
As estat�sticas oficiais afirmam que mais de 1,6 milh�es de brasileiros j� contra�ram o coronav�rus, e que mais de 64 mil morreram em decorr�ncia de covid-19.
Um m�s ap�s a pol�mica, os tr�s portais t�m apresentado estat�sticas razoavelmente parecidas, com apenas pequenas discrep�ncias.
Mas, mesmo assim, ainda existem muitas d�vidas sobre a confiabilidade desses n�meros — devido a uma s�rie de defici�ncias na forma como os casos e as mortes s�o contabilizados.
Essas imperfei��es elevam consideravelmente o risco de os n�meros oficiais sobre infectados e mortos por covid-19, tanto no Brasil como no resto do mundo, estarem subestimados. Em outras palavras, podem estar pintando um quadro distorcido da realidade.
Um estudo do Laborat�rio de Intelig�ncia em Sa�de da Faculdade de Medicina de Ribeir�o Preto, ligado � Universidade de S�o Paulo (USP), por exemplo, estima que o Brasil poderia estar pr�ximo de atingir a marca de 9 milh�es de pessoas com covid-19 — sugerindo que pode haver uma margem de erro de at� 500% nas estat�sticas oficiais.
Os pesquisadores partem da no��o de que n�o h� testes suficientes feitos no Brasil para se determinar o n�mero de infectados com o Sars-Cov-2, o v�rus causador da covid-19.
Assim, eles usam dados da Coreia do Sul — pa�s com um dos melhores sistemas de exames de covid-19 do mundo — para calcular a taxa de letalidade da doen�a, que � a quantidade de pessoas que morrem em propor��o � quantidade que fica doente.
Assumindo que essa taxa de letalidade da doen�a seja fixa para todo o mundo — ou seja, que a covid-19 mata a mesma propor��o de pessoas em todos os pa�ses —, eles calcularam o total de pessoas contaminadas com covid-19 no Brasil usando essa taxa fixa e o n�mero de �bitos oficiais no pa�s, que seria mais confi�vel do que apenas o registro de casos da doen�a.
Alguns ajustes pontuais foram feitos, considerando diferen�as nas pir�mides et�rias dos dois pa�ses e tempo m�dio entre interna��o e �bito. Foi usando essa "engenharia reversa" que eles conclu�ram que o Brasil pode estar com at� seis vezes mais casos do que mostram as estat�sticas oficiais.
Dem�grafos e cientistas ouvidos pela BBC News Brasil dizem n�o acreditar que exista um esfor�o intencional do pa�s de subnotificar os casos, mas que diversos problemas do pa�s — alguns deles comuns em diversas outras na��es que enfrentam a pandemia — dificultam a compreens�o da dimens�o real da crise do coronav�rus.
Mas afinal, quais s�o esses problemas? Por que � t�o dif�cil estabelecer n�meros precisos sobre casos e mortes por covid-19 no pa�s?
1. Digita��o e transmiss�o de dados
Os sistemas para se registrar mortes de covid-19 foram montados especialmente para a pandemia, sem haver uma padroniza��o entre prefeituras e Estados de como coletar os dados.
Antes da covid-19, j� havia algumas ferramentas para ajudar o Brasil a entender o qu�o grave � o quadro de doen�as respirat�rias no pa�s, como o Sistema de Informa��o da Vigil�ncia Epidemiol�gica da Gripe (Sivep-Gripe), do Minist�rio da Sa�de, e o InfoGripe, da Fiocruz. Mas esses sistemas trabalham de forma agregada com os dados, sem conseguir discriminar com precis�o quais casos est�o ligados a covid-19.
Os n�meros da covid-19 que est�o sendo noticiados diariamente nos portais oficiais s�o compilados atrav�s de um "telefone sem fio". Diariamente as prefeituras entram em contato com hospitais, postos de sa�de e cl�nicas para perguntar sobre o n�mero de casos e mortos em cada lugar. Esses dados s�o compilados e repassados aos governos estaduais, que agregam os n�meros de todos os munic�pios e os enviam ao minist�rio da Sa�de.
J� houve epis�dios em que o governo federal precisou corrigir dados devido a erros de digita��o. E n�o h� nenhuma garantia de que os n�meros oficiais divulgados atualmente n�o tenham falhas de digita��o que ainda n�o foram detectadas.

Tamb�m existe um atraso nesse telefone sem fio. Um pesquisador disse � BBC News Brasil que os n�meros nacionais que estamos vendo em um determinado dia provavelmente s�o compila��es de dias anteriores que s� chegaram � ponta de cima do sistema — o Minist�rio da Sa�de — com alguns dias de atraso.
2. Qualidade e quantidade de testes
O maior obst�culo para se conhecer os n�meros reais ainda est� na testagem de pessoas, n�o s� no n�mero baixo de testes dispon�veis, como tamb�m na qualidade desses exames.
Mesmo os testes mais confi�veis, os chamados RT-PCR, s�o limitados, pois detectam apenas pessoas que est�o com a doen�a no momento do exame — e n�o os recuperados, que deveriam estar na estat�stica de total de casos.
H� tamb�m o risco de o exame n�o detectar o v�rus em pacientes doentes, pois ele pode n�o estar exatamente na parte do sistema respirat�rio de onde foi colhida uma amostra.
"O teste do PCR detecta, na melhor das hip�teses, de 70% a 80% dos casos", diz M�rcio Sommer Bittencourt, m�dico do centro de pesquisa cl�nica e epidemiol�gica do hospital universit�rio da USP.
E existe o problema da quantidade. O Brasil est� testando poucas pessoas para covid-19.
� poss�vel comprovar isso atrav�s da taxa de positividade — que mede quantas pessoas tiveram exame positivo em propor��o ao n�mero de pessoas testadas.

O Brasil tem uma taxa pr�xima de 40%, o que significa que se est� testando apenas os casos graves na maioria das vezes, de pessoas que j� est�o na rede hospitalar. Em uma pandemia, mesmo a popula��o sem sintomas deveria estar sendo testada.
A taxa ideal de positividade, segundo a Organiza��o Mundial da Sa�de, � de 5%, diz Domingos Alves, do Laborat�rio de Intelig�ncia em Sa�de da Faculdade de Medicina de Ribeir�o Preto. Ou seja, que apenas 5% dos testes feitos em uma popula��o dessem positivos, e os outros 95%, negativos.
"Os testes no Brasil s�o feitos quase que apenas nos internados. N�s estamos no escuro, estamos m�opes sobre essa pandemia", afirma ele.
Al�m disso, h� falta de rastreamento. Alves conta que, na maioria dos casos, nem mesmo as pessoas que tiveram contato recente com os pacientes de covid-19 est�o sendo testadas.
Bittencourt aponta que o governo federal n�o tem sido claro na divulga��o do n�mero de pessoas testadas. H� boletins e not�cias do governo falando em "n�meros de testes" sem especificar se esses testes j� foram de fato realizados ou conclu�dos.
3. Registro de mortes
A falta de testes prejudica a compreens�o sobre o n�mero de casos totais no Brasil. Mas outro n�mero crucial desta pandemia tamb�m pode estar sendo subnotificado segundo os cientistas: o de mortes causadas pelo coronav�rus.
E para se chegar a uma aproxima��o razo�vel da quantidade de mortos da pandemia, n�o � preciso olhar necessariamente apenas para os n�meros que est�o sendo enviados pelas prefeituras e Estados.
Cientistas em diversos pa�ses t�m preferido observar o "excesso de mortes". O n�mero de mortos em um determinado pa�s n�o costuma sofrer varia��es grandes de um ano para o outro — apesar de haver grandes varia��es sazonais (julho costuma ser o m�s com o maior n�mero de mortes no Brasil).
Neste ano, com a pandemia, h� muito mais gente morrendo todos os meses em compara��o com a m�dia dos �ltimos cinco anos — e dem�grafos dizem que se pode concluir com razo�vel precis�o que o coronav�rus � o grande respons�vel por essas mortes, j� que � o �nico fator novo.
Mas calcular as mortes em excesso � um problema no Brasil devido a outro obst�culo: os cart�rios.
Bittencourt explica que o sistema brasileiro de registros gera v�rios atrasos. A fam�lia tem at� 24 horas para registrar a morte de uma pessoa em um cart�rio. O cart�rio depois tem alguns dias para notificar a central nacional de registros dessa morte.
Em tese, a causa da morte deveria constar no registro do cart�rio, mas h� diversos problemas que dificultam isso. Em muitos casos, o exame que comprova que o paciente tinha covid-19 s� fica pronto dias depois que ele j� foi registrado como morto. Como o atestado de �bito precisa ser gerado logo ap�s a morte, n�o h� como esperar por um dado mais preciso. Al�m disso, h� munic�pios pequenos em que o atestado sequer � produzido por um m�dico.
As diversas imperfei��es e atrasos do sistema levam Alves a acreditar que o n�mero de �bitos que estamos vendo no notici�rio representa apenas 60% do total real de �bitos. Com isso, em vez de 64 mil mortes, a covid-19 seria respons�vel por 106 mil mortes no Brasil at� agora.
O estudo do laborat�rio de Alves usou o ent�o n�mero oficial de 60 mil mortes — e n�o o que ele acredita ser o real, de cerca de 100 mil — para estimar o n�mero real de casos de covid-19, que segundo ele estaria se aproximando de 9 milh�es de infectados.
"Nossos modelos sempre tentam errar para baixo para ningu�m nos acusar de exagerar o impacto da pandemia."

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