medidas preventivas adotadas na pandemia da COVID-19 motivou conflitos entre amigos e familiares, o que despertou o interesse de cientistas. Uma equipe brit�nica decidiu avaliar se os la�os sociais poderiam influenciar na ades�o �s regras para controlar a dissemina��o do coronav�rus, como o uso de m�scaras e o distanciamento social. A conclus�o foi que pessoas com la�os familiares fortes tendem a seguir mais as normas preventivas.

O estudo, feito por pesquisadores da Kent University, Nottingham Trent University e Coventry University, usou dados de mais de 13 mil pessoas de 122 pa�ses, incluindo o Brasil, coletados durante a primeira onda da pandemia, no in�cio de 2020. A abrang�ncia de participantes pretendeu garantir que os resultados contemplassem uma maior diversidade de v�nculos sociais em diferentes partes do mundo.

"Em nossa opini�o, se quisermos entender a humanidade ou fazer afirma��es sobre 'pessoas em geral', � essencial que conduzamos pesquisas com dados ricos de diversos participantes", afirma Martha Newson, antrop�loga da Kent University e uma das respons�veis pela pesquisa. "Queremos entender todo o espectro do comportamento humano e como ele interage com a cultura e o ambiente", completa.

A partir dos dados coletados por meio de um question�rio on-line, Newson e colegas examinaram o v�nculo com c�rculos sociais pr�ximos, como fam�lia e amigos, e grupos estendidos, na��o e governo, por exemplo. Eles encontraram evid�ncias de que as rela��es sociais com familiares levaram a melhores comportamentos de sa�de durante a crise sanit�ria: 46% das pessoas que afirmaram ser pr�ximas dos parentes lavavam as m�os com mais frequ�ncia, em compara��o com 32% das que n�o tinham esse tipo de rela��o.

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Al�m disso, aqueles com fortes v�nculos familiares representavam 73% dos que praticavam distanciamento social e 36% dos que usavam m�scara com mais frequ�ncia. Por outro lado, 54% das pessoas sem v�nculos fortes relataram nunca ter usado o acess�rio. "� prov�vel que o v�nculo promova comportamentos que se alinhem com as normas ou valores do grupo", analisa Newson.

Para Ronaldo Trindade, professor do Departamento de Antropologia da Universidade de Bras�lia (UnB) e doutor em antropologia social pela Universidade de S�o Paulo (USP), o comportamento e a forma como a pandemia foi vivida seguiram o posicionamento �tico das diferentes comunidades. "Esses grupos, por meio de determinadas afinidades, se constituem enquanto comunidade, e as suas decis�es s�o tomadas de acordo com uma �tica interna."

Confian�a


Al�m da identifica��o com os valores de um grupo, o estudo, publicado na revista Science Advances, afirma que, em per�odos adversos, como em desastres e crises sociais, antes decidir que curso de a��o tomar, os indiv�duos se voltam para pessoas em quem confiam. Isso tamb�m explicaria a maior ades�o �s medidas sanit�rias entre os fortemente ligados aos familiares.

Vladimir Melo, doutor em psicologia pela Universidade Cat�lica de Bras�lia (UCB), explica que, em situa��es extremas, o social passa a ter uma import�ncia maior. "Pequenos grupos familiares e de amigos refor�am a sensa��o de pertencimento e seguran�a", diz. "A decis�o coletiva divide a responsabilidade e fortalece o comprometimento. Trata-se de um mecanismo de coes�o que aumenta as chances de sobreviv�ncia."

Os resultados do estudo, segundo os autores, t�m implica��es para al�m de quest�es familiares. Eles acreditam que as constata��es podem servir de refer�ncia para a��es de sa�de p�blica. "Pol�ticas ou campanhas podem ser mais influentes quando encorajam os indiv�duos a compartilharem seus comportamentos de prote��o � sa�de dentro de seus c�rculos sociais pr�ximos", indica Newson.

Essa mesma din�mica, segundo a pesquisadora, ajudaria, por exemplo, na ades�o a tratamentos alternativos, reduzindo a depend�ncia a tratamentos medicamentosos. "Especialmente quando o que pode faltar na vida de um indiv�duo � o suporte que vem dos la�os sociais com um grupo pr�ximo, como uma fam�lia", justifica. Mas Newson alerta que tais iniciativas devem ser tratadas com cuidado e seguindo a vis�o de antrop�logos ou profissionais que conhe�am as din�micas sociais da comunidade.

*Estagi�ria sob a supervis�o de Carmen Souza

Duas perguntas para...

Vladimir Melo, doutor em psicologia pela Universidade Cat�lica de Bras�lia (UCB)


Desde o in�cio da pandemia, pesquisas mostram o aumento da ansiedade, bem como uma depend�ncia mais profunda de redes sociais pr�ximas, como familiares. Por que esse fen�meno acontece?

A sensa��o de vulnerabilidade e a necessidade de prote��o se tornaram mais importantes durante a pandemia, sobretudo no in�cio. O contato com a possibilidade de morte foi um forte estressor que fortaleceu as fam�lias. Ainda que a conviv�ncia tenha sido intensificada e gerado conflitos em v�rios lares, a ang�stia da perda e da pr�pria morte proporcionou uma revis�o de valores.

O que explica os la�os sociais, principalmente com a fam�lia, terem levado a melhores comportamentos de sa�de durante a crise da COVID-19?

A coes�o de um sistema grupal reduz a ansiedade pela sensa��o de prote��o. Cada indiv�duo assume um papel, o grupo assume cuidados com os mais vulner�veis e uma lideran�a (ou mais de uma) emerge como refer�ncia. Naturalmente, o estresse fica sob controle, uma vez que, para um �nico indiv�duo, � dif�cil lidar com todas essas amea�as sem qualquer suporte.