Trabalhadores est�o exaustos
Tr�s anos se passaram desde o in�cio da pandemia e, at� hoje, os sinais de redu��o do burnout ainda s�o poucos. No novo mundo do trabalho, grande parte dos profissionais segue sofrendo de exaust�o.
E a incid�ncia do burnout continua aumentando. Em uma pesquisa de fevereiro de 2023, entre 10.243 profissionais de v�rias partes do mundo, conduzida pelo centro de pesquisas e debates americano Future Form, 42% dos participantes relataram burnout – o maior n�mero desde maio de 2021.
Teoricamente, os acordos de trabalho flex�vel deveriam trazer maior equil�brio entre a vida pessoal e o trabalho, melhor produtividade e aumento do bem-estar para os funcion�rios.
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As discuss�es sobre o burnout aumentaram e as empresas parecem mais dispostas a oferecer atrativos aos funcion�rios, como inscri��es em academias e cobertura dos custos de home office.
Tudo isso, intuitivamente, deveria ajudar a reduzir os fatores de estresse que levam ao burnout. Mas, apesar desses fatores, os relatos de burnout continuam aumentando e o fen�meno j� n�o pode ser associado apenas � pandemia.
Sua alta incid�ncia indica que ele chegou para ficar, mesmo com os ajustes no ambiente de trabalho sendo promovidos pelas empresas.
Com isso, especialistas afirmam que empregadores e funcion�rios podem precisar se concentrar na gest�o do burnout, em vez de tentar elimin�-lo por completo.

A Organiza��o Mundial da Sa�de incluiu o burnout na sua Classifica��o Internacional de Doen�as
Getty ImagesQuest�o antiga
O burnout j� era uma preocupa��o crescente antes da pandemia.
Um estudo do instituto Gallup entre 7,5 mil profissionais americanos demonstrou, j� em 2018, que 67% deles sofriam de burnout no emprego. E, em 2019, a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) incluiu o burnout na sua Classifica��o Internacional de Doen�as, definindo-o como "fen�meno ocupacional" e n�o como condi��o m�dica.
Enquanto a cultura do trabalho extremo e jornadas extenuantes era constantemente glamourizada, as discuss�es sobre o burnout come�avam a reconhecer a gravidade da condi��o.
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Os dados foram parte importante desta evolu��o: outro estudo, de maio de 2021, realizado pela OMS e pela Organiza��o Internacional do Trabalho (OIT), estimou que cerca de 750 mil pessoas morrem todos os anos de AVC e parada card�aca isqu�mica, devido �s longas horas de trabalho.
"Mesmo antes da COVID-19, observamos que o burnout havia deixado de ser um risco ocupacional em poucas profiss�es de alta posi��o e grande n�vel de estresse para ser algo mais pr�ximo de um problema de sa�de p�blica", explica Alex Soojung-Kim Pang, autor do livro Rest: Why You Get More Done When You Work Less (Descanse: por que voc� faz mais quando trabalha menos, em tradu��o livre), que mora na Calif�rnia, nos Estados Unidos.
As principais causas de burnout incluem cargas de trabalho intensas e prolongadas, trabalho excessivo prolongado e culturas t�xicas no ambiente de trabalho. Pang afirma que essas pr�ticas foram comuns por d�cadas.
"Muitas empresas se sentiam no direito de exigir longas jornadas dos seus funcion�rios e extrair o m�ximo de trabalho deles para aumentar a produtividade", explica ele.
Tradicionalmente, as empresas deixaram o �nus de gerenciar o burnout a cargo dos funcion�rios. "A tend�ncia delas era pensar [no burnout] como responsabilidade do profissional: algo que acontece com voc�", afirma Pang.
Ainda segundo ele, o burnout "� tipicamente tratado na mesma categoria da sa�de e condicionamento f�sico, n�o como um fen�meno que o empregador permite que aconte�a como resultado de certas condi��es de trabalho. O burnout � um problema da organiza��o, que � deixado para o indiv�duo resolver".
Os motivos do aumento

Pandemia intensificou fatores que levam ao burnout
Getty ImagesQuando chegou a pandemia, os problemas pr�-existentes no ambiente de trabalho, como lidar com o estresse di�rio e a ansiedade na carreira, foram grandemente exacerbados pela incerteza da crise.
Sean Gallagher � diretor do Centro para a Nova For�a de Trabalho da Universidade de Tecnologia Swinburne, de Melbourne, na Austr�lia. Ele afirma que tudo isso teve um "efeito combinado" para os profissionais.
Nas pesquisas globais, os trabalhadores australianos, muitas vezes, aparecem entre os que mais sofrem burnout no mundo.
"Os profissionais n�o s� sofreram quest�es de sa�de mental decorrentes do isolamento, sem saber se teriam emprego no dia seguinte, mas tamb�m precisaram equilibrar responsabilidades de assist�ncia com uma nova forma de trabalho", acrescenta Gallagher.
"Foi criado um efeito residual em termos de burnout – muitos trabalhadores, at� hoje, ainda t�m dificuldade para manter seu bem-estar na vida pessoal e profissional."
Embora o trabalho h�brido e remoto tenha oferecido maior autonomia aos profissionais, a flexibilidade tamb�m tem seu pre�o: as jornadas de trabalho aumentaram.
Uma pesquisa de abril de 2022 entre 32.924 trabalhadores de v�rias partes do mundo, realizada pelo instituto de pesquisa ADP, concluiu que os profissionais trabalhavam 8,5 horas extras sem pagamento por semana, em compara��o com 7,3 horas antes da pandemia.
"Tudo isso, muitas vezes, pode significar que o trabalho nunca para", afirma Pang. "Voc� fica acess�vel onde quer que esteja, 24 horas por dia."
"Os profissionais ficam frequentemente com a responsabilidade de resolver problemas resultantes do trabalho flex�vel, enquanto muitas vezes tentam encaixar ao m�ximo poss�vel as responsabilidades de casa e do trabalho", segundo ele.
O novo ambiente de trabalho tamb�m favorece o surgimento de novas causas de excesso de trabalho. "Temos visto maus h�bitos na forma de comunica��o que surgiram a partir do trabalho remoto, como fazer uma reuni�o quando um e-mail seria suficiente", afirma Gallagher.
"Isso deixa os funcion�rios com menos tempo na jornada de trabalho para concentrar-se na sua excessiva carga de trabalho, for�ando-os a trabalhar regularmente al�m das horas contratadas para colocar tudo em dia – o que os deixa esgotados."
Embora alguns empregadores tenham reconhecido a necessidade de abordar o bem-estar dos profissionais, eles, muitas vezes, n�o oferecem os recursos adequados. Pang menciona o exemplo das grandes empresas de tecnologia e seus extravagantes benef�cios no local de trabalho.
Para ele, benef�cios como servi�os de entretenimento ou ofertas de refei��es elaboradas por chefs ajudam a manter o funcion�rio no escrit�rio pelo m�ximo de tempo poss�vel, em vez de reduzir o burnout. "Na verdade, eles criam um ambiente de trabalho confort�vel para que as pessoas trabalhem neles at� � morte."
Os empregadores, muitas vezes, n�o abordam as raz�es subjacentes do burnout, segundo Gallagher. Eles apenas oferecem benef�cios aos funcion�rios, que simplesmente mascaram os sintomas.
Para ele, "oferecer aos profissionais aplicativos de medita��o ou ioga de vez em quando n�o � ruim, mas � uma solu��o tempor�ria, um 'curativo' para problemas estruturais: horas de trabalho excessivamente longas, excesso de trabalho e incerteza sobre os acordos de trabalho flex�vel".
Uma solu��o � poss�vel?

Segundo especialistas, as pr�ticas atuais de trabalho fazem com que o burnout, em alguns casos, seja inevit�vel
Getty ImagesPang e Gallagher afirmam que as pr�ticas atuais de trabalho fazem com que o burnout, em alguns casos, seja inevit�vel.
"Na verdade, o burnout deveria ocorrer apenas em algumas profiss�es – quando voc� fica continuamente na linha de frente para salvar vidas", afirma Pang.
"Mas, no momento, para muitas empresas, ele se resume � toler�ncia do indiv�duo a longas jornadas, excesso de trabalho e fadiga, quer ele sofra de burnout ou n�o."
Al�m da alta incid�ncia, alguns especialistas acreditam que preocupa��es econ�micas mais gen�ricas significam que o burnout provavelmente ir� permanecer por mais tempo.
"Al�m do trabalho, os profissionais tamb�m precisam lidar com enormes press�es de custo de vida", afirma Gallagher. "A infla��o piorou, est�o acontecendo demiss�es em massa e os profissionais est�o preocupados em perder suas moradias. Por isso, n�o ser� surpresa se os n�veis de burnout aumentarem ainda mais."
A falta de creches e a instabilidade persistente tamb�m s�o um fator adicional em todo o mundo, particularmente para os pais. Um relat�rio da Universidade do Estado de Ohio, nos Estados Unidos, demonstrou em maio de 2022 que 66% dos pais e m�es americanos que trabalham preenchem os crit�rios de burnout.
Enquanto houver ambientes de trabalho que fa�am com que seus funcion�rios sofram estresse cr�nico, excesso de trabalho e longas jornadas, o burnout chegou para ficar.
Mas Pang afirma que cada vez mais empresas est�o come�ando a perceber que t�m responsabilidade de lidar com o burnout. "Estamos gradualmente saindo de um mundo no qual o burnout ficava totalmente a cargo do indiv�duo para reconhecer que as solu��es organizacionais s�o fundamentais", segundo ele.
"Existe um reconhecimento maior de que fatores do ambiente de trabalho contribuem para o burnout e que um funcion�rio afetado pode ter consequ�ncias negativas para os neg�cios como um todo."
Em alguns casos, as mudan�as podem vir na forma de legisla��o. Novas leis na Austr�lia, por exemplo, agora classificam o burnout como risco � seguran�a e � sa�de no trabalho.
Com isso, os patr�es s�o legalmente obrigados a identificar e administrar riscos que possam causar estresse trabalhista entre os funcion�rios, desde per�odos de pico com alta carga de trabalho at� jornadas excessivas. "Se as pr�ticas de trabalho est�o levando ao burnout, os empregadores agora t�m obriga��o significativa de retirar seus funcion�rios da beira do precip�cio", afirma Gallagher.
Mas essas medidas podem levar tempo, especialmente em escala global. E n�o h� garantia de que elas ir�o convencer os empregadores a reformular suas pr�ticas de trabalho.
Enquanto isso, Gallagher afirma que disposi��es de trabalho flex�vel podem ser mais formalizadas para os profissionais, ajudando a administrar sua carga de trabalho.
Para ele, "ter melhores normas em vigor pode definir melhor os hor�rios de trabalho, reduzir as horas extras sem pagamento e melhorar o equil�brio entre a vida pessoal e o trabalho".
Por enquanto, como o burnout � algo generalizado, Pang acredita que a narrativa em torno dele precisa ser redefinida. "A ideia de que ele pode ser eliminado � t�o realista quanto pensar que podemos resolver o equil�brio entre a vida pessoal e o trabalho de uma vez por todas", segundo ele.
"Na verdade, precisamos descobrir se vale a pena fazer os sacrif�cios que nos colocam em risco de burnout para proteger nossos empregos e carreiras."
Mas, olhando para o futuro, os especialistas ainda acreditam que o objetivo deveria ser erradicar o burnout. Mesmo que n�o pare�a realista, a busca ainda vale a pena, pois pode ajudar a reduzir seus efeitos mais prejudiciais e fazer com que menos profissionais precisem sofrer da condi��o. "Combater � sempre melhor do que n�o fazer nada", conclui Gallagher.
Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Worklife.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/articles/c87vgedy160o
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