Publica��es compartilhadas mais de 11 mil vezes nas redes sociais ao menos desde 24 de dezembro de 2021 afirmam que o surto da variante H3N2 da influenza que ocorre no Brasil n�o poderia acontecer no ver�o e sugerem que os casos de gripe reportados s�o, na verdade, da variante �micron do v�rus SARS-CoV-2.
“Uma coisa que est� me chamando muito a aten��o � essa tal influenza H3N2 no ver�o. Voc�s nunca ver�o isso. No ver�o, gripe no ver�o � muito estranho, n�? Ser� que � H3N2 mesmo, ou � �micron mascarado? (...) Ser� que eles n�o querem admitir que seja �micron e que n�o seja H3N2? Ser� que existe mesmo essa influenza H3N2?”, dizem publica��es compartilhadas em formato de v�deo no Facebook, no Telegram e no Twitter.
Conte�dos de teor similar tamb�m foram compartilhados s� em formato de texto (1, 2, 3), alegando que “a gripe H3N2 � uma farsa!” e que “trata-se da variante Omicron”.

Tanto a gripe quanto a covid-19 s�o doen�as respirat�rias contagiosas, mas elas s�o causadas por v�rus diferentes, apontam os Centros de Controle e Preven��o de Doen�as (CDC) dos Estados Unidos. “A covid-19 � causada pela infec��o do coronav�rus, identificado pela primeira vez em 2019, e a gripe � causada por v�rus da influenza”, explica a institui��o.
� poss�vel distingui-los, portanto, pelas fam�lias �s quais pertencem: “Os v�rus que as causam - influenza e SARS-CoV-2, respectivamente -, s�o v�rus de fam�lias distintas (Orthomyxoviridae e Coronaviridae)”, ressaltou ao AFP Checamos Anderson F. Brito, virologista e pesquisador cient�fico do Instituto Todos pela Sa�de (ITpS).
Em uma coletiva de imprensa de 4 de janeiro de 2022, o respons�vel pela gest�o da covid-19 da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS), Abdi Mahamud, tamb�m explicou que trata-se de fato de “dois v�rus diferentes que usam dois receptores diferentes”. A entidade destaca em um texto atualizado em 30 de setembro de 2021 semelhan�as e diferen�as entre os v�rus e as doen�as causadas por eles.
Segundo a Funda��o Oswaldo Cruz (Fiocruz), “a influenza � uma infec��o viral aguda que afeta o sistema respirat�rio” e � “causada pelos v�rus A, B, C e D”. O tipo A da influenza � classificado em subtipos, como o A(H1N1) e o A(H3N2). O surto registrado em v�rios estados brasileiros no fim de dezembro de 2021 foi impulsionado por uma nova cepa do subtipo H3N2, batizada de Darwin.
A atualiza��o epidemiol�gica mais recente sobre a influenza e outros v�rus respirat�rios da Organiza��o Pan-Americana da Sa�de (Opas), de 28 de dezembro de 2021, tamb�m mostra que “as detec��es de influenza circulando no Brasil foram registradas como influenza A(H3N2)”.
O mesmo relat�rio apontou que, no Brasil e no Cone Sul, a circula��o da gripe aumentou para n�veis pr�-pand�micos.
Para Brito, a baixa nos casos de gripe no per�odo pand�mico se explica pelo controle da gripe nos anos de 2020 e 2021, que se deu muito em fun��o do uso constante de m�scara e distanciamento, medidas adotadas no contexto da pandemia da covid-19. “Isso ajudou a conter n�o s� o coronav�rus SARS-CoV-2, como outros v�rus respirat�rios, incluindo o v�rus influenza. No momento em que estados promoveram amplas flexibiliza��es, o v�rus influenza, e o SARS-CoV-2, encontraram ali oportunidades para se disseminarem”.
“Gripe no ver�o”
No Brasil, houve uma mudan�a de sazonalidade, explicou a pesquisadora e chefe do Laborat�rio de V�rus Respirat�rios e do Sarampo da Fiocruz, Marilda Siqueira, e o avan�o da influenza A, que costuma ocorrer nos meses de temperaturas mais baixas, aconteceu durante a primavera e o come�o do ver�o. Essa circula��o do v�rus coincidiu com uma trajet�ria predominantemente de queda nos novos casos da covid-19 no pa�s, o que levou muitas pessoas (1, 2, 3) a flexibilizar as medidas restritivas.“Aqui no hemisf�rio sul, o v�rus da gripe voltou a circular no m�s de novembro porque provavelmente houve a entrada de pessoas vindas de outros pa�ses onde o v�rus j� estava circulando. E, como as medidas de restri��o, como m�scara e distanciamento social, j� n�o estavam sendo usadas por uma parcela expressiva da nossa popula��o, o v�rus se disseminou”, acrescentou a pesquisadora.
Mas apesar da maior preval�ncia da influenza em per�odos mais frios, o virologista Anderson Brito destacou que n�o � incomum haver casos de gripe no ver�o, fora dos per�odos sazonais: “Dados da Opas mostram que em anos anteriores observamos casos fora dos per�odos usuais, em diversos pa�ses das Am�ricas”. E concluiu: “N�o h� m�s com gripe e m�s sem gripe; o v�rus n�o para de circular, s� diminui a incid�ncia da doen�a fora dos meses mais frios”.
Baixa cobertura vacinal
O aumento dos casos de gripe no fim de 2021 n�o foi resultado somente do relaxamento das medidas de prote��o. Segundo Siqueira, o fato de a influenza ter circulado fora de �poca pode ter convergido com a queda da resposta imune daqueles que tomaram a vacina contra a gripe em abril, m�s de in�cio da campanha de vacina��o, e com a baixa cobertura vacinal.“N�s tivemos uma mudan�a de sazonalidade, tivemos baixa cobertura vacinal e a vacina n�o induz uma imunidade de longo tempo, mas de oito ou nove meses. Portanto, quem se vacinou em abril, dependendo da faixa et�ria, agora j� pode estar com uma queda de anticorpos”, afirmou a pesquisadora da Fiocruz.
Para Jos� Tadeu Monteiro, pneumologista e coordenador da Comiss�o Cient�fica de Infec��es Respirat�rias e Micoses da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, “o avan�o dos casos de influenza � resultado da falta de prote��o adequada da vacina administrada neste ano de 2021 somada a um relaxamento das medidas de prote��o”.
Ele argumenta que o atual aumento de casos de influenza deve servir como um alerta para os riscos de uma maior flexibiliza��o das medidas de prote��o no contexto da pandemia da covid-19: “As medidas de prote��o continuam v�lidas, entendendo que n�s temos a variante �micron [do v�rus SARS-CoV-2], que � bem infecciosa”.
Para duas epidemias acontecerem ao mesmo tempo, a exemplo das causadas pelo v�rus da influenza e pelo SARS-CoV-2 original e com muta��es, como no caso da variante �micron, basta haver condi��es favor�veis para a dissemina��o dos v�rus: “Ampla parcela da popula��o n�o vacinada (ou vulner�vel a infec��es), neglig�ncia quanto ao uso de m�scara, aus�ncia de distanciamento f�sico ou isolamento de infectados”, concluiu Brito.
Para o respons�vel pela gest�o da covid-19 da OMS, Abdi Mahamud, a maior preocupa��o diante da concomit�ncia das duas � a poss�vel satura��o dos sistemas de sa�de. “Mas, felizmente, todas as medidas tomadas contra a covid-19 (tamb�m) afastaram a gripe”, alertando que, ao diminuir a vigil�ncia, a doen�a causada pela influenza tende a voltar com for�a.
Na coletiva de imprensa, Mahmud insistiu: “Temos uma vacina eficaz contra a gripe e uma vacina anticovid eficaz que ir� proteger voc�s”, pedindo a todos que se vacinem.
*Esta verifica��o foi realizada com base em informa��es cient�ficas e oficiais dispon�veis na data desta publica��o.
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