
Em texto publicado, h� alguns meses, nessa coluna tratamos da Lei do Superendividamento (lei 14181/21) e das discuss�es sobre a defini��o de m�nimo existencial previsto nela. Como vimos, o legislador havia deixado a regula��o desse conceito para um momento posterior.
Naquela oportunidade apontamos a diverg�ncia existente entre institui��es financeiras e entidades de defesa do consumidor acerca do crit�rio a ser utilizado para se estipular um patamar que represente este m�nimo.
S� para lembrar, a Lei 14.181/21 tem por objeto prevenir e tratar do superendividamento dos consumidores. Uma das medidas previstas, por exemplo, � a repactua��o de d�vidas que deve ser realizada sem que os novos valores das parcelas ajustadas comprometam esse m�nimo existencial. Ou seja, o prop�sito da lei � garantir que o consumidor superendividado consiga cumprir um novo acordo e, tamb�m, pagar suas demais despesas b�sicas, sem que precise, em um futuro pr�ximo, recorrer a mais empr�stimos.
Em geral, as propostas de especialistas para regularem o m�nimo existencial s�o no sentido de que deve-se preservar um percentual entre 60 e 70% da renda do consumidor para que ele consiga sair do superendividamento.
A regula��o do m�nimo existencial veio na semana passada com a publica��o pelo governo federal do decreto 11.150/22, que entrar� em vigor 60 dias ap�s sua publica��o.
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Segundo seu texto, considera-se m�nimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do sal�rio m�nimo, o que corresponde, atualmente, a R$ 303,00.
Como n�o poderia ser diferente, a rea��o dos �rg�os de defesa do consumidor foi imediata. Para o IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), o decreto, ao estipular tal valor, coloca a popula��o brasileira abaixo da linha da pobreza.
A Associa��o Nacional das Defensoras e Defensores P�blicos tamb�m se posicionou por meio de uma nota: “Como � poss�vel de algum modo afirmar que a estipula��o do m�nimo existencial no valor atual de R$ 303,00 (trezentos e tr�s reais) cumpre a vontade da Lei? � desnecess�rio lembrar que o Decreto Presidencial tem a fun��o de regulamentar a Lei (art. 84, IV, da CF), de dar-lhe efic�cia, e toda vez que contraria seus dispositivos, princ�pios e a pr�pria ratio legis se revela norma n�o escrita, pois n�o pode e n�o tem essa fun��o”
De fato, se o valor estipulado pelo decreto for, realmente, implementado, podemos afirmar, como se diz no meio jur�dico, que a Lei do superendividamento virar� letra morta.
Imagine um consumidor que ganhe um sal�rio de R$ 2.000,00 e que esteja superendividado, ou seja, que � incapaz de pagar a totalidade de suas d�vidas de consumo, sem comprometer seu m�nimo existencial.
De acordo com a lei do superendividamento, ele pode apresentar em ju�zo para seus credores um plano para renegocia��o de suas d�vidas.
Qualquer acordo, dever� reservar para ele uma renda m�nima para o pagamento de suas despesas pessoais e de sua fam�lia. Segundo o texto do decreto, esse valor dever� ser de R$ 303,00. E o mesmo valor valer� para o consumidor endividado que ganha R$ 1212,00 e para aquele que ganha R$ 10.000,00.
Resumindo, os bancos e financeiras poder�o utilizar quase toda a renda do consumidor para o pagamento de d�vidas e juros relativos a eventuais renegocia��es.
O decreto desvirtua, totalmente, a lei, pois acaba fomentando ainda mais o endividamento das fam�lias brasileiras. Ser�, com certeza objeto de contesta��o judicial, n�o s� em raz�o do valor estipulado para o m�nimo existencial, mas por ter ampliado o rol de d�vidas previsto na lei que n�o se sujeitam a renegocia��o, como, por exemplo, d�vidas j� renegociadas, anteriormente e despesas condominiais.
Segundo a nota da associa��o dos defensores p�blicos acima citada, o decreto n�o possui validade, juridicidade e efic�cia, pois jamais uma regulamenta��o pode contrariar a lei que � subordinada.
O autor desta coluna � Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. � s�cio-fundador do Escrit�rio Ribeiro Rodrigues Advocacia e da Tr�plice Marcas e Patentes
Sugest�es e d�vidas podem ser enviadas para o email [email protected]