“Minha vida e a de meu filho foram destro�adas pelo pr�prio sistema judici�rio brasileiro”. Esse � o relato de uma das centenas de m�es que por cinco anos enfrentou a Justi�a e perdeu a guarda do filho para o ex-companheiro, acusado de viol�ncia sexual. Psic�logas, advogadas e coletivos formados por m�es e mulheres apontam que a Lei de Aliena��o Parental tem sido usada em muitos casos nos tribunais brasileiros para silenciar mulheres e beneficiar homens. Fizemos este v�deo #PRAENTENDER o que � essa lei e porque movimentos feministas lutam para revog�-la.
A s�ndrome da aliena��o parental
O conceito S�ndrome de Aliena��o Parental (SAP) foi criado pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner, em 1985. Ele � conhecido pelo trabalho como perito judicial em mais de 400 casos de guarda de crian�as, defendendo pais, professores e membros de congrega��es religiosas de acusa��es de abusos sexuais e de pedofilia.Para Richard, um genitor poderia, como forma vingativa, desconstruir a imagem do outro para a crian�a, inclusive criando falsas mem�rias de abuso sexual. Ele defende que, quando n�o identificada e devidamente tratada, a S�ndrome de Aliena��o Parental poderia trazer graves consequ�ncias ps�quicas e comportamentais para a crian�a.
A aliena��o parental, no entanto, nunca foi reconhecida como s�ndrome ou doen�a. A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) define o termo aliena��o parental como “um problema de relacionamento entre crian�a e cuidador”, e n�o como um dist�rbio.
A lei da Aliena��o Parental no Brasil
A demanda para a elabora��o da Lei de Aliena��o Parental (12.318%u22152010) surgiu das associa��es de pais separados que buscavam reivindicar seus direitos de conv�vio com suas(seus) filhas(os).A aliena��o parental virou lei no Brasil em 2010. A justificativa usada na �poca era a de que a legisla��o protegeria crian�as que convivem com pais separados.
A lei define aliena��o parental como o conjunto de pr�ticas promovidas ou induzidas por um dos pais ou por quem tenha um adolescente ou crian�a sob sua autoridade, guarda ou vigil�ncia, com o objetivo de lev�-lo a repudiar o outro genitor ou impedir, dificultar ou destruir v�nculos entre ambos.
Caso a justi�a entenda que houve a aliena��o parental, o genitor pode sofrer puni��es como advert�ncia, multa, altera��o ou invers�o de guarda, mudan�as nas visitas, determina��o de acompanhamento psicol�gico e, em casos mais graves, at� mesmo a suspens�o da autoridade parental.
O que diz a lei de aliena��o parental:
Art. 6o Caracterizados atos t�picos de aliena��o parental ou qualquer conduta que dificulte a conviv�ncia de crian�a ou adolescente com genitor, em a��o aut�noma ou incidental, o juiz poder�, cumulativamente ou n�o, sem preju�zo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utiliza��o de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:I - declarar a ocorr�ncia de aliena��o parental e advertir o alienador;
II - ampliar o regime de conviv�ncia familiar em favor do genitor alienado;
III - estipular multa ao alienador;
IV - determinar acompanhamento psicol�gico e/ou biopsicossocial;
V - determinar a altera��o da guarda para guarda compartilhada ou sua invers�o;
VI - determinar a fixa��o cautelar do domic�lio da crian�a ou adolescente;
VII - declarar a suspens�o da autoridade parental. Par�grafo �nico. Caracterizado mudan�a abusiva de endere�o, inviabiliza��o ou obstru��o � conviv�ncia familiar, o juiz tamb�m poder� inverter a obriga��o de levar para ou retirar a crian�a ou adolescente da resid�ncia do genitor, por ocasi�o das altern�ncias dos per�odos de conviv�ncia familiar.
Mariana Regis, advogada especialista em direito das fam�lias, ainda destaca que, em 2010, a lei foi aprovada �s pressas, sem participa��o de �rg�os de prote��o � inf�ncia, nem das m�es na �nica audi�ncia p�blica que a precedeu.
Embora tenha nascido com a promessa de proteger crian�as, segundo especialistas, a Lei de Aliena��o Parental tem sido usada nos tribunais para defender pais. Ela, muitas vezes, � ultilizada para pedidos de pens�o; pedidos de div�rcio e, nos casos mais graves, retalia��o a den�ncias de viol�ncia sexual contra a crian�a.
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Nos casos mais graves, em geral a m�e que tem guarda compartilhada ou unilateral percebe que seu filho est� sendo abusado sexualmente pelo pai e faz a den�ncia na Justi�a. � aberto um inqu�rito para investigar, mas, antes mesmo de ele ser conclu�do, o pai consegue uma decis�o de revers�o de guarda, na Vara da Fam�lia, alegando falsa den�ncia e implanta��o de falsas mem�rias por parte da m�e, que � ent�o acusada de ser alienadora. Isso ocorre porque os processos correm em varas diferentes, o de guarda na vara de fam�lia e o de abuso na criminal.
Uma pesquisa realizada pela psic�loga Analicia de Souza, especialista em Psicologia Jur�dica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) analisou jurisprud�ncia de tr�s Tribunais de Justi�a, o de Minas Gerais, o da Bahia e o de S�o Paulo. A pesquisa mostra que, entre 404 processos analisados de agosto de 2010 a dezembro de 2016, em 89% das demandas judiciais n�o ocorreu a comprova��o de aliena��o parental. A mesma pesquisa revela tamb�m que � mais comum associar supostos atos de “aliena��o parental” �s m�es. Alega��o feita, majoritariamente, por homens.
Refor�a os pap�is de g�nero
Nos processos judiciais, especialistas apontam que as mulheres s�o categorizadas caracterizadas como mentirosas, superprotetoras, loucas ou at� mesmo inconformadas com o fim do relacionamento. Fato que denuncia como esses estere�tipos afetam a credibilidade dos seus depoimentos.“A Justi�a sempre est� utilizando do refor�o dos pap�is que as mulheres deveriam exercer na sociedade para acus�-las de algo. Se elas n�o agem em conformidade com esses pap�is conservadores ela est� sendo acusada de m�e neglig�nte”, aponta a soci�loga pol�tica e fil�sofa, J�ssica Miranda.
A lei da Aliena��o Parental pelo mundo
Brasil e Porto Rico s�o os �nicos pa�ses que contemplam a aliena��o parental em suas legisla��es.“S� o Brasil e, mais recentemente, Porto Rico contemplam a aliena��o parental em suas legisla��es. Mesmo com a manifesta��o do Departamento de Justi�a deste �ltimo pa�s recomendando a supress�o da express�o 'aliena��o parental' face � aus�ncia de reconhecimento cient�fico e da comunidade m�dica, o legislativo daquele pa�s alterou a legisla��o que trata sobre a guarda de crian�as e adolescentes para incluir a suposta s�ndrome”, explica Mariana Regis, advogada especialista em direito das fam�lias.
Nos Estados Unidos, onde esse conceito foi criado, os tribunais de inf�ncia e juventude proibiram o uso da S�ndrome de Aliena��o Parental.
Um dos �ltimos pa�ses onde a lei vigorava era o M�xico. Mas, em 2017, o pa�s revogou a Lei de Aliena��o Parental ap�s um caso que envolvia disputa judicial pela guarda de tr�s filhos - com acusa��o de abuso sexual e uso da Lei de Aliena��o - terminou com o suic�dio da m�e e a morte das crian�as e dos av�s.
Campanha pela revoga��o no Brasil
M�es que perderam a guarda ou foram afastadas de seus filhos ap�s denunciarem pais agressores ou ped�filos se uniram para mostrar que essa lei n�o � um problema individual, mas social. Profissionais do direito, da psicologia e coletivos feministas defendem que a lei de aliena��o parental seja revogada no Brasil.Mas, afinal, caso a lei de aliena��o parental seja revogada, h� outras leis que possam assegurar a prote��o e o cuidado das crian�as ap�s a separa��o dos pais? Especialistas afirmam que sim.
“O estatuto da crian�a e do adolescente (ECA), a Constitui��o Federal, o C�digo Civil j� disp�em de dispositivos suficientes para enfrentar o que eu chamo de abuso do poder parental. Um pai ou m�e que impede o conv�vio de uma crian�a com outro genitor pratica um abuso de poder parental. O que questionamos � o enfrentamento proposto pela LAP. O enfrentamento que gera a cria��o do estigma de uma v�tima e de /algoz - e que � um lugar que as mulheres - infelizmente - s�o sempre colocadas”, aponta.
A campanha pela revoga��o da lei de aliena��o parental foi criada pela a uni�o de coletivos feministas. Ao receber 20.000 apoios, a ideia pode ser tornar uma sugest�o legislativa para ser debatida pelos senadores. At� esta sexta-feira (16/04), a peti��o conta com 13.845 apoios. A data limite para a campanha � 8 de junho.
Sibele Lemos, que integra o Coletivo de Prote��o a Inf�ncia Voz Materna, afirma que n�o existe o mal uso da Lei. “Ela � usada exatamente para o prop�sito ao qual foi elaborada: silenciar mulheres%u2215m�es que denunciam a viol�ncia dom�stica e familiar, assim como as viol�ncias e abusos sexuais contra suas(seus) filhas(os) ap�s a separa��o”, disse.
Denuncie a viol�ncia contra crian�as
Em caso de crime sexual, voc� pode fazer uma den�ncia pelos telefones:
- Ligue 100 em casos de viol�ncia contra crian�as, adolescentes ou vulner�veis
- Para urg�ncia, disque 190
- E para os demais casos, ligue 180
O que � relacionamento abusivo?
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Como denunciar viol�ncia contra mulheres?
- Ligue 180 para ajudar v�timas de abusos.
- Em casos de emerg�ncia, ligue 190.
O que � viol�ncia f�sica?
- Espancar
- Atirar objetos, sacudir e apertar os bra�os
- Estrangular ou sufocar
- Provocar les�es
O que � viol�ncia psicol�gica?
- Amea�ar
- Constranger
- Humilhar
- Manipular
- Proibir de estudar, viajar ou falar com amigos e parentes
- Vigil�ncia constante
- Chantagear
- Ridicularizar
- Distorcer e omitir fatos para deixar a mulher em d�vida sobre sanidade (Gaslighting)
O que � viol�ncia sexual?
- Estupro
- Obrigar a mulher a fazer atos sexuais que causam desconforto
- Impedir o uso de m�todos contraceptivos ou for�ar a mulher a abortar
- Limitar ou anular o exerc�cio dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher
O que � viol�ncia patrimonial?
- Controlar o dinheiro
- Deixar de pagar pens�o
- Destruir documentos pessoais
- Privar de bens, valores ou recursos econ�micos
- Causar danos propositais a objetos da mulher
O que � viol�ncia moral?
- Acusar de trai��o
- Emitir ju�zos morais sobre conduta
- Fazer cr�ticas mentirosas
- Expor a vida �ntima
- Rebaixar por meio de xingamentos que incidem sobre a sua �ndole
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