A suposta rela��o entre a tecnologia 5G e a covid-19 foi descartada por especialistas, diferentemente do que alegam publica��es que circulam nas redes sociais desde 27 de junho de 2022.
Baseadas em um estudo da biof�sica norte-americana Beverly Rubik, elas afirmam que a covid-19 surgiu em Wuhan, na China, 'logo ap�s o 5G em toda a cidade ter 'entrado em opera��o'' e que h� uma correla��o 'estatisticamente significativa' entre a intensidade da radia��o de radiofrequ�ncia e a mortalidade pelo SARS-CoV-2.
Mas a pandemia chegou a lugares onde n�o foi implementada a tecnologia, que utiliza comprimentos de onda mais superficiais do que seus antecessores, como o 4G.
'RELA��O ENTRE COVID E 5G', diz uma sequ�ncia de oito tu�tes, com a introdu��o: 'O estudo trata de uma conex�o entre a doen�a coronav�rus-19 e a exposi��o � radia��o de radiofrequ�ncia de comunica��es sem fio, incluindo 5G'.
De acordo com o resumo do estudo citado, os pesquisadores investigaram 'um poss�vel fator ambiental na pandemia' de coronav�rus, especificamente 'a radia��o de radiofrequ�ncia ambiental dos sistemas de comunica��o sem fio'. 'A covid-19 surgiu em Wuhan, China, logo ap�s a implementa��o do 5G (...) por toda a cidade' e depois se espalhou rapidamente 'globalmente, demonstrando uma correla��o estat�stica com comunidades internacionais com antenas 5G instaladas'.
O conte�do circulou anteriormente em julho de 2021, em espanhol, quando o material ainda era divulgado em forma de preprint.

Ap�s ter passado pelo processo de revis�o por pares, o estudo foi publicado na revista cient�fica Journal of Clinical and Translational Research, que tem 'qualidade question�vel', disse � AFP Alberto N�jera, f�sico e doutor em neuroci�ncia e membro do Comit� Cient�fico Assessor em Radiofrequ�ncias e Sa�de (CCARS) espanhol, em 16 de julho de 2022.
'� uma revista recentemente inclu�da na Web of Science e n�o possui �ndice de impacto, ocupa a posi��o 140 em 195 na categoria 'Medicina, Pesquisa & Experimental' sendo, portanto, 'Q3''.
De acordo com N�jera, uma descoberta dessa magnitude, que demonstrasse rela��o clara entre a covid-19 e a tecnologia 5G, deveria ter sido publicada em um peri�dico renomado. 'Mas, tendo em vista os coment�rios de muitos dos revisores, em uma revista s�ria, a proposta n�o teria passado do editor'.
Isso se deve ao fato de que, segundo ele, v�rios dos 12 revisores apontaram que o artigo mistura achados in vitro com animais e humanos e extrapola para humanos 'sem qualquer pudor, sem apresentar evid�ncias do que se pretende demonstrar'.
N�jera aponta, ainda, a quantidade incomum de revisores, explicando que o normal � que um estudo seja revisado por tr�s pessoas. 'Se os tr�s estiverem mais ou menos de acordo, ent�o o artigo tem uma certa consist�ncia', disse. Mas no caso do artigo de Rubik, isso aconteceu de forma diferente:
'Quando h� v�rios revisores que, de forma argumentativa, revelam as defici�ncias, vieses e erros de um artigo, � normal que o editor o rejeite, independentemente de haver mais que indiquem que o artigo � fant�stico. A ideia � que se fosse t�o maravilhoso como dizem alguns dos revisores, o l�gico seria que esse achado incr�vel fosse destaque em todo o mundo, mas � t�o bruto, tendencioso e absurdo que est� onde est�'.
Abaixo, a AFP verifica as principais alega��es do resumo:
1 - 'A covid-19 surgiu em Wuhan, logo ap�s a implementa��o do 5G' - Enganoso
A tecnologia 5G � considerada o futuro da telefonia m�vel, j� que oferece uma banda larga muito maior para liderar a transi��o digital das economias, de ve�culos aut�nomos a intelig�ncia artificial. As redes 5G s�o apontadas como um salto exponencial na quantidade e velocidade de dados sem fio, o que permitir� o desenvolvimento futuro de ind�strias, da realidade virtual e da assist�ncia m�dica online, entre outros.
A primeira rede nacional de telefonia m�vel de quinta gera��o, ou 5G, foi lan�ada pela Coreia do Sul em abril de 2019, e os primeiros registros do novo coronav�rus, em dezembro de 2019 na China.
A cidade de Wuhan foi pioneira na introdu��o da cobertura 5G em suas telecomunica��es na China, mas n�o foi a �nica. Em 1º de novembro de 2019, quase dois meses antes da notifica��o dos primeiros casos da covid-19, o 5G chegou oficialmente a mais de 50 cidades do pa�s gra�as a tr�s empresas chinesas de telecomunica��es.
Al�m disso, em junho de 2019, ainda que de forma limitada, j� existia cobertura 5G em uma dezena de localidades do pa�s, incluindo Wuhan. Em meados de outubro de 2019, segundo a ag�ncia chinesa Xinhua, havia 1.580 esta��es 5G instaladas naquela cidade.
Em 2018, testes dessa tecnologia j� haviam sido realizados em um grupo de cidades piloto, incluindo Wuhan, junto com outras 16. Em fevereiro de 2018, foi inaugurada a primeira esta��o piloto de 5G na prov�ncia de Hubei.
2 - A covid-19 'se espalhou pelo mundo, mostrando uma correla��o (...) com antenas 5G instaladas' - Falso
O professor N�jera respondeu � AFP em julho de 2021 que o v�nculo citado no estudo '� absolutamente falso' e que 'n�o h� evid�ncias de que isso ocorra'. O especialista enfatizou que, � �poca, a pandemia assolava a �ndia, 'onde a cobertura m�vel � limitada �s grandes cidades, mas a incid�ncia do v�rus, n�o'.
Neste mapa da plataforma Ookla, � poss�vel ver como n�o h� cobertura ou implementa��o de 5G na �ndia, que, em 12 de julho de 2021, era o terceiro pa�s com maior n�mero de mortes pelo v�rus.
O Equador, um dos pa�ses latino-americanos mais afetados pela pandemia, tamb�m n�o registra nenhuma implementa��o de cobertura 5G nos mapas.

3 - 'Identificamos v�rias maneiras pelas quais as radia��es de redes sem fio podem ter contribu�do para a pandemia da covid-19 como um cofator ambiental t�xico' - Falso
N�jera destacou: 'Nem essa nem outras alega��es, como a de que a exposi��o a campos eletromagn�ticos de radiofrequ�ncia interferem nas fun��es fisiol�gicas, comportamentais ou psicol�gicas, s�o verdadeiras'. 'O texto se baseia' nas afirma��es de Rubik de que 'a energia da natureza est� em sintonia com supostas frequ�ncias que interagiriam com nossas c�lulas, o que � falso', concluiu.
'N�o foram observadas altera��es na respira��o ou no metabolismo energ�tico em n�vel celular em seres vivos expostos a ondas 5G, muito menos altera��es respirat�rias dram�ticas t�picas da pneumonia por SARS-CoV-2', avaliou nessa verifica��o da AFP de maio de 2020 o m�dico Luis A. P�rez Romasanta, chefe de Radioterapia Oncol�gica do Complexo de Assist�ncia Universit�rio de Salamanca.
4 - 'Em particular, o 5G, que implica o adensamento da infraestrutura 4G, pode ter exacerbado a preval�ncia e gravidade da covid-19' - Falso
'Devemos especificar que tipo de radia��o e em que n�veis' s�o inofensivas as radia��es eletromagn�ticas mencionadas no estudo compartilhado, afirmou Alberto N�jera. 'Estudos cient�ficos rigorosos estabelecem os n�veis em que os efeitos s�o produzidos e ag�ncias independentes estabelecem esses limites de seguran�a', comentou o professor universit�rio.
A radia��o de telefones celulares 'n�o � muito intensa e penetra pouco' no corpo humano, disse N�jera em maio de 2020. 'A pot�ncia emitida pelas antenas � extremamente baixa', disse ele em fevereiro de 2021. 'Nos n�veis usuais de exposi��o , que est�o bem abaixo dos limites estabelecidos, n�o h� evid�ncias de efeitos na sa�de humana', ressaltou.
A Comiss�o Internacional para Prote��o de Radia��es N�o Ionizantes (ICNIRP, na sigla em ingl�s) explica que todos os celulares, independentemente de sua gera��o tecnol�gica, 'operam na faixa de radiofrequ�ncia do espectro eletromagn�tico, de v�rias centenas de megahertz a v�rios gigahertz, para habilitar chamadas telef�nicas sem fio e transmiss�o de dados'.
'Depois de 30 anos [dessas radiofrequ�ncias] n�o temos provas cient�ficas de que haja um efeito na sa�de', concordou o f�sico espanhol N�jera, insistindo que a radiofrequ�ncia '� inofensiva (...) sempre que trabalhemos com os limites estabelecidos por organismos internacionais', como a pr�pria ICNIRP. 'Estamos entre 10.000 e 100.000 vezes abaixo do limite de seguran�a', disse N�jera, por isso 'temos uma margem ampla'.
Sobre a infraestrutura 4G em rela��o ao 5G, Federico Ruiz, diretor do Observat�rio Nacional 5G espanhol (com participa��o estatal), explicou � AFP em 2020: 'Embora a informa��o digital que contenham seja muito diferente, do ponto de vista eletromagn�tico, sinais 5G e 4G s�o basicamente a mesma coisa'.
A tecnologia 5G 'vai permitir ter antenas menores e mais pr�ximas das pessoas. (...) Se eu tiver que me comunicar com a antena, estando mais perto, meu equipamento tem que emitir menos intensidade', esclarece N�jera.
Em rela��o �s bandas de frequ�ncia, as do 5G 'est�o pr�ximas �s usadas atualmente pelo 4G ou Wi-Fi', disse Olivier Merckel, especialista da ag�ncia de seguran�a sanit�ria francesa (Anses). 'A partir de 10 gigahertz, a energia eletromagn�tica quase n�o penetra no corpo, concentra-se no n�vel da pele', explicou.
O especialista franc�s alertou que, embora existam 'estudos que tenham mostrado a exist�ncia de efeitos biol�gicos em par�metros muito espec�ficos, como sono ou estresse', isso n�o significa necessariamente que haja risco para a sa�de. Os efeitos biol�gicos mostram que o corpo se adapta �s varia��es em seu ambiente, disse ele.

Por outro lado, Xavier Vilajosana Guill�n, pesquisador principal do grupo de investiga��o de Redes Sem Fios da Universidade Oberta da Catalunha (UOC), disse � AFP, em fevereiro de 2019, que os sistemas de telecomunica��es utilizam ondas eletromagn�ticas em bandas de frequ�ncia muito altas, mas que essas ondas 's�o muito menos energ�ticas do que, por exemplo, a luz vis�vel ou a luz solar'.
O ser humano viveu os �ltimos 100.000 anos exposto 'a radia��es de frequ�ncia muito mais altas', estimou Vilajosana. Segundo o especialista em 5G, 'n�o foi poss�vel demonstrar que [ondas eletromagn�ticas] tenham algum efeito na sa�de humana'.
A radia��o pode ser 'ionizante e n�o ionizante, e enquanto a radia��o ionizante (como raios X ou rea��es nucleares) pode causar s�rios efeitos � sa�de, incluindo c�ncer, a radia��o n�o ionizante em n�veis 5G n�o pode causar tais efeitos', explicou Rodney Croft, professor da Universidade de Wollongong, na Austr�lia, e tamb�m membro do ICNIRP.
O Instituto Nacional do C�ncer dos Estados Unidos indica em seu 'Dicion�rio do C�ncer' que 'est� estabelecido que a maioria dos tipos de radia��o n�o ionizante n�o causa c�ncer'.
O AFP Checamos j� verificou outras alega��es que abordavam uma suposta rela��o entre a tecnologia 5G e a pandemia da covid-19 (1, 2).
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