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Estado de Minas RAMIRO BATISTA

Lula dilui plebiscito e den�ncias de corrup��o, mas restam as companhias

Depois de abater den�ncias e a rea��o plebiscit�ria contra sua candidatura, petista precisa amenizar a presen�a dos companheiros que o associam a radicalismo


08/02/2022 06:00

O ex-presidente Lula segura microfone e gesticula durante discurso
Esse o grande desafio de Lula: como esconder essa defici�ncia ou, como conv�m em campanha, transform�-la em virtude (foto: NELSON ALMEIDA / AFP)
Em torno do carro que levava Lula do seu instituto ao sindicato do ABC em S�o Bernardo do Campo, onde se refugiaria logo depois da ordem de Sergio Moro para prend�-lo, o mundo girava num ritmo de cinema.

Como narra de forma eletrizante Fernando Moraes nesta sua �ltima biografia, um comboio de carros de todos os interessados na hist�ria — amigos, familiares, advogados, correligion�rios, imprensa — e helic�pteros dos jornais de TV tentavam n�o perder o motorista esperto que cortava caminhos para evitar sinais e congestionamentos.

Moraes encadeia a cena a v�rias conversas nos tantos telefonemas que cruzavam os c�us do pa�s naquele momento, de pol�ticos a sindicalistas da velha guarda de S�o Bernardo, para armar o circo em que resistiria por quase 48 horas e de onde achei que nunca se reergueria politicamente, como escrevi � �poca:


Dentro, com apoio do ajudante de ordens no celular, disparava telefonemas e tramava os pr�ximos passos como se a movimenta��o l� fora n�o fosse com ele. Estava, como sempre, calculando os passos a frente, para dali a dois dias, das semanas, dois meses, dois ou quatro anos. Quatro e meio, se se considerar a elei��o de outubro de 2022.

Com a teimosia, a resili�ncia e a capacidade impressionante de mover as pe�as do tabuleiro para virar o jogo e transformar praticamente em p� a montanha de acusa��es que o puseram no centro da mais importante opera��o contra a corrup��o da hist�ria brasileira e  municiaram os processos que o levaram para a cadeia. 

Mais do que isso, transformar em criminosos os seus acusadores, numa das mais brutais invers�o de valores de que se tem conhecimento em nossa hist�ria moral, e chegar praticamente limpo ao palanque de que o bom senso das leis e da sociedade recomendava mant�-lo afastado.

Mais ainda, al�m de propalado como inocente sem ser, transformar-se em solu��o para um pa�s absolutamente sem rumo. Como se s� mesmo um mandarim desse porte fosse capaz de dar jeito.

Dilu�do o problema da corrup��o que o abateu e a seu partido temporariamente, tornando-a tema irrelevante no pr�ximo pleito, agora era diluir o plebiscito que ainda se formava contra ele, em cima do recall dos seus males passados.

Por mais que seus fi�is se incomodassem com a ideia de uma polariza��o que o punha em equival�ncia com Bolsonaro em personalidade, m�todos e prop�sitos, dois plebiscitos estavam armados para a elei��o de outubro.

Um que colocava metade do pa�s contra Bolsonaro, tornando f�cil a tarefa de angariar mais alguns votos da direita contrariada para derrub�-lo no segundo turno contra qualquer que fosse o advers�rio.

Mas tamb�m um outro, da outra metade contra Lula, alimentado por votos at� de esquerdistas frustrados com a m� hist�ria do partido. Perderia de qualquer outro candidato, a exce��o de Bolsonaro.

Assim como o capit�o se isolou na defesa de pautas restritas � sua massa de radicais nas redes sociais, o petista tamb�m parecia fechado na esquerda, num teto dif�cil de ultrapassar al�m dos partidos que comungam de sua pauta, tamb�m restrita, de forte controle estatal.

At� o dia em que, na mais esperta manobra da temporada, resolveu convidar para compor sua chapa Geraldo Alckmin, um dos tucanos de papo amarelo mais emplumados do espectro advers�rio, emblem�tico de tudo o que seu principal arco de alian�as odeia.

Com ele, abateu em 24 horas o alvoro�o da sua massa de radicais de ferocidade bolsonarista, abriu o leque para uma s�rie de outros contatos produtivos � centro-direita e diluiu, mais r�pido do que se imaginava, o pared�o que o isolava � esquerda no segundo turno.

De forma a sinalizar, com alta dose de realismo, para uma vit�ria j� no primeiro turno. Em que � esquerda j� fechada em torno dele se soma quase toda lideran�a relevante � direita e sobra pouco o que agregar aos demais candidatos.

Numa motoniveladora, colocou al�m de suas alian�as tradicionais um tent�culo dentro de cada grande partido — PMDB, PSDB, PP, PSD —,  j� estruturou mais de um palanque em alguns estados (quase todos os relevantes de S�o Paulo) e conquistou no amplo espectro do notici�rio pol�tico o estigma de conciliador.

— Concilia��o � o outro nome de Lula — escreveu Demetrio Magnoli, o muito respeitado soci�logo que tantas vezes foi carimbado pelos companheiros de Lula.

A essa altura, tendo dilu�do os dois pared�es, seu maior desafio parece ser o que alguns analistas, marqueteiros e estrategistas menores do governo ou mais argutos, na imprensa ou na pol�tica, apontam como seu terceiro calcanhar: as m�s companhias.

S�o aqueles aliados de dentro da cozinha, n�o relacionados com corrup��o mas com o radicalismo invariavelmente associado a Lula e ao lulismo, por mais que ele se esforce por provar o contr�rio. N�o fosse sua maestria e sua autoridade para enquadr�-los como patinhos em momentos de crise, n�o teria feito os acenos que sempre fez � parte da sociedade que o rejeita.

Come�a pelos ideol�gicos albaneses de estado controlador, como Ruy Falc�o, Jos� Genoino ou Jos� Dirceu. Passa pelos sindicalistas das greves e das invas�es, alojados na CUT e no MST, como Wagner Freitas ou Jo�o Pedro Stedile. Amplia-se nos histri�nicos como Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias ou Z� de Abreu. 

Ou mesmo Jean Willys e Randolfe Rodrigues, que, mesmo em outro partido, s�o associados � constela��o de gente irritada, cacof�nica e agressiva que sobrevoa a cabe�a de Lula como uma segunda natureza. 

N�o � toa, Bolsonaro passou a chamar a aten��o para os nomes mais estelares dessa constela��o em suas provoca��es. Tendo esvaziado o repert�rio de acusa��es poss�veis ao petista, sem legitimidade para falar de corrup��o ou for�a para ampliar alian�as, tem sugerido como natural que voltem a um eventual governo do advers�rio.

— Algu�m acha que se o cara [Lula] voltar, Z� Dirceu n�o vai para a Casa Civil? Dilma no Minist�rio da Defesa? Defesa, j� que ela � mandona e uma arma poderosa conhecida.

Para um amplo espectro bem informado e menos ideol�gico, que at� engoliria Lula como mal menor diante da falta de alternativas, essa trupe de radicais deu sonoridade ao discurso contra a zelite (os "n�s contra eles") e s� espera a hora de voltar para retomar o tom da agressividade dificilmente dissociada dos governos petistas. 

Seus adeptos dir�o que pode se dizer o mesmo de Bolsonaro em campanha. Sua volta poderia significar o retorno de extremos da extrema direita, como Abraham Weintraub ou Ernesto Ara�jo. Ou de despreparados como Ricardo Salles ou Marcelo Queiroga. Ou, para ficar no melhor exemplo, dos tr�s filhos problem�ticos.

Mas tratam-se aqui de personas que, at� pelo tempo bem menor de exposi��o, n�o ganharam tal musculatura que lhes fizesse confundidos com uma �poca. E, para quem precisa de um nome como desculpa para que Bolsonaro n�o volte, basta o do pr�prio, bastante queimado a esta altura.

Para mim, fora os sindicalistas que querem tomar um dia do meu sal�rio para fomentar greves ou o MST que me assusta, importam pouco os nomes. O petista ou o bolsonarista radical em si, de raiz, j� � motivo suficiente para n�o votar em nenhum dos dois.

� aquela ra�a de fan�ticos que nos bate com virul�ncia abaixo da cintura nas redes sociais, nos chama de facista ou de porco, e, como j� escrevi neste artigo, nos d� a certeza de que:

— Ah, n�o. N�o d� para votar em Bolsonaro. Essa gente n�o pode voltar ao poder.

— Ah, n�o. N�o d� para votar em Lula. Essa gente n�o pode voltar ao poder.

Esse o grande desafio de Lula: como esconder essa defici�ncia ou, como conv�m em campanha, transform�-la em virtude. Que reputo t�o dif�cil quanto desmoralizar a Lava Jato ou convencer a sociedade de que virou centro-direitista desde criancinha. Mas n�o duvido que ele consiga.

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