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Estado de Minas Direito e Inova��o

Os novos desdobramentos da disputa sobre o spray da barreira

Laudo pericial aponta um desfecho favor�vel para o inventor da tecnologia


26/10/2023 06:00 - atualizado 25/10/2023 17:19
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Copa do Mundo do Brasil foi a primeira a utilizar a tecnologia do spray
Copa do Mundo do Brasil foi a primeira a utilizar a tecnologia do spray (foto: Thiago Madureira)
As gera��es mais jovens n�o se recordam, mas a barreira no futebol era mais do que um obst�culo para os bons cobradores de falta. Era uma arma, tamb�m, para o antijogo. Ap�s a contagem feita pelo �rbitro da dist�ncia entre a bola e a barreira, os jogadores que a compunham se adiantavam tentando enganar o �rbitro ou exigindo dele uma nova medi��o, o que nem sempre ocorria. Com isso, equipes que desejavam parar o jogo ganhavam minutos preciosos.

 

Esse cen�rio mudou no in�cio dos anos 2000 com a cria��o de um spray que hoje faz parte dos itens b�sicos utilizados pela arbitragem em competi��es mundo afora. Seu diferencial � uma espuma que desaparece segundos ap�s sua aplica��o.

 

Para quem n�o sabe, ele foi desenvolvido pelo mineiro Heine Allemagne que patenteou a inven��o no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) em nome de sua empresa  Spuni Com�rcio de Produtos Esportivos e Marketing. Conseguiu a patente tamb�m em mais de 40 pa�ses.

 

Mas, por tr�s dessa inova��o, h� uma longa batalha judicial entre a empresa e a Fifa, entidade m�xima do futebol mundial.

 

Em resumo, h� tr�s raz�es principais para o lit�gio: A utiliza��o do spray pela Fifa sem autoriza��o e sem a devida contrapresta��o, o rompimento pela entidade das negocia��es para a compra da patente e o repasse pela Fifa para outros fabricantes de informa��es obtidas durante o uso do equipamento.

 

Com essas alega��es, a Spuni ajuizou em 2017 uma a��o pleiteando indeniza��es pela quebra da promessa de compra, pelo uso n�o autorizado do spray, pelas verbas de patroc�nio que a empresa deixou de receber e por danos morais.

De fato, a Fifa iniciou o uso do spray na Copa do Mundo de 2014 de forma gratuita e sem estampar a marca da Spuni. O Sr. Heine chegou a prestar assessoria � entidade, que ap�s idas e vindas nas negocia��es, ofereceu-lhe, formalmente, US$ 500 mil para sua aquisi��o, quantia bem menor do que havia sido prometido antes.

 

O processo tramitou na 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. No final de 2017, o juiz do caso concedeu uma liminar proibindo o uso do spray pela Fifa no mundo todo e fixou uma multa caso a ordem fosse descumprida. A Fifa recorreu da decis�o e o Tribunal de Justi�a do Rio a manteve. A entidade recorreu, ent�o, ao STJ.

 

Enquanto o recurso tramitava na corte superior, a Fifa continuou a usar o spray e resolveu alterar sua estrat�gia de defesa. Em agosto de 2019, ajuizou uma a��o na Justi�a Federal do Rio de Janeiro para requerer a nulidade da patente. O principal argumento era de que o spray n�o poderia ser considerado uma inven��o, j� que n�o era fruto de uma atividade inventiva nos moldes exigidos pela lei. Para comprovar essa alega��o apresentou pareceres t�cnicos atestando que um composto de espuma para demarcar dist�ncias era �bvio para um t�cnico no assunto. 

 

Logo ap�s a Spuni se defender nesta nova a��o, veio a senten�a da 7ª Vara Empresarial do Rio. Todos os pedidos da empresa foram julgados improcedentes. A decis�o foi proferida em junho de 2020, desta vez, por uma ju�za. Para ela, n�o ficou comprovada no processo nenhuma conduta il�cita da Fifa e, caso algumas empresas estivessem violando a patente, era contra elas que a Spuni deveria tomar medidas judiciais. Destacou, tamb�m, que o processo de fabrica��o do spray n�o � complexo e que, por isso, sua populariza��o era algo inevit�vel, o que retiraria a suposta exclusividade decorrente da patente da Spuni.

 

A empresa n�o se deu por vencida e recorreu ao Tribunal de Justi�a do Rio de Janeiro.

 

Mas a�, foi a vez do STJ julgar o recurso apresentado pela Fifa contra aquela liminar que havia sido concedida no in�cio da a��o proposta pela Spuni. O problema � que, com a senten�a da ju�za, a liminar havia sido e o recurso perdeu a raz�o de ser. Mas a corte decidiu se manifestar sobre um ponto espec�fico dele. A jurisdi��o. Segundo os ministros, medidas liminares como aquela s� poderiam ser aplicadas em competi��es realizadas no Brasil, porque a prote��o da patente concedida aqui, limita-se ao nosso territ�rio.

 

Tudo indicava que a batalha de Heine Allemagne e da Spuni estava perdida. A liminar nunca foi cumprida pela Fifa, nenhum de seus pedidos de indeniza��o foi acolhido e seu spray era produzido por v�rias empresas pelo mundo. Al�m disso, o prazo da patente venceu e sua cria��o caiu em dom�nio p�blico.

 

Eis que o Tribunal de Justi�a do Rio de Janeiro acolhe o seu recurso. Para os desembargadores, a inven��o do spray era sim, diferenciada tanto que foi patenteada no Brasil e em v�rios pa�ses. E, al�m disso, segundo eles, o uso do spray consolidou-se entre os anos 2000 e 2009 no cen�rio do futebol, pois j� era usado por v�rias federa��es.

 

Entenderam que a Fifa realizou promessas infundadas e negocia��es jur�dicas em troca de recebimento da expertise e da utiliza��o gratuitas do equipamento, para depois fazer uma proposta que n�o atendia �s expectativas criadas. E que, al�m disso, depois da Copa do Mundo de 2014, ela passou a utilizar o spray de outros fabricantes.

 

Conclu�ram que a entidade violou o princ�pio da boa-f� negocial. Ou seja, faltou fair play � entidade m�xima do futebol.

 

Condenaram a Fifa ao pagamento de uma indeniza��o pela utiliza��o das latas de spray, nas competi��es organizadas por ela e por suas afiliadas (CONMEBOL e CBF) no territ�rio nacional, no per�odo de 2012 at� o fim da vig�ncia da patente.  

 

Condenaram a entidade tamb�m ao pagamento de uma indeniza��o correspondente aos valores de contratos de patroc�nio que a Spuni deixou de receber em raz�o da omiss�o de sua marca no spray utilizado na Copa do Mundo de 2014.

 

Por fim, os desembargadores arbitraram uma indeniza��o por danos morais no valor de R$ 50mil.

 

A Fifa apresentou um recurso ao STJ que ainda n�o foi julgado. Al�m disso, a a��o de nulidade da patente ganhou novos contornos. Afinal, caso ela seja declarada nula pela justi�a, essas indeniza��es ser�o mantidas?

 

De acordo com a lei que regula as patentes no Brasil (9279/96), a senten�a de nulidade tem efeitos retroativos. Em outras palavras, no caso de nulidade, � como se a patente nunca tivesse existido nem gerado nenhum direito para seu titular. A Fifa ficaria, ent�o, livre da indeniza��o fixada pelo Tribunal do Rio.

 

A quest�o, por�m, n�o � simples pois o judici�rio n�o tem uma posi��o firme sobre o tema.O Tribunal de Justi�a de S�o Paulo, por exemplo j� encerrou uma a��o de execu��o movida por uma fabricante de pl�stico contra uma concorrente que havia copiado um produto patenteado. A execu��o foi extinta porque a concorrente conseguiu em outro processo a nulidade da patente. Com isso, a senten�a que servia de t�tulo para a execu��o, tamb�m, foi anulada. 

 

Mas uma das desembargadoras que participaram do julgamento entendeu que a anula��o de uma senten�a transitada em julgado traria insuper�vel afronta � seguran�a jur�dica. 

 

A verdade � que h� poucos julgados sobre o tema. � prov�vel, ent�o, que nos casos de anula��o de patente, ocorra uma modula��o dos efeitos da senten�a como acontece em decis�es que declaram a inconstitucionalidade de leis. Para garantir certos direitos consolidados e preservar a seguran�a jur�dica, h� nelas a fixa��o de um determinado per�odo em que a lei gerou efeitos. O mesmo pode ser aplicado para uma patente.

 

Voltando ao nosso caso, pode ser que o Sr. Heine n�o precise se preocupar com toda essa discuss�o. No in�cio desse m�s, uma perita nomeada na a��o de nulidade declarou que o spray de barreira preenche todos os requisitos de uma inven��o. Por consequ�ncia, a patente concedida em 2000 era v�lida.

 

Embora o INPI tenha, de forma contradit�ria, mudado de ideia e concordado com o pedido de nulidade da Fifa, o mais prov�vel � que o juiz siga o laudo pericial para proferir sua senten�a. 

 

 

 

 

O autor desta coluna � Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. � s�cio da Empresa Tr�plice Marcas e Patentes do escrit�rio Ribeiro Rodrigues Advocacia.

Sugest�es e d�vidas podem ser enviadas para o email [email protected]


 



 

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