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Estado de Minas LIVRO

Em 'Eterna Vigil�ncia', Edward Snowden conta por que se rebelou contra o imp�rio americano

Autobiografia do ex-analista da NSA d� detalhes sobre a coleta de dados particulares de pessoas do mundo inteiro pelo governo dos EUA


postado em 20/09/2019 04:00 / atualizado em 20/09/2019 08:37



Meu nome � Edward Joseph Snowden. Eu trabalhava para o governo, mas agora trabalho para o p�blico. Levei quase tr�s d�cadas para reconhecer que havia diferen�a entre um e outro, e quando reconheci acabei tendo problemas no trabalho. E o resultado disso foi que agora passo meu tempo tentando proteger o p�blico da pessoa que eu era antes – um espi�o da Ag�ncia Central de Intelig�ncia (CIA) e da Ag�ncia Nacional de Seguran�a (NSA). Apenas mais um jovem tecn�logo construindo o que eu tinha certeza que seria um mundo melhor.”

Assim Edward Snowden, de 36 anos, o foragido da Justi�a norte-americana mais conhecido do mundo, inicia o relato de sua autobiografia. Permanent record, traduzido para Eterna vigil�ncia, foi lan�ado na ter�a-feira em vinte pa�ses, entre eles, Brasil (Editora Planeta), Estados Unidos, Fran�a, Alemanha e Reino Unido. A obra detalha como Snowden participou da cria��o do sistema mundial de espionagem e por que decidiu denunci�-lo, ao constatar os rumos autorit�rios que assumiram os Estados Unicos com a vigil�ncia sem tr�guas da era digital sobre os cidad�os e assim como, na colabora��o entre a espionagem e as multinacionais, a informa��es pessoais s�o comercializadas.“(...) Participei da mudan�a mais significativa da hist�ria da espionagem estadunidense – da vigil�ncia direcionada a indiv�duos � vigil�ncia em massa de popula��es inteiras. Ajudei a tornar tecnologicamente vi�vel que um �nico governo coletasse todas as comunica��es digitais do mundo, que as armazenasse por eras e fizesse buscas nelas � vontade”, afirma Snowden.

Em 2013, Snowden mostrou ao mundo, em reportagens publicadas no jornal brit�nico The Guardian, pelo jornalista Glenn Greenwald, que o governo dos Estados Unidos desenvolvia meios para coletar todos os telefonemas, mensagens de texto e e-mails enviados em qualquer pa�s do mundo, em um sistema sem precedentes de vigil�ncia em massa, uma verdadeira invas�o n�o s� � soberania de pa�ses, mas tamb�m � privacidade de pessoas, em ato contra as liberdades individuais dos cidad�os e de governos. As revela��es causaram ainda mais mal-estar diplom�tico entre os Estados Unidos e pa�ses aliados porque, entre os in�meros documentos vazados, foi demonstrado o monitoramento de mensagens de v�rios l�deres – a chanceler alem� Angela Merkel esteve na mira. No Brasil, a ent�o presidente Dilma Rousseff e seus principais assessores foram espionados, assim como o Minist�rio de Minas e Energia, a Petrobras e as descobertas do pr�-sal. Desse monitoramento nasceria, anos mais tarde, a Opera��o Lava-Jato e suas conex�es com �rg�os de controle norte-americanos.

Centro do esc�ndalo global, Snowden, her�i para milh�es de pessoas que compreenderam o que estava em jogo, foi considerado inimigo p�blico pelo governo americano. Buscou asilo na R�ssia, onde tem perman�ncia assegurada at� 2020. Em Eterna vigil�ncia, ele conta como ajudou a criar este sistema de espionagem mundial e tamb�m como atuou para desvend�-lo, ao se dar conta dos perigos desse projeto. Afirma n�o ser contra que os governos coletem informa��es por medidas de seguran�a, mas alerta para o risco de vigiar pessoas em toda a sua trajet�ria de vida, do momento em que nascem at� a morte. Snowden adverte todos para que tenham muito cuidado ao dar um telefonema, mandar uma mensagem de �udio ou digitar dados de sua conta banc�ria.

Governo americano move a��o judicial

Por causa da autobiografia, em mais um lance de sua ca�ada a Snowden, o governo americano move agora a��o judicial contra ele e as editoras da obra, alegando viola��o de acordos de confidencialidade de assuntos relacionados � “intelig�ncia”. Considerando n�o ser inten��o “deter ou restringir a publica��o ou distribui��o do livro”, o Departamento de Justi�a norte-americano diz pretender “ressarcir-se com todos os lucros obtidos” pelo autor, para que n�o receba “benef�cios monet�rios por violar a confian�a depositada nele”. Pelo Twitter, Snowden respondeu: “� dif�cil pensar em um maior selo de autenticidade que o fato de o governo dos EUA apresentar uma demanda afirmando que o livro � t�o veraz que escrev�-lo era literalmente contr�rio � lei”.

As mem�rias de Snowden esquentam um debate �tico e filos�fico sobre os limites do direito individual � privacidade e as pol�ticas de Estado, que, para al�m da vigil�ncia em tempo integral com alegados prop�sitos de seguran�a nacional – a justificativa veio com o 11 de Setembro – encampa, tamb�m e sobretudo, grandes interesses comerciais de players globais. Para al�m da exposi��o da privacidade individual, tamb�m est� em jogo qual empresa deve ser destru�da com a exposi��o dos dados, portanto, trata-se de quais interesses de mercado est�o em disputa.

 “A raz�o pela qual voc� est� lendo este livro � que eu fiz uma coisa perigosa para um homem em minha posi��o: decidi dizer a verdade. Eu coletei documentos internos da CIA que evidenciavam o desrespeito do governo dos EUA �s leis e os entreguei a jornalistas, que os examinaram e publicaram para um mundo que ficou escandalizado. Este livro fala sobre o que me levou a essa decis�o, os princ�pios morais e �ticos que a embasaram, e como eles surgiram. Isso significa que ele fala tamb�m sobre a minha vida”, escreve Snowden.

O ex-espi�o conta como tal sistema nasce a partir da evolu��o da internet, esta que, em princ�pio, trouxe para ele o inocente encanto das possibilidades de conex�o humana. Evoluiu para a bolha do com�rcio eletr�nico, que colapsou na virada do mil�nio quando percebeu-se que, com pessoas muito interessadas em contar ao mundo onde estavam e o que faziam, tais conex�es podiam ser monetizadas. Foi nesse momento que todas as empresas precisavam descobrir como se colocar no meio dessas intera��es sociais para, por meio delas, extrair lucros. “Esse foi o come�o do capitalismo de vigil�ncia e o fim da internet como eu a conhecia”, revela Snowden. Seguiram-se tempos da web criativa, com in�meros sites individuais, de interessantes conte�dos, mas de dif�cil manuten��o, aos poucos substitu�dos por p�ginas no Facebook e contas do Gmail.

“A apar�ncia de posse era f�cil de confundir com a propriedade real. Poucas pessoas entenderam isso na �poca, mas nada do que compartilhar�amos nos pertenceria mais. Os sucessores das empresas de com�rcio eletr�nico que fracassaram – por n�o ter encontrado nada que estiv�ssemos interessados em comprar – passaram a ter um novo produto para vender. E esse novo produto �ramos n�s”, explica Snowden. “Nossa aten��o, nossas atividades, nossa localiza��o, nossos desejos – tudo que revelamos sobre n�s, conscientemente ou n�o, estava sendo vigiado e vendido em segredo, a fim de retardar a inevit�vel sensa��o de viola��o que a maioria de n�s s� sente agora. E essa vigil�ncia continuaria sendo ativamente encorajada e at� financiada por um ex�rcito de governos �vidos pelo vasto volume de informa��o que obteriam”, prossegue Snowden, que acrescenta: “Al�m de logins e transa��es financeiras, quase toda comunica��o on-line foi criptografada nos primeiros 20 anos, de tal forma que os governos nem precisavam se dar ao trabalho de abordar as empresas para saber o que seus clientes estavam fazendo. “Podiam simplesmente espionar o mundo sem ningu�m saber”, diz ele.

Vigil�ncia em massa

De acordo com o ex-espi�o, o governo dos EUA assumiu o poder da vigil�ncia em massa. “Foi s� quando cheguei a uma compreens�o mais completa dessa vigil�ncia e de seus danos � que passei a me sentir assombrado pela consci�ncia de que n�s, o p�blico – o p�blico n�o apenas de um pa�s, mas do mundo todo – nunca tivemos voz nem voto, nunca tivemos a chance de dar nossa opini�o nesse processo. Um sistema de vigil�ncia quase universal havia sido estabelecido n�o apenas sem nosso consentimento, mas tamb�m de uma maneira que ocultava deliberadamente de nosso conhecimento todos os aspectos de seus programas. A cada passo, os procedimentos vari�veis e suas consequ�ncias eram escondidos de todos, inclusive da maioria dos legisladores. A quem eu poderia recorrer? Com quem poderia falar? S� sussurrar a verdade a um advogado, a um juiz ou ao Congresso seria um crime t�o grave que a simples descri��o b�sica dos fatos mais amplos provocaria pris�o perp�tua em uma cela federal”, afirma ele.

Ao mesmo tempo em que lamenta a morte da internet das conex�es inocentes que conheceu em seus prim�rdios, Snowden alerta para os perigos que vislumbra no futuro pr�ximo, com a fus�o entre a intelig�ncia artificial e a capacidade do sistema universal de vigil�ncia. E n�o deixa de se exasperar com a maioria de n�s, que n�o tentamos compreender como as tecnologias que utilizamos podem ser usadas contra n�s. “� a tirania da n�o compreens�o sobre tecnologia”, constata ele, ou seja, o abismo entre a incompreens�o de quem usa o computador ou smartphone satisfeito pelas facilidades e liberdade alcan�ada, sem atinar em como essa tecnologia nos torna vulner�veis.


ETERNA VIGIL�NCIA
• De Edward Snowden
•  Editora Planeta
• 288 p�ginas

• R$ 44,90 / R$ 36,37 (e-book)


Usu�rios vulner�veis

O document�rio exp�e as arestas do ambiente on-line que favorecem a persuas�o de usu�rios “vulner�veis”, orientando fake news e desinforma��es. Paralelamente, o filme retrata uma luta leg�tima, como o acirramento e mobiliza��es da sociedade civil em defesa � privacidade, como os levantes #DataJustice e #DataForGood. Como se sabe, essa movimenta��o acarretou no aperfei�oamento do arcabou�o jur�dico na privacidade e direito digital na Uni�o Europeia, que aprovou em 2016 a GDPR – nova legisla��o que estabelece normas severas para a prote��o de dados.

No contexto brasileiro, o document�rio cita o recente caso do uso de disparos em massa no WhatsApp durante a �ltima campanha presidencial, vencida por Jair Bolsonaro. Esse aspecto aponta, indiretamente, sobre a urg�ncia de colocar em pr�tica a Lei Geral de Prote��o de Dados (LGPD), recentemente sancionada e que estabelece a cria��o da Autoridade Nacional de Prote��o de Dados. A entidade ter� como miss�o ser a guardi� dos dados pessoais dos usu�rios brasileiros. Num modelo similar, a ag�ncia reguladora ICO, do Reino Unido, � uma refer�ncia de boa pr�tica no debate p�blico sobre a explora��o de dados pessoais. Ela condenou o Facebook e a Cambridge Analytica sobre a coleta indevida de dados pessoais dos usu�rios, com multas de 550 mil e 15 mil libras, respectivamente.

Elaborado como uma grande reportagem, Privacidade hackeada reconstitui a linha hist�rica de uma das pol�micas mais noticiadas dos �ltimos anos e que colocam em risco democracias do mundo todo, sejam elas novas ou mesmo consolidadas. Ao viver os impasses e os levantes de Carrol, Cadwalladr e Kaiser surge a constata��o de que a era dos big datas interpela o posicionamento de todos os cidad�os. H�, no presente imediato, muitos desafios, os quais envolvem legisla��es pr�ticas tecnol�gicas e um amplo debate p�blico. Inserir a big data no centro da agenda contempor�nea n�o � uma quest�o de escolha, mas uma urg�ncia para toda democracia que preza seus valores mais essenciais.

Servi�o


PRIVACIDADE HACKEADA
•  Dura��o: 2h19min
•  Document�rio de Karin Ahmer e Jehane Noujaim
•  Dispon�vel na Netflix




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