
Por Eleonora Cruz Santos
A viol�ncia pol�tica come�ou a reverberar com mais for�a na sociedade, em 2014, nos est�dios de futebol da Copa do Mundo. Em 2018, come�ou a banalizar, quando o ent�o candidato e vencedor ao cargo de presidente da Rep�blica dizia que iria acabar com a “pol�tica de coitadismo” do nordestino, do gay, do negro e da mulher.
Ali come�ava, de forma expl�cita, a segrega��o social na sua forma mais desprez�vel e perversa, capaz de desestruturar os preceitos que comp�em uma verdadeira democracia. E em quatro anos o pa�s viveu sob constante amea�a � democracia, �s vidas humanas e � preserva��o de suas institui��es.
Ali come�ava, de forma expl�cita, a segrega��o social na sua forma mais desprez�vel e perversa, capaz de desestruturar os preceitos que comp�em uma verdadeira democracia. E em quatro anos o pa�s viveu sob constante amea�a � democracia, �s vidas humanas e � preserva��o de suas institui��es.
Viol�ncia pode ser a palavra que melhor define a �ltima semana da campanha presidencial. A sociedade brasileira veio a conhecer a trucul�ncia, a falta de respeito e de limites e o arsenal de armas e granadas de um dos maiores apoiadores do atual presidente; tamb�m conheceu a t�tica de faroeste da deputada federal mais votada de S�o Paulo, tamb�m cabo-eleitoral do atual presidente, capaz de sair com uma arma em dire��o a um civil e construir uma narrativa falsa que justificasse seu ato.
Essa mesma sociedade assistiu � “naturaliza��o do il�cito”, com total de 2.360 den�ncias de ass�dio eleitoral feitas ao Minist�rio P�blico do Trabalho, at� �s v�speras do segundo turno das elei��es de 2022. O show de horrores, o p�nico que fazia morada no inconsciente coletivo de boa parte da sociedade brasileira que decidiu, pela primeira vez na hist�ria de sua redemocratiza��o, n�o reeleger seu presidente em exerc�cio.
Logo no in�cio de seu discurso ap�s a confirma��o da vit�ria, Lu�s In�cio Lula da Silva disse que “(...) esta n�o � uma vit�ria minha, nem do PT, nem dos partidos que me apoiaram nessa campanha. � a vit�ria de um imenso movimento democr�tico que se formou, acima dos partidos pol�ticos, dos interesses pessoais e das ideologias, para que a democracia sa�sse vencedora.” O discurso democr�tico, pacificador e agregador foi a consolida��o de sua campanha.
Lula, reeleito pela segunda vez, beneficiou-se, no segundo turno, do apoio incans�vel de mulheres que foram determinantes para sua vit�ria: Simone Tebet, Marina Silva, Tabata Amaral, Luiza Erundina, as ind�genas C�lia Xakriab� e Sonia Guajajara, entre outras mulheres de partidos pol�ticos distintos, todas com o prop�sito comum de restabelecer as bases democr�ticas a fim de garantir que o pa�s voltasse a discutir e reestruturar pautas fundamentais como educa��o, meio ambiente, erradica��o da fome e da pobreza, garantia de direito �s minorias, �s mulheres, ao di�logo comum no campo democr�tico, ao combate ao �dio, ao fim da polariza��o e das fake news e da reinser��o na comunidade internacional.
“Enfrentar sem tr�guas o racismo, o preconceito e a discrimina��o, para que brancos, negros e ind�genas tenham os mesmos direitos e oportunidades” foram tamb�m palavras proferidas em seu discurso ap�s confirma��o da vit�ria. Portanto, em 30 de outubro de 2022, fica sacramentado que, por meio de amplo movimento de alian�as e apoios diversos, a sociedade opta por recompor as bases da sociedade democr�tica que, em sua ess�ncia, deva garantir dignidade para todos e todas.
Esse amplo movimento de suporte � candidatura de Lula contou, no primeiro turno, com participa��o de economistas de v�rias institui��es renomadas do Brasil e do exterior por meio de uma carta-manifesto a favor do voto �til pela preserva��o da democracia; j� no segundo turno, congregou os mais renomados economistas do pa�s – Arm�nio Fraga, P�rsio Arida, Andr� Lara Resende, Edmar Bacha, al�m das diversas cartas coletivas de apoio assinadas por (i) juristas, (ii) servidores do judici�rio, (iii) economistas do Ipea, (iv) bispos do Di�logo pelo Reino etc.
No meio pol�tico, declara��o por v�deo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi gesto � altura de um chefe de Estado que, ao longo de grande parte de sua vida pol�tica, teve Lula como seu maior opositor, mas que, de ambas partes, sempre preservaram dignamente o trato pessoal em gestos comuns: Lula foi ao vel�rio da ex-primeira-dama Ruth Cardoso, em 2008, com comitiva de ministros e Fernando Henrique Cardoso visitou Lula, em 2017, quando do falecimento da ex-primeira-dama Da. Marisa Let�cia, acompanhado de seu ex-ministro Jos� Gregori e do chanceler Celso Amorim.
Mais adiante em seu discurso, o presidente eleito Lula afirma que “quer liberdade religiosa. Quer livros em vez de armas. Quer ir ao teatro, ver cinema, ter acesso a todos os bens culturais, porque a cultura alimenta nossa alma.” Era not�rio, ao longo desses meses, nas redes sociais, o engajamento de diferentes personas.
Do meio social e art�stico, o empenho extraordin�rio e incans�vel, desde o in�cio, do youtuber Felipe Neto, que didaticamente explicava quest�es pol�ticas e contextualiza��es hist�ricas, al�m de combater diuturnamente fake news; de artistas consagrados da “velha guarda” e outros tantos mais jovens – a lista � enorme! – de cineastas, com destaque para Kleber Mendon�a Filho e Petra Costa, a profissionais liberais de diversas �reas e em constantes postagens em redes sociais, colunas em jornais, revistas e lives.
Toda a sociedade teve oportunidade de se beneficiar do trabalho da maioria da imprensa, que buscou trazer dados e fatos para combater fake news e/ou inverdades num�ricas ditas em debates ou programas eleitorais. Jornalistas mulheres tornaram-se alvo de amea�as, viol�ncia e persegui��o, com destaque mais ostensivo �s jornalistas Miriam Leit�o e Vera Magalh�es, por defenderem a necessidade do resgate da democracia.
“A ningu�m interessa viver num pa�s dividido, em permanente estado de guerra. Este pa�s precisa de paz e de uni�o. Esse povo n�o quer mais brigar. Esse povo est� cansado de enxergar no outro um inimigo a ser temido ou destru�do. � hora de baixar as armas que jamais deveriam ter sido empunhadas. Armas matam. E n�s escolhemos a vida”.
Lula, em mais um trecho de sua fala, retoma a pauta da uni�o, do restabelecimento do di�logo, da escuta, do combate � viol�ncia e � desuni�o que corr�i as bases democr�ticas e civilizat�rias da sociedade brasileira. O discurso � claramente inclusivo: ningu�m ficar� de fora.
Lula, em mais um trecho de sua fala, retoma a pauta da uni�o, do restabelecimento do di�logo, da escuta, do combate � viol�ncia e � desuni�o que corr�i as bases democr�ticas e civilizat�rias da sociedade brasileira. O discurso � claramente inclusivo: ningu�m ficar� de fora.
Lula tem intelig�ncia inata para negocia��o, aglutina extremos e prop�e arranjos que beneficiam ambas partes. � um agregador. Resta parte expressiva da sociedade, que n�o reelegeu seu candidato, abrir-se para a escuta e o di�logo em prol da harmonia e da reconstru��o do pacto democr�tico.
Conv�m lembrar que, ao recusar aceitar o resultado das elei��es de 2014, A�cio Neves levou o pa�s para o fosso antidemocr�tico e carregou parte expressiva da sociedade que n�o aceitou o resultado das urnas. O pre�o da desuni�o e da viol�ncia est� se tornando insustent�vel.
Que essa hist�ria n�o se repita por parte da sociedade que a endossou, sob pena de termos anos ainda mais dif�ceis do que os que se avizinham, em condi��es normais de temperatura e press�o – guerra na Ucr�nia, infla��o, polariza��es e crescimento da extrema direita e do autoritarismo em diversas partes do mundo.
Em breve, seremos surpreendidos pelo rombo nas contas p�blicas federais e conheceremos o que restou verdadeiramente do or�amento para 2023 que, seguramente, trar� um ano com s�rias dificuldades fiscais e exig�ncia de recursos para cobrir as mazelas sociais que se agravaram nos �ltimos anos.
E Lula n�o tem ilus�o, ao contr�rio, tem plena consci�ncia do que lhe espera no alto de seus 77 anos de idade, ao dizer, em seu discurso que “O desafio � imenso. � preciso reconstruir este pa�s em todas as suas dimens�es. Na pol�tica, na economia, na gest�o p�blica, na harmonia institucional, nas rela��es internacionais e, sobretudo, no cuidado com os mais necessitados”.
Lula demonstra profundidade e reflex�o crist� ao dizer que “� preciso reconstruir a pr�pria alma deste pa�s. Recuperar a generosidade, a solidariedade, o respeito �s diferen�as e o amor ao pr�ximo.” Lula passou 20 meses preso em Curitiba e seu ex-carcereiro e chefe do N�cleo de Opera��es da Pol�cia Federal, declarou apoio ao candidato no segundo turno das elei��es presidenciais. Jorge Chastalo Filho foi, seguramente, a pessoa que mais conviveu de perto com Lula no pres�dio. N�o teria porqu� tomar partido, mas assim o fez.
N�o faltaram demonstra��es de confian�a na capacidade de Lula restabelecer as bases civilizat�rias corro�das nos �ltimos oito anos. Cabe aos pol�ticos, aos governantes e � sociedade unirem-se em prol de algo maior: a constru��o de uma na��o que h� mais de 500 anos insiste em ser bem menor do que poderia ser.
Que a esperan�a sem ingenuidade nos conduza a tempos, embora ainda dif�ceis e penosos, mais dignos e compat�veis com tudo que essa na��o pode oferecer de melhor para seus cidad�os, para seu meio ambiente e para o legado de sua hist�ria no mundo.
Que a esperan�a sem ingenuidade nos conduza a tempos, embora ainda dif�ceis e penosos, mais dignos e compat�veis com tudo que essa na��o pode oferecer de melhor para seus cidad�os, para seu meio ambiente e para o legado de sua hist�ria no mundo.
