
Em 2020, o Pew Research Center divulgou uma pesquisa em que apontava insatisfa��o de 56% da popula��o com a democracia. Em coluna recente (12/07) discorri sobre os elevados n�veis de polariza��o nutridos por estrat�gias de dissemina��o de inverdades, repress�o da liberdade de express�o e intoler�ncia � diversidade e � pluralidade, medidos pelo �ndice V-Dem da democracia.
O �ndice V-Dem de 2022 refor�ou a tend�ncia brasileira mais conservadora, verificada a partir de 2013 – refrescando a mem�ria, no ano que come�aram os movimentos pelo passe livre e depois as manifesta��es contra o governo Dilma Rousseff.
Nos sub�ndices polariza��o e viol�ncia pol�tica do V-Dem, em 2020, o Brasil ficou em 170ª e 175ª posi��es, respectivamente; em 2022, sofreu ligeira recuada, caindo para 163ª e 171ª, entre os 177 pa�ses avaliados, mantendo-se no topo daqueles que apresentam as piores performances democr�ticas do mundo.
O Brasil s� tem perdido desde que a polariza��o e a viol�ncia t�m ganhado.
Desde 2014, a instabilidade econ�mica anda de m�os dados com a polariza��o, a falta de di�logo e a viol�ncia. As pautas cl�ssicas da direita, de menor interven��o e atua��o mais livre do mercado, agora v�m acompanhadas de valores morais, �ticos e culturais que limitam a liberdade de escolha e de express�o.
As pautas cl�ssicas da esquerda, que flertam em muitos pa�ses bem-sucedidos com valores mais sociais-democratas, est�o perdendo seu campo de argumenta��o por n�o trazerem � baila como realmente pretendem enfrentar os problemas sociais fazendo valer suas bandeiras em meio � grave crise econ�mica, ao elevado endividamento, ao cen�rio internacional extremamente desfavor�vel, � baixa qualifica��o da m�o de obra e ao mercado de trabalho com elevado grau de informalidade.
As equa��es n�o fecham em nenhum dos lados, extrema-direita e esquerda, e a sociedade parece n�o se dar conta do fosso que tem cavado para o seu pr�prio desenvolvimento humano. Nesse jogo de for�as pol�tico, cego, populista, manipulador, tem um grupo cada vez maior aproveitando para “passar a boiada”. E a boiada do centr�o fez a festa legislativa.
O PL, partido do atual Presidente Bolsonaro, elegeu 8 dos 17 senadores e ter� a maior bancada com 13 representantes, al�m de 99 deputados federais - entre eles o mais votado do pa�s -, tamb�m constituindo a maior bancada da C�mara, a partir de janeiro de 2023. Somados ao partido Republicanos, com 42 deputados eleitos, o atual presidente, se reeleito, ter� forte base aliada no Congresso Nacional. Para engrossar esse coro, Uni�o Brasil tamb�m constituiu forte base, com 59 deputados eleitos e 12 representantes no Senado; o PP, com 47 deputados e 7 senadores, superando o MDB que obteve 42 novos assentos para deputado e totalizou 10 senadores.
Do lado do candidato Lu�s In�cio Lula da Silva, a federa��o petista com PCdoB e PV elegeram 79 novos parlamentares. � indiscut�vel a cont�nua perda de for�a parlamentar da esquerda, bem como de partidos mais de centro-esquerda como PSDB, com 18 novos parlamentares, PDT, com 17, e PSD com 42. No Senado, os n�meros finais seguiram a perda de express�o, finalizando com 9 assentos para o PT, 4 para o PSDB e 2 para o PDT. O antipetismo segue firme na mente do eleitorado brasileiro e as ideias progressistas perdem cada vez mais terreno.
Quem paga essa conta? A pr�pria sociedade que n�o consegue entender que o jogo de for�as tem interesses muito menos coletivos do que pessoais, que os projetos tradicionais de fam�lia e bons costumes � afrontoso com os ideais de liberdade de escolha e de express�o, que a democracia est� se arruinando em meio �s estrat�gias de poder constru�das sob os preceitos fundamentalistas religiosos.
Em 06 de setembro, o Pew Research Center divulgou pesquisa realizada com adultos americanos sobre as li��es aprendidas com o desenvolvimento de tratamentos m�dicos e as vacinas, no combate � Covid-19. Os respondentes democratas afirmaram que as maiores li��es foram “o apre�o pelo processo de desenvolvimento de vacinas e pela velocidade que foram desenvolvidas, bem como o respeito pela ci�ncia”. J� os respondentes que se identificaram como republicanos afirmaram ser “o ceticismo em rela��o �s vacinas seu principal aprendizado, seguido das desconfian�as em rela��o � ind�stria farmac�utica e aos funcion�rios do governo”.
O rec�m-deputado federal mais votado do Brasil tornou-se nacionalmente conhecido, em 2021, quando tentou conhecer o Cristo Redentor e n�o p�de subir por n�o ter cart�o de vacina. O PL trouxe para o cen�rio nacional o ceticismo em rela��o � ci�ncia, seja sob forma de cuidados sanit�rios, seja clim�tico ou de seguran�a p�blica – deixo esse exerc�cio para o leitor buscar conhecer a nova maior bancada do Congresso Nacional.
As minorias tamb�m tiveram seu papel: mulheres transexuais agora s�o 2, ind�genas, s�o 3. Defensoras da educa��o e dos direitos de liberdade e igualdade para a mulher continuam, a passos de tartaruga, ganhando espa�o, a despeito de nomes como da ex-ministra Damares, conhecida por suas pautas extremamente conservadoras, passar a compor o Senado com mais outras 3 novas representantes daquela Casa. Mas as mulheres, no c�mputo final, responder�o por apenas 18% dos cargos legislativos, mantendo-se distantes do coeficiente de igualdade de g�nero.
O que o pa�s revelou em seu �ltimo debate antes das elei��es foi que padre pode n�o ser padre e fingir continuar fingindo ser padre, em rede nacional, que a popula��o acha gra�a, faz m�me e se diverte; que ofensas e palavras de baixo cal�o s�o normas de educa��o institu�das oficialmente, desde a Copa do mundo de 2014, quando a Presidente Dilma Rousseff foi ofendida em frente a v�rios chefes de Estado; que morte e fome s�o tratadas como armas manipuladoras para angariar ou repelir votos; e que educa��o n�o � pauta para gest�o p�blica.
O Brasil vem se redesenhando democraticamente com forte guinada � direita, uma “nova direita” ainda n�o t�o conhecida, mas reconhecida em hist�rias de na��es que hoje vivem verdadeiras trag�dias humanit�rias, autoritarismo e forte repress�o. A esquerda, por seu turno, parece paralisada em um passado aparentemente glorioso, que abriu espa�o para o que hoje vivemos. Ainda n�o conseguiu mostrar para o que veio, deixando o terreno cada vez mais firme para aqueles que sabem bem o que querem e n�o se intimidam em mostrar.