Imagina a perversidade de uma pessoa que se disp�e, pela internet, a atacar um beb� de quatro meses e sua fam�lia. Agora, pense em um motivo para isso?! Pois �. Ela mesma: a gordofobia. A beb� Lua, filha dos ex-bbs e influencers Viih Tube e Eliezer est� sendo atacada junto dos pais h� alguns dias nas redes sociais. Pessoas gastam o pr�prio tempo escrevendo coment�rios carregados de �dio, criticando a cria��o da crian�a e chamando-a de adjetivos que conferem inferioridade.
Tudo � desculpa para praticar livremente a gordofobia. A fil�sofa Malu Jimenez, que pesquisa o conceito, define-o como uma opress�o estigmatizante, estrutural e institucionalizada, e basta correr a timeline de qualquer rede social para confirmar isso.
Muitos coment�rios, como j� falei aqui um sem n�mero de vezes, chegam carregados de "cuidado" e "preocupa��o", num tom fofo, como: "ela n�o est� muito gordinha para a idade dela? cuidado!". Agora, pensa comigo: cuidado com qu�? Por Deus! � um beb� de quatro meses, gente. Que s� mama no peito da m�e. Tenham a santa paci�ncia.
Outros coment�rios conseguem ser piores, como "Ela n�o est� acima do peso, mas est� no limite. � importante fazer exames de tireoide para avaliar". Imagina sugerir para os pais de uma beb� que ela fa�a exame de tireoide. E a m�xima: avaliar, pelas redes sociais, que ela est� "no limite" do peso. Com que base, gente? Quem � essa pessoa? Pediatra da crian�a?
Eu fico imaginando os pais lendo isso. Esse tom de "cuidado" � capaz de me fazer perder o r�u prim�rio, porque eu penso: com que caralhos de autoridade a pessoa pensa que pode falar assim comigo? Ou com algu�m? Ou com quem quer que seja?
Os ataques foram tantos a ponto dos pais produzirem conte�dos em resposta e, pasmem, exibirem a consulta da crian�a com a pediatra e os exames da beb� de quatro meses para PROVAR que ela est� saud�vel. Pois �. Eu tamb�m j� ca� nessa cilada do "sou gorda, mas sou saud�vel" e exibi meus exames. E quer saber? Foda-se! Foda-se se a pessoa estiver gorda e n�o estiver saud�vel. Algu�m cobra isso das pessoas magras? N�o! Somente pessoas magras podem adoecer? Somente elas t�m esse direito? Sequer beb�s gordos podem existir?
N�o! Ningu�m - exceto os pais - est� preocupado com a sa�de da crian�a. Isso n�o existe, gente. J� falei aqui que um estudo comprova que obesidade n�o �, necessariamente, doen�a. Mas, vamos l�: e se for? � um problema seu, caro internauta? Voc� vai fazer algo pra ajudar? Est�, mesmo, preocupado com a sa�de dos beb�s? Ent�o, que tal visitar um hospital de crian�as com c�ncer e ajudar a organizar doa��es e tudo mais? � produtivo e, pasmem: � cuidar da sa�de de outra pessoa com responsabilidade.
Sugerir para os pais de uma beb� de quatro meses que ela � doente por ser gorda, definitivamente, n�o � o melhor caminho. Tampouco saud�vel.
E n�o para por a�. Em alguns dos coment�rios, algu�m, indignado, trouxe a foto de uma outra beb�, cujos pais postam fotos dela comendo frutas. Algu�m teve a coragem (sim, porque tem que ter coragem, convenhamos) de comentar: "Como ela gosta de comer, n�? J� vai guardando dinheiro para a bari�trica."
Sim! Estamos falando de uma beb� que n�o deve ter um ano de vida. E j� tem o corpo e o peso fiscalizados nas redes sociais. E j� tem a sugest�o "m�gica" da bari�trica garantida. Um beb�. Que n�o tem nem um ano.
A�, voc� pode me dizer: "Ah, mas a culpa � dos pais, pra qu� expor a crian�a?". E eu posso rebater: porque s�o os pais e escolhem o que fazer com a crian�a. N�o temos nada a ver com isso. E fim, sabe?
Mas n����oooo, a �nsia pela regula��o do corpo alheio e pelo �dio aos corpos gordos cruza, cada dia mais, as fronteiras invis�veis de qualquer coisa que poderia ser considerado algo moralmente impens�vel. Ou em algum momento pensamos que pudesse ser natural e aceit�vel atacar beb�s nas redes sociais por conta do tamanho de seus corpos?
Ali�s, em que momento beb�s gordos e cheios de dobrinhas e fofuras deixaram de ser uma del�cia e passaram a ser uma amea�a? E se tornaram "personinhas" non gratas socialmente? Em que momento deixamos de apreciar um beb� gordinho e achamos que era de bom tom julg�-los nas redes sociais e patrulhar seus corpinhos indefesos? Em que situa��o pensamos que pudesse ser confort�vel para os pais ter que ler que a filha est� muito gorda (ela tem quatro meses, gente) e que devem se preocupar com a alimenta��o dela (ela s� mama no peito, a �nica alimenta��o poss�vel para beb�s nessa idade) e com o futuro e o corpo e j� metendo um diagn�stico que sugere uma cirurgia altamente invasiva e que segue tirando a vida de v�rias pessoas no mundo?
Quando � que achamos que seria divertido, jocoso, bacana produzir esse tipo de coment�rios nas fotos de um casal que est� feliz e curtindo os primeiros meses da filha em harmonia?
Isso, claro, sem falar no algoritmo. O TikTok, na busca, sugere algo como: filha da Viih Tube obesa. Sim. Isso mesmo. Imagina, um programa sugere essa busca. E, perversamente, � uma das tags mais buscadas.
� claro que eu poderia falar aqui sobre a banalidade do mal e citar Hannah Arendt, poderia citar Freud e at� Lacan. Poderia teorizar sobre algoritmo e opress�o. Poderia um sem n�mero de coisas. Mas o que me perturba � como pode algu�m - e v�rias pessoas, em bando - achar razo�vel demonizar e desumanizar um beb� de quatro meses para praticar gordofobia.
O que me tira o ju�zo � saber que as pessoas t�m esse tempo dispon�vel e essa capacidade indiscriminada de serem gordof�bicas e de forma absolutamente livre, sem que isso lhes cause qualquer constrangimento, qualquer contra-ataque, qualquer sentimento que n�o seja o da mais absoluta compactua��o com o que est� sendo dito ali. � desesperador!
� desesperador existir num mundo em que crian�as e beb�s sejam expostos � gordofobia com t�o pouca idade e que se considere justo, OK, divertido, tripudiar sobre eles e sobre seus pais e sobre todas as pessoas gordas, que inevitavelmente se sentem mal diante disso.
Lembrando que, se voc� tem medo de engordar, voc� � uma pessoa gordof�bica, portanto, essa justificativa n�o serve como desculpa para atacar um beb� nas redes sociais e patrulhar o peso e o corpo dessa crian�a.
Por fim, sigo indignada. Inclusive, fiz esse texto no auge da indigna��o com a ousadia da gordofobia. E fico feliz por ainda me indignar, porque, do jeito que a coisa caminha, logo menos, nem isso vai me desestabilizar diante de tamanhos absurdos e viol�ncias.