
N�o h�, por�m, um acordo sobre como resolv�-los. Qualquer iniciativa de regula��o esbarra em uma tens�o entre valores. Liberdade de express�o e censura, retrocesso e inova��o, interven��o estatal e livre concorr�ncia.
Outro ponto sens�vel diz respeito � legitimidade para esta regula��o. Afinal, quem deve ditar o que pode e o que n�o pode na internet?
Recentemente, a Advocacia-Geral da Uni�o anunciou a cria��o de uma procuradoria de defesa da democracia. A medida, que teve como pano de fundo, os atos golpistas de 8 de janeiro, visa combater a desinforma��o no �mbito de pol�ticas p�blicas.
Cr�ticas n�o faltaram. Muitos consideraram a medida autorit�ria, j� que ela pode permitir que o poder executivo, defina, de forma ideol�gica, o que � verdade ou n�o.
No in�cio do ano, o governo tamb�m cogitou editar uma medida provis�ria redigida pelo Minist�rio da Justi�a para coibir conte�dos golpistas nas plataformas digitais. Ap�s diverg�ncias entre os poderes e cr�ticas, a ideia acabou sendo abandonada.
A atua��o do judici�rio, bastante incisiva durante as �ltimas elei��es, � tamb�m alvo de cr�ticas principalmente em raz�o de uma poss�vel afronta ao princ�pio da separa��o de poderes.
E o que dizer de uma renova��o legislativa sobre o tema pelo parlamento? As principais leis que regem o ambiente digital atualmente s�o a Lei Geral de Prote��o de Dados (LGPD) e o Marco Civil da Internet (MCI) que devem ser aplicadas em conjunto com a Constitui��o Federal.
Neste ano o STF poder� julgar a constitucionalidade do artigo 19 do MCI. Nele � tratada a responsabilidade das plataformas pelos conte�dos nelas postados. Segundo o artigo, “Com o intuito de assegurar a liberdade de express�o e impedir a censura, o provedor de aplica��es de internet somente poder� ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conte�do gerado por terceiros se, ap�s ordem judicial espec�fica, n�o tomar as provid�ncias para, no �mbito e nos limites t�cnicos do seu servi�o e dentro do prazo assinalado, tornar indispon�vel o conte�do apontado como infringente, ressalvadas as disposi��es legais em contr�rio”.
Ao analisar dois recursos com repercuss�o geral (Res 1037.396 e 1.057.258), o Supremo poder� definir se h� hip�teses em que os provedores s�o obrigados a retirar determinado conte�do ap�s uma simples notifica��o do usu�rio, sem a necessidade de se recorrer ao judici�rio. Para tanto, foi marcada para o dia 28 de mar�o uma audi�ncia p�blica para discutir a mat�ria.
Vale lembrar, tamb�m, que permanece no congresso aguardando aprova��o o PL 2.630/20, popularmente chamado de PL das fake news, que cria regras para a modera��o de conte�do nas plataformas. O governo atual j� sinalizou a inten��o de aproveitar o projeto.
Enquanto isso, l� fora, h� dois movimentos bem relevantes. Na Europa, j� est�o sendo implementados o Digital Services Act (Ato dos Servi�os Digitais) e o Digital Markets Act (Ato dos Mercados Digitais), marcos regulat�rios que trazem diretrizes para a regula��o do ambiente digital no continente.
Em resumo, os atos t�m regras para combater a desinforma��o, exigir transpar�ncia da publicidade online e responsabilizar as empresas pelos conte�dos publicados pelos usu�rios. Outras normas buscam combater o oligop�lio das cinco grandes empresas de tecnologia (Google, Amazon, Apple, Meta/Facebook e Microsoft).
No m�s passado, diversas plataformas entregaram � Comiss�o Europeia dados sobre o n�mero de usu�rios que acessam seus servi�os. Os dois atos entrar�o em vigor, por completo, em 2024.
J� nos Estados Unidos, teremos um importante julgamento da Suprema Corte que poder� mudar o rumo da regula��o por l� e refletir no mundo todo.
Trata-se de uma poss�vel revis�o da Se��o 230 da chamada Lei da Dec�ncia nas Comunica��es, existente desde 1996. De acordo com a lei, os provedores de conte�do e de hospedagem (Google, Facebook e outros) n�o podem ser legalmente responsabilizados pelas postagens dos seus usu�rios. H� uma imunidade total, diferentemente do que prev� nosso Marco Civil da Internet.
Isso pode mudar em raz�o de uma a��o ajuizada pela fam�lia de uma das v�timas do tiroteio ocorrido em 2015 na casa de shows Bataclan em Paris. Os pais de Nohemi Gonzalez pedem a responsabiliza��o da Google pela morte da filha, sob o argumento de que os assassinos foram influenciados por v�deos com conte�do radical sugeridos pelo algoritmo do Youtube.
As grandes empresas de tecnologia, certamente, s�o refrat�rias a qualquer inova��o legislativa que lhe possa imputar mais responsabilidade, diminuir sua participa��o no mercado ou colocar em xeque seu modelo de neg�cio. Defendem, por exemplo, a liberdade de express�o, a proibi��o da censura e a inova��o tecnol�gica.
� necess�rio, portanto, que estas altera��es sejam precedidas por debates entre todos os envolvidos para se encontrar formas de conciliar valores e interesses aparentemente conflitantes.
H� duas semanas, iniciou-se uma confer�ncia mundial promovida pela Unesco com este prop�sito: estabelecer e implementar processos regulat�rios que preservem a liberdade de express�o, o acesso � informa��o e os direitos humanos. Resultado dela � a cria��o de um documento com diretrizes para regulamentar as plataforma digitais. Ele estar� aberto para receber contribui��es de todos os envolvidos no acesso � internet. Governos, especialistas, influenciadores digitais, empresas e sociedade civil.
Enfim, podemos esperar que o ano de 2023 seja marcado por importantes mudan�as no ambiente on line que poder�o repercutir para todos n�s.
- O autor desta coluna � Advogado, Especialista e Mestre em Direito Empresarial. � s�cio da Empresa Tr�plice Marcas e Patentes
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