(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas ECONOM�S EM BOM PORTUGU�S

No feriado da Padroeira do Brasil, crian�as estimuladas a pegar em armas

Crian�as com armas nas m�os � fosso humanit�rio, � sociedade desgovernada e dominada pela viol�ncia e pelo �dio


18/10/2022 06:00 - atualizado 18/10/2022 09:38
1143

Por Eleonora Cruz Santos
 
Crianças ao lado de estandes e colocando as mãos em armas
V�deos circularam na internet e mostraram as crian�as ao lado de estandes e colocando as m�os nos equipamentos que foram expostos (foto: Reprodu��o)
Oito anos antes da promulga��o da Constitui��o Federal, o dia 12 de outubro foi decretado feriado nacional em comemora��o � Nossa Senhora Aparecida, proclamada padroeira do Brasil por decreto do Papa Pio XI. Na mesma data tem-se o feriado comercial do dia das crian�as. Ambos, neste ano, foram marcados negativamente por manifesta��es nunca antes vistas na hist�ria das cren�as e esperan�as simbolicamente difundidas nessa data. Estado laico, liberdade de express�o, combate ao trabalho infantil s�o pautas que precisam ser reestabelecidas urgentemente na sociedade brasileira. 
 
A laicidade do Estado, garantida constitucionalmente pelo artigo 19, inciso I – � vedado � Uni�o, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Munic�pios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencion�-los, embarcar-lhes o funcionamento ou manter com eles, ou seus representantes, rela��es de depend�ncia ou alian�a, ressalvada, na forma da lei, a colabora��o de interesse p�blico -, assegura ao indiv�duo escolher ou n�o uma religi�o e garantir sua liberdade de cren�a ou descren�a. Acaba a�!
 
 
Em hip�tese alguma, o Estado pode legislar em mat�ria religiosa, subvencionar cultos, nem as Igrejas podem atuar na vida p�blica comprometendo a laicidade. Como bem sintetizado por C�ssia Maria Senna Ganem, em seu artigo “Estado Laico e direitos fundamentais”, “(...) a separa��o entre Igreja e Estado, caracter�stica do Estado laico, n�o significa incompatibilidade entre um e outro, e nem falta de di�logo entre ambos. A separa��o exige que o Estado n�o apoie nenhuma corrente religiosa, mas tamb�m n�o adote postura antirreligiosa. Em suma, Estado laico � Estado neutro.”
 
Em di�logo direto com a laicidade encontra-se a garantia da liberdade de express�o. Embora possa parecer absurdo, nos tempos atuais, no Brasil, v�rias garantias e direitos precisam ser relembrados, ou mesmo restabelecidos. O caput do art. 5º da Constitui��o Federal consagra o princ�pio da ordem democr�tica, o princ�pio da igualdade, fundamento maior do Estado de Direito e o inciso IV protege a liberdade de pensamento e de express�o. 
 
Dentre outras garantias fundamentais est�o a veda��o de todas as formas de trabalho infantil para crian�as e adolescentes com menos de 16 anos de idade, conforme define o artigo 7º, inciso XXXIII da Constitui��o Federal. A �nica exce��o � a aprendizagem profissional, a partir dos 14 anos.
 
Em 12 de outubro de 2022, ap�s dois anos de fortes restri��es, a cidade de Aparecida do Norte pode abrir suas portas e receber seus fi�is sem restri��o contra a covid-19. Festa marcada por grande multid�o de fi�is em tradicionais atos de devo��o e f�, neste ano, a Bas�lica de Aparecida, seu bispo e arcebispo foram violentamente agredidos por fi�is cuja ideologia partid�ria se sobrep�s �s motiva��es da f�. 
 
 
O dia 12 de outubro de 2022 ficar� marcado pelo desrespeito ao clero, � igreja e aos fi�is que ali estavam em exerc�cio exclusivamente religioso. N�o se trata de garantir o Estado laico e a liberdade de express�o; ao contr�rio, trata-se de garantir que laicidade e direito de express�o sigam regras de respeito, limite e preserva��o da individualidade e da seguran�a. 
 
Some aos berros, incita��es ao �dio e � total falta de compostura na festa da padroeira, a celebra��o do dia das crian�as com soldados da Policia Militar do munic�pio de Uberaba e do Rio de Janeiro fazendo desfile de crian�as com vestimentas policiais e armas, mesmo que de brinquedo, nas m�os. Era vis�vel o constrangimento das crian�as, seja pela exposi��o, seja pela viol�ncia que significa, no dia da crian�a, receber a incumb�ncia de se tornar a guardi� contra a viol�ncia e o combate ao crime. 
 
Pergunto-me onde chegaremos com um Estado desvirtuado de seus valores assinados na Carta Magna; um Estado em que os tr�s Poderes parecem n�o respeitar mais suas pr�prias regras de atua��o e limite; um Estado onde legisladores podem fazer v�deos de xingamentos a bispos; um Estado onde policiais transgridem moral e civilmente ao usarem crian�as como trof�us de seus valores. 
 
No dia 12 de outubro dever�amos estar discutindo como enfrentar o trabalho infantil, seja na sua forma de explora��o sexual, seja escrava, dom�stica, ou em atividades ligadas ao tr�fico de drogas e tantas outras. Nessa mesma data, o F�rum Nacional de Preven��o e Erradica��o do Trabalho Infantil (FNPETI) divulgou que, em 2019, 1,9 milh�o de crian�as e adolescentes de cinco a dezessete anos de idade encontravam-se em situa��o de trabalho infantil no Brasil. Para 2020 e 2021, o FNPETI estima que os dados pioraram ainda mais.
 
 
Outros dados mostram o quanto precisamos avan�ar no combate ao trabalho infantil e nas pol�ticas de garantia de escolas e boa forma��o para crian�as e jovens: na popula��o brasileira de cinco a dezessete anos de idade, 96,6% estavam na escola, em 2019. No entanto, no grupo das que trabalhavam, essa propor��o caia para 86,1%, refor�ando o processo intergeracional de pobreza. 
Para finalizar, 45,8% do total de crian�as e adolescentes trabalhadores estavam em ocupa��es classificadas como as piores formas de trabalho infantil. Desse contingente, 65,1% tinham entre cinco e treze anos de idade. Pasmem! 
 
Crian�a n�o precisa de arma para se defender; ao contr�rio, crian�a precisa ser protegida. Crian�a precisa de pol�tica p�blica para se desenvolver. Crian�a precisa de Estado laico que respeite diverg�ncias e garanta seus direitos. Crian�a precisa ver seus direitos constitucionais prevalecerem. Crian�as com armas nas m�os � fosso humanit�rio, � sociedade desgovernada e dominada pela viol�ncia e pelo �dio. 
 
Serra Leoa mostrou sua atrocidade para o mundo com seu ex�rcito de crian�as, no final do s�culo passado. O que alguns policiais militares do estado de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, livres para mostrarem crian�as armadas no dia 12 de outubro, sinalizam para o pa�s? Qual o tamanho da mis�ria humana que pode estar sendo constru�da dentro de quart�is?  
 
No dia 16 de outubro comemorou-se, internacionalmente, o Dia Mundial da Alimenta��o. O tema deste ano da Organiza��o das Na��es Unidas para a Agricultura e a Alimenta��o (FAO) � "n�o deixar ningu�m para tr�s. Melhor produ��o, melhor alimenta��o, um ambiente melhor e uma vida melhor para todos". Papa Francisco aproveitou a ocasi�o e convidou a FAO a introduzir a “categoria amor” na sua linguagem. 
 
S�o Jo�o da Cruz, o maior m�stico da igreja cat�lica, escreveu que “no ocaso dessa vida, seremos julgados pelo amor”. Em meio a tanta atrocidade, a �nica op��o � n�o desistir. � seguir na esperan�a de que as celebra��es m�sticas, a liberdade de express�o, a laicidade, a preval�ncia dos direitos e o cumprimento dos deveres constitucionais, por parte do Estado, para constru��o de uma sociedade mais digna e pr�spera, tenham no amor e na fraternidade o lubrificante para realinhar os trilhos da hist�ria do Brasil. 

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)